Capítulo 33 – Detalhes
No dia seguinte, um domingo, Viviane percebeu que não tinha nada para
fazer. Ligou para Verônica e perguntou se ela não tinha nada para fazer, mas
Verônica respondeu que estava fazendo um trabalho de faculdade para entregar na
segunda. Vivi conversou um pouco com o avô. Logo depois que saiu do quarto do
Dr. Otávio, resolveu ir à biblioteca.
Ao entrar, percebeu que Emanuela e Mariana estavam concentradas. Viviane
entrou sob os olhares curiosos das outras duas e pegou um livro qualquer na
estante, enquanto parecia tentar tomar coragem para falar algo. Durante o
jantar do dia anterior, ela mal falara algo com as duas, principalmente, devido
ao que tinha acontecido sobre Viviane dizer o segredo de Mariana.
— Vocês só têm isso para fazer? – perguntou Viviane depois de alguns
minutos em silêncio, enquanto folheava o livro e olhava de vez em quando para
as duas que conversavam baixo sobre algumas questões da matéria que Mariana
estudava.
Mariana e Emanuela olharam para Viviane.
— O que foi? – perguntou Vivi, percebendo o espanto no rosto das irmãs.
– Eu disse alguma coisa estranha?
Mariana sorriu um pouco confusa.
— Não... Quer dizer... É que ontem você quase não falou com a gente.
— Mas agora eu quero falar... Por quê? Não posso?
Emanuela olhou para Viviane.
— Pode... Mas há algum motivo especial para isso?
Viviane se aproximou de repente da mesa onde as meninas estavam.
— Sabe o que é... – disse, olhando para as duas. – É que eu estou
completamente entediada! Quer dizer, eu liguei para a Verônica e ela está
ocupada, até o Fabinho saiu com a babá...
Emanuela e Mariana permaneceram em silêncio.
— E o que vocês me dizem? – perguntou Vivi esperançosa.
Emanuela ainda estava confusa.
— Por acaso, está nos convidando para sair?
Viviane sorriu.
— Como imaginado do principal cérebro das duas. Como sempre você pega as
coisas rápido, Emanuela.
Mariana olhou intrigada para Viviane.
— O que quer dizer com...
— Então, aceitam ou não? – perguntou Viviane, interrompendo Mariana.
As gêmeas se olharam como que perguntando uma a outra.
— Tudo bem... – disse Emanuela
— Mas tem uma condição. – acrescentou Mariana, atraindo também o olhar
curioso da irmã.
— Que condição? – perguntou Vivi.
Mariana sorriu.
— A condição é que a gente não vá a qualquer lugar que se pareça com um
shopping.
— Ok, então. Não estava pensando em fazer compras. Que tal a praia?
As duas concordaram.
— Tudo bem. – disse Vivi por fim. – Está decidido. Vamos à praia. Vamos
arrumar as coisas bem rápido e a gente vai. O motorista nos leva até lá.
— Antes do almoço? – perguntou Mariana, ficando desmotivada.
—A gente come alguma coisa por lá... – disse, saindo.
Mariana olhou para Emanuela como se tivesse um ponto de interrogação no
rosto.
— Eu não sei o que deu nela... – disse, olhando para a porta que acabara
de se fechar. – Mas até que estou gostando dessa nova versão da Viviane.
Emanuela sorriu, pensando que talvez essa Viviane não fosse tão nova
assim.
***
Viviane e Mariana estavam na areia da praia, debaixo do guarda sol,
esperando que Emanuela chegasse, pois ela tinha saído para comprar algumas
garrafinhas de água.
— Por que está sendo assim com a gente? – perguntou Mariana, enquanto
Viviane passava protetor solar.
— Assim como? – Vivi perguntou displicente.
—Legal. – disse, logo percebendo que Viviane parara de repente.
Viviane permaneceu calada por alguns instantes.
— Esse é um pedido de desculpas... – disse ela um pouco envergonhada.
Mariana olhou para Vivi, já imaginando porque ela queria pedir desculpas.
Viviane desviou o olhar do mar e olhou para Mariana – Queria pedir desculpas
pelo que eu fiz ontem. Sei que não foi legal.
— Pelo menos sua intenção foi boa.
— Isso não é desculpa. Nunca ouviu falar “de boas intenções o caminho do
inferno está cheio”?
As duas permaneceram em silêncio por um instante. Apenas ouviam o som do
mar e o barulho de conversa inteligível de pessoas que vez e outra falavam algo
enquanto mergulhavam.
— Sabe, Mariana... – disse Viviane sem olhar para a garota. – Outro dia,
conheci uma garota extremamente chata. Não, totalmente irritante. Se houvesse
um adjetivo melhor, eu até usaria... – e
rindo-se. – Acredita que eu cheguei até dar uma tapa nela? Naquele momento, eu
me lembrei de mim mesma e pensei “Ah... Então deve ser assim que as pessoas se
sentem em relação a mim”. – e volvendo-se para Mariana com um sorriso um pouco
melancólico – Me pergunto quantas vezes as pessoas sentiram vontade de me dar
uma tapa daquele jeito. Não posso culpá-las por se sentirem assim também.
Mariana permaneceu em silêncio por alguns instantes.
— De fato. Mas algumas pessoas são irritantes ou tem convicções muito
fortes, porque querem que os outros se afastem... Não querem se machucar. No
fundo, essas são as que mais precisam de atenção, mas vivemos em uma sociedade
onde querer ser amado é considerado algo ruim, então, elas não têm alternativa
a não se fecharem dentro de si mesmas.
Viviane olhou para Mariana e riu.
— Que boa garota você é... E pensar que eu realmente tinha raiva de
vocês. Dizer que eram uma fraude era só uma desculpa. No fundo, eu sabia que
meu avô jamais traria duas garotas para casa se não tivesse certeza que eram
netas dele. Mas isso pouco importava. A verdadeira razão era porque, mais do
que tudo, eu achava que vocês queriam tomar o pouco que eu tinha. Mas, no
final, a verdade é que fui eu quem tomei tudo de vocês. Engraçado como as
coisas são.
Mariana olhou séria para Viviane.
— Não é bom pensar assim. É verdade que não é bom pensar como vítima,
achando que só você tem problemas e só você sofre, mas também não é bom pensar
como se fosse a culpada por tudo de ruim e que por sua causa todas as pessoas
são infelizes. A felicidade é algo que vem de dentro para fora e não o
contrário. Absolutamente todos nós temos problemas, mas a questão não é essa, a
questão é como nós reagimos a eles. Eu gosto de reagir positivamente. Claro que
algumas pessoas acham isso bobagem, mas, no meu ponto de vista, pensar que nada
vai dar certo não acrescenta nada à minha vida.
— Engraçado que Emanuela não parece ter a mesma facilidade como você
nesse sentido... – comentou Viviane.
De repente, Emanuela chegou.
— Pronto, trouxe a água. – disse, sentando-se perto das duas e
entregando as garrafinhas de água.
— Você foi fazer a água, minha filha? – perguntou Mariana brincalhona.
— Claro que não, minha mãe! – respondeu Emanuela, fazendo com que
Viviane e Mariana rissem.
***
Fabrício estava animado. Possivelmente, na segunda, receberia o
resultado de uma entrevista que havia feito e estava confiante que seria
empregado, além disso, depois de quase uma semana sem ver Emanuela, que agora
sempre estava ocupada trabalhando, iria sair com ela à noite. Parecia que,
enfim, as coisas estavam dando certo. Por enquanto, ainda tinha algumas coisas
para resolver, como pegar emprestado o carro da irmã.
Saiu do apartamento e desceu pelo elevador. Assim que saiu do prédio,
uma vã parou de repente. Um homem desceu com uma arma, se aproximou e a
pressionou contra o abdômen de Fabrício.
— Entra no carro! – gritou o desconhecido.
Fabrício se assustou, mas como sempre havia ouvido, ele não reagiu e
apenas entrou no carro. Para sua infelicidade, não havia ninguém por perto,
presenciando a cena para que pudessem acionar a polícia.
Entrou e se sentou no banco de trás junto com mais outro, que também
estava armado, enquanto o motorista dava partida no carro.
— O que vocês querem? Dinheiro? Eu não tenho dinheiro... – disse,
tentando manter a calma.
Um dos homens riu.
— Se fosse um seqüestro, mostraríamos nosso rosto? Idiota. – disse.
***
As três garotas, depois de um pouco de sol, foram almoçar em um
restaurante especializado em frutos do mar que ficava próximo à praia. Viviane
e Mariana escolhiam algo no cardápio, enquanto Emanuelade vez em quando olhava
no celular.
— O que foi que está olhando o celular assim? – perguntou Mariana,
tirando a atenção do cardápio e olhando para a irmã curiosa.
Emanuela pareceu ficar um pouco sem jeito.
— Ah, Mariana... – disse Vivi – Não percebe? Possivelmente, ela está
esperando a ligação do namoradinho dela. – e depois, percebendo o pouco de
mal-estar que se estabelecera. – Ah, desculpa. – disse meio sem jeito.
— Não precisa se desculpar. – disse Mariana. – Nós duas resolvemos agir
com naturalidade sobre isso.
— Entendo... Então, está bem. Então, essa preocupação toda é por que é o
primeiro namorado, é?
Mariana olhou curiosa para Vivi.
— Você fala como se já tivesse tido muitos namorados... Pelo que eu
saiba, você também não é muito experiente nesse assunto.
Viviane olhou para Mariana, se fingindo de chateada.
— E nem mesmo você. – e um pouco mais baixo. – Pelo menos, eu sei quando
um cara está interessado em mim...
— O que disse? – perguntou Mariana.
— Nada. – respondeu Viviane, tentando disfarçar. – Mas quer saber?
Melhor assim, homens dão muito trabalho no final das contas. É só olhar para
sua irmã. Namorando há pouco tempo e está toda preocupada por que ele não liga.
E isso é só o começo. Depois, vêm as desculpas de que quer ficar com os amigos
e blá, blá, blá...
— Lá vai de novo, falando como se tivesse experiência. – comentou
Mariana.
— Quem precisa de experiência própria, quando se tem a internet com
pessoas com experiência prática? – retrucou Viviane.
— Falou a sabedoria em pessoa. – comentou Mariana, provocando Viviane –
Essa vai para as célebres frases da Viviane. Sabe que até pensei em montar um
blog só com suas pérolas?
— Você não é a primeira pessoa a ter essa ideia. – e percebendo o que
acabara de ouvir – O quê? Pérolas? – disse Viviane, apertando as bochechas de
Mariana. – Agora, vou fazer o que sempre tive vontade e me vingar por ter me
tirado o Rafael. – falou, enquanto Mariana também começava a puxava as
bochechas dela também, fazendo Emanuela rir.
— Vocês se dão bem mesmo, hein? Parecem até irmãs.
— Quem?! – perguntaram as duas em uníssono, soltando uma da outra,
enquanto as duas massageavam as bochechas vermelhas.
— Eu me dar bem com essa patricinha? Somos o completo oposto. – declarou
Mariana.
— É verdade. Jamais posso ser como irmã para essa santinha do pau oco. –
disse Viviane, provocando a outra.
Emanuela suspirou, fazendo com que as outras duas ficassem sérias.
— Mas você parece que não está aproveitando muito. – comentou Viviane.
— Se querem realmente saber... – disse – É que Fabrício disse que
ligaria para confirmar a que horas vem me pegar hoje. Tentei ligar para ele,
mas não atende. Então, fiquei um pouco preocupada, só isso. Pode estar
acontecendo alguma coisa.
Viviane riu.
— O que, por exemplo? Sendo raptado ou algo do tipo? – e olhando para Emanuela.
– Não se engane, Manu, os homens, em sua maioria, têm o mesmo comportamento.
Exceto um aqui e outro ali. – disse, ficando pensativa.
Mariana olhou para Vivi, tentando descobrir o que ela estava pensando.
— Por acaso, você está querendo dizer que o Rafael está incluído nessa
exceção?
— Ah? – disse ela, acordando de seus pensamentos. – C-claro. De quem
mais eu estaria falando. Rafael é um Lorde. O homem dos sonhos de qualquer
mulher. Lindo, educado, rico...
— Do jeito que você fala, até parece que não sabe que Rafael pode ser...
– disse, parando no meio da frase. Mariana ficou um pouco receosa de estragar
os sonhos de Viviane.
— Pode ser o quê? – perguntou a outra.
— Gay...?
Viviane riu alto, atraindo a atenção de alguns que estavam por perto.
— Você está maluca? Se Rafael é gay, então, você é um homem.
— Então... Ele realmente gosta de uma garota... – disse quase em
sussurro.
Viviane olhou, semicerrando os olhos.
— Será que tenho que desenhar para saber quem é a garota de quem Rafael
gosta?
— Então, quem é?
— Você é uma tapada mesmo. Já te dei tantas dicas.
Emanuela olhou para Viviane e seu rosto se iluminou.
— Ah, sério?!
Viviane riu.
— Como esperado do cérebro.
Mariana ficou olhando para as duas, confusa.
— Então, quem é? – e olhando para Emanuela – Quem é?
— Não ouse dizer, Manu. – ameaçou Vivi.
— Se ela não perceber sozinha, então não adianta. – disse Emanuela.
— Ah, meninas! Vou ficar na curiosidade mesmo?
Viviane olhou para Emanuela séria.
— Tudo bem... O nome dela é... – disse fazendo um suspense, enquanto
verificava a expectativa de Mariana. Não conseguia imaginar como poderia haver
uma garota tão lenta para certas coisas. – Não vou dizer. Também tenho meu
orgulho próprio. Afinal, até pouco tempo atrás, Rafael era meu objetivo.
— Era? – perguntaram as gêmeas em uníssono.
Viviane parecia meio sem jeito.
— Digo, é. Ele é. Verbo ‘ser’ no presente, ok? Até pouco tempo atrás e
sempre. – e tentando mudar de assunto, enquanto via Emanuela olhando para o
celular de novo. – Não fique assim, daqui a pouco ele liga, dizendo que estava
assistindo um jogo e não ouviu o celular tocar.
***
Fabrício estava sentado em uma cadeira em frente à escrivaninha daquele
homem. Parecia um déjà vu, no entanto, o que estava acontecendo era
real. Mais uma vez, aquele homem que, de alguma forma, aprendera a desprezar
estava a sua frente, soltando baforadas, enquanto fumava um charuto. Olhou em
direção à porta e dois dos homens que o haviam capturado estavam de prontidão
ali.
— O que você quer agora? – perguntou Fabrício, virando-se para
Fernandes. – Pensei que tudo já estivesse resolvido entre nós.
Fernandes cerrou os olhos por um instante e soltou mais fumaça,
infestando o ar, o que fez com que Fabrício se irritasse mais ainda.
— “O que você quer agora?” – disse Fernandes, olhando para o jovem. – Você,
com certeza, é corajoso para falar comigo assim. Ou isso, ou é um completo
louco. – e soltando mais uma baforada.
Fernandes, calmamente, pegou um papel que estava na gaveta e estendeu
para que Fabrício pudesse ver. Fabrício leu o papel e ficou assustado. Aquele
documento dizia que Fernandes havia emprestado mais de um milhão de reais em
dinheiro para Fabrício. E bem embaixo havia a assinatura do rapaz.
— O... O que é isso? – perguntou ele atônito. – Não me lembro de ter
assinado isto!
— Não se lembra? – disse Fernandes rindo. – Deveria ler os contratos que
assina, meu rapaz.
— Como isso aconteceu? – perguntou ele assustado.
— Muito simples. Nada que uma criança não saiba fazer... O documento que
você assinou que estava por cima, de fato foi o que Rosália digitou, mas o
outro documento eu apenas o imprimi. Simples não? Você assinou os dois, como se
fosse o mesmo, e ficou com o que tinha que ficar. Com isso, você me deve muito
mais do que um milhão de reais. É por isso que as pessoas sempre dizem para ler
exatamente tudo que se assina.
Fabrício estava perplexo. Não sabia como pôde ser tão ingênuo e ser
enganado daquela forma tão boba.
— Mas eu não tenho esse dinheiro.
— Como não tem? Principalmente, agora... Depois que eu soube que seu pai
tem relação direta com o Grupo Demontieux.
Fabrício olhou um pouco ameaçador para Fernandes.
— Meu pai não tem nada a ver com essa história! Não o coloque nisto!
— Ok, então... – disse Fernandes calmamente. – Então, como pretende me
pagar?
— Eu já disse, eu não tenho esse dinheiro... – sussurrou Fabrício.
Fernandes soltou mais uma baforada.
— Tudo bem, então, não tenho alternativa a não ser procurar o seu pai
e...
— O que mais eu posso fazer para que não vá até meu pai? – interrompeu
Fabrício com o olhar perdido. Àquela altura, pedir ajuda a seu pai significava
assumir que era incapaz de sobreviver sozinho. Significaria dizer que era um
incompetente e imaturo como seu pai sempre dizia.
Fernandes sorriu. Finalmente, havia chegado ao ponto. Havia confiado no
orgulho do rapaz para conseguir o que queria e Fabrício não havia decepcionado.
***
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