quinta-feira, 26 de junho de 2014

O HOMEM QUE DEVE MORRER - CAPÍTULO 23 - TONI FIGUEIRA


Novela de Janete Clair

Adaptação de Toni Figueira

CAPÍTULO 23

Participam deste capítulo

Cyro – Tarcísio Meira
Professor Zacarias  -  Arnaldo Weiss
Mestre Jonas  -  Gilberto Martinho
Lia  -  Arlete Salles
André  -  Paulo José
Pé-na-Cova  -  Antonio Pitanga
Baby  -  Claudio Cavalcanti
Inês - Betty Faria



CENA 1  -  FLORIANÓPOLIS  -  CENTRO DE ESTUDOS ESPACIAIS  -  INTERIOR  -  DIA

NAS PAREDES MAPAS DO COSMO, COM O SISTEMA SOLAR A CORES E FOTOS DOS PRINCIPAIS PLANETAS – MARTE E VÊNUS EM DESTAQUE, ALÉM DA LUA E DO COMETA HALLEY.

O PROFESSOR ZACARIAS, NUMA MESA RETANGULAR, ERA LADEADO POR ANDRÉ, JONAS, PÉ-NA-COVA E LIA.
PROF. ZACARIAS  -  (deu início à sessão) Bem... meus amigos. Somente Dona Lia talvez não conheça os verdadeiros motivos desta sessão (olhou para a mulher e, num rápido preâmbulo, referiu-se a alguns fatos do passado e à terrível noite de há 31 anos, em Porto Azul) É por isso que estamos aqui. Três de vocês ainda eram crianças, quando receberam aquilo que podemos chamar de comunicação... vinda de um ser extraterreno. (andou até a frente da mesa) Nós, pesquisadores, estamos sempre fazendo perguntas. E a pergunta que eu faço agora é: por que Lia, André, Lucas e Jonas tiveram aquele sonho, visão, comunicação ou como quiserem chamar? Não pode ter sido por acaso.
MESTRE JONAS  -  (levantou-se e pediu) Se o sinhô me dá licença... eu posso respondê, com toda a certeza que me dá a minha fé. Dr. Cyro é a reencarnação do ente superior que voltou à terra pra cumpri uma missão.
UM SORRISO DE INCREDULIDADE SURGIU NOS LÁBIOS DE ANDRÉ E ZACARIAS.
ANDRÉ  -  O senhor acha isso mesmo?
MESTRE JONAS  -  Acho e tenho certeza. E quem disse, sabe. Mestre Charam, mestre do oriente, meu Guia... Depois que eu tive aquele sonho, fiquei muito tempo sem sabê o que ele significava. Até que um dia, levado por um amigo, fui na tenda que frequento até hoje. Foi lá que Mestre Charam apareceu e escreveu... Explicou que, em outra encarnação, tinha sido um mestre do Oriente... depois tinha encarnado num negro escravo, pra se purificar de toda a vaidade... e que agora vinha numa nova missão. Não sei se vocês acreditam... Mas não tenho dúvida sobre a missão que cada um de nós tem a cumpri.
ANDRÉ  -  (irônico) Qual é?
MESTRE JONAS  -  Eu já era home... podia não sê acreditado. Vocês eram crianças. E ninguém duvida da pureza das crianças.
ANDRÉ  -  (esmurrou a mesa) Olha, eu respeito sua crença... mas para mim não é nada disso. Eu vi o lugar onde a nave espacial aterrou. Meu pai me levou pra ver. Já tinham passado muitos meses... e mesmo assim as árvores em volta ainda estavam queimadas e não cresceram mais.
LIA  -  (curiosa) O senhor acha que... que ele veio numa nave espacial?
ANDRÉ  -  Ele não. O ser que...
ZACARIAS  -  (interveio) O pai dele.
ANDRÉ  -  Isso. E a luz que Orjana viu era da astronave.
ZACARIAS  -  E se vocês querem ter a prova definitiva de que essa astronave realmente desceu em Porto Azul, aqui está... (todos os olhares concentraram-se nele, que abriu uma gaveta e mostrou um fragmento de metal desconhecido) Eu recolhi isto no local da aterragem e a análise demonstrou a existência de substancias desconhecidas em nosso planeta.
O PROFESSOR ENTREGOU O FRAGMENTO AO PRIMEIRO ASSISTENTE NA FILA À SUA DIREITA.  VÁRIAS PESSOAS SE PRECIPITARAM A OBSERVAR A PEDRA DE FORMAÇÃO ESQUISITA, PARDACENTA.
ANDRÉ  -  Foi isso... ele veio de outro planeta, de uma civilização muito mais adiantada que a nossa. Aqui, Orjana foi escolhida para ser mãe de uma criança que eles vão dirigir, ou melhor, estão dirigindo de lá, para cumprir uma missão qualquer, que não sei qual é.
PÉ-NA-COVA  -  (olhos arregalados) Qué dizê que o doutô Cyro tá sendo dirigido de outro planeta?

ANDRÉ  -  Isso mesmo. Você não acredita?

PÉ-NA-COVA  -  (pensou por alguns instantes) Eu acho que só uma pessoa pode dirigir a gente, o destino da gente: é Deus, Nosso Sinhô. Pra mim, doutô Cyro é um santo, porque os santos é que vêm a mando de Deus.

ZACARIAS  -  (dirigiu-se a Lia) E a senhora? A senhora ainda não disse nada.

LIA  -  Eu não sei... eu não acredito nem desacredito em tudo o que vocês disseram. Só quero confessar uma coisa muito séria. A única sensação que toda essa história me causa... é de medo.

MESTRE JONAS  -  Medo, Dona? Se ele veio pro bem, a senhora tem medo?

LIA  -  Tenho. Desde que sonhei e era muito criança. Não sei por que tenho medo. Só sei que não queria estar envolvida nisso... e vim aqui... mais pra dizer a vocês todos... que eu quero me desligar de tudo o que se refere ao Dr. Cyro.

ZACARIAS  -  (desapontado) Isso é covardia! Desculpe, mas é covardia. Não há por que ter medo. A missão que ele veio cumprir, a missão que ele trás, é de paz. A civilização de onde ele veio é muito superior à nossa. Tão superior que lá não existe mais maldade. Vocês me entendem?

ZACARIAS FALAVA COMO SE TIVESSE CERTEZA DE QUE CYRO DE FATO ERA UM ENVIADO E DE QUE O SEU MUNDO FICAVA DISTANTE DALI.

CORTA PARA:
Baby (Claudio Cavalcanti) e Inês (Betty Faria)

CENA 2  -  PORTO AZUL  -  PRAIA BONITA  -  EXTERIOR  -  NOITE

BABY LIBERATO E INÊS SAÍRAM DO CARRO. A MOÇA SENTOU-SE NO ESTRIBO E DESCALÇOU OS SAPATOS, ENTERRANDO OS PÉS NA AREIA BRANCA. BABY FITAVA UM BARCO RÚSTICO, AMARRADO A ALGUNS METROS DA PRAIA.

INÊS AGARROU-O PELO PESCOÇO E PUXOU-O PARA SEU LADO, NA AREIA.

O RAPAZ TINHA A EXPRESSÃO SÉRIA.

INÊS  -  Puxa! Você tá com uma cara tão feia! Que bicho te mordeu?

BABY  -  (sentou-se à força) Não tenho nada. Senta aí e fica calada que é melhor.

INÊS  -  Meu irmão, Daniel, vive fazendo pergunta. Tá querendo sabê quando é que a gente se casa.

BABY OLHOU-A COM UM SORRISO IRÔNICO, LEMBRANDO-SE DO INCIDENTE NO SUBSOLO DA MINA. DANIEL SALVARA-LHE A VIDA, MAS TINHA TENTADO AGREDI-LO, DEPOIS, OBRIGANDO-O A ESMURRÁ-LO VIOLENTAMENTE.

BABY  -  E você, o que disse?

INÊS  -  Disse pra mãe que você tá com boa intenção. Aí ela me perguntô: “como é que tu vai casá com um moço que nem sabe o nome direito! Baby! Baby não é nome de gente! Parece nome de cachorro...”

INÊS RIU GOSTOSAMENTE, PROVOCANDO A IRRITAÇÃO DO NAMORADO. O RAPAZ LEVANTOU-SE, DE CARA AMARRADA. A MOÇA CESSOU DE GARGALHAR E CORREU ATRÁS DELE, ABRAÇANDO-O COM AMOR. PASSOU-LHE O BRAÇO PELO PEITO FORTE.

INÊS  -  Que é que você tem, bem?

BABY  -  (virou-se e beijou-a nos lábios) Nada. Eu nunca tenho nada.(apontou para o bote ancorado à distancia) Podíamos ter ido passear de barco.

INÊS  -  (ignorou a sugestão e perguntou, curiosa) Não me leva a mal, bem... mas como é teu verdadeiro nome?

BABY  -  Leandro.

INÊS  -  Puxa! É mais bonito do que Baby!

BABY  -  Agora veja se cala essa boca!

FECHOU-LHE OS LÁBIOS COM O POLEGAR E O INDICADOR. INÊS TENTOU FALAR, SEM PODER.

DE REPENTE, OS OLHOS DO RAPAZ FITARAM ALGO, MUITO ALÉM. UM VULTO. UMA SILHUETA CONTRA O SOL QUE SE PUNHA.

BABY  -  Olha, bem! Quem será aquele louco? Veja! Lá, naquele penhasco!

BABY APONTAVA A FORMA VAGA, DESENHADA CONTRA O CÉU EM SANGUE. IMÓVEL, CYRO FITAVA O OCEANO, DESLIGADO DO MUNDO.

INÊS  -  Leandro. (abraçou-o) Gosto tanto do teu nome. .. só vou te chamar assim, de agora em diante.

BABY  -  (afastou-a, grosseiro) Não vai haver de agora em diante!

INÊS  -  (estremeceu) Não... vai... havê o quê?

BABY  -  Não vai haver de hoje em diante, droga! É surda? Não ouve? Não vai haver mais de hoje em diante, pronto! Acabou! Entendeu bem? Acabou tudo o que existe entre nós!

INÊS  -  (atônita) Explica bem... por quê. Por quê?

BABY  -  (virou-lhe as costas) Problemas... problemas, lá com meu velho. Você não levou muito a sério nosso namoro, não é?

INÊS  -  Eu levei... levei mesmo, viu?

BABY  -  Pois fez mal! Eu te iludi alguma vez? Iludi?

INÊS  -  (se continha para não explodir) Não, mas...

BABY  -  Falei em casamento, falei?

INÊS  -  Nunca.

BABY  -  Então...

INÊS  -  Então... eu pensei, né? Pensei que você... gostava de mim!

BABY  -  (riu nervosamente, fitando-a) E gosto... o que eu não quero é me casar agora, nem nunca, tá? Sinto, no duro que sinto. Você é uma menina bacaninha. De toda garota que eu conheci, você até que era a mais legal. Com toda tua pureza. Mas... eu não presto. A verdade é esta. Não nasci pra namorar bonitinho, só beijinhos. Não nasci pra casar. Nada disso. Sou um homem sem destino, sem nada... Sou vazio.

INÊS  -  (agarrou-lhe o braço, com brutalidade) Leandro! Não faz isso comigo, não faz! Tou te pedindo!

BABY  -  Sou vazio! Oco! Sabe bem o que é isso? Não me agarro a ninguém! Não consigo, tá? Olha... espera! (Inês o agarrava mais forte ainda, ele esforçava-se para sair, lutando, quase) Espera aí, garota! Tenho um negócio pra te dar!

INÊS  -  Não quero nada, Leandro! Quero você!

BABY CONSEGUIU RETIRAR A CARTEIRA DE NOTAS. PUXOU UM MAÇO. COM UMA DAS MÃOS AFASTOU O CORPO ESGUIO DA NAMORADA.

BABY  -  Olha... tome isso... pra você comprar alguma coisa.

INÊS APERTOU AS MÃOS, CRUZANDO-AS NAS COSTAS, RECUSANDO-SE A ACEITAR O DINHEIRO. LÁGRIMAS ESCORRIAM-LHE PELO ROSTO BELO. O MILIONÁRIO TENTOU COLOCAR O MAÇO ENTRE AS MÃOS CERRADAS. INÊS FEZ QUE NÃO COM A CABEÇA, DESARVORADA, DENTES TRINCADOS.

BABY  -  Aceita, vá... Não quero te ofender. É pra você comprar qualquer coisa.

PERCEBENDO QUE A MOÇA NÃO QUERIA MESMO ACEITAR O DINHEIRO, BABY ATIROU O BOLO DE NOTAS SOBRE A AREIA DA PRAIA.

BABY  -  Olha... fica aí... você pega depois. Eu vou indo... e não me acompanhe, por favor. Não vai adiantar. Eu não posso voltar atrás. Sinto muito... sinto mesmo.

O MOTOR DO CONVERSÍVEL RONCOU NA ESTRADA E O CARRO DESAPARECEU DENTRO DA NOITE.

AJOELHADA, COM A CABEÇA ENTRE AS MÃOS, INÊS FICOU A CHORAR, SOLUÇANDO. POR ENTRE A NÉVOA DAS LÁGRIMAS, VIU O BARCO BALANÇANDO, AO SABOR DAS ONDAS. CORREU ATÉ ELE. DESANCOROU-O. ABRIU A VELA SURRADA, GASTA E EMBICOU A PROA NA DIREÇÃO DO MAR ALTO. O PEQUENO BOTE SE PERDEU NA ESCURIDÃO DO OCEANO.

FIM DO CAPÍTULO 23


 E NA PRÓXIMA SEXTA, O 24. CAPÍTULO!

Um comentário:

  1. Pobre Inês, tão ingênua! Acho que vai tentar o suicídio. Que situação!

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