Novela
de Janete Clair
Adaptação
de Toni Figueira
CAPÍTULO
3
Participam
deste capítulo
Mestre
Jonas - Gilberto Martinho
Ricardo
- Edney Giovenazzi
Prof.
Valdez - Enio Santos
Orjana
- Neuza Amaral
Vanda
- Dina Sfat
Paulus
- Emiliano Queiroz
D.
Bárbara - Zilka Salaberry
Cyro
- Tarcísio Meira
CENA 1 -
PORTO AZUL - PRAIA BONITA - EXTERIOR - DIA.
MESTRE
JONAS, COM OS PÉS ENTERRADOS NA AREIA, QUERIA SABER TUDO SOBRE A VOLTA DELE.
MESTRE
JONAS - Veio sozinho?
RICARDO
- Acho que sim.
MESTRE
JONAS - O senhor não acredita?
RICARDO
- Na história que Orjana contou?
MESTRE
JONAS - Não foi só ela que
contou (benzeu-se, amedrontado, tornando a olhar o céu) Eu e mais três meninos
tivemos o mesmo sonho naquela noite. E o que a gente sonhou aconteceu a ela.
RICARDO
- (falou com franqueza) Não acredito.
CORTA
PARA:
CENA
2 - PORTO AZUL - RUA - EXTERIOR
- DIA.
O
CARRO FREOU DIANTE DE UMA DÚZIA DE CASAS MODESTAS, DE PAREDES CAIADAS. ORJANA E
VALDEZ SALTARAM SEM PRESSA.
PROF.
VALDEZ - Por que mandou parar? Ainda não é aqui.
ORJANA
- Eu sei. Mas esta rua... O senhor não se lembra? Foi aqui que aconteceu
aquilo!
VALDEZ
OBSERVOU DEMORADAMENTE A REGIÃO. O MONTE DE ASPECTO SOMBRIO. O MAR SEMPRE
AGITADO. AS ÁRVORES ESGUIAS, QUASE SEM FOLHAGENS.
PROF.
VALDEZ - É verdade. Está um pouco mudado. Era uma estrada com
poucas casas.
ORJANA
- Era um caminho quase deserto. Acho que não havia mais ninguém, a não
ser eu e o senhor, naquela noite...
A
VISÃO DE 30 ANOS TORNOU À MEMÓRIA DA MULHER DE MEIA-IDADE.
ORJANA
- Era uma noite escura, nós mal enxergávamos o caminho. De repente... uma
sensação que não sei explicar. Uma coisa que me fez olhar para trás. Só de
lembrar ainda sinto medo! Da visão do halo luminoso... Da voz invisível... Da
luz azulada e da sensação de que tudo se acabava para sempre... Depois desmaiei
naquela noite escura... 30 anos!...
PROF.
VALDEZ - (sacudiu-a com
energia, fazendo-a voltar à realidade) Orjana... que é que você tem?
ORJANA
- Parece que foi ontem... e já tem mais de 30 anos!
PROF.
VALDEZ - Vamos embora daqui (mostrou o homem impaciente sentado ao
volante do carro) O chofer já está intrigado.
VOLTARAM
AO AUTOMÓVEL.
PROF.
VALDEZ - (dirigiu-se ao motorista) Podemos ir. Ao endereço que
lhe demos.
CORTA
PARA:
CENA
3 - PORTO AZUL - PRAIA BONITA -
EXTERIOR - DIA
VANDA
IDENTIFICOU DE LONGE OS DOIS HOMENS QUE CONVERSAVAM. VESTIA UM BIQUINI AMARELO,
COM LACINHOS NAS LATERAIS. APROXIMOU-SE SEM SER PRESSENTIDA.
VANDA
- Vai passear sozinho?
RICARDO
- (voltou-se surpreso) Vanda! Que faz aqui?
VANDA
- Eu é que tenho o direito de perguntar: está fugindo de mim? (apontou
para a lancha) Posso subir? Ou vou comprometer sua reputação?
RICARDO
- (hesitou por alguns segundos) Pode... suba, vai.
MESTRE
JONAS EXPRESSAVA UM OLHAR DE REPROVAÇÃO.
RICARDO
- (dirigindo-se ao pescador) Olha, talvez seja melhor não dizer nada a
ninguém. Sobre a vinda do rapaz. Eu acho que ele vai ficar pouco tempo por
aqui.
MESTRE
JONAS - O senhor diz isso porque não acredita. Mas eu acho que ele
veio pra ficá. Pra cumpri a missão que o pai dele me disse no sonho, quando
anunciou que ele vinha. É um espírito de luz.
O
ENGENHEIRO BALANÇOU A CABEÇA, NUM GESTO DE INCREDULIDADE E COMISERAÇÃO. DE UM
SALTO, SUBIU À LANCHA E ARRANCOU PARA FORA DO LITORAL. COM O MOTOR ESPOCANDO E
QUEBRANDO O SILENCIO DA NATUREZA.
CORTA
PARA:
Ricardo (Edney Giovenazzi)
CENA
4 - PORTO AZUL - CASA DE D. BÁRBARA -
INTERIOR - DIA.
A
VELHA SE MOSTRAVA MAIS FURIOSA DO QUE ANTES, AO RECEBER O JOVEM MÉDICO.
D.
BÁRBARA - Se vocês querem que eu seja sincera, acho que fazem muito
mal em voltar a esta cidade.
PROF.
VALDEZ - (com aspereza) Apesar de tudo, eu não esperava que, depois
de 30 anos, você nos recebesse desse modo.
ORJANA
- Nem eu, mãe Bárbara. Julgava que, com o tempo, a senhora já tivesse
reconhecido a injustiça que fez comigo e com o meu pai.
D.
BÁRBARA - (não aceitou as desculpas da filha adotiva) Eu é que não
esperava que vocês tivessem o cinismo de voltar aqui, depois de tudo!
ORJANA
- Depois de tudo o quê, mãe Bárbara? Nenhum de nós cometeu crime nenhum!
Deus é testemunha!
D.
BÁRBARA - Você continua a insistir nessa história absurda e cínica!
PROF.
VALDEZ - (perdendo a paciência) Não é absurda nem cínica. O que
aconteceu nesta cidade há mais de 30 anos é tão real quanto o que vai acontecer
agora que ele voltou.
D.
BÁRBARA - (aplacou a agressividade) Ele esteve aqui, o rapaz.
ORJANA
- (respirando fundo) Eu sabia...
D.
BÁRBARA - E pelo que percebi, a ele vocês não contaram a tal
história que quiseram nos impingir naquela noite.
ORJANA - Claro que não! Ele não
sabe de nada. E a senhora não falou a ele sobre isso...
D.
BÁRBARA - Não. Mas se ele começar a perguntar por aí, alguém vai
contar. Quem é que não se lembra, ou ouviu falar? Aquilo virou lenda. Vocês
conseguiram que muita gente idiota acreditasse (encarou com decisão o velho
professor) Mas eu não, seu idiota Hilário Valdez. Depois do nosso desquite, eu
tive que aturar ainda por muito tempo a gente cretina desta cidade. Vocês
fugiram, mas eu fiquei e agüentei as conseqüências do escândalo. Jornalistas,
gente da rua disposta a acreditar em tudo, gente maldosa... sofri o diabo, até
que me casei de novo. Meu segundo marido, que Deus o tenha, me ajudou a
esquecer. E não venham vocês agora me fazer lembrar tudo, novamente. Não,
chega!
COM
UM MOVIMENTO RÁPIDO, A VELHA DEU AS COSTAS AO CASAL.
ORJANA
- (ainda tentou dizer alguma coisa) Nós não viemos fazer a senhora
lembrar de nada. Estamos tentando localizar Cyro, meu filho. Por isso viemos
aqui. Imaginamos que ele tivesse vindo procurá-la, pois é a única pessoa de
quem falamos, de vez em quando, com carinho.
PROF.
VALDEZ - Ele não disse aonde ia?
D.
BÁRBARA - Não, não disse.
PROF.
VALDEZ - Então vamos, Orjana.
ORJANA
- Vamos, pai.
CORTA
PARA:
CENA
5 - FLORIANÓPOLIS - HOTEL CENTRAL -
PORTARIA - INTERIOR - NOITE.
CYRO
- (estendeu a mão para receber a chave que o porteiro lhe entregava) Por
favor, 422.
PORTEIRO
- Aquele senhor está à sua espera.
CYRO
VOLTOU-SE E DEU DE CARA COM O DR. PAULUS, SORRIDENTE, COMO SEMPRE.
CORTA
PARA:
Dr. Paulus (Emiliano Queiroz) e Catarina (Lidia Mattos)
CENA
6 - HOTEL CENTRAL - APTO. DE CYRO -
INTERIOR - NOITE.
O
MÉDICO ABRIU A PORTA COM UM MOVIMENTO RÁPIDO E ENTROU NO APARTAMENTO, SEGUIDO
DO ADVOGADO.
PAULUS
- Eu queria dar-lhe uma explicação sobre o que o senhor viu, ontem. O
acidente com aquele negro... nossas leis não...
CYRO
- (cortou rudemente) Não foi acidente! Aquele pobre foi covardemente
assassinado!
PAULUS
- (afiançou) O fato já foi comunicado às autoridades. Ele era empregado
do Dr. Otto Muller e havia sido despedido por ter cometido atos contra a moral.
CYRO
- Quase não pude dormir esta noite (afirmou, abrindo o colarinho e
aliviando a pressão da gravata) Já vi muita gente morrer, mas ninguém desse
modo. Estava pensando até em procurar a família dele...
PAULUS
- Acho que ele não merecia tanta preocupação de sua parte (e mudando de
inflexão) Mas eu ainda não me apresentei: sou o Dr. Victor Paulus, advogado do
Dr. Otto Muller. Foi ele quem me mandou procurá-lo.
CYRO
- (indiferente) Para quê?
PAULUS
- Ele é sobrinho do Comendador Liberato e está preocupado com a saúde do
tio.
CYRO
- (esticando as pernas sobre um pequeno banco de madeira) O comendador
vai ser operado amanhã.
PAULUS
- O senhor acha que ele se salva?
CYRO
- Acho que sim. Ele sofre de uma insuficiência da válvula aórtica. Vamos
substituir a válvula.
PAULUS
PROCUROU CONTROLAR-SE PARA NÃO DAR A PERCEBER AO MÉDICO A DECEPÇÃO CAUSADA PELA
AFIRMATIVA DE CYRO. LIBERATO NÃO PODIA SOBREVIVER À OPERAÇÃO. ERA CASO LÍQUIDO
E CERTO. TINHA DE MORRER.
PAULUS
- (insistiu) Não é uma operação difícil?
CYRO - Não muito. Nem
precisava ter-me chamado. Há muita gente no Brasil capaz de realizar essa
operação.
PAULUS
MAL CONSEGUIA DISFARÇAR O DESAPONTAMENTO. O MÉDICO, NO ENTANTO, PARECIA
AUSENTE.
CYRO
- (perguntou de estalo) O Sr. Otto Muller sabe o que fizeram com aquele
negro?
PAULUS
- Sabe.
CYRO
- Foi ele quem mandou?
PAULUS
- Não, é claro! Já lhe disse que foi um acidente!
CYRO
CERROU OS OLHOS, TRANQUILAMENTE. OS DENTES APERTARAM-SE, COMPLEMENTANDO A AÇÃO
DOS PUNHOS. ALGUMA COISA TERIA DE SER FEITA, PENSOU. MAS MUITO BEM FEITA...
FIM
DO CAPÍTULO 3
NÃO PERCA O CAPÍTULO 4 DE
ÀS
TERÇAS, QUINTAS E SEXTAS
A história parece ser bem interessante. Estou curioso para ver a continuação.
ResponderExcluirTambém estou curiosa para ver a continuação dessa história. Legal!
ResponderExcluirVai ficar muito mais, quando Ester entrar em cena, e iniciar uma bela história com Cyro. Aí a marca de Janete Clair fica ainda mais presente.
ResponderExcluirToni