Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 98
Participam deste capítulo
Ester - Glória Menezes
Das Dores - Ruth de Souza
Delegado - Vinícius Salvatori
Von Muller - Jorge Cherques
Tavares
Otto - Jardel Filho
Lia - Arlete Salles
Tula - Lúcia Alves
Cabo Faria
Mestre Jonas - Gilberto Martinho
Daniel - Paulo Araújo
Pé-na-Cova - Antonio Pitanga
Rosa - Ana Ariel
CENA 1 - FLORIANÓPOLIS - CASA DE ESTER - SALA - INTERIOR - DIA
DEPOIS DAS DILIGÊNCIAS POLICIAS, O DELEGADO MOREIRA JÁ DISPUNHA DE UMA OPINIÃO FORMADA SOBRE O CASO. PELO MENOS, À PRIMEIRA VISTA, TODAS AS SUSPEITAS CONVERGIAM SOBRE UM HOMEM. E ERA ISTO QUE ELE FORA DIZER A ESTER EM SUA PRÓPRIA RESIDENCIA.
DELEGADO - Infelizmente, verifiquei que ninguém, a não ser o Dr. Cyro, esteve visitando a mulher. Interroguei a vizinha, amiga íntima. Estava muito nervosa, mal podia responder às perguntas... mas me garantiu que só viu o Dr. Cyro sair de lá já levando a mulher à morte para o hospital. Isto vem de encontro às palavras do marido.
ESTER - Ela pode ter saído durante a tarde. Ninguém a viu sair?
DELEGADO - Ninguém.
ESTER - Então... o caso está realmente complicado.
DELEGADO - Tudo está contra ele. E o prefeito continua exigindo que se tomem providencias contra ele... E urgentes.
ESTER - Ora, o prefeito não pode passar sobre medidas legais. As provas ainda são insuficientes. Continue investigando, delegado. Tente saber se esta mulher, durante a tarde, saiu à procura de alguém. Investigue, interrogue... tente saber por que esta vizinha estava tão nervosa. Talvez ela saiba alguma coisa que esteja escondendo. Não se satisfaça com meias palavras. Procure a verdade, a qualquer preço.
ESTER, NO FUNDO, ESTAVA CERTA QUE ALGUMA TRAMA FORA FORJADA PARA ENREDAR O MÉDICO. E TUDO PARTIA DO ÓDIO DE OTTO MULLER.
CORTA PARA:
CENA 2 - SERRINHA - CASA DE TAVARES E ZÉLIA - SALA - INTERIOR - NOITE
DAS DORES NÃO CONSEGUIU IMPEDIR A REVOLTA ÍNTIMA. QUALQUER COISA LHE DIZIA QUE A VERDADE DEVIA SER CONHECIDA ANTES QUE CYRO VALDEZ PAGASSE POR UMA CULPA QUE NÃO LHE CABIA. E A DECISÃO TINHA SIDO TOMADA, INFLEXIVELMENTE. E ELA PARTIU PARA A RESIDÊNCIA DO BISCATEIRO TAVARES.
ERA NOITE.
UM VENTO FRIO, CORTANTE, SOPRAVA POR TODA A COSTA DE SANTA CATARINA.
DAS DORES CAMINHOU POR ENTRE AS ÁRVORES ATÉ A VELHA CHOUPANA AFASTADA.
LEMBRAVA DA AMIGA FALECIDA, CHEIA DE VIDA E ALEGRIA, DENTRO DA INFELICIDADE QUE FORA SUA VIDA ATÉ A MORTE.
DAS DORES - (perguntou, benzendo-se) Não tem ninguém aí?
TORNOU A BATER PALMAS.
TAVARES - (respondeu do interior do casebre) O que é?
DAS DORES - Seu Tavares... eu vim falar com o senhor. É Das Dores. Eu... eu tenho uma confissão a lhe fazer.
O GROSSEIRO ASSECLA DE VON MULLER ABRIU A PORTA COM UM CIGARRO ENTRE OS LÁBIOS.
TAVARES - Entre e vá dizendo logo.
DAS DORES - Eu... tou muito, mas muito angustiada da minha vida, Seu Tavares... com a morte da sua mulher.
TAVARES - É, eu sei... eu imagino.
DAS DORES - Não... o senhor não pode imaginar. É uma coisa que eu tenho de lhe dizer... mas que tá aqui engasgada... no meu peito.
DAS DORES MAL PÔDE PERCEBER O MOVIMENTO POR TRÁS DE SUAS COSTAS. A PORTA SE ESCANCAROU, O VENTO VARREU A CASA. VON MULLER, EMPUNHANDO UMA BENGALA NEGRA ENTROU VAGAROSAMENTE E TORNOU A FECHAR A PORTA. O VENTO ZUNIA DO LADO DE FORA.
VON MULLER - Ela demorou a virr, hem, Tavares?
TAVARES - É... demorou, Seu Henrique.
DAS DORES - (sem nada entender) O que é isso, gente?
VON MULLER - Estávamos esperrando apela senhorra... há muito tempo.
DAS DORES - Como? Sabia que vinha?
VON MULLER - Iá... sabíamos sim... que virria fazerr um confissão...
DAS DORES - mas... como?
VON MULLER - Sua sorte foi não terr procurrado o polícia, antes...
DAS DORES - Mas... eu vou procurá. Vim antes pra falar com o Seu Tavares... mas saindo daqui eu vou procurá a polícia.
OS DOIS HOMENS SE ENTREOLHARAM.
VON MULLER - (movendo a bengala) Nós já sabemos de seu confissão. Nós sabemos que querr inocentarr Dr. Cyro Valdez... sabemos que a senhorra é culpada da morte de Dona Zélia.
DAS DORES - (estremeceu) Sabem? Como sabem?
VON MULLER - Vizinha contou... nós já calamo boca de vizinha. Agorrra vamos calarr seu boca, também...
A NEGRA TENTOU LEVANTAR-SE, MAS OS DOIS HOMENS A MANTIVERAM SENTADA NO BANCO.
DAS DORES - O que qué dizê isso? Será que eu tô ficando doida?
VON MULLER - Deixe coisas como estão, senhorra.
DAS DORES - Deixá... que a polícia prenda o Dr. Cyro... no meu lugá!
VON MULLER - Ela inteligente, Tavares...Não foi preciso usá de mesmos argumentos que usamos parra o vizinha testemunha...
DAS DORES - Agora... eu tou entendendo! Vocês tão querendo... que o Dr. Cyro seja preso... pelo crime que não cometeu!
VON MULLER - (sorriu sarcasticamente) Iá... Dr. Cyro não tem só este crime... Dr. Cyro tem outros crimes... este foi apenas gota d’água.
DAS DORES - Mas isso é judiação! Eu num vou deixá que isso aconteça. E o senhor, Seu Tavares... como pode aceitá uma coisa dessas? Foi sua mulher que morreu!
TAVARES - Pois é... ela morreu e eu não tive culpa. Agora num tem mais jeito. Ela não volta mais mesmo...
DAS DORES - Ao menos respeita a morta!
TAVARES - (voltou-se para o velho) Diz a ela, Seu Henrique... diz a ela o que vai acontecê se ela dé com a língua nos dente.
DAS DORES - Por que isso? A troco de que isso?
VON MULLER - A troco de seu liberdade. Não ser bom parra você?
DAS DORES - Gente... eu tou assustada... parece que tou vivendo um pesadelo. Eu não entendo bem o que tá acontecendo e não quero entendê. Vou sair daqui e vou na polícia contá pro delegado como tudo conteceu.
DAS DORES FOI ATÉ A PORTA, AMEAÇANDO SAIR. VON MULLER IMPEDIU-A COM A PONTA AGUÇADA DA BENGALA.
VON MULLER - Se sair daqui parra ir no polícia, seu filho Lucas não terrá mais um dia de vida!
DAS DORES - (estacou diante da porta, trêmula de medo) Nossa Senhora! Assim já é demais!
VON MULLER - (afastou a bengala) Agorra, saia!
A MULHER DEIXOU O CASEBRE CORRENDO, INVESTINDO CONTRA O VENTO FRIO QUE ASSUMIRA PROPORÇÕES DE TEMPESTADE.
TAVARES ENTORNOU UMA DOSE MACIÇA DE CACHAÇA, ENQUANTO O ALEMÃO FUMAVA TRANQUILAMENTE. A ETAPA NÚMERO DOIS FORA VENCIDA COM ÊXITO. DAS DORES NÃO DARIA COM A LÍNGUA NOS DENTES. O MEDO CONTINUAVA SENDO UMA ARMA INFALÍVEL NA MÃO DOS TORTURADORES.
TAVARES - Acha que vai dizer?
VON MULLER - Non... ela só tem aquele filho. E eu falei sérrio quando ameacei.
TAVARES - Afinal, eu são sei se estou agindo certo. Foi ela que matou minha mulher e tinha de pagar por isso.
VON MULLER - Vai receberr muito grande dinheiro... parra deixarr que ela fique em liberdade.
TAVARES - Não sei se vale a pena.
VON MULLER RETIROU UM MAÇO DE DINHEIRO DE UMA SACOLA DE PLÁSTICO. ATIROU-O SOBRE A MESA DE MADEIRA.
VON MULLER - Trouxe um boa parte... o restante... pago quando Dr. Cyro forr preso.
TAVARES RELUTOU POR ALGUNS SEGUNDOS ANTES DE POR A MÃO NO DINHEIRO. A TENTAÇÃO ERA DEMAIS. LENTAMENTE CONTOU AS NOTAS E ENFIOU-AS ENTRE A CAMISA E O CORPO ENREGELADO.
CENA 3 - MANSÃO DE OTTO MULLER - QUARTO DE OTTO E LIA - INTERIOR - DIA
OTTO TROCAVA DE ROUPA NO QUARTO ABARROTADO DE BUGINGANGAS, ENQUANTO LIA PENTEAVA OS LONGOS CABELOS DIANTE DO ESPELHO DE CRISTAL. PELO ESPELHO, ELA OBSERVAVA A LONGA CICATRIZ QUE MARCAVA EM VERMELHO O PEITO DO MARIDO.
OTTO - Por que é que a mamãe de Katy está tão nervosa?
LIA - Porque a mamãe de Katy tomou conhecimento hoje que o papai de Katy cometeu um ato sujo e sórdido!
OTTO - Eu cometi é? Qual foi?
LIA - Otto... você teve coragem... você deu queixa contra o Dr. Cyro... do material desviado do hospital! Material que eu desviei para ceder a ele, por livre e espontânea vontade! Você fez isso. Otto?
OTTO - Fique tranqüila, eu não contei a ninguém que foi você quem desviou o material. E não pense que escondi em consideração a você. É porque não quero envolver a mamãe de Katy num escândalo...
LIA - Já envolveu, Otto (disse, com ambos os braços erguidos para ajeitar os cabelos em coque) Já envolveu, porque eu preveni você de que estava disposta a contar à polícia o que sei a respeito da morte de Ivanzinho e da pessoa que acendeu a dinamite no desmoronamento da mina!
OTTO - (explodiu, enraivecido) Você não pode fazer isso. Você tem é apenas uma suspeita... como eu também tenho. Mas a certeza, minha cara... nenhum de nós tem...
LIA - Não importa, Otto. Eu vou dizer à polícia o que sei. O que ouvi de você. E vai ficar muito mal para o prefeito de Porto Azul, se ver envolvido num escândalo desta natureza. Vou dizer muito mais. Contarei que entreguei o material do hospital ao Dr. Cyro e que ele aceitou de boa-fé. Portanto, ele não tem culpa de coisa alguma!
OTTO - Pois bem... faça isso. Mas faça mesmo, viu? Vai estourar um escândalo sem precedentes. Todos nós seremos enrolados na história... e eu lhe digo uma coisa, Lia: você nunca mais verá Katy!
LIA - Otto, você sabe que isso não pode ser ameaça... eu posso ir embora daqui levando Katy e tenho todo o direito porque sou mãe.
OTTO - Não dará um passo além da porta da rua. Você sabe que sou muito homem para fazer isso. Muito homem, viu?
CORTA PARA:
CENA 4 - PORTO AZUL - CONSULTÓRIO DE CYRO - INTERIOR - DIA
OS POLICIAIS DESCERAM DO CARRO COMO UM BANDO DE ASSALTANTES E SEM PESTANEJAR INVADIRAM O CONSULTÓRIO DE CYRO VALDEZ.
ENQUANTO TRÊS SOLDADOS REMOVIAM MÓVEIS E APARELHOS, O CABO FARIA COMANDAVA, AMEAÇADOR. TULA, PÁLIDA, NÃO SABIA O QUE FAZER.
CABO FARIA - Coloquem tudo no carro! Vamos lá... mais depressa!
TULA - (gritava, aturdida) Esperem aí! Vocês não podem fazer isso! Deixem ao menos o Dr. Cyro chegar!
CENA 5 - PORTO AZUL - CONSULTORIO DE CYRO - EXTERIOR - DIA
OS SOLDADOS ENCONTRARAM DIFICULDADE EM AJEITAR A MESA DO MÉDICO NO CARRO ESTREITO. UM DELES ENTROU NA CAMIONETA, TENTANDO AFASTAR OUTROS OBJETOS QUE IMPEDIAM A COLOCAÇÃO DO MÓVEL.
FOI AÍ QUE O CABO FARIA NOTOU A PRESENÇA DE MESTRE JONAS, EM COMPANHIA DE DANIEL, PÉ-NA-COVA, PEDRÃO E MARTINS. VIU AS FEIÇÕES TRANSTORNADAS DOS HOMENS.
MESTRE JONAS - (ordenou, com a mão erguida) Um momento! Que história é essa? Quem é que mandô você vir aqui levá o material do consultório do Dr. Cyro?
CABO FARIA - Temos ordens!
MESTRE JONAS - Não acredito!
FARIA RETIROU UM PAPEL AMARELO DO BOLSO DA FARDA.
CABO FARIA - Sabe ler?
DANIEL - (arrancando o documento das mãos do outro) Me dá isso!
MESTRE JONAS - O que é, filho?
DANIEL - Uma ordem do delegado. Diz que é material roubado.
MESTRE JONAS - Mas isto é uma mentira!
TRANSTORNADO, O POLICIAL COMEÇAVA A ALISAR A CORONHA DO REVÓLVER, ENQUANTO OS OUTROS PARAVAM PARA RESPIRAR.
CABO FARIA - Eu não tenho nada com isso! Estou cumprindo ordens, entendam!
DANIEL - É, pai. (devolveu a ordem ao policial) A gente não pode fazer nada!
MESTRE JONAS - Que não pode o quê! Pra mim isso é mesmo que nada. Este papel não tem valor nenhum!
CABO FARIA FECHOU A CARRANCA.
MESTRE JONAS - Antes de Cyro chegá, ninguém vai levá daqui nenhum grãozinho de poeira!
CABO FARIA - (procurando controlar-se) Sinto muito. Já que vocês querem reagir... eu vou ter de levar mesmo à força.
MESTRE JONAS - Pois tente!
DANIEL - Tente levá à força! (dirigiu-se aos companheiros) Se prepara, gente!
FARIA DEU UM PASSO ATRÁS E COM UM MOVIMENTO RÁPIDO SACOU A ARMA DO COLDRE.
CABO FARIA - Aquele que der um passo, leva fogo!
PÉ-NA-COVA TENTOU INVESTIR CONTRA O POLICIAL, MAS MESTRE JONAS O DETEVE COM MÃO DE FERRO.
MESTRE JONAS - Cuidado, home!
PÉ-NA-COVA - (fora de si) Cêis tem medo dum cano curto?
CABO FARIA - Quem der um passo, eu atiro!
FEZ SINAL PARA OS HOMENS PROSSEGUIREM NO TRABALHO.
O POLICIAL PODIA ESPERAR POR TUDO, MENOS PELO QUE ACONTECERIA SEGUNDOS DEPOIS.
ROSA - Vão largando! Vão largando tudo isso!
O CABO VOLTOU-SE ASSUSTADO AO OUVIR A VOZ DA MULHER DE MESTRE JONAS. ROSA CORRERA ATÉ O LOCAL DOS ACONTECIMENTOS E, AMEAÇADORAMENTE, APONTAVA A CARABINA PARA O CHEFE DOS GUARDAS.
CABO FARIA - (reagiu, enfurecido) Não pára, gente! Vão em frente!
O TIRO REBOOU OBRIGANDO O POLICIAL A SE LANÇAR AO CHÃO.
ROSA - (com voz alta e firme) Alguém aqui duvida da minha “Risoleta”? Larga essa arma, moço. Larga se não qué se arrependê de ter botado os pés aqui! Pelo Dr. Cyro qualquer um de nós dá a vida e vai preso sorrindo... Vamo, larga essa arma e desaparece!
CABO FARIA - (guardou a arma, zangado) Gente de boa paz! Boa paz! Eu é que sei!
ROSA - Vamo dando sumiço daqui! Ninguém vai levá nada, nem um alfinete!
DANIEL - Manda brasa, mãe!
ROSA - (coçou o gatilho da arma com o indicador) Vão dando o fora! E depressa que eu já tô ficando nervosa!
DE OLHOS ARREGALADOS E COM AGILIDADE DE SÍMIOS, OS HOMENS SE MANDARAM DO VEÍCULO. FARIA AINDA TENTOU REAGIR, MAS A ARMA DE ROSA PERMANECIA NA MIRA. QUALQUER MOVIMENTO E A MULHER PODERIA MANDÁ-LO PARA O INFERNO... PREFERIU ACATAR A ORDEM.
CABO FARIA - Olha... isso não vai ficar assim, viu? Eu volto... e mais preparado!
DANIEL - (aproximou-se cautelosamente) Nem sempre você vai andá tão bem preparado... Policial devia sabê que não pode andá sempre acompanhado. Um dia, sai só, por aí... E a noite é muito escura!
FARIA ENTENDEU ATÉ ONDE QUERIA CHEGAR A AMEAÇA DO RAPAZ. AFASTOU-SE, COM A CARA AMARRADA E RESMUNGANDO COISAS ININTELIGÍVEIS.
Cyro tem muitos amigos dispostos a tudo para defendê-lo,que legal! Gostei de ver Rosa correndo com o cabo kkkkkk, que mulher valente!
ResponderExcluirParaíba masculina, mulher macho, sim senhor... kkkkkkkkk
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