O
conto Temporal no Amazonas é da autoria de Thiago de Mello.
Para
maiores informações sobre o autor, favor acessar: http://www.escritas.org/pt/biografia/thiago-de-mello.
Boa
leitura!
O
TEMPORAL NO AMAZONAS
Passamos
o dia em Ponta Alegre, aldeia dos índios Maués, banhada pelo rio Andirá. Muito
aprendi
com o jovem tuchaua, conhecedor de ervas mágicas e amigo das estrelas. Ao
entardecer, saímos de canoa com motor de popa, ao rumo da Freguesia, pequenina
comunidade no coração da floresta. Era tempo de cheia. Soprava de leve o vento
geral. Éramos quatro a bordo. Viajávamos rente à margem abarrancada, já na
metade do percurso, quando, de repente, o temporal desabou.
"Este
vai ser dos medonhos", disse sereno, lá na popa, onde manejava o motor,
Morón, um índio meu amigo. Junto a ele, no chão da canoa, o seu filho menino,
todo encolhido de frio. Lembro-me de que, antes de escurecer totalmente, do
banco da frente onde eu viajava, virei-me e vi o brilho intenso dos seus olhos
enormes. Era o pavor. Na proa, sem camisa, o
cabloco
Jari, morador da Freguesia.
Enfrentamos
o temporal em silêncio, solidários. A correnteza crescia, a canoa se balançava
na alta crista das ondas, depois se despencava com fragor. A chuva nos vergastava
por todos os lados. Houve um momento em que não vimos mais nada. Repetidas
vezes a
proa
tocava num tronco. O baque surdo, a canoa parecia que ia virar. Morón inclinava
o motor para a frente, de jeito que a hélice ficasse fora da água.
Só
os relâmpagos nos ajudavam, cortando o céu de um lado a outro: a luz fugaz nos
mostrava um tronco enorme, um pedaço de árvore ainda com ramos frescos, já
quase em cima de nós. O índio, ágil e calado, desviava a canoa num golpe de
leme. A escuridão era tanta que eu sequer enxergava a minha mão aberta a
centímetros do meu rosto. Mesmo assim, em alguns instantes, tive a certeza de
que o piloto conseguia distinguir, dentro da treva espessa, alguma coisa das
águas e das margens. Um filho da floresta.
A
tempestade cessou pouco antes de chegarmos à Freguesia. E duas coisas
aconteceram que eu preciso contar. A primeira é que, de repente, demos com
várias canoas vindo em nossa direção. Eram homens e mulheres daquele pedaço
verde do mundo, certos de que deveríamos chegar no começo da noite e nossa
tardança já era tanta, nos sabiam surpreendidos pelo temporal e decidiram ir ao
nosso encontro, para nos salvar. Quando nos viram, foi um imenso e prolongado
grito de alegria, saído de todas as bocas. Do coração solidário. A segunda coisa
é que depois do temporal o céu acendeu as suas estrelas, perdão, todas as suas
estrelas, que brilhavam enormes, pairando soltas no campo da noite.
Que lindo conto!
ResponderExcluirLegal o conto.
ResponderExcluir