sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

IRMÃOS CORAGEM - CAPÍTULO 101 - AUTOR: TONI FIGUEIRA


Roteirizado por Toni Figueira
do original de Janete Clair 

CAPÍTULO 101

PARTICIPAM DESTE CAPÍTULO:

BRAZ
JOÃO
MÁRCIA / DIANA
NITA
BEATO VENÂNCIO

CENA 1  -  ALDEIA  -  CHOUPANA DE JOÃO  -  SALA DE JANTAR  -  INT.  -  NOITE.

A noite quedava-se na Serra da Lagoa Santa.

Nita detestava instintivamente a mulher de João. Fosse Márcia, Lara ou Diana. E era com um misto de desassossego e raiva que ela se via obrigada a servir à mesa. Pelo canto dos olhos  observava o sorriso que ressaltava a felicidade da rival. João acariciava a mão da esposa, embevecido. Braz entrou, como sempre, apressado.


BRAZ  -  Num vim atrapalhá...

JOÃO  -  Senta aí e come com a gente!  Nós tava falano agora mesmo do morto-vivo. Márcia teve lá em Belo Horizonte, na direção que meu irmão Duda deu.

MÁRCIA  -  Não tive sorte.  O casal já havia deixado o hospital.

JOÃO  -  Eu vou mandá alguém de confiança procurá por Dona Branca. Pra isso a gente tinha que sabê com Alberto a direção da mãe dele, na capital.

BRAZ  -  (comunicou, aborrecido)  Tá difícil se comunicá com Alberto. Gorica mesmo veio o Raimundo, de Coroado. Ele, que num é conhecido, tentô visitá o rapaz na cadeia. Falcão num deixô ele entrá.

JOÃO  -  Mas a gente tem que sabê notícia dele. Não se pode abandoná um companheiro.

Estendeu a caneca para que Nita a enchesse de vinho tinto.

BRAZ  -  Também acho.

JOÃO  -  Tou matutando as idéia... procurando um jeito de tirá ele de lá. Confesso que tou meio pobre de pensamento.

MÁRCIA  -  Acho que não convém você se arriscar, João.

BRAZ  -  Nem a gente deixa.

MÁRCIA  -  (pediu vinho a Nita)  Um pouco, por favor. (ergueu a taça. A mulher permaneceu de costas, ignorando a solicitação. Márcia tornou a pedir a bebida)  Nita, por favor, você quer me servir vinho?

JOÃO  -  (interferiu, com energia, ao constatar a má vontade da outra)  Nita! Minha mulhé tá falando. Serve ela de vinho!

NITA  -  (voltou-se, bruscamente, zangada)  Dela não sou criada!

Como se impelido por um jato, o rapaz ergueu-se da cadeira, jogando-a ao chão.


JOÃO  -  Nita!

MÁRCIA  -  Deixa, João!

NITA  -  (repetiu, com os dentes trincados)  Dela não sou criada! Já disse.

JOÃO  -  Ela é minha mulher, Nita!

O ódio enrubescia a face da jovem e com modos grosseiros encheu o copo de Márcia. Por um instante algo transtornou o pensamento da criada e, num lampejo de ira, ela atirou a bebida contra o corpo da mulher a quem odiava. Márcia nem teve tempo de esquivar-se. O  vinho tingiu de roxo suas vestes. Num átimo, Nita desapareceu pela porta dos fundos.

JOÃO  -  Você já viu disso, Braz? (e dirigindo-se à esposa)  Ela tem feito isso outras vezes, Márcia?

MÁRCIA  -  Não, João, não... apenas sinto que ela não gosta de mim. E... eu posso adivinhar qual a razão. Ela gosta de você!

JOÃO  -  A razão... a razão é lá da cabeça dela. Eu num tenho nenhuma culpa se ela cismou comigo. Deus é testemunha de que eu nunca dei a menor bola prela... Não por nada... que até podia ter me aproveitado. Mas, eu num sou disso... tá aí o Braz que pode dizê se eu tou mentindo!

O negro confirmou com um leve movimento de cabeça.

BRAZ  -  (coçou a cabeça e aduziu)  Nisso João num tem culpa. Justiça seja feita. Ela arrastô um bocado as asa pra ele e ele tava sempre com o pensamento nocê.

JOÃO  -  Mas eu vou lá e dou uma lição nela...

CORTA PARA:

CENA 2  -  ALDEIA  -  CHOUPANA DE JOÃO  -  QUARTO -  INT.  -  NOITE.

 
Era tempo de João Coragem encontrar-se com o grupo que chefiava. O relógio marcava 22 horas. O encontro fora programado para as 22,20. O garimpeiro curvou-se sobre a cama, beijou a testa da esposa e, com o paletó no ombro, abriu a porta do quarto e saiu.  Nita vinha entrando com o chá fumegante.


MÁRCIA  -  Obrigada por ter trazido o chá, Nita!

Sem dizer palavra a bela empregada entregou a xícara nas mãos da mulher. Márcia, com um gesto calmo, tirou um comprimido do vidro de remédio, jogou-o à boca e bebeu um gole do chá quente. Meio engasgada cuspiu fora a bebida, com expressão de nojo. Olhou o fundo do recipiente.

MÁRCIA  -  Terra!... Você pôs terra no chá!

Nita sorria irônica, enquanto Márcia lavava a boca na janela escancarada. Um vento frio adentrava o quarto.

MÁRCIA  -  O que é que você pretende com isso?

Aumentando o ritmo da gargalhada a estranha mulher encaminhou-se para os seus aposentos.

Tudo aconteceu repentinamente. Como a fusão da água para o vapor. Num instante era Márcia: no seguinte, Diana. A personagem agressiva lançou longe o vidrinho de comprimidos. Com movimentos rápidos, ajeitou os cabelos, as vestes e rodopiando no centro do quarto, jogou ao chão os restos do chá com terra.

CORTA PARA:

CENA 3  -  ALDEIA  -  CHOUPANA DE NITA  -  COZINHA  -  INT.  -  NOITE.

Nita acendia o fogo na cabana rústica. Ouviu a voz que a chamava.


DIANA  -  Ei, cara, você aí!!

A princípio não pôde compreender o porquê da presença da mulher de João em sua casa. Fixou os olhos na garrafa e no copo que a outra empunhava. Diana cruzou molemente o chão de terra e depositou a garrafa sobre a mesa simples, enfeitada com um vaso verde. Fora de si, atirou o conteúdo do copo no rosto da rival e com as mãos enegrecidas pelo pó esfregou um punhado de terra nos lábios da mulher. Empurrou-lhe o resto pela boca. Aas duas rolaram, derrubando cadeiras e móveis, numa luta de vida ou morte. Diana arranhava impiedosamente o rosto da outra, arrancando pedaços da pele com o gume afiado das unhas. Nita estrebuchava, com os olhos esbugalhados e uma expressão de desespero. As duas mulheres rolavam pelo chão, derrubando móveis, ferindo o silencio da noite alta.

O beato Venâncio, figura estranha que, misteriosamente, sem saber de onde, aparecera na pequena aldeia dos foragidos, entrou e estacou, levantando as mãos ao céu.


BEATO VENÂNCIO  -  Deus Nosso Sinhô Jesus Cristo!

Alguns se referiam à fama de milagreiro do místico sertanejo, de alpargatas de couro resistente e longa bata branca quase a tocar-lhe os pés. Do pescoço caía-lhe sobre o peito a cruz rústica de madeira. Dois pedaços cortados a canivete  e colados com goma castanha. Venâncio observou a cena, atraído pelo barulho da queda dos móveis.

BEATO VENÂNCIO  -  É o demônio que tomou conta do corpo das duas.

Deixou o local a passos largos, correndo para o centro do povoado.

BEATO VENÂNCIO  -  João! João!

Diana levantou-se, libertando a rival de suas mãos impiedosas. Estava agressiva, refletindo no brilho dos olhos a loucura de que fora possuída. Ouvia, ao longe, os gritos do beato.


BEATO VENÂNCIO  -  (off)  João! João!

Um súbito receio sustou de vez os movimentos da mulher. Preferiu fugir, ajudada pela escuridão, da pequenina aldeia de João Coragem.


CORTA PARA:

CENA 4  -  OUTEIRO  -  EXT.  -  NOITE.


Beato Venâncio conseguiu alcançar o topo do outeiro e vislumbrou a luz baça que clareava o grupo de homens, reunidos em torno do chefe. O beato bradou, como se fora um profeta, no alto da montanha. As vestes esvoaçando, batidas pelo vento.


BEATO VENÂNCIO  -  João! Vem cá! João!

A voz rouca chamou a atenção dos foras-da-lei. João atirou terra sobre a pequena fogueira. Os homens voltaram-se.


JOÃO  -  Diacho... que foi que deu no Venâncio?

BRAZ  -  Parece que houve alguma coisa!

JOÃO  -  (com um pressentimento desagradável, convocou a turma)  Vamos lá, gente!

CORTA PARA:

CENA  5  -  ALDEIA  -  CHOUPANA DE NITA   -  COZINHA  -  INT.  -  NOITE.

Nita continuava encolhida junto à parede de barro, as mãos tapando o rosto lanhado, de onde escorria um filete de sangue, riscando um traço vermelho na linha do maxilar. João Coragem correu os olhos à procura da esposa. Via apenas Nita, um monte de pano jogado ao canto da sala.


JOÃO  -  (voltando-se para o místico) Que foi que houve aqui, Venâncio?

BEATO VENÂNCIO  -  Entrei... (abrindo os braços num gesto de Messias)  Vinha fazê minha oração de toda noite, pra afastá os pecado do corpo de Nita. Ela anda cheia de maus pensamentos.

Enquanto o beato falava, Braz Canoeiro atendia a jovem apavorada, com as vestes e o corpo imundos. Nita evitava mostrar-lhe o rosto.

JOÃO  -  E daí?

BEATO VENÂNCIO  -  Cheguei aqui e vi ela, mais tua mulhé, querendo se matá, uma a outra...

JOÃO  -  Minha mulhé? Brigando com Nita?

BEATO VENÂNCIO  -  Foi. As duas rolando feito fera!

João aproximou-se da mulher, encolhida. Forçou-a a levantar-se.

JOÃO  -  Isto é verdade, Nita?

A jovem não respondeu de imediato. Com lentidão abriu o leque das mãos e mostrou o rosto ferido.


JOÃO  -  Me dá aí o lampião, Braz.

O beato aproximou a luz da face pálida da mulher. Os homens examinaram horrorizados os ferimentos que lembravam marcas de garras de pantera.

BRAZ  -  (se benzendo) Virge Mãe! Parece mesmo que andou lutando com fera!

JOÃO  -  Tu confirma que foi minha mulhé quem fez isso?

NITA  -  Foi.

JOÃO  -  Será possível, meu Deus?

BRAZ  -  (acercou-se do companheiro. Respirava forte)  Tá... tá pensando o que eu tou pensando, João?

JOÃO  -  (com rispidez)  Não! Não acredito! Deve de tê sido outra mulhé! A minha num pode sê!

BRAZ  -  (sugeriu, disfarçadamente)  Márcia, não... mas...

JOÃO  -  Num fala nisso, Braz! Eu me recuso a aceitá isso!

BEATO VENÂNCIO  -    (interveio, dramático)  Era ela. Eu vi com estes olhos que a terra há de comê. Era ela e parecia outra...

JOÃO  -  (gritou)  Cala a boca, Venâncio! Tu tá dizndo bobage! (virou-se para o negro, numa última busca de esperança)  Vai lá, Braz! Vai lá e vê se Márcia tá dormindo!

BEATO VENÂNCIO  -  Ela saiu, por aí. Passô perto de mim e trazia nos olhos o desespero.

Braz despachou-se, aflito, enquanto João Coragem segurava Nita pelos ombros e a sacudia com violencia.


JOÃO  -  Se alguma coisa aconteceu, tu foi culpada. E se tu tem culpa, não quero mais te vê na minha frente. Por tudo que fez, tu merece um castigo. (puxou do braço do beato) Venâncio, reza ela. Se ocê num tirá a maldade de dentro dela... num quero mais vê ela aqui.

Erguendo o corpanzil, o rapaz se afastou colérico. Venâncio vergou o corpo e ajoelhou-se diante da moça. Braços abertos com as mãos para o alto.


BEATO VENÂNCIO  -  “Espírito das treva... deixa de lado o corpo da pecadora... Padre Nosso, que estais no céu...”

FIM DO CAPÍTULO  101
Nita (Ana Maria Lage)

E NO PRÓXIMO CAPÍTULO...
*** Após a briga com Nita, Diana desaparece da aldeia, deixando João desesperado!

*** Escondido numa casa em bairro afastado de Belo Horizonte, Lourenço se recupera do acidente, com a ajuda da mulher, Branca.


NÃO PERCA O CAPÍTULO 102 DE

3 comentários:

  1. Nunca ouvi falar nessa atriz da foto..Ana Maria Lage...

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  2. Toni, custou caro para Nita, mexer com a mulher de João, como apanhou! E João coitado, não pode ter uns instantes de sossego, que vida estressante! Onde será que Diana foi? Bjs.

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  3. Nita mexeu com a pessoa errada rsrsrs
    Estamos agora em contagem regressiva: faltam 18 capítulos para o final de Irmãos Coragem!

    Bjs!

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