Capítulo 32 – Confissões
Naquele dia à noite, Mariana se encontrava no quarto de Emanuela,
enquanto estava deitada na cama, olhando para o teto, repassando todos os
acontecimentos do dia. Logo após ser ameaçada por Viviane, ela ainda foi
almoçar na companhia de Rafael. Pensava em como faria para se afastar de Rafael
sem que ele se sentisse ofendido, já que Vivi poderia cumprir sua ameaça. Mas
do que isso, se sentia incomodada por ter que fazer isso, afinal, o Dr. Rafael
havia se tornado um amigo próximo. Estava nisso, quando Emanuela entrou no
quarto.
— Mari? – perguntou ela, surpresa ao ver a irmã na cama – Estranhei não
estar na sala, mas não sabia que estaria aqui no meu quarto.
Mariana se ergueu, sentando-se.
— Essa é uma prova do quanto eu amo você. – disse, fazendo um muxoxo –
Ficar o dia inteiro nessa casa não é muito legal.
Emanuela sentou-se ao lado da irmã.
— Não é como se essa casa não tivesse ninguém. Você pode conversar com a
dona Gabriele, às vezes, com o filho da Érica e até mesmo com o nosso pai.
— E o que eu conversaria com eles? Quer dizer, eu converso com o nosso
pai, mas não tem muita coisa para falar.
Emanuela ficou pensativa.
— E o Dr. Rafael? Vocês não são amigos?
— Éramos, né? – disse e se arrependendo logo depois – Digo, somos. É que
ele é muito ocupado. Mas, mudando de assunto, e quanto ao seu trabalho? Como
vai a empresa? Vi umas notícias na internet.
Emanuela suspirou.
— Pois é, estava o maior alvoroço por lá. Mas o Presidente Interino, o
Dr. Marcos, lembra-se dele na festa da Viviane? Ele mandou todos se acalmarem
porque nada de ruim iria acontecer às empresas do grupo.
— Hum... Então, está gostando de lá?
— Está bom. Por enquanto, estou no Departamento de Marketing, mas, em
breve, vão me mudar para o Departamento Financeiro. É algo que o Dr. Otávio já
tinha explicado para fazer, assim eu conheço a empresa melhor.
Mariana olhou sério para a irmã.
— E é isso que quer? Parece que nosso avô planeja fazer de você uma
sucessora no futuro.
— Também achei isso. Mas se ele quiser, então, tudo bem.
Mari pareceu ficar um pouco impaciente.
— Como assim tudo bem? É isso que quer mesmo? Se for, eu digo tudo bem,
mas se não for... Manu, não tem algo que queira fazer, um sonho?
Emanuela suspirou.
— Mari, não sou como você, nunca pensei muito nessas coisas. E por outro
lado, é obrigado todo mundo ter um sonho?
— Isso eu não sei. – disse pensativa – Mas ter um sonho ou um grande
desejo, bem, acho que dá um colorido especial a vida de alguém. Por exemplo, eu
quero ser médica pediatra porque sempre quando as crianças ficavam doentes no
orfanato, eu desejava de alguma forma tirar ou pelo menos diminuir o sofrimento
delas. Só em pensar que poderei fazer isso no futuro, me sinto feliz. Por isso,
antes de decidir o seu futuro, acho que deveria pensar muito bem nisso e não
fazer algo apenas porque os outros querem.
— É, você pode ter razão. – e olhando, encarando a irmã – Mas aconteceu
alguma coisa?
— Por que pergunta isso de repente? – perguntou Mari confusa.
Emanuela olhou para a irmã curiosa.
— Você está um pouco estranha, por isso pensei que algo diferente
tivesse acontecido.
— E o que aconteceria nessa casa enorme
de grande? – e tentando desconversar – Mas mudando de assunto, com tanto
trabalho, você tem ligado para o Fabrício?
— Hoje, ainda não nos falamos, por quê?
Mariana suspirou.
— Manu, um relacionamento só vai para frente se você fizer a devida
manutenção nele. Entende? Você precisa dar mais atenção ao seu namorado,
irmãzinha!
— E desde quando, você sabe tanto sobre relacionamentos, hein, maninha?
– disse, rindo – Do jeito que fala, parece até que teve vários namorados.
Mariana levantou-se teatralizando.
— Existem pessoas que já nascem com determinados conhecimentos.
De repente, alguém bateu a porta. Era uma das empregadas, avisando que o
jantar já estava prestes a ser servido. As duas avisaram que logo desceriam.
— Vou tomar um banho rápido e já vou. Se quiser, pode ir na frente. –
disse Emanuela à Mariana, logo depois entrando no banheiro do quarto.
Mariana deitou-se novamente na cama. Não conseguira até aquele momento
se decidir sobre Rafael. Mas algo mais a incomodava e não sabia o que
exatamente.
***
— O que?! – exclamou Verônica ao ouvir o relato de Viviane.
As duas já estavam sentadas em uma área de convivência da faculdade,
esperando a aula começar naquela terça-feira. Por um milagre, como Verônica
dizia, Vivi havia chegado cedo à faculdade.
— Vivi, como pôde fazer isso? Isso é muito cruel, sabia? Não pode
ameaçar contar esse tipo de segredo para a irmã dela! Do pouco que a conheço,
ela é uma pessoa legal e parece se dar muito bem com a irmã, coisa bem rara
esses dias. Quem dera meu irmão fosse assim comigo, que só para constar está
ignorando as minhas ligações agora. Tentar estragar esse tipo de amor fraternal
é quase um pecado!
Vivi assoprou impaciente.
— Calma, Verônica. Acha mesmo que sou tão má assim? Eu ameacei, não quer
dizer que vá fazer. – e um pouco enigmática – Além disso, também tenho outro
motivo.
— Que outro objetivo seria esse? – perguntou Verônica – Que coisa pior
está planejando, hein?
— Você tem um péssimo conceito de mim, não é?
— E de quem acha que é a culpa?
Verônica olhou desconfiada para a amiga.
— Mas, você não me contou porque fez isso. O que foi que teve nessa
conversa que chegou a esse ponto? Por que não conta? – e vendo que Vivi ficara
calada – Não vai me contar mesmo?
Viviane suspirou.
— Está bem. Mas é humilhante, pelo menos para mim que passei mais de
três anos me declarando para ele e não consegui nada. – e suspirando novamente
– Ele a conhece há pouco tempo e praticamente já se confessou para ela.
— O que?! – exclamou Verônica, chamando a atenção de todos e um pouco
mais baixo – Você está certa disso?
— Tão certa quanto meu nome é Viviane Alcântara. Teve uma hora na
conversa que ele contou que gostava de uma garota e depois a descreveu
totalmente. É claro que ou ela fingiu, e fingiu muito bem, ou não percebeu que
ele estava se referindo a ela mesma.
— Nossa, que babado!
Vivi olhou, estranhando aquela expressão.
— De que época veio para usar essa gíria, Verônica?
A amiga deu uma risadinha.
— Reciclar é o meu lema querida. Mas voltando ao assunto... Entendo que
teve os seus motivos, mas mesmo assim não deixa de ser cruel. Me sinto até
culpada por saber agora desse segredo, principalmente, porque sou irmã do
Fabrício. – Verônica olhou para a amiga com uma expressão cansada. – Vivi,
quando vai aprender a ser um pouco mais madura?
— Eu sou madura, de um jeito diferente, mas sou.
— Em todo caso, deveria se desculpar com ela e deixar essas ameaças
infantis de lado. Mas de qualquer forma, você está mudando. – e olhando para a
expressão curiosa de Vivi – Se fosse em outros tempos, teria feito coisa pior.
Será que é por que você está gostando de outra pessoa?
— Haha. Não me venha falar do Gabriel, por favor.
Verônica riu, batendo palmas.
— Olha... Eu nem falei o nome dele, você mesmo se entregou. Deveria
deixar de lado esse orgulho e se jogar nos braços dele e parar de vez com essa
maluquice com o Rafael, que ele também é um ser humano e merece ser feliz.
Viviane riu alto.
— Me jogar nos braços do Gabriel? Nunca, querida.
— Nunca diga nunca, Vivi. Você pode se arrepender depois, viu? – e se
levantando, enquanto olhava para o relógio – A conversa está ótima, mas já deu
a hora, amiga. Vamos logo que o meu professor de hoje da primeira aula gosta de
fazer a chamada bem no começo. Mesmo que o meu nome comece com “V”, ele é tão
chato que muitas vezes faz a chamada começando pelo fim. – suspirou.
Vivi se levantou também e acompanhou a amiga.
***
Érica estava mais uma vez no hospital. Voltava de mais um último exame.
Já tomara a sua decisão. Em breve, estaria viajando para fora do país e apesar
de suas chances de cura, não tinha certeza se voltaria. Enquanto andava pelo
corredor, avistou Fabiano que conversava com outro médico. Ela chamou a atenção
dele e se aproximou, enquanto o outro médico se afastava.
—
Fabiano, você pode me dar alguns minutos? Preciso falar com você.
Fabiano
olhou indiferente para ela.
—
Infelizmente, não tenho muito tempo para os seus joguinhos, Érica. Você não se cansa
disso? De vir aqui só me perturbar?
Érica
pareceu ficar chateada.
— Acha
mesmo que tenho tanto tempo livre assim para vir a um hospital apenas para lhe
perseguir? Nem passou pela sua cabeça que eu poderia estar aqui por outra
razão?
— E que
razão seria essa? – perguntou, olhando para Érica que não respondeu – Viu? Você
mesma parece não saber.
— Me
odeia tanto assim pelo que eu te fiz?
Fabiano
suspirou um pouco impaciente.
— Eu não
lhe odeio Érica. Não sou do tipo que guarda mágoas e deve saber muito bem
disso. Só gosto de manter distância das pessoas que não pensam duas vezes em me
ferir.
— Pensei
que pudéssemos ser pelo menos amigos. Em todo caso, agora, eu realmente preciso
falar com você...
Dr.
Fabiano olhou para Érica, sério.
— Por
favor, não demore muito. – disse, enquanto os dois se retiravam para um local
mais reservado.
***
Rebeca tamborilava com os dedos na mesa, impaciente. Já estava perto da
hora do almoço e, mais uma vez, Érica faltava sem dizer nada e o trabalho
apenas ficava para ela. Seus pensamentos agora passaram para Fabiano, não
tivera qualquer notícia dele, depois daquele último encontro. Precisava
esclarecer algumas coisas. Se pudesse explicar tudo a ele, talvez até mesmo ela
desistisse do objetivo de ter chegado até ali. Poderia esquecer toda aquela
história e seguir em frente. Tomou a decisão e saiu.
Rebeca
tomou um táxi para ir ao hospital. Não demorou muito para chegar. Antes de
entrar, respirou fundo. Precisava de coragem naquela hora.
— Vamos
lá! – disse para si mesma.
Ao entrar
no hospital, logo avistou Fabiano no corredor. Ia ao seu encontro, quando
percebeu que Érica se aproximou para falar com ele. Esperou um pouco, quando
percebeu que os dois já estavam saindo. Rebeca se aproximou.
— Dr.
Fabiano? – disse ela ao se aproximar, interrompendo-os
Fabiano
virou-se. Ao ver Rebeca, sua expressão ficou mais fria.
— Dr.
Fabiano. – disse ela ao chegar mais perto. – Eu gostaria muito de falar com o
senhor.
Fabiano
olhou sério para Rebeca. Érica achou estranho aquele comportamento.
— Acho
que não há mais nada que possamos conversar. Naquele dia, tudo ficou claro. Fiz
mal em tentar me meter nos seus assuntos e, por isso, não vou me intrometer
mais. Agora, se o que quer dizer é algo relacionado à consulta médica, deve
passar pelos procedimentos do hospital. – disse, se preparando para sair.
—
Fabiano. – ela insistiu, fazendo-o virar-se para ela – Eu sei que está muito
magoado comigo, mas tenho minhas razões de ter feito aquilo...
— Claro, sei
que tudo tem uma explicação. – disse ele ainda com um tom frio – Mas,
infelizmente, não tenho tempo agora para isso. – E olhando para Érica ao seu
lado – Tem alguém com tenho que conversar.
Rebeca
olhou para Érica e, em seguida, para Fabiano.
— Vocês
dois...
— Sim,
nós dois estamos pensando em voltar. – disse, diante do olhar surpreso de
Érica. –Depois de tanto tempo, eu percebi que meu amor pela Érica voltou. No
fundo, talvez eu me aproximei de você porque me lembrava muito ela.
— Mas ela
não é casada com o Dr. Marcos? – perguntou Rebeca confusa.
Érica que
assistia a tudo, e mesmo não entendendo muita coisa, resolveu ajudar Fabiano. Segurou
no braço do médico e percebeu que ele não se desvencilhou dela.
— Eu
resolvi me divorciar do Marcos e pretendo voltar com Fabiano. Eu disse a você,
Fabiano é meu.
— Eu não
sabia... – disse Rebeca sem reação. – Desculpa por me intrometer então. – disse,
olhando para Fabiano e se retirando.
Rebeca
saiu, enquanto Fabiano apenas a observava. Érica olhou para o médico e percebeu
sua expressão de tristeza.
— Eu não
gosto dessa Rebeca, mas não acho que esse é o melhor caminho, mesmo que eu
tenha lhe ajudado na atuação. Acho que se há um mal-entendido, deveriam apenas
conversar e esclarecer tudo.
Fabiano
olhou para Érica, se soltando dela.
— Desde
quando acha isso? Ou você esqueceu o que me disse depois que reapareceu com o
meu tio? Que tudo entre nós havia sido um teatro e que, no fundo, sempre teve
como objetivo se casar com ele, principalmente, depois que soube que eu era de
uma família rica.
— Sim, eu
disse. E era verdade. Mas acredite, apenas estou dando um conselho de alguém
que tomou esse caminho e agora está recebendo as consequências disso.
Fabiano
olhou para Érica, confuso.
— Do que
está falando?
Érica
ficou calada durante alguns segundos.
— Não é
nada.
— Não
queria tanto conversar comigo? Sobre o que é?
—
Queria... Mas acho que esse não é o momento adequado. Volte ao seu trabalho e
pense no que eu disse. – disse, se afastando logo em seguida, deixando o médico
um pouco confuso e pensativo.
***
O resto
da semana passou rápido e já estavam no sábado. Viviane,
de repente, acordou, quando a governanta Sônia abriu as cortinas do quarto,
deixando a luz do sol banhar o quarto.
— Fala sério! – reclamou Viviane, se escondendo no edredom. – Me deixa
dormir, por favor... Sabe que fico extremamente de mau humor, quando me acordam
quando não quero.
Sônia chegou perto da cama de Viviane.
— Me desculpe, sua mãe pediu para fazer isso.
— Que horas são? – perguntou ela, sentando-se, demonstrando sua
irritação.
— São dez da manhã... Já está mais do que na hora de acordar.
Viviane resmungou algo enquanto se levantava. Sônia saiu do quarto para
que ela pudesse trocar de roupa. Depois de meia hora, Viviane já estava
descendo para tomar o café da manhã. Ela entrou na sala e viu que não havia
ninguém à mesa.
— Rute. – disse ela para uma das empregadas enquanto se sentava para se
servir. – Onde está todo mundo?
— Todos acordaram muito cedo... Suas irmãs... – e percebendo que Viviane
olhara de repente. – Quer dizer, as gêmeas já tomaram café e estão na
biblioteca, seu avô também já se alimentou e está no quarto, descansando. –
disse, dispondo na mesa mais alimentos para Vivi.
— E os meus tios? – perguntou ela curiosa, enquanto colocava um pouco de
suco em um copo.
— Dona Iêda e a dona Camila saíram juntas, acho que foram fazer compras...
O seu tio Bruno está no pavilhão do jardim e seu tio Fabiano está no hospital
de plantão. Já seu tio Otávio tomou café da manhã e voltou ao quarto. – Rute
sorriu, olhando para a garota – Mais alguma coisa?
— Não, obrigada. Você me deu um relatório completo. – disse, retribuindo
o sorriso, enquanto comia uma fatia de bolo.
— Por que esse interesse todo na família de repente? – perguntou Érica,
que vinha entrando. A babá também vinha acompanhada com Fabinho. – Desde quando
você é tão interessada com o que as pessoas daqui fazem?
Viviane olhou desinteressada para Érica.
— Não acho que isso seja da sua conta... Por acaso, eu não posso
perguntar? – e olhando para Fabinho, que se sentou ao seu lado. – Oi, Fabinho!
Até que enfim, consigo te ver, hein? Depois que sua mãe malvada te colocou na
escola integral, só podemos nos ver nos finais de semana.
— Você vai sair de novo para o shopping?
— Você gostou? – perguntou a menina admirada – Esse sabe aproveitar as
coisas boas da vida. – e olhando para Érica – O que aconteceu? Você está
diferente...
Érica se surpreendeu com o comentário de Vivi.
— Eu? Não, não aconteceu nada... Mas por que a pergunta? – perguntou,
enquanto se servia.
— Você não está com aquele ar de superioridade habitual... Nem replicou
quando acabei de te chamar de mãe malvada e surpreendentemente não está de
ressaca, pelo que percebo.
Érica riu um sorriso forçado.
— Obrigada pelo elogio, se é que pode ser considerado um. Mas você
também está diferente.
Depois terminar o café da manhã, Viviane levantou-se.
— Com licença. – disse, saindo.
Érica se surpreendeu novamente.
— Ela disse “Com licença”? – perguntou, olhando para Rute, que apenas
deu de ombros. – Que milagre foi esse?
***
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