sexta-feira, 16 de maio de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - CAPÍTULO 6 - TONI FIGUEIRA


Novela de Janete Clair
Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 6

Participam deste capítulo

Ester  -  Gloria Menezes
Otto   -  Jardel Filho
Ivanzinho  -  Rogério Pitanga
Cyro  -  Tarcísio Meira
Mestre Jonas  -  Gilberto Martinho
Inês  -  Betty Faria
Rosa  -  Ana Ariel
Daniel  -  Paulo Araújo
Orjana  -  Neusa Amaral
Prof. Valdez  -  Enio Santos
Ricardo  -  Edney Giovenazzi
Júlia  -  Ida Gomes

CENA 1  -  FLORIANÓPOLIS  -  APARTAMENTO DE ESTER  -  SALA  -  INTERIOR  -  NOITE.

ESTER NÃO GOSTAVA DE LUXO, DE EXCESSOS DE MODERNISMOS, MAS MANTINHA UM APARTAMENTO BEM MOBILIADO. BOM GOSTO MARCANTE, DESDE OS DETALHES. IVANZINHO SAIU CORRENDO DO FUNDO DA SALA E JOGOU-SE NOS BRAÇOS DA MÃE.

IVANZINHO  -  Boa noite, mãe!

ESTER  -  Boa noite, filhinho! (beijou-o) Durma bem, sonhe comigo.

IVAN DESPRENDEU-SE E SEGUIU PARA O QUARTO, NO MOMENTO EM QUE JÚLIA PENETROU NA SALA.

ESTER  -  Alguma notícia?

JULIA  -  Duas. Uma boa, outra não muito boa. O comendador está passando bem.

ESTER  -  (unindo as mãos) Graças a Deus!

JULIA  -  Esta é a boa notícia! A outra é que o Dr. Otto está aí. Quer falar com a senhora.

OTTO, DE FATO, IA ENTRANDO NA SALA COM PASSADAS BARULHENTAS.

OTTO  -  Será que agora, toda vez que eu quiser falar com você ou com meu filho, vou ter de ficar esperando na sala?

ESTER  -  É costume quando se vai visitar alguém, fazer-se anunciar.

OTTO  -  Quando se é um estranho!

ESTER  -  Quando se é bem-educado!

OTTO  -  E então?

ESTER  -  (virando-lhe as costas) Que é que você quer de mim?

OTTO  -  Um acordo.

ESTER  -  Que espécie de acordo?

OTTO  -  Diga o que quer para me entregar o menino.

ESTER  -  Nada. Não há preço para isso. E só há um meio... você mandar me matar, como fez com alguém.

OTTO  -  (estremeceu) Isso não é verdade! Você não pode provar!

ESTER  -  (encarou-o com desprezo) Otto, eu não quero nada de você. A não ser que me deixe viver para meu filho, que é só meu.Você sabe.

OTTO  -  (inteiramente transtornado) Se você repetir isso mais uma vez, mesmo que estejamos sós, aí sim, sou capaz de matá-la!

ESTER  -  (sem medo) Pois eu vou repetir... e bem alto!

OTTO SEGUROU-A PELOS OMBROS, COM VIOLÊNCIA, SACUDINDO-A COMO A UM BONECO DE PALHA.

JULIA  -  (interveio, enérgica) Não, Sr. Otto! Não faça isto!

CORTA PARA:

CENA 2  -  PORTO AZUL  -  CHOUPANA DE MESTRE JONAS  -  INTERIOR  -  NOITE.

A LUZ BAÇA DO LAMPIÃO CLAREAVA MUITO POUCO O INTERIOR DA CHOUPANA. MESTRE JONAS ENTROU, DESCONSOLADO, CABISBAIXO. INÊS CORREU AO SEU ENCONTRO, ABRAÇANDO O PAI.

INÊS  -  Onde cê foi, pai? A mãe já tava agoniada!

MESTRE JONAS -  Fui na capital.

INÊS  -  Ah, se eu soubesse. Tinha ido com ocê. Queria comprá um vestido pra mim.

MESTRE JONAS  -  Larga de pensá em besteira. Fui na capital pra coisa séria. E  por sinal que num adiantou nada.

ROSA  -  (vindo do interior da choupana) Você chegou, Jonas? Conseguiu falá com ele?

MESTRE JONAS  -  (baixou os olhos, visivelmente aborrecido) Nada. Uns desgraçado num me deixaro. Fui escorraçado como um cão danado.

ROSA  -  Ele te escorraçou?

MESTRE JONAS  -  Ele num tá sabendo de nada. Foram os empregados do hotel e os guarda... mas num adianta. Eu hei de chegar até ele! Isso ninguém vai impedir!

INÊS  -  Não tou entendendo... de que vocês tão falando. Quem é que o pai foi procurá?

MESTRE JONAS  -  É uma pessoa que vem pra fazê o bem, ajudá  quem precisa. Faz mais de 30 anos que eu tive o aviso que ele vinha.

INÊS  -  (intrigada) Tá falando sério?

MESTRE JONAS  -  E eu ia brincá com uma coisa dessas?

ROSA  -  Falá nisso, nosso filho taí muito ruim, muito ruim mesmo.

MESTRE JONAS  -  (pareceu despertar ao ouvir falar do filho) Daniel? Taí de novo?

ROSA  -  Ardendo em febre, suando frio...

MESTRE JONAS  -  (explodiu, com o punho fechado, esmurrando o ar) Ó mina dos diabos!

DE UM SALTO, CORREU PARA O QUARTO AO LADO.

CORTA PARA:

Ester (Glória Menezes) e Otto Muller (Jardel Filho)

CENA 3  -  CHOUPANA DE MESTRE JONAS  -  QUARTO DE DANIEL  -  INTERIOR  -  NOITE.

NA ESTEIRA, DEITADO, DANIEL TIRITAVA. DA TESTA ESCORRIAM-LHE GROSSAS BAGAS DE SUOR BRILHANTE. JONAS DEBRUÇOU-SE CARINHOSO SOBRE O FILHO, ENCOSTANDO O DORSO DA MÃO CONTRA A FRONTE EM BRASA.

MESTRE JONAS  -  É, amanhã vou procurá doutô Ricardo. Tenho que falá com ele... falo sobre isso também.

LEVANTOU-SE, DEPOIS DE COBRIR O FILHO COM UM LENÇOL DE RETALHOS COLORIDOS.

CORTA PARA:

CENA 4  -  CHOUPANA DE MESTRE JONAS  -  EXTERIOR  -  DIA.

O DIA AMANHECEU CHUVOSO EM PORTO AZUL. O MAR BRAVIO IMPEDIA A SAÍDA DAS EMBARCAÇÕES E O VENTO CORTANTE ASSOBIAVA POR SOBRE O TELHADO DOS CASEBRES DE SAPÉ E BARRO. JONAS DEIXOU A CHOUPANA E SE DIRIGIU, MAIS UMA VEZ, À CIDADE.

CORTA PARA:

CENA 5  -  FLORIANÓPOLIS  -  HOTEL CENTRAL  -  EXTERIOR  -  NOITE.

HÁ HORAS MESTRE JONAS ENCONTRAVA-SE DIANTE DO HOTEL, ENVOLVIDO NUMA CAPA GROSSA. ESPERAVA PACIENTEMENTE, ATÉ QUE, LÁ PELAS 22:30 UM TÁXI PAROU E O DR. CYRO VALDEZ APARECEU À PORTA, PAGOU AO MOTORISTA E DESCEU. VESTIA UM TERNO CINZA, DE CORTE MODERNO E SÉRIO. JONAS APERTOU OS PASSOS E SE COLOCOU ENTRE O CARRO, QUE PARTIA, E O PORTÃO DE ENTRADA DO HOTEL. CYRO FITOU-O INTRIGADO.

MESTRE JONAS  -  (balbuciou, emocionado) Dr. Cyro!

CYRO  -  Boa noite!

O MÉDICO TENTOU ANDAR. JONAS SEGUROU-LHE O BRAÇO.

MESTRE JONAS  -  Eu preciso falar com o senhor!

CYRO  -  (fitou-o com bondade) Fale!

MESTRE JONAS  -  O senhor não me conhece, mas... eu lhe garanto que é importante. Já quis entrar aí, no hotel. Uma porção de vezes. Não me deixaram.

CYRO  -  Não deixam por quê? Venha comigo.

CYRO ABRAÇOU O VELHO, LEVANDO-O PARA O INTERIOR DO EDIFÍCIO.

CORTA PARA:

CENA  6  -  FLORIANÓPOLIS  -  HOTEL CENTRAL  -   APARTAMENTO DE CYRO  -  INTERIOR  -  NOITE.

JONAS OLHAVA PARA O MÉDICO INSISTENTEMENTE, COMO SE NÃO ACREDITASSE EM SEUS OLHOS. CYRO AOS POUCOS PERDIA A NATURALIDADE.

CYRO  -  Pronto. Agora o senhor pode dizer o que quer de mim.

MESTRE JONAS  -  (como que hipnotizado) Eu só queria... olhá bem pro sinhô!

CYRO  -  Eu não estou entendendo... por quê o senhor quer olhar bem para mim?

MESTRE JONAS  -  Faz 30 anos eu recebi o aviso...

CYRO  -  Que aviso?!

MESTRE JONAS  -  Que o sinhô vinha.

CYRO  -  (penalizado) Meu velho, eu estou muito cansado... se você pudesse me dar licença...

MESTRE JONAS  -  Eu me chamo Jonas, sou pescador. Moro em Porto Azul, na Praia Bonita. Todo mundo lá conhece Mestre Jonas. Quando o sinhô precisá de mim, é só mandá chamá. Largo tudo e sigo seus passos. É o meu Mestre e o meu Guia.

CYRO LEVOU-O ATÉ A PORTA, DELICADAMENTE. À SAÍDA, MESTRE JONAS TOMOU A MÃO DO MÉDICO, TENTANDO BEIJÁ-LA. CYRO PUXOU-A, NUM REPELÃO.

CYRO  -  Que é isso?! Por favor!

MESTRE JONAS  -  Desculpe... desculpe mesmo!

CORTA PARA:

CENA  7  -  FLORIANÓPOLIS  -  APARTAMENTO DE RICARDO  -  SALA  -  INTERIOR  -  NOITE.

A CAMPAINHA TOCOU. RICARDO ABRIU A PORTA, VESTIDO COM UM ROUPÃO DE SEDA. ERAM ORJANA E O PROF. VALDEZ.

ORJANA  -  (antes de qualquer cumprimento) Estou... estamos aqui para lhe fazer um pedido, Ricardo. É  em nome de... de nossa antiga amizade.

RICARDO  -  Faz muito tempo, não é, Orjana? Os primeiros anos da nossa adolescência.  Tão jovens... Como esquecer do amor que nasceu e morreu na noite dos acontecimentos...

ORJANA  -  É possível que você e Cyro voltem a se encontrar. É possível, também, que ele lhe faça perguntas embaraçosas...

RICARDO  -  Sobre os fatos sobrenaturais?

ORJANA  -  Também...

PROF. VALDEZ  -  Mas ele não sabe de nada. Se você não disser...

RICARDO  -  Não tenho por que dizer, se ele não me perguntar.

ORJANA  -  Acho que ele não vai perguntar-lhe nada sobre... sobre nossas relações, nosso noivado... Ele não vai falar sobre isso, diretamente, é claro, mas seria bom que você soubesse... que eu tive de mentir! Ele pensa que é seu filho!

RICARDO  -  (estremeceu) Você disse isso a ele?!

ORJANA  -  (baixando os olhos) Desculpe-me...  Procure compreender. Num dado momento eu tive de citar um nome.

O ENGENHEIRO NÃO CONSEGUIA ESCONDER O DESCONTROLE QUE A NOTÍCIA LHE CAUSARA.

RICARDO  -  (nervoso) Bem, eu... eu não sei o que dizer...

PROF. VALDEZ  -  É possível que ele nem toque nesse assunto, Ricardo. É o mais provável, aliás. Ele é um homem superior, inteligentíssimo, não vai se preocupar com essas coisas.


FIM DO CAPÍTULO 6


 NA PRÓXIMA TERÇA, MAIS UM CAPÍTULO INÉDITO!

6 comentários:

  1. Pobre Orjana, quanta preocupação, quanto cuidado para impedir o filho de saber a verdade! Mas, desconfio que ele logo irá descobrir o segredo da mãe. Estou gostando muito!

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  2. Uma história emocionante, estou gostando muito!

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  3. Amigos, como muitos já sabem, quando Janete Clair escreveu essa novela, pretendia fazer uma "alegoria" sobre a vinda de Cristo á terra, mas a censura, implacável, proibiu o tema e ela teve que modificar às pressas, transformando o Dr. Cyro numa espécie de extraterrestre. Mesmo assim, com sua genialidade, mudou a história original, criando outra cheia de emoção e novos ganchos, que vão crescendo a cada capítulo! Bom que estão gostando! ;)

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  4. Gente, vocês lembram como era a abertura dessa novela ? Perguntei ao José Henrique Uessler e ele lembra mais ou menos de um sol no começo e cenas de um homem correndo na praia, com passos do homem na lua, nave espacial etc...
    Abraço Césio

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    1. Césio, era muito pequeno nessa época. Uma pequena que não exista mais a abertura dessa novela.

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    2. É verdade, gente. Ia ser bacana ver a abertura original, como o amigo do Césio descreveu. Pena que das novelas do início dos anos 70, poucas aberturas restaram. Pior ainda é não ter uma cena sequer! "Irmãos Coragem", que foi produzida antes de "O Homem que Deve Morrer", ainda tem começo, meio e fim, né...

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