Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira
CAPÍTULO 6
Participam deste capítulo
Ester - Gloria Menezes
Otto - Jardel Filho
Ivanzinho - Rogério Pitanga
Cyro - Tarcísio Meira
Mestre Jonas - Gilberto Martinho
Inês - Betty Faria
Rosa - Ana Ariel
Daniel - Paulo Araújo
Orjana - Neusa Amaral
Prof. Valdez - Enio Santos
Ricardo - Edney Giovenazzi
Júlia - Ida Gomes
CENA 1 - FLORIANÓPOLIS - APARTAMENTO DE ESTER - SALA - INTERIOR - NOITE.
ESTER NÃO GOSTAVA DE LUXO, DE EXCESSOS DE MODERNISMOS, MAS MANTINHA UM APARTAMENTO BEM MOBILIADO. BOM GOSTO MARCANTE, DESDE OS DETALHES. IVANZINHO SAIU CORRENDO DO FUNDO DA SALA E JOGOU-SE NOS BRAÇOS DA MÃE.
IVANZINHO - Boa noite, mãe!
ESTER - Boa noite, filhinho! (beijou-o) Durma bem, sonhe comigo.
IVAN DESPRENDEU-SE E SEGUIU PARA O QUARTO, NO MOMENTO EM QUE JÚLIA PENETROU NA SALA.
ESTER - Alguma notícia?
JULIA - Duas. Uma boa, outra não muito boa. O comendador está passando bem.
ESTER - (unindo as mãos) Graças a Deus!
JULIA - Esta é a boa notícia! A outra é que o Dr. Otto está aí. Quer falar com a senhora.
OTTO, DE FATO, IA ENTRANDO NA SALA COM PASSADAS BARULHENTAS.
OTTO - Será que agora, toda vez que eu quiser falar com você ou com meu filho, vou ter de ficar esperando na sala?
ESTER - É costume quando se vai visitar alguém, fazer-se anunciar.
OTTO - Quando se é um estranho!
ESTER - Quando se é bem-educado!
OTTO - E então?
ESTER - (virando-lhe as costas) Que é que você quer de mim?
OTTO - Um acordo.
ESTER - Que espécie de acordo?
OTTO - Diga o que quer para me entregar o menino.
ESTER - Nada. Não há preço para isso. E só há um meio... você mandar me matar, como fez com alguém.
OTTO - (estremeceu) Isso não é verdade! Você não pode provar!
ESTER - (encarou-o com desprezo) Otto, eu não quero nada de você. A não ser que me deixe viver para meu filho, que é só meu.Você sabe.
OTTO - (inteiramente transtornado) Se você repetir isso mais uma vez, mesmo que estejamos sós, aí sim, sou capaz de matá-la!
ESTER - (sem medo) Pois eu vou repetir... e bem alto!
OTTO SEGUROU-A PELOS OMBROS, COM VIOLÊNCIA, SACUDINDO-A COMO A UM BONECO DE PALHA.
JULIA - (interveio, enérgica) Não, Sr. Otto! Não faça isto!
CORTA PARA:
CENA 2 - PORTO AZUL - CHOUPANA DE MESTRE JONAS - INTERIOR - NOITE.
A LUZ BAÇA DO LAMPIÃO CLAREAVA MUITO POUCO O INTERIOR DA CHOUPANA. MESTRE JONAS ENTROU, DESCONSOLADO, CABISBAIXO. INÊS CORREU AO SEU ENCONTRO, ABRAÇANDO O PAI.
INÊS - Onde cê foi, pai? A mãe já tava agoniada!
MESTRE JONAS - Fui na capital.
INÊS - Ah, se eu soubesse. Tinha ido com ocê. Queria comprá um vestido pra mim.
MESTRE JONAS - Larga de pensá em besteira. Fui na capital pra coisa séria. E por sinal que num adiantou nada.
ROSA - (vindo do interior da choupana) Você chegou, Jonas? Conseguiu falá com ele?
MESTRE JONAS - (baixou os olhos, visivelmente aborrecido) Nada. Uns desgraçado num me deixaro. Fui escorraçado como um cão danado.
ROSA - Ele te escorraçou?
MESTRE JONAS - Ele num tá sabendo de nada. Foram os empregados do hotel e os guarda... mas num adianta. Eu hei de chegar até ele! Isso ninguém vai impedir!
INÊS - Não tou entendendo... de que vocês tão falando. Quem é que o pai foi procurá?
MESTRE JONAS - É uma pessoa que vem pra fazê o bem, ajudá quem precisa. Faz mais de 30 anos que eu tive o aviso que ele vinha.
INÊS - (intrigada) Tá falando sério?
MESTRE JONAS - E eu ia brincá com uma coisa dessas?
ROSA - Falá nisso, nosso filho taí muito ruim, muito ruim mesmo.
MESTRE JONAS - (pareceu despertar ao ouvir falar do filho) Daniel? Taí de novo?
ROSA - Ardendo em febre, suando frio...
MESTRE JONAS - (explodiu, com o punho fechado, esmurrando o ar) Ó mina dos diabos!
DE UM SALTO, CORREU PARA O QUARTO AO LADO.
CORTA PARA:
Ester (Glória Menezes) e Otto Muller (Jardel Filho) |
CENA 3 - CHOUPANA DE MESTRE JONAS - QUARTO DE DANIEL - INTERIOR - NOITE.
NA ESTEIRA, DEITADO, DANIEL TIRITAVA. DA TESTA ESCORRIAM-LHE GROSSAS BAGAS DE SUOR BRILHANTE. JONAS DEBRUÇOU-SE CARINHOSO SOBRE O FILHO, ENCOSTANDO O DORSO DA MÃO CONTRA A FRONTE EM BRASA.
MESTRE JONAS - É, amanhã vou procurá doutô Ricardo. Tenho que falá com ele... falo sobre isso também.
LEVANTOU-SE, DEPOIS DE COBRIR O FILHO COM UM LENÇOL DE RETALHOS COLORIDOS.
CORTA PARA:
CENA 4 - CHOUPANA DE MESTRE JONAS - EXTERIOR - DIA.
O DIA AMANHECEU CHUVOSO EM PORTO AZUL. O MAR BRAVIO IMPEDIA A SAÍDA DAS EMBARCAÇÕES E O VENTO CORTANTE ASSOBIAVA POR SOBRE O TELHADO DOS CASEBRES DE SAPÉ E BARRO. JONAS DEIXOU A CHOUPANA E SE DIRIGIU, MAIS UMA VEZ, À CIDADE.
CORTA PARA:
CENA 5 - FLORIANÓPOLIS - HOTEL CENTRAL - EXTERIOR - NOITE.
HÁ HORAS MESTRE JONAS ENCONTRAVA-SE DIANTE DO HOTEL, ENVOLVIDO NUMA CAPA GROSSA. ESPERAVA PACIENTEMENTE, ATÉ QUE, LÁ PELAS 22:30 UM TÁXI PAROU E O DR. CYRO VALDEZ APARECEU À PORTA, PAGOU AO MOTORISTA E DESCEU. VESTIA UM TERNO CINZA, DE CORTE MODERNO E SÉRIO. JONAS APERTOU OS PASSOS E SE COLOCOU ENTRE O CARRO, QUE PARTIA, E O PORTÃO DE ENTRADA DO HOTEL. CYRO FITOU-O INTRIGADO.
MESTRE JONAS - (balbuciou, emocionado) Dr. Cyro!
CYRO - Boa noite!
O MÉDICO TENTOU ANDAR. JONAS SEGUROU-LHE O BRAÇO.
MESTRE JONAS - Eu preciso falar com o senhor!
CYRO - (fitou-o com bondade) Fale!
MESTRE JONAS - O senhor não me conhece, mas... eu lhe garanto que é importante. Já quis entrar aí, no hotel. Uma porção de vezes. Não me deixaram.
CYRO - Não deixam por quê? Venha comigo.
CYRO ABRAÇOU O VELHO, LEVANDO-O PARA O INTERIOR DO EDIFÍCIO.
CORTA PARA:
CENA 6 - FLORIANÓPOLIS - HOTEL CENTRAL - APARTAMENTO DE CYRO - INTERIOR - NOITE.
JONAS OLHAVA PARA O MÉDICO INSISTENTEMENTE, COMO SE NÃO ACREDITASSE EM SEUS OLHOS. CYRO AOS POUCOS PERDIA A NATURALIDADE.
CYRO - Pronto. Agora o senhor pode dizer o que quer de mim.
MESTRE JONAS - (como que hipnotizado) Eu só queria... olhá bem pro sinhô!
CYRO - Eu não estou entendendo... por quê o senhor quer olhar bem para mim?
MESTRE JONAS - Faz 30 anos eu recebi o aviso...
CYRO - Que aviso?!
MESTRE JONAS - Que o sinhô vinha.
CYRO - (penalizado) Meu velho, eu estou muito cansado... se você pudesse me dar licença...
MESTRE JONAS - Eu me chamo Jonas, sou pescador. Moro em Porto Azul, na Praia Bonita. Todo mundo lá conhece Mestre Jonas. Quando o sinhô precisá de mim, é só mandá chamá. Largo tudo e sigo seus passos. É o meu Mestre e o meu Guia.
CYRO LEVOU-O ATÉ A PORTA, DELICADAMENTE. À SAÍDA, MESTRE JONAS TOMOU A MÃO DO MÉDICO, TENTANDO BEIJÁ-LA. CYRO PUXOU-A, NUM REPELÃO.
CYRO - Que é isso?! Por favor!
MESTRE JONAS - Desculpe... desculpe mesmo!
CORTA PARA:
CENA 7 - FLORIANÓPOLIS - APARTAMENTO DE RICARDO - SALA - INTERIOR - NOITE.
A CAMPAINHA TOCOU. RICARDO ABRIU A PORTA, VESTIDO COM UM ROUPÃO DE SEDA. ERAM ORJANA E O PROF. VALDEZ.
ORJANA - (antes de qualquer cumprimento) Estou... estamos aqui para lhe fazer um pedido, Ricardo. É em nome de... de nossa antiga amizade.
RICARDO - Faz muito tempo, não é, Orjana? Os primeiros anos da nossa adolescência. Tão jovens... Como esquecer do amor que nasceu e morreu na noite dos acontecimentos...
ORJANA - É possível que você e Cyro voltem a se encontrar. É possível, também, que ele lhe faça perguntas embaraçosas...
RICARDO - Sobre os fatos sobrenaturais?
ORJANA - Também...
PROF. VALDEZ - Mas ele não sabe de nada. Se você não disser...
RICARDO - Não tenho por que dizer, se ele não me perguntar.
ORJANA - Acho que ele não vai perguntar-lhe nada sobre... sobre nossas relações, nosso noivado... Ele não vai falar sobre isso, diretamente, é claro, mas seria bom que você soubesse... que eu tive de mentir! Ele pensa que é seu filho!
RICARDO - (estremeceu) Você disse isso a ele?!
ORJANA - (baixando os olhos) Desculpe-me... Procure compreender. Num dado momento eu tive de citar um nome.
O ENGENHEIRO NÃO CONSEGUIA ESCONDER O DESCONTROLE QUE A NOTÍCIA LHE CAUSARA.
RICARDO - (nervoso) Bem, eu... eu não sei o que dizer...
PROF. VALDEZ - É possível que ele nem toque nesse assunto, Ricardo. É o mais provável, aliás. Ele é um homem superior, inteligentíssimo, não vai se preocupar com essas coisas.
FIM DO CAPÍTULO 6
NA PRÓXIMA TERÇA, MAIS UM CAPÍTULO INÉDITO!
Pobre Orjana, quanta preocupação, quanto cuidado para impedir o filho de saber a verdade! Mas, desconfio que ele logo irá descobrir o segredo da mãe. Estou gostando muito!
ResponderExcluirUma história emocionante, estou gostando muito!
ResponderExcluirAmigos, como muitos já sabem, quando Janete Clair escreveu essa novela, pretendia fazer uma "alegoria" sobre a vinda de Cristo á terra, mas a censura, implacável, proibiu o tema e ela teve que modificar às pressas, transformando o Dr. Cyro numa espécie de extraterrestre. Mesmo assim, com sua genialidade, mudou a história original, criando outra cheia de emoção e novos ganchos, que vão crescendo a cada capítulo! Bom que estão gostando! ;)
ResponderExcluirGente, vocês lembram como era a abertura dessa novela ? Perguntei ao José Henrique Uessler e ele lembra mais ou menos de um sol no começo e cenas de um homem correndo na praia, com passos do homem na lua, nave espacial etc...
ResponderExcluirAbraço Césio
Césio, era muito pequeno nessa época. Uma pequena que não exista mais a abertura dessa novela.
ExcluirÉ verdade, gente. Ia ser bacana ver a abertura original, como o amigo do Césio descreveu. Pena que das novelas do início dos anos 70, poucas aberturas restaram. Pior ainda é não ter uma cena sequer! "Irmãos Coragem", que foi produzida antes de "O Homem que Deve Morrer", ainda tem começo, meio e fim, né...
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