O
texto abaixo é de autoria de Fernando Sabino.
Para
maiores informações sobre o autor, favor acessar: https://www.ebiografia.com/fernando_sabino/.
Boa
leitura!
MULHER
DE MATAR
Olhou
distraidamente para o relógio e deu um pulo na cadeira: Ih, Cacilda, quatro e
meia da manhã! Mais um pouco e encontraria a mulher acordada.
Enquanto
a noite durasse, nada a temer. Mas não podia se deixar se apanhar na rua quando
a claridade do céu começava a anunciar o novo dia. A partir de então a mulher
acordava a qualquer barulhinho. Houve um dia, por exemplo, em que mal havia
tirado a roupa, ouviu a voz dela lá na cama, você vai sair a esta hora? Não teve
remédio senão dizer que sim, tinha de estar bem cedo no escritório. E tornou a
sair, foi mesmo para o escritório, dormir no sofá da sala de espera o restinho
da manhã.
—
Gente, eu tenho de me mandar.
Chamou
o garçom, pagou sua conta, despediu-se dos amigos que, já bêbados, nem deram
por sua partida. Meio bebido, ele próprio, na rua firmou-se sobre as pernas e
fez sinal para um táxi que passava.
Alguém
mais se adiantou e acenou para o mesmo táxi. Era uma mulher que também acabava
de sair da boate.
Pronto,
pensou rápido: se perco este táxi, lá vai minha última chance de chegar ainda
de noite.
Quando
o táxi parou, fingiu que não via a mulher e avançou para abrir a porta. Ela
também avançou, tocou-lhe o braço:
—
Por favor, estou com pressa!
A
voz, aflita, era educada e insinuante. Então ele reparou que era uma mulher
bonita. Ainda assim resistiu: pediu-lhe também de maneira educada que o
desculpasse, mas sua pressa era maior. A menos que seguissem juntos no táxi, e
ele a deixaria no caminho, se é que iam para o mesmo lado. Vacilaram ambos:
—
Se não se incomoda…
—
Incômodo nenhum.
—
Bem, nesse caso…
Estavam
nisso quando surgiu um grandalhão, de terno xadrez e segurou a mulher pelo
braço. Ignorou a presença dele e falou com a voz carregada:
—
Eu agorra te matarr.
Notou
que o homem tinha à ilharga algo avolumado sob o paletó, só podia ser revolver.
E a manopla já avançando para sacá-lo.
—
Não faça isso! — gritou, com a mão espalmada no ar, como um guarda de trânsito:
— O senhor não pode fazer uma coisa dessas!
O
homem se voltou, como se o visse só então:
—
Não poderr porr quê? Quem é senhorr?
Agora
era distrair o gringo e tomar o táxi:
—
Tenho mulher e filhos em casa me esperando, e o senhor quer me envolver num
crime?
—
Sernhor não saberr que esta mulherr fazerr comigo.
—
Seja o que for, não vá matá-la, pelo menos na minha vista.
Mesmo
que fosse embora, estaria envolvido: o chofer do táxi seria testemunha. E a
mulher não tinha a menor reação, ia morrer sem um pio. O jeito era ficar:
—
Do you speak English?
—
Eu serr alemon.
—
Neste caso vai em português mesmo. Vamos tomar um drinque.
Dispensou
o táxi e conduziu ambos pelo braço de volta à boate.
Era
dia claro quando se viu noutro táxi, em companhia da mulher e do alemão,
reconciliados graças à sua intervenção. A idéia era deixá-la primeiro, para
evitar que o homem, sozinho com ela, tivesse novo ímpeto homicida.
Quando
ela saltou, o alemão quis descer também, foi um custo contê-lo:
—
Você prometeu, Fritz.
Ela
se foi, sã e salva, e os dois seguiram viagem. Ele convidou o alemão para tomar
o café da manhã em sua casa — única maneira de sua mulher acreditar naquela
história:
—
Quero que você conheça minha mulher. Esta sim, é de matar.
Coitado, que medo da muher! Gosto muito dessas crônicas de Fernando Sabino, sempre me fazem rir muito!
ResponderExcluirGostei da crônica, que confuson kkkk
ResponderExcluirQue confuson kkkk
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