Capitulo 19 - Revelação
O jantar
na mansão dos Alcântara ocorreu sem maiores problemas, o que surpreendeu o
patriarca da família, o Dr. Otávio. Para ele, Viviane se comportara e isso o
intrigava, apesar de estar visivelmente contente com isso.
As gêmeas
foram para os quartos. No entanto, Mariana querendo conversar mais com a
irmã, entrou no quarto de Emanuela e deitou-se na cama de bruços, enquanto
olhava para a irmã que tirava algumas roupas da mala que trouxe.
— O que
você achou? – perguntou Mariana, olhando a irmã, deixando sua posição inicial e
sentando-se na cama.
— Do quê?
— Da
família Alcântara.
Emanuela parou
o que estava fazendo e sentou-se ao lado da irmã.
— Não sei
muito bem. Mas, acho que dos três filhos do seu Otávio, apenas aquele advogado,
o Otávio Jr., pareceu não gostar muito da nossa presença.
— Pareceu
não gostar?! – exclamou Mariana perplexa, sentando-se na cama. – Ele realmente
não foi com a nossa cara! Mas tirando isso, acho que foi bem legal. A mãe da
Viviane me pareceu muito simpática, o que me deixou mais à vontade e até a
própria Viviane me surpreendeu... – e sorrindo – Acho que a vida aqui vai ser
bem divertida!
Emanuela
nunca conseguia entender a irmã.
— Fala
sério, Mariana. Às vezes, eu me pergunto de onde vem tanto entusiasmo...
— E como
não? – disse ela se levantando. – Você não percebe, Manu? Estamos vivendo como
princesas em um castelo e temos uma família. É claro que ainda falta ser
revelado que somos netas do Dr. Otávio, mas mesmo assim... Isso não te deixa
feliz?
Emanuela
suspirou.
— Você
sempre achando que as coisas são simples. – e sorrindo. – Mas acho que
entendo um pouco o que quer dizer.
De
repente, o rosto de Mariana pareceu se iluminar.
— Manu,
tive uma idéia!
Emanuela
pareceu preocupada.
— O que
foi? – perguntou ela hesitante.
Mariana
fez um gesto com a mão espalmada para pedir à irmã um minuto. Foi até a porta
do quarto, abriu-a e olhou para o corredor, depois a fechou novamente.
— Que tal
um passeio pela mansão?
Emanuela
não acreditava no que estava ouvindo.
—
Mariana, quantos anos você tem? Não estamos mais na fase de aventuras. Além
disso, acabamos de chegar a essa casa. Você quer que mais pessoas nos detestem?
— Do que
você tem medo? Se alguém nos ver, é só dizer que não temos sono, ou sei lá,
inventar uma desculpa qualquer.
— Nem
pensar. – objetou Emanuela.
— Por
favor... Por favor... – pediu Mariana, olhando para a irmã, tentando convencê-la
sem êxito. — Então, eu vou sem você mesmo! – disse, enquanto saía.
Emanuela
não sabia o que fazer. De repente, percebeu que se deixasse Mariana sozinha,
talvez ela entrasse em alguns problemas. Saiu para o corredor, mas não
encontrou ninguém.
“Mariana,
por que você se comporta assim?” – pensou, enquanto saía à procura da irmã.
Mariana
desceu rapidamente as escadas. Pelo que conhecia da irmã, em poucos minutos,
ela estaria ali, fazendo-a voltar para o quarto. Apesar de ter a idade que
tinha, odiava ter que se comportar como adulta o tempo todo.
“Detesto
esse mundo de padrões” – pensou consigo mesma, enquanto terminava de descer às
escadas. - “Aonde eu vou primeiro?” – perguntou a si mesma, olhando para os
lados.
De frente
à escada estava a sala principal da mansão, que estava apenas iluminada por uma
luz fraca de um abajur. Mariana se deteve, olhando para ela e pensou que não
tinha notado o quanto ela era grande. Cheia de decorações, sofás, poltronas
acolchoadas, tapetes e quadros de pintores pós-modernistas. Mariana andou até
lá. A parede do lado oposto à escada, a alguns metros, era coberta por enormes
cortinas que pela aparência pareciam ser muito caras. Na parede do lado
esquerdo, parecia haver uma porta de correr feita de madeira e ao lado dessa
porta, na parede paralela à parede de cortinas, havia outra porta um pouco
menor.
Mariana se
dirigiu até a porta de correr e a abriu com um som quase inaudível. O que viu a
surpreendeu. Era um imenso salão onde, quase no centro, havia um piano. No teto,
havia lindos lustres e nas paredes, cortinas luxuosas.
— Isso
deve ser um salão de festas. – disse para si mesma, enquanto fechava a porta
novamente e voltava à sala principal.
Ainda na
sala, no outro lado, havia a porta que dava para a sala de jantar já conhecida
por Mariana. Ela entrou na sala de jantar que também era tão grande como todos
os cômodos daquela sala. No fundo da sala de jantar, havia uma porta que levava
a um corredor tão largo que quase não poderia ser chamado de corredor
“Nossa,
como é linda. Como eu não tinha percebido?” – pensou.
Ela
passou pela sala e entrou no corredor que dava para a cozinha. Mariana pensou
que não mais se surpreenderia, mas estava enganada. A cozinha era bastante
luxuosa, no entanto, era um luxo sem exageros. Em um canto da cozinha havia um
pequeno bar.
— Você
não deveria estar dormindo? – perguntou alguém, saindo da penumbra do bar com
um copo de bebida.
Mariana
quase caiu do susto que teve, fazendo rir a pessoa que se aproximava.
— Por que
se assustou assim? Estava fazendo algo errado?
Era
Érica. Mariana a reconhecera.
— E-eu só
estava...
— Não
precisa me explicar, afinal você tem mais direito do que eu de ficar nessa
casa... Eu sou uma parente muito distante, enquanto que você e sua irmã são
netas do Dr. Otávio. – disse ela, se aproximando um pouco tonta. E como que
percebendo que falara demais. – Digo, netas adotivas... Você me entendeu...
Mariana olhou
para Érica intrigada e logo compreendeu que ela estava um pouco bêbada. Ela se
aproximou mais de Mariana e olhou bem para ela.
— De
fato, você se parece muito com... – disse, mas, de repente, foi como se
recobrasse a consciência.
— Pareço
com quem? – perguntou ela curiosa.
— Nada. –
ela disse, logo depois, comprimindo a mão contra o estômago. – Maldita dor.
De
repente, Érica pareceu se desequilibrar, Mariana conseguiu segurá-la a tempo.
—
Obrigada. – disse ela. – Você é muito gentil, nem se compara à sua irmã. –
bebeu o resto do líquido no copo. – Acho que preciso dormir um pouco.
Mariana
pegou o copo e o colocou em cima de uma mesa, enquanto ajudava Érica a ir para
o quarto.
— Onde
fica o seu quarto?
— Suba a
escada, à direita.
Mariana
se surpreendeu.
— No
mesmo corredor onde fica o meu quarto? – e dizendo como para si mesma - Mas eu
acho que Viviane não chegou a mencionar isso.
Érica
riu.
— Eu
disse que você era mais gentil que ela. Viviane ignora totalmente as pessoas
quando ela quer.
Mariana
percebeu que o quarto de Érica era ao lado do dela. Logo que Érica entrou no quarto,
olhou para Mariana.
—
Desculpe, mas como é mesmo o seu nome?
—
Mariana.
—
Obrigada, querida. – disse, enquanto fechava a porta.
Mariana
ficou no corredor, pensativa.
“Estranho...
Pensei que o Dr. Otávio estava mantendo em segredo o fato de que somos netas
dele para toda a família... Mas pelo que vejo, parece que todos já sabem.”
Depois,
olhou o quarto da irmã. Emanuela não estava. Mariana pensou em esperar pela
irmã, mas estava com muito sono, então foi ao seu quarto dormir.
***
Emanuela
desceu as escadas. Olhou para frente e viu a sala principal. No entanto, sem saber,
tomou o caminho inverso de Mariana. Ao invés de seguir em frente para a sala
principal, saiu para o lado direito e entrou em um pequeno corredor. Logo,
quando saiu do corredor, ela chegou a uma pequena sala. Na esquina à esquerda,
bem próxima a ela, havia uma porta com o nome “Biblioteca” e ainda à esquerda,
um pouco mais a frente na pequena sala, enormes janelas e suntuosas cortinas. Bem
a sua frente e do lado oposto à biblioteca, havia outra porta. Emanuela se
aproximou e verificou que estava trancada.
“Deve ser
algum escritório” – pensou.
À direita
dessa saleta, do lado oposto às janelas, havia um elevador e bem ao lado uma
escada que dava para o segundo andar.
Ela
pensou que a irmã não teria a ousadia de ir para o segundo andar. Hesitou por
um instante e abriu a porta da biblioteca, o que a surpreendeu bastante. A
biblioteca era bem iluminada e havia muitas estantes abarrotadas de livros.
Emanuela
não fazia ideia que aquela biblioteca pudesse ser tão grande. Sempre pensara
que as bibliotecas pessoais eram bem menores. De repente, ela percebeu que
alguém se aproximou, o que a assustou. Ela olhou e percebeu que era Viviane.
— O que
está fazendo aqui? – perguntou Viviane, tentando esconder um papel que estavas
nas mãos.
— Estava
sem sono. – respondeu Emanuela, pegando emprestada a desculpa de sua irmã.
— Ah,
claro... – disse, se dirigindo à porta. – Boa noite, então. - e parando – Vocês
já se acham donas de tudo, não é? Andando por aí, quando mal chegaram nessa
casa.
— Me
desculpe... – disse Emanuela, sentindo-se envergonhada.
Viviane
virou-se e olhou para Emanuela.
— Não
pense que vou cair nesse seu teatrinho... Estou entrando no jogo de vocês para
não preocupar meu avô. Mas, mais cedo ou mais tarde, vou desmascarar vocês
duas. Porque para mim, isso tudo foi planejado por vocês. – disse, saindo.
Emanuela ficou
parada durante um tempo, tentando descobrir do que realmente ela estava
falando.
“Eu sabia
que não era tão simples.” – pensou, mas seus pensamentos se dissiparam ao olhar
para aquela quantidade imensa de livros.
Emanuela
se deteve olhando para aquela quantidade de livros. Havia livros de literatura
brasileira, americana, inglesa... E outros assuntos, dentre eles Medicina. Emanuela
não soube quanto tempo permaneceu ali até que um bocejo a fez olhar para o
relógio.
—
Meia-noite! – disse. “Preciso ir dormir!” – pensou, enquanto saía às pressas da
biblioteca.
Ao voltar
para os quartos, tentou abrir o quarto da irmã, mas estava trancado. Concluiu
que Mariana já tinha voltado e que estava dormindo.
***
Mariana e
Emanuela acordaram cedo. Gabriele pediu para que a governanta Sônia as chamasse
para que tomassem seu café da manhã. As duas desceram e foram para a sala de
jantar onde havia diversos tipos de comida. Mariana, no começo, pareceu um
pouco constrangida em comer ali junto com Gabriele e Viviane, mas depois
esqueceu e parecia se deliciar com tudo.
— Nossa!
Esse bolo de batata está maravilhoso! – elogiou Mariana. – Quem foi que fez?
Foi a senhora, Dona Gabriele?
Gabriele
sorriu.
—
Infelizmente, não tenho o dote culinário. Foi a nossa Ane. Ela cozinha para a
família desde que Viviane ainda era muito pequenininha.
— E esse
bolo de chocolate? Está com uma cara maravilhosa!
Gabriele
riu.
— Você
fica empolgada como o Fabinho.
— E onde
ele está? – perguntou Mariana empolgada, pois gostava muito de crianças.
— Foi
para a escola. Como ele estava se transferindo, só hoje pode ir.
Mariana
fez um muxoxo.
— Que
pena. Pensei que podia brincar um pouco com ele.
Emanuela,
que estava em silêncio, resolveu se intrometer na conversa.
—Você
fala como se o garoto fosse um brinquedo. Quantos anos você tem?
Gabriele
sorriu, divertindo-se, mas seu sorriso se desvaneceu quando olhou para a filha
que também estava tomando o seu café da manhã em silêncio junto com as duas.
Viviane,
de repente, se levantou.
— Não vai
comer mais nada, filha? – perguntou preocupada. – Você comeu tão pouco.
— Não
estou com muita fome... – disse, saindo, mas logo depois parou e virou-se, olhando
diretamente para Emanuela. – Ah, ia esquecendo. Emanuela, o vovô quer falar com
você. Ele disse que está esperando no escritório. Fica em frente à
biblioteca... Ah, eu não preciso dizer onde é, afinal você já deve ter dado uma
conferida na casa, não é? – concluiu, saindo.
—
Estranho... – comentou Mariana assim que Viviane saiu.
— O que
seria estranho? – perguntou Gabriele curiosa.
— Nós somos
gêmeas idênticas e usamos até o mesmo estilo de cabelo. Até quem nos conhece há
muito tempo hesita um pouco, quando chama uma de nós, mas Viviane é uma das
poucas pessoas a nos diferenciar em tão pouco tempo. E é porque não falamos o
nosso nome uma só vez, quando conversamos aqui.
— Com a
sua personalidade fica difícil sermos confundidas. – comentou Emanuela.
— Olha
quem fala. – Mariana alfinetou a irmã.
Gabriele sorriu,
se divertindo com as duas. Pensou que talvez Viviane pudesse mudar um pouco com
a influência das garotas.
***
Logo
depois do café, Emanuela se dirigiu para o escritório do Dr. Otávio, enquanto
Mariana conversava com o pai que estava no jardim. Os outros membros da família
saíram, com exceção de Érica, que continuava no quarto.
Emanuela
bateu na porta e abriu-a, quando obteve permissão para entrar. Ao entrar,
percebeu que o Dr. Otávio olhava pela janela que ficava próximo a sua poltrona.
— O que o
senhor queria falar comigo?
Otávio
virou-se e sorriu, sentando-se logo em seguida.
— Só
queria saber como vocês estão se sentindo... Quer dizer, vocês se sentem
confortáveis? Querem que eu faça alguma coisa? Se tiverem algum problema, não
hesitem em me procurar.
— Está
tudo bem, Dr. Otávio. Não precisa se preocupar.
— E onde
está sua irmã?
— Foi
falar com Rogério. Aquela lá já estava com saudades do pai. – e pensativa. – Se
bem que talvez agora, ela já esteja na biblioteca, estudando.
—
Estudando? – perguntou ele curioso.
— Sim.
Mariana tem estudado bastante desde o ano passado para passar em Medicina. É o
sonho dela.
Otávio parecia
surpreso.
— Medicina?
Que ótimo. Viviane também faz medicina. – de repente, seu rosto pareceu se
iluminar. – Será que a sua irmã aceitaria fazer uma prova na faculdade onde
Viviane estuda? Posso agendar para ela.
— O
senhor faria isso? – disse contente. – Com certeza, ela vai ficar muito feliz.
Mas eu acho que é melhor falar com ela primeiro.
— Claro.
– disse com o olhar vago, mas parecendo realmente alegre. – E você? – olhou
para Emanuela. – Que faculdade pretende fazer? Posso agendar uma prova para
você também.
Emanuela
ficou um pouco séria.
— Na
verdade, eu não sei ainda...
Otávio
sorriu compreensivo.
— Não tem
problema. Assim que você se decidir, por favor, me diga para que eu possa falar com o Diretor da faculdade.
— Sim,
Dr. Otávio. Mas há outra coisa sobre a qual eu gostaria de falar...
— O quê?
— Eu
disse ao senhor que uma das condições para eu ficar nessa casa era fazer algo.
Afinal, eu e minha irmã somos completamente estranhas nessa casa. Não quero que
os seus familiares pensem que estamos aqui para tirar vantagem do senhor.
Otávio
pareceu um pouco pensativo.
—
Emanuela, o fato é que... – disse ele um pouco hesitante.
— O quê?
— Bem,
sim... Eu providenciarei para que faça algo, se é assim que deseja. O que acha
de trabalhar como aprendiz na parte administrativa do Grupo?
— Sim,
claro. – disse Emanuela sorrindo - Muito obrigada, Dr. Otávio.
Otávio
sorriu.
— Não
precisa me agradecer. Quanto à prova de Mariana, assim que ela estiver pronta é
só falar comigo.
— Sim,
vou avisar a ela.
***
A aula
Anatomia II tinha acabado de começar, mas por mais que o professor falasse,
Vivi não conseguia se concentrar. De repente, ouviu alguém falando com ela. Era
o professor que perguntava algo.
— Não vai
me responder, Viviane? – perguntou o professor um pouco descontente.
— O que,
professor? – perguntou Vivi, como que acordando.
A turma
riu. O professor parecia irritado.
— Viviane
Alcântara, você confia muito no seu sobrenome, não é?
Viviane
não soube responder.
—
Felizmente, essa universidade não foi fundada por um brasileiro. Aqui todos são
tratados por igual. Então, senhorita Alcântara, eu gostaria de lhe avisar que
você poderá ser reprovada como qualquer outro. Você me entendeu?
— Claro,
professor. – respondeu ela. - “É sempre a mesma conversa...” – pensou.
A
primeira e a segunda aulas terminaram, para alívio de Viviane que poderia
aproveitar o intervalo.
Verônica
a encontrou pensativa, sentada no refeitório da faculdade.
—
Viviane? – perguntou, passando a mão em frente à amiga como que tentando
acordá-la.
Viviane
olhou para Verônica.
— Verô! Como
você vai? Está bem?
Verônica
olhou surpresa para Vivi.
— Primeiro,
você sabe que eu detesto esse apelido, mas por causa de alguma lapso na sua
memória, você deve ter esquecido. Segundo, não era eu que devia perguntar se
você está bem?
— Era?
Verônica
suspirou, mas depois a sua expressão pareceu mudar de repente.
—
Viviane, o Fabrício comprou um apartamento novo. Você não quer ir comigo? Vai
ser depois da aula...
—
Desculpa, Verô... – e sob o olhar ameaçador da amiga – Digo, Verônica... –
disse. – Eu não estou com o humor muito legal. Depois eu visito o Fabrício,
pode ser?
— Claro.
– respondeu Verônica desanimada. – Você não deve mesmo estar legal... Sempre
quando começa a inventar apelidos é porque a situação está ruim. Mas o que
houve?
Viviane
parecia distante.
— Não foi
nada...
— Ok,
então... - “O que deu nela?” – pensou.
Viviane
saiu da faculdade. Não estava com a menor vontade de estudar naquele dia. Havia
muitos pensamentos em sua cabeça. Pegou o celular para chamar o motorista
particular, mas desistiu da ideia. Resolveu caminhar um pouco até a entrada do
campus. Foi seguindo pela calçada na rua e passando pelos diversos núcleos da
universidade - Ciências Humanas, Sociais, Exatas... O campus era realmente
grande, como pensou em seguida. Alguns carros passavam e até mesmo o ônibus da
universidade, mas Viviane não prestava atenção a eles. O seu pensamento estava
distante. No entanto, como que automaticamente, começou a atravessar a rua e,
de repente, percebeu que um carro vinha em alta velocidade. Não havia tempo de
correr. Viviane ficou paralisada, enquanto o carro se aproximava rápido. De
repente, alguém puxou Viviane e o carro passou, buzinando alto, enquanto o
motorista soltava alguns palavrões.
— Você
está bem? – perguntou a pessoa que havia puxado Viviane. – Tem alunos que não
sabem que estão em um campus e correm feito loucos.
Viviane
olhou para a pessoa e teve um sobressalto. Era Gabriel.
— Você
está bem? Se machucou em algum lugar? –
perguntou ele preocupado.
— S-Sim.
Quer dizer. – disse, baixando os olhos. – Quem estou tentando enganar. Eu não
estou nada bem... – falou, enquanto limpava algumas lágrimas que corriam no
rosto.
Gabriel
parecia meio desconcertado.
— Você
está chorando? É melhor irmos ao hospital? – perguntou ele sem saber o que
fazer.
— Não preciso
de hospital. – disse ela, enxugando as lágrimas, enquanto voltava a caminhar,
ignorando o rapaz.
Gabriel a
pegou pelo braço.
— Você
não está bem. Do jeito que está pode ser atropelada e não quero me sentir
culpado por isso. Venha. – disse, pegando-a pelo braço.
Os dois
caminharam um pouco e entraram em um carro que estava próximo. Gabriel dirigiu
para fora do campus.
— Você quer
que eu te deixe em casa? – perguntou Gabriel, enquanto dirigia.
— Não.
— Tem um
lugar que eu sempre vou quando tenho alguns problemas... – disse ele, enquanto
olhava a expressão perdida de Viviane.
— Me leve
para lá. – disse ela quase mecanicamente.
Gabriel
dirigiu. Enquanto dirigia, algumas vezes olhava para Viviane. Nunca vira aquela
garota naquele estado. Ela parecia completamente perdida. Não lembrava nem de
longe aquela menina encrenqueira e cheia de energia que sempre encontrava rindo
e conversando com a amiga. Por alguma razão, ele também se sentiu triste.
O carro
parou e Viviane percebeu que o lugar que Gabriel falara: uma grande praça bem
arborizada junto a um lago. Os dois desceram do carro e caminharam pela praça.
Gabriel sentou-se em um banco e indicou que Viviane se sentasse também.
— Eu
sempre gostei de praças como essas... – disse ele, olhando para Vivi que se
sentara e depois para a praça. – Aqui você pode ver todo tipo de pessoa.
Viviane
permaneceu calada.
— Está
vendo aquele homem lá? – disse ele, olhando um homem que apanhava algumas
latinhas de um cesto de lixo. – Quando eu olho para ele, eu percebo que os meus
problemas comparados com os deles não são nada... Muitas vezes, eu me preocupo
com coisas tão insignificantes, mas eu não tenho ideia do que é se preocupar
com o que vou comer amanhã ou coisas do tipo.
Viviane
continuou calada.
— Então,
seja qual for o seu problema...
— Estou
cansada desses tipos de discursos. – interrompeu Viviane e, em seguida, olhando
para ele. - Você é como todos os outros, não é? Na sua cabeça, eu sou apenas
uma patricinha, cujos problemas se resumem ao que vou vestir amanhã ou o que
vou comprar. E não diferente dos professores e colegas que acham que só quero
me exibir e aproveitar o nome da família para conseguir as coisas de forma mais
fácil, dizendo que os problemas daquele homem são piores que os meus... Como
pode saber disso? Você nem sequer sabe o que estou pensando.
Gabriel
percebeu que a antiga Viviane havia voltado.
— O que
está pensando? Me diga exatamente o
que está pensando. Assim quem sabe eu posso ter uma impressão diferente de
você.
— O que
estou pensando? Estou me perguntando o que deu na minha cabeça para vir até
aqui com você. Agradeço por ter salvado a minha vida. Se quiser uma recompensa,
é só me dizer que eu deposito o dinheiro na sua conta. Ah, esqueci... Você já
tem muito dinheiro. Então, o que eu deveria...
Sem que
Viviane terminasse de falar, Gabriel a beijou. Viviane ficou sem reação por
alguns segundos.
— Por que
fez isso?
— Já que
eu já tenho muito dinheiro, essa é a minha recompensa. Estamos quites agora.
— Eu
poderia lhe processar por isso, mas não farei isso porque... Porque não estou
com cabeça para esse tipo de coisa no momento.
Viviane levantou-se
e olhou para Gabriel como que esperando por algo.
— E,
então? Não vai me levar até o carro?
Gabriel
riu-se.
— E por
que eu faria isso?
— Ok, se
não quer fazer, não tem problema. Posso esperar por meu motorista na estrada. –
disse, saindo.
Por
alguns minutos, Gabriel a observou, até que resolveu acompanhá-la de longe.
Afinal, ele a havia trazido até ali. Enquanto caminhava, pode observar o quanto
Viviane ficava assustava sempre que algum estranho passava perto dela. De
repente, lembrou-se de como Verônica havia lhe dito que Viviane poderia ficar
facilmente com medo de estar sendo seguida. Apressou um pouco os passos, se aproximando
mais e tocou no ombro de Viviane. A garota virou-se assustada.
— Ah, é
você... – disse, tentando respirar fundo.
— Pensou
que era quem? – perguntou ele.
—
Ninguém. Por que está aqui?
— Vou lhe
acompanhar até a rua onde seu motorista vai vir.
— Não é
como se eu tivesse pedindo para você fazer isso. – disse Viviane, visivelmente
mais tranquila.
Gabriel
riu-se.
— Do que
está rindo? O que é tão engraçado?
— Nada.
Não estou rindo de nada.
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