Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 19
Participam deste capítulo
Cyro - Tarcísio Meira
Orjana - Neusa Amaral
Prof. Valdez - Enio Santos
Otto - Jardel Filho
Baby - Claudio Cavalcanti
Pé-na-Cova - Antonio Pitanga
Pedrão - Waldir Onofre
Coice de Mula - Dary Reis
CENA 1 - HOTEL CENTRAL - APARTAMENTO DE CYRO - INTERIOR - DIA
AS MALAS EMPILHAVAM-SE PRÓXIMO À PORTA DE SAÍDA DO APARTAMENTO.
ORJANA - (sem acreditar na resolução do filho) Cyro! Você está brincando! Eu já arrumei as malas!
CYRO - Já disse, mãe. Decidi não viajar mais. Você e vovô, se quiserem, podem ir. Eu não vou prender vocês aqui. Sei que você está louca para voltar...
ORJANA - Estou louca para voltar... com você. Deixando você aqui, não tem nenhum sentido o meu regresso.
O PROFESSOR VALDEZ ABRIA UM SORRISO MISTERIOSO. O VELHINHO SIMPÁTICO, EXPERIENTE, DE HÁ MUITO JÁ HAVIA PERCEBIDO A MUDANÇA DO NETO.
PROF. VALDEZ - Eu já sabia...
ORJANA - (voltou-se para ele, preocupada) Sabia o quê?
PROF. VALDEZ - Nada... nada! Nada!
ORJANA - (irritou-se com o pai) E o senhor parece estar muito contente!
PROF. VALDEZ - Por mim, minha filha, tanto faz. Vivo em qualquer lugar. E gosto daqui; sempre gostei. É a minha terra. E eu prefiro morrer aqui a morrer em qualquer outra parte.
ORJANA - (dirigiu-se ao filho, sentando-se na poltrona) Por que você tomou essa decisão assim, tão de repente?
CYRO - Não foi tão de repente, mãe. Há vários dias que eu venho pensando nisto.
ORJANA - Mas ontem à noite você ainda estava certo de viajar. Que foi que aconteceu pra você mudar de ideia? Pense bem, meu filho. Você tem responsabilidades, compromissos sérios. Sua clínica em Londres, a direção do hospital...
CYRO - Estou começando a achar que nada disso tem sentido...
ORJANA - (chegou ao cume da irritação) Você está louco!
CYRO - Não tem nenhum sentido eu voltar para Londres, onde ninguém precisa de mim.
ORJANA - E aqui?
CYRO - Aqui, eu sei que posso ser útil. Que minha vida vai ter um sentido. É a minha terra, a minha gente. Eu fui criado fora daqui, mãe, e quando cheguei me sentia um estrangeiro. Mas, a cada dia que passa mais me sinto ligado a esse povo, mais sinto que tenho um destino a cumprir, aqui, entre essa gente.
ANGUSTIADA, ORJANA BUSCAVA O OLHAR DO VELHO PAI, À PROCURA DE UMA AJUDA, DE UM APOIO. O PROFESSOR VALDEZ ERGUEU OS OMBROS, NUM GESTO DE IMPOTÊNCIA.
ORJANA - E sua carreira? E seu futuro? Você é um grande cirurgião. Em Londres tem todos os recursos...
CYRO - Em Londres podem me substituir, facilmente. Aqui, eu sei que vou ter muito o que fazer.
ORJANA - (respirou fundo) Você pretende... ficar morando aqui?
CYRO - Pretendo! Alugar uma casa. Trabalhar.
ORJANA - (pediu auxílio do pai, à beira de uma crise emocional) Papai! Diga alguma coisa!
PROF. VALDEZ - (acabava de fazer um aviãozinho de papel e o atirou pelo espaço do quarto, comicamente) Você acha que eu posso fazer ele voltar atrás? Será que você não conhece o seu filho?
ORJANA - Seja como for, não assista, assim, impassível, tudo o que está acontecendo!
CYRO - (enérgico) Espera lá, mãe! Você fala como se isso fosse o prenúncio de uma tragédia.
ORJANA - (como se falasse para si mesma) E quem sabe se não é?
CYRO - Ora, vamos deixar de bobagem (acarinhou-lhe a cabeça) Não sei o que você está imaginando, mas não vejo razão para esse desespero. Se é por causa dessas histórias que inventaram sobre o meu nascimento, tenha paciência, mãe. Não vou ligar para isso. Não tem cabimento.
PROF. VALDEZ - (se impacientou) Bem... o que decidimos?(apontou para a pilha encostada na parede) As malas estão ali!
ORJANA - (decidiu, quase às lágrimas) Se Cyro não vai, eu também não vou, é claro!
PROF. VALDEZ - (bateu palmas) Ótimo! Ficamos todos, então!
CYRO - Vou passar na companhia e cancelar as passagens. (beijou a mãe na testa) Chau!
CYRO SAIU. PAI E FILHA AGORA CONVERSAVAM.
ORJANA - E então?
PROF. VALDEZ - Não há nada a fazer, minha filha. Mesmo porque... tudo indica que há uma mulher no meio da história...
ORJANA - (empalideceu) Uma mulher?
PROF. VALDEZ - É... seu filho está apaixonado.
ORJANA ABRIU A BOCA, DE ESPANTO.
CORTA PARA:
CENA 2 - ADMINISTRAÇÃO DAS MINAS - ESCRITÓRIO - INTERIOR - DIA
COICE DE MULA - Táqui o home, seu Otto!
COICE DE MULA ENTREGOU PÉ-NA-COVA ÀS MÃOS DO SUPERINTENDENTE. O NEGRO ESTAVA PÁLIDO, COM O CAPACETE PRATEADO ESCONDENDO-LHE A METADE DA CARA FERRUGINOSA. OTTO EXAMINAVA UM MAPA NA PAREDE. PAROU. GIROU A CADEIRA, PARA ENCARAR O EMPREGADO.
OTTO - Tira o capacete! (Pé-na-Cova obedeceu) Tu foste te queixar aquele doutorzinho de bosta...
PÉ-NA-COVA - Não fui me queixá...
OTTO - (cortou, ríspido) Foi, sim. Eu sei de tudo, não vem com desculpas!
PÉ-NA-COVA - Não é desculpa...
OTTO - (gritou, colérico) Cala a boca! Não te perguntei nada! Olha! (bateu com o punho na mesa) Vou te readmitir, mas não penses que foi pelo teu doutorzinho de merda. Ele aqui não pia nada, entendes? (voltou-se para o auxiliar) Ele vai trabalhar na câmara 32 da M-6!
COICE DE MULA - (moveu os lábios, incrédulo) Seu Otto... essa câmara a gente abandonamos por questão de segurança... tinha muito gás... os detonadores tiveram lá, fizeram o trabalho, mas depois não houve condição pra paleação...
PÉ-NA-COVA - (assustado) Teve um começo de incêndio na semana passada...
OTTO - Coisa nenhuma! Gás tem em toda a mina. Risco, quem não quiser correr, que não desça embaixo da terra. Pra isso, vocês tem aposentadoria com 15 anos de serviço. E a companhia não vai ter prejuízo, abandonar uma galeria, só porque vocês são uns frouxos! Se quiser voltar a trabalhar, tem que ser lá. Escolha!
CORTA PARA:
Otto (Jardel), Lia (Arlete Sales), Baby (Claudio Cavalcanti) e Coice de Mula (Dary Reis) |
CENA 3 - MINA - INTERIOR - DIA
NO FUNDO DA GALERIA, A ESCURIDÃO ERA TOTAL. ALGUMAS VIGAS DE MADEIRA ESCORAVAM UM TRECHO ABANDONADO. PÉ-NA-COVA E PEDRÃO ENCHERAM UM VAGONETE COM AS PÁS, DEPOIS DE ESCAVAREM AS PAREDES NEGRAS, NUM TRABALHO CUIDADOSO. A QUALQUER DESCUIDO, O ACIDENTE PODERIA ACONTECER. FATAL. COM O DESMORONAMENTO DE TONELADAS DE MINÉRIO.
PÉ-NA-COVA - (encostou o ouvido contra a rocha fria) Vê se tu ouve...
PEDRÃO - O quê?
PÉ-NA-COVA - Um chiado.
PEDRÃO - Deve ser o gás.
PÉ-NA-COVA - Era acendê um fósforo e tudo ia pelos ares.
PEDRÃO - Teve uma galeria da Próspera, lá em Criciúma, que pegou fogo e ficou um mês inteiro queimando.
AS LÂMPADAS DE PILHAS, PRESAS AOS CAPACETES, ILUMINAVAM PEQUENOS TRECHOS, À MEDIDA QUE OS HOMENS CAVAVAM. EM TORNO, A ESCURIDÃO, O SILÊNCIO.
PÉ-NA-COVA - Por isso é que aquele desgraçado mandou a gente pra cá. Na esperança de que a gente vire churrasco!
PEDRÃO - Um assassino!
CORTA PARA:
CENA 4 - ESCRITÓRIO DAS MINAS - INTERIOR - DIA
COICE DE MULA - (olhou pela janela e avisou) Sabe quem tá chegando aí? O filho do comendador!
OTTO - (se espantou) Baby? Não é possível!
COICE DE MULA - Ele mesmo.
OTTO CORREU À JANELA, A TEMPO DE VER A MANOBRA DO MERCEDES CONVERSÍVEL DO MILIONÁRIO. BABY DESCEU DO CARRO.
OTTO - Que é que esse pilantra vem cheirar aqui? Com certeza, foi o pai que o mandou. Ele está querendo botar esse maluco na presidência da Companhia. (guardou alguns papéis jogados sobre a mesa e encaminhou-se para a porta, ao encontro do primo, fingiu alegrar-se) Olá, primo! Você por aqui? Não é possível!
BABY - (apertou-lhe a mão calosa) Vim dar uma olhada. O velho vive me enchendo!
OTTO - Pra quê?
BABY - Pra eu me enfronhar nos negócios da Companhia. Tá com medo de morrer... quer que eu trabalhe nesse troço... e eu, você sabe, não manjo nada disso.
OTTO - Se eu não me engano, é a primeira vez que você aparece por aqui.
BABY - É a primeira vez. Nunca desci no fundo de uma mina.
OTTO - Quer descer?
BABY - (hesitou, olhando a roupa limpa e cara) Não vim com o espírito preparado.
OTTO - Bobagem! Não tem perigo algum. A segurança das nossas minas é absoluta.
BABY - Eu tenho sabido de acidentes...
OTTO - É muito raro. (chamou) Capataz! (Coice de Mula adiantou-se, prestimoso) Este é o meu primo, Baby. Leve ele lá embaixo. (piscou um olho para o assecla) Afinal, um presidente que nunca viu uma galeria é uma vergonha...
BABY - Mas, quem é que disse que eu vou ser presidente? O velho só deseja que eu trabalhe. Ideia infeliz...
OTTO - Arranje um macacão pra ele, capataz (ordenou) Senão ele vai se sujar todo. Leve ele até a M-6!
COICE DE MULA - (olhou significativamente para o chefe) Na M-6?
OTTO - É, lá perto da Câmara 32, onde aquele negro tá trabalhando...
BABY - Que negócio de M-6, Câmara 32...
ENQUANTO BABY VESTIA O MACACÃO POR CIMA DA ROUPA. CALÇAVA AS BOTAS DE CANO COMPRIDO E AJEITAVA O CAPACETE, OTTO EXPLICAVA:
OTTO - M-6 quer dizer Galeria Mestra, número 6. Câmara é uma pequena galeria, ainda em começo.
BABY - Preciso ir aprendendo essa terminologia. Nessa história de extração de carvão, eu não pesco bulhufas. Mas, vamos lá, pelo menos vai ser uma aventura. Já voei a 20 mil metros, mas nunca desci um palmo abaixo da terra.
OTTO - Eu não vou com você porque preciso trabalhar. Mas o capataz lhe dá todos os esclarecimentos.
BABY - (despedindo-se) Até já, então.
FIM DO CAPÍTULO 19
e na próxima quinta, o 20. capítulo!
O que será que o Otto vai aprontar mais agora,hein?
ResponderExcluirE ainda envolve o Baby nisso tudo!
Pobre Orjana,vejo o quanto ela tá preocupada...
A trama tá maravilhosa! Continua,por favor!
Otto deve estar aprontando alguma maldade! E Cyro, vai ficar na cidade, aumentando o sofrimento dele e Ester!. Otto vai morrer de raiva rsrsrs.
ResponderExcluirOtto é daqueles vilões clássicos. Gosto mais deles assim e não como alguns de hoje em dia. kkkkkkkkkk
ResponderExcluirBacana ler os seus comentários, amigos. Otto ainda tem muito o que aprontar. E preparem-se, porque brevemente seu pai vai entrar em cena e - acreditem - é um verdadeiro ex-carrasco nazista disfarçado! E então, tem ou não tem a quem puxar? rsrsrsrs
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