terça-feira, 31 de janeiro de 2012

SESSÃO REMAKE MUSICAL - SHE - ELVIS COSTELLO

A música She, que teve como um de seus intérpretes Charles Aznavour, é apresentada abaixo por Elvis Costello.
Para ouvir a interpretação de Aznavour, favor acessar: http://biscoitocafeenovela.blogspot.com/2012/01/sessao-tunel-do-tempo-musical-she.html.
Boa audição!


SESSÃO TÚNEL DO TEMPO MUSICAL - SHE - CHARLES AZNAVOUR

A música She, interpretada por Charles Aznavour, foi tema da trilha sonora de Corrida do Ouro, novela apresentada pela Rede Globo, no horário das 19 h, de 3 de julho de 1974 a 25 de janeiro de 1975.
Para maiores informações sobre a novela, favor consultar: www.teledramaturgia.com.br/tele/corrida.asp.
Boa audição!



LETRA

SHE

She may be the face I can't forget,
A trace of pleasure or regret,
May be my treasure or
The price I have to pay.

She may be the song that summer sings,
May be the chill that autumn brings,
May be a hundred different things
Within the measure of a day.

She may be the beauty or the beast,
May be the famine or the feast,
May turn each day into a
Heaven or a hell.

She may be the mirror of my dream,
A smile reflected in a stream,
She may not be what she may seem
Inside her shell.

She who always seems so happy in a crowd,
Whose eyes can be so private and so proud,
No one's allowed to see them
When they cry.

She may be the love that cannot hope to last,
May come to me from shadows of the past,
That I'll remember till the day I die.

She may be the reason I survive,
The why and wherefore I'm alive,
The one I'll care for through the
Rough and ready years.

Me, I'll take her laughter and her tears
And make them all my souvenirs
For where she goes I've got to be.
The meaning of my life is she, she, she--.

TRADUÇÃO

ELA

Ela pode ser o rosto que eu não consigo esquecer
Um traço de prazer ou de arrependimento
Talvez meu tesouro ou
O preço que eu tenho que pagar

Ela pode ser a música que o verão canta
Talvez o frescor que o outono traz
Talvez uma centena de coisas diferentes
No espaço de um dia

Ela pode ser a bela ou a fera
Talvez fartura ou a fome
Pode transformar cada dia em um paraíso
ou em um inferno

Ela pode ser o espelho do meu sonho
O sorriso refletido no rio
Ela pode não ser o que parece ser
dentro de sua concha

Ela, que sempre parece tão feliz no meio da multidão
Com os olhos tão pessoais e tão orgulhosos
Mas que não podem ser vistos
quando choram

Pode ser o amor que não espera que dure
Pode vir das sombras do passado
Que eu irei me lembrar até o dia de minha morte

Ela talvez seja o motivo para eu sobreviver
A razão pela qual eu estou vivo
A pessoa que cuidarei através
dos difíceis e imediatos anos

Eu, eu pegarei as risadas e as lágrimas dela
E farei delas todas minhas recordações
Para onde ela for, eu tenho que estar lá
O sentido da minha vida é ela.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

SESSÃO RETRÔ - VARIEDADES - ADELAIDE CHIOZZO

A reportagem que apresentamos abaixo foi publicada na revista Grande Hotel, número 1.655, de 13 de maio de 1979.
Nosso agradecimento à amiga Maria do Sul pela remessa do material.
Boa leitura!


SESSÃO RETRÔ - NOVELAS - ANTÔNIO MARIA - ATORES E PERSONAGENS - PARTE 1

Tempos atrás tivemos a oportunidade de publicar algumas páginas do livro Momentos Maravilhosos de Antônio Maria: http://biscoitocafeenovela.blogspot.com/2010/07/antonio-maria.html.
Continuamos agora a apresentar os materiais desse livro.
Inicialmente, nas próximas semanas, apresentaremos os personagens e os atores que os interpretaram.
A primeira versão da novela Antônio Maria foi apresentada pela TV Tupi, no horário das 19 h, de julho de 1968 a 30 de abril de 1969.
Para maiores informações sobre a novela, favor consultar: http://www.teledramaturgia.com.br/tele/antonio68.asp.
Boa recordação!




domingo, 29 de janeiro de 2012

HOMENAGEM AO NOSSO AMIGO TONI FIGUEIRA

Toni, obrigado por tua responsabilidade e talento ao ter nos brindado com emocionantes 120 capítulos de Irmãos Coragem.
A homenagem abaixo é singela, mas representa bem o quanto o consideramos.
Um abraço, obrigado pela parceria e que ela se prolongue por longo tempo!
Boa sorte no novo trabalho!


IRMÃOS CORAGEM - CAPÍTULO 120 (FINAL) - AUTOR: TONI FIGUEIRA


Roteirizado por Toni Figueira
do original de Janete Clair 

CAPÍTULO 120

ÚLTIMO CAPÍTULO

PARTICIPAM DESTE CAPÍTULO:

 JOÃO
MARIA DE LARA
CEMA
DALVA
LÍDIA
RODRIGO
PEDRO BARROS
ALBERTO
GENTIL PALHARES
DOMINGAS
DR. MACIEL
JUCA CIPÓ
BRAZ CANOEIRO
PADRE BENTO

CENA 1  -  RIO DE JANEIRO  -  CASA DE SAÚDE  -  QUARTO DE LARA  -  INT.  -  DIA.

Cema cuidava do menino quando o casal entrou no quarto. Ela, rindo do cansaço do marido.


MARIA DE LARA  -  João, nem parece que veio do campo. Se cansou só numa corrida!

CEMA  -  (tapando a boca com a mão)  Virge Mãe, como a senhora tá diferente!

MARIA DE LARA  -  Cema... por que a cerimônia? Você nunca me chamou de senhora!

CEMA  -  Hã...

Lara viu a criança e beijou-a com ternura.


MARIA DE LARA  -  Puxa vida! Como ele cresceu desde a última vez que o vi! Nossa Mãe, João! É a tua cara, amor. Nunca vi coisa assim. Parece cópia do teu rosto. E tem até as sobrancelhas cerradas... Você tem certeza de que é o meu Antonio?

JOÃO  -  Tenho, uai! A gente ia trocá ele?

MARIA DE LARA  -  Eu falo porque está enorme! Como Sinhana cuidou bem dele, meu Deus do Céu! Que coisa de louco! Agora nós vamos ficar juntos para sempre, sempre! Ah, Dalva! Arrumou as malas, tia? Já tenho alta, João. Estava só esperando você chegar. Mas... por que Sinhana não veio com você?

CEMA  - (respondeu, desavisada)  Sinhana, uai... a Sinhana ficô, coitada. Pra missa de sétimo dia daqueles dois...

MARIA DE LARA  -  Missa de quem? (perguntou, com expressão de surpresa) Quem morreu?

CEMA  -  Uai...

JOÃO  -  Ela num sabe?

DALVA  -  Não  (respondeu, meio desconsolada)  Recebi um telefonema de Gentil contando tudo, mas achei melhor não dizer a ela.

MARIA DE LARA  -  (intrigada com o mistério)  O quê?

CEMA  -  Foi o Jeromo, mais a Potira...  A polícia e os home que queria roubá o diamante... mataro os dois.

Lara procurou um banco para sentar-se. Suas pernas tremiam ante a notícia trágica.


MARIA DE LARA  -  Ah, João, eu não sabia. Se soubesse... meu Deus, não estaria tão contente. (abrigou-se nos braços do marido)  Você me perdoa, amor?

JOÃO  -  Não. Pelo amor de Deus,  eu não quero que nada disso, nada desse mundo, estraga a sua alegria. Você já passou o diabo... e não vai agora se impressioná com uma coisa... que... afinal de contas...

MARIA DE LARA  -  Amor... amor... não fique assim... escute.

JOÃO  -  Não diz nada, bem. É mais melhó. A gente tem que continuá a vivê a vida, num tem?

MARIA DE LARA  -  Claro. E vamos continuar juntos... haja o que houver.

JOÃO  -  Não é possível que ainda vá acontecê mais coisa... É preciso que tu saiba. A gente vai começá a vida lá de baixo. Tenho dívida pra pagá... e a vida vai sê dura. Num tenho conforto pra te dá.

MARIA DE LARA  -  Eu não estou pedindo conforto, João. Só te peço amor. E acho que disso nós somos milionários.

CORTA PARA:

CENA 2  -  COROADO  -  PENSÃO DO GENTIL PALHARES  -  EXT.  -  ENTARDECER.


Os dois encontraram-se na porta da pensão do Gentil. Iam cabisbaixos, remoendo o mesmo drama.


LÍDIA  -  (não usava luto)  Quando você vai embora?

RODRIGO  -  (muito pálido)  Hoje mesmo.

LÍDIA  -  Aproveito a condução. Vou com você.

RODRIGO  -  (encarou-a fixamente)  Acho que vamo-nos consolar mùtuamente. Estamos precisando muito um do outro...

Os dois seguiram na direção da estação ferroviária.


CENA 3  -  FAZENDA DE PEDRO BARROS  -  GARIMPO  -  EXT.  -  DIA.

 
Pedro Barros sentara-se à beira do rio, onde outrora houvera vida. Extração da riqueza. Gente. Hoje tudo se resumia à saudade. Ou apenas à lembrança, já que a saudade era sentimento muito cristão para o velho e vingativo coronel dos diamantes...

Lara e João avistaram-no de longe. A moça fez sinal para o marido. Convinha que apenas ela aparecesse diante do pai.


MARIA DE LARA  -  Papai!

PEDRO BARROS  -  (levantou a cabeça e sorriu, sem graça)  Uai, você taí?

MARIA DE LARA  -  Voltei curada, pai.

PEDRO BARROS  -  Bom pra ocê, filha.

MARIA DE LARA  -  Eu vim buscar o senhor. João quer ajudá-lo.

Ainda havia resquícios de orgulho e maldade no velho chefe.


PEDRO BARROS  -  E você pensa que vou aceitar favor do João Coragem?

MARIA DE LARA  -  Não há mais razão para ódios, papai...

PEDRO BARROS  -  Eu é que sei! Eu é que sei! Eu quero que ele vai pros quintos dos infernos! Ninguém tem que se incomodar comigo. Fui abandonado por todo mundo. Humilhado. Desprezado. Só quem tinha valor era meu dinheiro. Pois eu vou fazê todo mundo pagá caro o que fizero...

MARIA DE LARA  -  (afagou os cabelos do pai)  Deixa disso, pai.

PEDRO BARROS  -  Vai embora com teu marido! Eu quero ficar sozinho e em paz! Tou aqui e tou maquinando um jeito de me vingar de todo mundo! Anda, vai com ele e me deixa cuidar da minha vida!

Lara afastou-se ante a irredutibilidade do velho coronel. De longe, ela e o marido observavam o homem resmungar, falando consigo mesmo. Louco. Inteiramente louco.


PEDRO BARROS  -  Todo mundo me paga... eu me vingo de todo mundo de uma só vez... eu me vingo!

Escurecia e Pedro Barros, uma figura indistinta, perdia-se por entre as árvores da estrada, caminhando na direção da floresta. Mais ao lado a casa branca, onde Lara e Diana tinham-se confundido na luta de personalidades.


CORTA PARA:

CENA 2  -  COROADO  -  ALMOXARIFADO  -  EXT.  -  NOITE.


Já era noite. Escurecera. Barros arrombou a porta do almoxarifado e retornou com um latão de gasolina. Espalhou o líquido pelas paredes de madeira, embebendo chão e móveis da casa arruinada. Dela o fogo propagou-se. Em poucos minutos devorava a pequena cidade de Coroado. Por entre as chamas o rosto barbudo do coronel, rindo loucamente. Uma visão diferente de Nero. Um Nero caboclo.

Coroado já não existia. Bares, armazéns, a igreja, as árvores da praça. Coroado transformara-se em fogo e cinzas, num ato de destruição. Um homem a criara; o mesmo homem a destruía.


As labaredas podiam ser vistas a léguas de distancia. A cidade deixara de existir.

CORTA PARA:

CENA 3  -  ALDEIA DE JOÃO   -  CHOUPANA  -  SALA   -  INT.  -  NOITE.


Alberto chegou apressado da cidade e nem mesmo parou para cumprimentar os presentes.


ALBERTO  -  (deu a notícia sem poder falar. Afobado)  Desculpe, gente... mas tem notícia da cidade. É urgente. Pedro Barros ficou louco. Tocou fogo em toda Coroado. A cidade está se incendiando.

JOÃO  -  (benzendo-se)  Virge Mãe! Vamo lá ver se a gente salva alguma coisa...

Os homens desapareceram, aflitos, munidos de cordas e instrumentos de ferro.

CORTA PARA:

CENA 4  -  COROADO  -  CENTRO  -  EXT.  -  NOITE.


A praça regurgitava de gente. Gentil explicava o que sabia. Perdera tudo. Ele e todos os que habitavam, negociavam, viviam na cidadezinha que fôra próspera...


GENTIL PALHARES  -  Felizmente não houve vítimas... Vimos o fogo a tempo... e tivemos tempo de desocupar todas as casas...

JOÃO  -  Minha aldeia abriga todo mundo!

MARIA DE LARA  -  (aflita)  E meu pai?

DOMINGAS  -  Depois de tocá fogo aqui... (chorando, relatava os acontecimentos)  voltô pra casa que era dele... e ficou lá... até o fim.

Domingas se afastou, desolada. Uma voz fê-la voltar-se, incontinenti.


DR. MACIEL  -  Você não está só!

A mulher abraçou-se ao médico, ao homem que ainda lhe poderia dar um pouco de conforto, uma velhice talvez menos sofredora.

Juca apareceu, negro de cinza, os lábios avermelhados, o rosto caricatural.


JUCA CIPÓ  -  Cadê meu patrãozinho? Cadê?

DR. MACIEL  -  (procurou ajudá-lo, com bondade)  A gente vai procurar... eu ajudo vocês. Agora estamos todos juntos... Finalmente juntos...

CORTA PARA:

CENA 5  -  COROADO  -  PRAÇA  -  EXT.  -  AMANHECER.

 
Braz Canoeiro olhava o céu, infinitamente azul. Da igrejinha branca apenas a imagem de Cristo sobrevivera ao incêndio. E a torre e o sino. O sino do chamamento a Deus.


BRAZ CANOEIRO  -  E agora, Padre?

PADRE BENTO  -  É... está tudo acabado. Agora... é levantar os olhos para Deus e rezar. Que Ele tenha piedade de nós.

Um pouco afastado, João Coragem remexia os escombros do templo. Sua fisionomia parecia irradiar estranha luminosidade. Subiu as escadarias da torre, a passos lentos, e puxou o sino. A pancada ecoou por todo o vale. Olhos voltaram-se para o estranho sineiro da igrejinha
.

PADRE BENTO  -  O sino da igreja!

BRAZ CANOEIRO  -  Que adianta o sino, agora?

João badalou com mais força, sorrindo. Nos olhos a chama de um otimismo inesperado. Homens e mulheres voltaram-se para ele. Viram o rapaz no alto da torrezinha chamuscada.


JOÃO  -  (gritou)  O sino da igreja, minha gente!  Tá aqui o sino! Que chamô a gente tantas vez pra missa! Pros batizado! Pros casamento! Lembra, Padre? Quanta gente o senhô casô, quanta batizô! E o sino taqui, são e salvo!

PADRE BENTO  -  (com pessimismo)  De que vale um sino, sem igreja, João? É preferível uma igreja sem sino...

JOÃO  -  Mas... por alguma coisa a gente tem que começá. Uns começam pelos tijolo... a gente começa pelo sino. Começa por cima. Vamo, minha gente! Que cara de desânimo é essa? Coroado num desapareceu de todo!  (abriu os braços e mostrou os rios, os campos, as montanhas)  Veja aqui! Ficô o sino e a imagem de Cristo! O sino pra chamá vocês pra refazê tudo direitinho como era antes! A imagem pra abençoá esta cidade, antes amaldiçoada! (falava em tom místico, como se profetizasse uma nova era para o povo da região)  Muito melhó! Muito melhó, porque agora não vamo tê mais luta! Nem exploração! Agora o que restô de tudo foi uma lição de amor e de paz! Paz e amor que ficou no nosso coração e que nós vamo semeá por aí tudo! (os cabelos negros caíam-lhe por sobre os olhos)  Vamo, minha gente!

Os primeiros movimentos entusiasmaram o rapaz. Os escombros começavam a ser removidos. As pessoas surgiam de todos os cantos. Um formigueiro. Pás, picaretas, enxadas... Coroado renasceria das cinzas.


JOÃO  -  Isso, minha gente! Vamo trabalhá! E num vamo deixá pra amanhã, vamo começá agora mesmo! O senhô vai tê sua igreja de novo, Padre! E nós vamo tê de novo as nossa casa e uma Coroado mais bonita do que nunca!

Lara ria e chorava, num misto de tristeza e alegria. Sinhana ajoelhava-se nas escadas sujas de água e cinza.


Padre Bento ajoelhou-se, também, contrito, diante da imagem do Criador.


PADRE BENTO  -  Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

João desceu aos saltos e bateu, risonho, nas costas do sacerdote.


JOÃO  -  Isso num é hora de rezá, Padre! É hora de trabalhá! Vamo! Deus vai ajudá a gente!

A terra. O sol. A gente.

Coroado renasceria das cinzas da destruição.


FIM  -

ELENCO DE IRMÃOS CORAGEM
  



NOTA:

Eu gostaria de agradecer, especialmente, a José Eugênio e Maria do Sul, que, com seus comentários de incentivo, muito me ajudaram a levar essa proposta até o fim, e a todos que me acompanharam por esses meses, revivendo as amoções dessa maravilhosa história da maior novelista do Brasil, Janete Clair, que viverá para sempre em nossa memória e em nossos corações. 

Toni Figueira


e na próxima quarta-feira, não perca a estréia de



PARA MEDITAR

"Bom trabalho precisa de tempo." (provérbio húngaro)

SESSÃO BISCOITINHOS - OS CÃEZINHOS DO CANIL


Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=e2Sk1WyOYog&feature=related

sábado, 28 de janeiro de 2012

PARA MEDITAR - COLABORAÇÃO: MARI DO MURAL DA URCA

SOLIDÃO PRESENTE

Às vezes à noite.
Eu me sinto muito sozinho.
Mas não é falta de ninguém.
É excesso de mim mesmo.
Ainda vou dormir com esse sentimento.
Eu não deveria ficar acordado até tarde.
Deveria me levantar amanhã cedo.
Para aproveitar melhor meu novo dia.
Já que essa noite não trará mais nada.
Mais nada demais.
Conforme os anos passam.
As noites ficam mais longas.
E a solidão mais presente.

FELIPE ACOSTA – CRÔNICAS RÁPIDAS

SESSÃO FOTONOVELA - MOMENTOS DE CONFLITO

A fotonovela que reproduzimos abaixo foi publicada na revista Sétimo Céu, nr. 226, de 1975.
Nosso agradecimento à amiga Maria do Sul pela remessa do material.
Boa leitura!




















sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

IRMÃOS CORAGEM - CAPÍTULO 119 - AUTOR: TONI FIGUEIRA


Roteirizado por Toni Figueira
do original de Janete Clair 

CAPÍTULO 119

PENÚLTIMO CAPÍTULO

PARTICIPAM DESTE CAPÍTULO:

JOÃO
DELEGADO CASTRO
BRAZ
SINHANA
DALVA
CEMA
MARIA DE LARA
MÉDICO


CENA 1  -  MATAGAL  -  EXT.  -  NOITE.

JOÃO  -  Que foi isso?

À luz dos archotes, João Coragem saltou lépido da sela e debruçou-se sobre os corpos.


DELEGADO CASTRO  -  Eu fiz tudo para evitar...

JOÃO  -  (a voz saiu-lhe grave, engasgada)  Jeromo... índia. Por quê, gente? Por quê fizero isso com eles?

DELEGADO CASTRO  -  João... eu ofereci a vida em troca da prisão deles...

JOÃO  -  Ofereceu... mas não cumpriu a palavra.

DELEGADO CASTRO  -  Ia cumprir... mas parece que estes homens vieram atrás do diamante que estava com ele... e era o diamante o que visavam. Não fui eu que o matei... foram os homens... pela ambição.

O garimpeiro ergueu os olhos, fitando um a um os soldados do ex-delegado. O contingente policial de reforço afastava-se lentamente.


DELEGADO CASTRO  -  Um deles atirou na moça... isso estragou tudo. Teu irmão perdeu a cabeça...

JOÃO  -  Some daqui... o senhô também!

DELEGADO CASTRO  -  João... eu tentei... acredite em mim.

JOÃO  -  Já entendi tudo. Saia!

O delegado levantou-se e deixou o local, lento. Um dos homens aproximou-se de João Coragem, que tinha a cabeça baixa e os olhos cheios de lágrimas. Com uma das mãos alisava os cabelos negros da mestiça, com a outra, o rosto do irmão.

HOMEM  -  Eu vi... assisti a tudo... a polícia teve culpa. Mas não tinha toda... se não fosse os home que atiraro na Potira. Disso eu tenho prova. Não foi o delegado. Foi um dos home que queria o diamante.

JOÃO  -  (sem desligar os olhos dos corpos inanimados)  Eles queria o diamante...

HOMEM  -  O diamante foi a perdição!

JOÃO  -  Mais uma vez o diamante foi a perdição... Mais uma vez. Mas... não foi só o diamante! Foi a maldade! Não foi só o diamante! Foi a falta de humanidade! A falta de amor! A falta de bondade! No entanto... esses dois... tinha tanto amor pra dá... tanto amor!

O garimpeiro ajoelhou-se com as mãos postas e os olhos perdidos no infinito.

Braz Canoeiro aproximou-se do amigo.


BRAZ  -  João...

JOÃO  -  Num diz nada, Braz. Ninguém diz nada. É melhó. Ninguém diz... eu sei o que faço... eu sei, Braz!

Os lábios tremiam-lhe e os olhos embaçavam-se, inundados de lágrimas. Os homens foram chegando, um a um. Homens rudes da aldeia de João Coragem. João retirou o diamante da bolsinha de couro, presa no interior da calça do irmão.


JOÃO  -  (mostrou-o aos companheiros)  Tá aqui, gente! Tá aqui ele... quem quisé ficá rico que me acompanhe! Me acompanhe!

Como um desvairado, João Coragem embrenhou-se por entre os homens, enquanto Braz ordenava que o ajudassem a levar os corpos para Coroado.

CORTA PARA:

CENA 2  -  COROADO  -  RUAS  -  EXT.  -  DIA.


A cidade parou para assistir à passagem do rapaz, seguido por uma multidão de velho,s jovens, negros e brancos.


JOÃO  -  (entrou na praça, gritando)  Venha todo mundo! Todo mundo que qué ficá rico depressa! Eu vou distribuí diamante! Vou distribuí riqueza! Meu irmão e a índia morrero!  Cês num qué festejá? Vem! Vem festejá com o diamante do João Coragem! Todo aquele que condenô eles, vem festejá! A intolerância, a incompreensão! Vem festejá, gente! Vem festejá!

Desceu do cavalo e chamou as pessoas, completamente fora de si. O Padre Bento tentou aproximar-se do amigo. A multidão impediu-o. Todos queria ver a loucura de João Coragem. O garimpeiro colocou o diamante sobre uma pedra no centro da praça, pegou uma espingarda e, com tiros certeiros, partiu a pedra em vários pedaços. Como uma leva de famintos sobre pratos de comida, os seguidores e curiosos atiraram-se sobre os pedaços de carbono que refletiam a vida e a morte!

CORTA PARA:

CENA 3  -  COROADO  -  RUAS  -  EXT.  -  DIA.


A cidade parou para assistir à chegada dos corpos, trazidos pelos homens de Braz Canoeiro. Envoltos em panos brancos, os corpos vinham suspensos por cavalos. Como restos de uma batalha.

Sinhana tentou conter o grito, mas não pôde. Na escadaria da igreja, aos seus pés, os corpos dos dois filhos – ele, o legítimo; ela, a de criação – ali estavam, sem vida. A velha debruçou-se sobre o casal ensangüentado. As lágrimas a se confundir com o sangue. Diamante sobre veludo vermelho.

CORTA PARA:

CENA 4  -  RIO DE JANEIRO  -  CASA DE SAÚDE  -  QUARTO DE LARA  -  INT.  -  DIA.


JOÃO  -  Vem, Cema!

O rapaz, triste, entrou no quarto branco da casa de saúde. Dalva arrumava as malas quando a porta se abriu.


DALVA  -  João!

CEMA  -  (com o menino no colo)  Ai, João, tou inté tonta!

DALVA  -  Meu Deus, que felicidade!

CEMA  -  Tou tonta daquele avião, Virge Mãe!

JOÃO  -  Ela veio pra cuidá do Antonio. A mãe... a mãe ficô lá, pra missa.

DALVA  -  Eu soube, João...

JOÃO  -  (mudou de assunto)  Cadê minha mulhé?

DALVA  -  No jardim. Vá ao encontro dela.

JOÃO  -  Como é que ela tá?

DALVA  -  Você verá com seus próprios olhos. Está totalmente recuperada. Sua personalidade definida.

JOÃO  -  E... qual... das três?

DALVA  -  Vá, João! (tocou no braço do rapaz, impelindo-o)  Não faça perguntas.

CORTA PARA:

CENA 5  -  RIO DE JANEIRO  -  CASA DE SAÚDE  -  JARDIM  -  EXT.  -  DIA.


Os pássaros brincavam no cimo das árvores e a moça admirava-os, embevecida. João divisou-a de costas e aproximou-se, amedrontado. O riso cristalino da jovem chegou-lhe aos ouvidos. Lembrando o de Diana. A moça brincava com um pássaro, atirando-lhe migalhas de pão. O médico chegou por trás, assustando o rapaz.


MÉDICO  -  Olha, você vai ter uma surpresa.

JOÃO  -  (balbuciou)  Diana! (a moça não se moveu; ele se animou mais e insistiu)  Márcia!  (nada. A jovem permanecia estática. Tentou mais uma vez)  Lara!

A jovem voltou-se. Um sorriso a iluminar-lhe os lábios. Atirou-se aos braços do marido, abraçando-o amorosamente.


JOÃO  -  Quando te vi de longe... tive tanto medo!

MARIA DE LARA  -  Medo de quê, amor?

JOÃO  -  Sei lá... de que tu não tivesse se curado... ou se tava curada... em outra.

MARIA DE LARA  -  Nunca me senti tão bem... tão realizada... tão feliz. Só me faltava você mesmo... e o nosso filho.

JOÃO  -  Ele taí

MARIA DE LARA  -  Você trouxe?

JOÃO  -  Uai... num fui buscá ele? Você num pediu?

MARIA DE LARA  -  Quando pedi não estava tão consciente das coisas. Agora estou, João. E me sinto bem porque me recordo de tudo o que aconteceu. Sem o menor sofrimento, sem a menor mágoa.

JOÃO  -  Se lembra de tudo... tudo?

MARIA DE LARA  -  Tudo, João! É até espantoso! Como as coisas mudam de aspecto. Tudo dependendo do seu estado de espírito. O bom é a gente se sentir assim. De alma limpa. Como eu me sinto agora com relação a todas as coisas que me aconteceram. O importante é a gente se sentir com vontade de viver. E isso, em mim, parece que veio em dose dupla. (riu)  Acho que fizeram um transplante de otimismo dentro do meu cérebro...

JOÃO  -  É que você tá curada, bem.

MARIA DE LARA  -  (levantou-se do banco e puxou o marido pela mão)  Venha... onde está nosso filho?

FIM DO CAPÍTULO 119
Diante do povo de Coroado, João destrói o diamante!

NÃO PERCA O ÚLTIMO CAPÍTULO DE

E VEM AÍ...
ESTRÉIA DIA 01 DE FEVEREIRO

SESSÃO CAPAS E PÔSTERES

A capa que apresentamos abaixo foi publicada na revista Sétimo Céu em número e data que não conseguimos identificar.
Nosso agradecimento ao amigo Césio Vital Gauderetto pela remessa do material.
Já o pôster foi publicado na revista Amiga – TV Tudo, nr. 305, de 24 de março de 1976.
Boa diversão!



SESSÃO FOTO QUIZ

A foto da semana passada é da cantora Ivete Sangalo.
Agora, tentem descobrir quem é a garota da foto.
Eis algumas pistas:
1) É uma atriz que é filha de uma atriz e de um diretor famoso.
2) Estreou em novelas em 1984, em Partido Alto, da Rede Globo.
3) Sempre trabalhando na Globo, atuou em novelas como: Que Rei Sou Eu?, O Cravo e a Rosa e Aquele Beijo (sua última aparição em pequeno papel).
Boa diversão!



quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

SESSÃO LEITURA - A MORTE DA PORTA-ESTANDARTE - ANÍBAL MACHADO

O conto “A morte da porta-estandarte” é da autoria de Aníbal Machado.
Boa leitura!

A MORTE DA PORTA-ESTANDARTE

Que adianta ao negro ficar olhando para as bandas do Mangue ou para os lados da Central?
Madureira é longe e a amada só pela madrugada entrará na praça, à frente do seu cordão.
Se o negro soubesse que luz sinistra estão destilando seus olhos e deixando escapar como as primeiras fumaças pelas frestas de uma casa onde o incêndio apenas começou!...
Todos percebem que ele está desassossegado, que uma paixão o está queimando por dentro. Mas só pelo olhar se pode ler na alma dele, porque, em tudo mais, o preto se conserva misterioso, fechado em sua própria pele, como uma caixa de ébano.
Por que não se incorporou ao seu bloco? E por que não está dançando? Há pouco não passou uma morena que o puxou pelo braço, convidando-o? Era a rapariga do momento, devia tê-la seguido... Ah, negro, não deixes a alegria morrer... É a imagem da outra que não tira do pensamento, que não lhe deixa ver mais nada. Afinal, a outra não lhe pertence ainda, pertence ao seu cordão; não devia proibi-la de sair. Pois ela já não lhe dera todas as provas? Que tenha um pouco de paciência: aquele corpo já lhe foi prometido, será dele mais tarde...
Andar na praça assim, todos desconfiam... Quanto mais agora, que estão tocando o seu samba... Está sombrio, inquieto, sem ouvir a sua música, na obsessão de que a amada pode ser de outrem, se abraçar com outro... O negro não tem razão. Os navais não são mais fortes que ele, nem os estivadores... Nem há nenhum tão alinhado. E Rosinha gosta é dele, se reserva para ele. Será medo do vestido com que ela deve sair hoje, aquele vestido em que fica maravilhosa, "rainha da cabeça aos pés"? Sua agonia vem da certeza de que é impossível que alguém possa olhar para Rosinha sem se apaixonar. E nem de longe admite que ela queira repartir o amor.
O negro fica triste.
E está até amedrontado com as ameaças da noite, com essa Praça Onze que cresce numa preamar louca.
A Praça transbordava. Dos afluentes que vinham enchê-las, eram os do Norte da cidade e os que vinham dos morros que traziam maior caudal de gente. O céu baixo absorvia as vozes dos cantos e o som em fusão de centenas de pandeiros, de cuícas gemendo e de tamborins metralhando. O negro, indiferente à alegria dos outros, estava com o coração batendo, à espera. Só depois que Rosinha chegasse, começaria o Carnaval. O grito dos clarins lhe produz um estremecimento nos músculos e um estado de nostalgia vaga, de heroísmo sem aplicação. Ó Praça Onze, ardente e tenebrosa, haverá ponto no Brasil em que, por esta noite sem fim, haja mais vida explodindo, mais movimento e tumulto humano, do que nesse aquário reboante e multicor em que as casas, as pontes, as árvores, os postes parecem tremer e dançar em conivência com as criaturas, e a convite de um Deus obscuro que convocou a todos pela voz desse clarim de fim do mundo?...
A Praça inteira está cantando, tremendo. O corpo de Rosinha não tardaria a boiar sobre ela como uma pétala. O povo dá passagem aos blocos que abrem esteiras na multidão, entre apertos e gritos.
- Isso não é assim à beça, Jerônimo! Cuidado com essa aíí! É virgem...
Rompem novos cantos. Os "Destemidos de Quintino", os "Endiabrados de Ramos" estão desfilando. Há correria do povo para ver. Os companheiros se separam, as filhas perdem-se das mães, as crianças se extraviam. Acima das vagas humanas os estandartes palpitam como velas. E é pela ondulação dessas flâmulas que os que não podem se aproximar deduzem os movimentos das portas-estandartes.
Não se vê o corpo delas, vê-se-lhes o ritmo dos passos no pano alto. Mas era como se fossem vistas de corpo interio, tão fiel a imagem delas na agitação das bandeiras.
- Oh, aquela lá, que colosso!... É pena não poder vê-la;; mas é mulata, te garanto...
- Ih, como deve estar dançando aquela do outro lado!... Dezoito anos com certeza... Coxas firmes... Meio maluca...
- A que está empunhando o estandarte que vem vindo aí é que deve ser do outro mundo. Preta com certeza... Veja só como a bandeira se agita, como a bandeira samba com ela...
- Pelo frenesi, a gente conhece logo.
Dezenas de estandartes pareciam falar, transmitiam mensagens ardentes, sacudiam-se, giravam, paravam, desfalecendo, reclinavam-se para beijar, fugiam...
- Imagino como estão tremelicando os seios daquela, lá llonge; aquela diaba deve estar suando... Eta gostosura de raça!
- Cala a boca, Jerônimo... Você acaba apanhando...
Os cordões se entrecruzam, baralham-se os cantos. Vem crescendo agora um baticum medonho de tambores. Um bloco formidável se anuncia. O negro amoroso interpreta os sinais semafóricos do estandarte que está entrando pelo lado da Praça da República. O negro fura a massa, coloca a sua figura enorme em situação de poder ficar bem perto. Apura o ouvido para saber se é o canto do seu cordão. A barulheira é grande. Algumas notas são do hino... Sente um arrepio. Ela virá com aquele vestido? Se entristece mais, à medida que a mulata se vem aproximando numa onda de glória, entre alas do povo.
Se quiser agora sair daquele lugar, já não poderá mais, se sente pregado ali. O gemido cavernoso de uma cuíca próxima ressoa-lhe fundo no coração. - Cuíca de mau agouro, vai roncar no inferno... Será ela, meu Deus!...
O negro está tremendo. Mas não pode ser ela. Rosinha, quando aparece, ninguém resiste, é um alvoroço, uma admiração gera... Não vê que é assim... Até o ar fica diferente. E o estandarte que vem vindo é de veludo azul, tem a imagem de São Miguel entre estrelas e as insígnias do cordão. Ainda não é bloco de Madureira.
O preto se enganou. Sente-se desoprimido. Foi melhor assim. Pensa em ir embora, desistir de tudo. No dia seguinte, na oficina do Engenho de Dentro, se sentirá leve ouvindo o batido das bigornas e o farfalhar das polias. Se os companheiros perguntarem por que não apareceu, dirá que esteve doente, que foi ao enterro de algum parente, de uma tia, por exemplo. Está mesmo disposto a voltar para casa. Que o tomem por decadente, se quiserem...
Se Rosinha desobedecer e vier à Praça, não faz mal. Está também disposto a não se importar... Nem indagará se ela fez sucesso, se alguém mais se apaixonou por ela, se o Geraldo continuou com aquelas atenções, aquele safado. Amanhã, no trabalho, recomeçará a vida, será livre novamente. Rosinha que venha procurá-lo depois. Ele é homem e é forte. O que vale no homem é a vontade. Além disso, uma noite corre depressa. Enfiará a cabeça debaixo do travesseiro e a desgraça passará. Apelará para o sono. Já está até com vontade de dormir. Entretanto, não seria mal que caísse uma tempestade. Ao menos assim, Rosinha deixaria de vir à frente do cordão... Oh! como gostaria, como estava torcendo por um temporal que estragasse o vestido dela! Daqueles que inundam tudo, derrubam as casas, param os bondes e trazem uma desmoralização geral. No fundo está até com ódio do Carnaval...
Perto, estão tocando um samba de fazer dançar as pedras. Todos se mexem. Só quem está imóvel é ele, sob o peso de uma dor enorme. As mulatas passam rente, cheias de dengue; sorriem, dizem palavras. Hoje ele não topa. Se sente mesmo envergonhado de estar tão diferente. Nunca foi assim. No futebol, no trabalho, nas greves, nas festas, era sempre o mais animado. Foi de certo tempo para cá que uma coisa profunda e estranha começou a bulir e crescer dentro de seu peito, uma influência má que parecia nascer, que absurdo! do corpo de Rosinha, como se esta tivesse alguma culpa. Rosinha não tem culpa. Que culpa tem sua namorada? - essa é que é a verdade.
E está sofrendo, o preto. Os felizes estão se divertindo. Era preferível ser como os outros, qualquer dos outros a quem a morena porderá pertencer ainda, do que ser alguém como ele, de quem ela pode escapar. Uma rapariga como Rosinha, a felicidade de tê-la, por maior que seja, não é tão grande como o medo de perdê-la. O negro suspira e sente uma raiva surda do Geraldão, o safado. Era este, pelos seus cálculos, quem estaria mais próximo de arrebatar-lhe a noiva. O outro era o Armandinho, mas esse era direito; seu amigo, de fato, incapaz de traí-lo. Sentiu um reconhecimento enexplicável pelo Armandinho.
Suas pernas o vão levando agora sem direção. Não se acha a caminho de casa, nem se sente completamente na Praça. Algunas trechos de sambas e marchas chegam aos ouvidos, pousam-lhe na alma:

O nosso amor
Foi uma chama...
Agora é cinza,
Tudo acabado
Nada mais...

Tudo acabado, tudo tristeza, caramba!... Cabrochas que fogem, leitos vazios, desgraças. Nunca viu tanta dor de corno. Não nasceu para isso, nem tem vocação para sofrer. Os sambas o incomodam. Por que não está dançando como os outros?
O negro está hesitante. As horas caminham e bloco de Madureira é capaz de não vir mais. Os turistas ingleses contemplam o espetáculo a distância, e combinam o medo com a curiosidade. A inglesa recomenda de vez em quando: - "Não chegue muito perto, minha filha, que eles avançam..." - A mocinha loura pergunta então ao secretário da LegaçÃo se há perigo: - "Mas eles são ferozes?" - "Não, senhorita, pode aproximar-se à vontade, os negros são mansos." - A baiana dos acarajés se ofendeu e resmunga desaforos: - "Nóis é que temo medo de vancês, seu cara de não se que diga; nóis não é bicho, é gente!..."
Passa rente aos olhos da miss um torso magnífico de ébano. Ela se perturba, fica excitada, segreda aos ouvidos do secretário, tremendo na voz: - "Eu tinha vontade dançar com um... posso?" - "You are crazy, Amy!..." exclama-lhe a velha, escandalizada. Mas os turistas agora se assustam. No fundo da Praça, uma correria e começo de pânico. Ouvem-se apitos. As portas de aço descem com fragor. As canções das Escolas de Samba prosseguem mais vivas, sinfonizando o espaço poeirento. A inglesa velha está afobada, puxa a família, entra por uma porta semicerrada.
- Mataram uma moça!
A notícia, que viera da esquina da Rua Santana, circulou depois em torno da Escolha Benjamin Constant, corria agora por todos os lados alarmando as mães.
- Mataram uma moça! - comentava-se dentro dos bares. - Mataram, sim, mataram uma moça!...
- Que maldade matarem uma moça assim, num dia de alegriaa! Será possível?...
- Mas mataram, sim senhora, garanto que mataram!...
- Como é o tipo dela? O senhor viu?
- Me disseram que é morena, de uns dezenove anos, por aíí...
- Morena? Dezenove anos!... Ai, meu Deus! é capaz de serr a minha filha!... Diga depressa como é o tipo do rosto dela...
Outra senhora cheia de pressentimentos se aproxima do informante:
- O homem que estava com ela era preto, era? Estava de branco?... E tinha uma cicatriz? Ai! se tinha, não me diga mais nada... não me diga mais nada! Meu Deus, mataram minha filha!... Nenucha! Nenucha! Cadê Nenucha?...
As mães todas se levantam e saem a campear as filhas. O clamor de umas vai despertando as outras. Cada qual tem uma filha que pode ser a assassinada. Rompem a multidão, varam os cordões, gritam por elas. Os noivos são ferozes, os namorados prometem sempre matá-las.
A animação da Praça é atravessada agora pelo grito das mães aflitas. A mãe de Nenucha, porém, a primeira desgrenhada que se levantou, já está de volta ao seu lugar. Voltou porque cruzara com uma que se rasgava toda em imprecações: - "Laurinha, eu bem te disse que não viesses, o malvado jurou que te matava. Virgem Mãe, mataram minha filha... Eu sei... Eu nem quero ver." A mãe de Nenucha transfere o seu desespero para a mãe de Laurinha e se acalma. Mas apareceu uma gorda a dizer por sua vez à mãe de Laurinha que a morta era outra, uma pequena de Bangu, operária de fábrica. A fera tinha sido presa.
Distante do tumulto mortífero, as outras mães que já haviam arrecadado as filhas seguram-nas bem, ao abrigo dos noivos fatais. Eram as que escaparam de morrer, as que tinham sido salvas. - "Mariazinha, que susto tua mãe passou! Não vai lá mais não, ouviu? É melhor irmos embora, teu namorado está rondando..."
Outras mães, cheias de maus presságios, partem ainda à procura das filhas.
Uma senhora que recebia corte de um português debaixo do coreto, ao ouvir a notícia, larga-se aos berros, ainda toda embrulhada em serpentinas, à procura de sua Odete. Era Odete, com certeza...
Nem tinha dúvidas... Dava encontros, punha a mão na cabeça, corria. O povo achava graça imaginando fosse alguma farsante bêbeda. Odete já devia estar numa poça de sangue, esvaindo-se. Foi o namorado! Nunca tirava os olhos dos seios dela, aquele monstro... Dizia sempre que ela havia se ser sua. E tinha uma cara malvada, o diabo do homem... Coitadinha de sua Odete... Aqueles seios!... Bem não queria, oh! que fossem tão grandes. Odete também não queria, já estava amedrontada. A mãe corria e soluçava perguntando a todos onde se achava a filha morta. Era Odete, sim, tinha quase certeza! Caminhava como uma sonâmbula. Falava sozinha, soltando lamentações. Onde é que Odete estaria caída? E não tirava do pensamento que a desgraça foi por causa dos seios da mocinha... Quem não estava vendo? Ela mesma, como mãe, reconhecia que aqueles seios chamavam demais a atenção. Tinha o pressentimento de que aquilo acabava mal. Até os passageiros dos bondes cheios se viravam para apreciá-los, quando Odete parava na calçada. Odete, a princípio, coitada, tào inexperiente, se sentia faceira com eles... Depois, cresceram mais do que se esperava, e ela própria teve medo. Já produziam escândalo... Fora o demônio que tomara conta daquela parte do corpo de sua filha. Ultimamente, era um desespero: a pobrezinha mal podia atravessar a rua, sentia-se perseguida pelos homens. E não eram dois nem três que olhavam, não: da porta dos cafés, de dentro dos armarinhos, das sacadas, de todos os lados, todos queriam espiar, ficavam olhando... Ela passava depressa, envergonhada. Porque sempre foi muito seriazinha, a sua Odete... Que gente mal-educada... Deus nos livre dos homens. Que adiantou o soutien de arrocho?... Foi pior. "Ah, meu Deus, haverá mão que possa dormir tranqüila vendo os seios da filha crescerem assim dessa maneira?..." Quando Odete caminhava é que eles adquiriam a sua plenitude de vida e mistério. Daí o fato de todo mundo, quando pensa em Odete, pensar logo nos seios dela, que sempre apareciam primeiro e na frente, como a proa dos navios...
A mulher tremia e soluçava. Ah! Odete não tem culpa. Foram os seios, foram... Tanto desejava levá-la para longe desses brutos.
Agora, lá vai como louca, à procura do corpo da filha.
Caminha e vê crescendo uma rosa vermelha bem em cima do seio esquerdo de sua Odete. Dá um grito, cai sem sentidos. Dois pretos carregam-na para um bar. Já outras mães vinham de volta, trazendo as respectivas filhas bem seguras nas mãos. Deram-lhe éter a cheirar, abanaram-na. Quando voltou a si, parecia ter saído de um banho de resignação. Calma. Como se tivesse se conformado com tudo o que acontecera.
Começa então a declamar a história da filha com o criminoso: conheceram-se num banho à fantasia, na praia de Ramos; ele parecia distinto a princípio, tinha emprego, dava presentes. Depois... o malvado começou a ameaçar a pobrezinha, a fazer-lhe exigências. Não queria que fosse aos bailes, que usasse blusa de malha. Dizia que lea remexia demais as cadeiras quando caminhava. Proibiu-lhe trazer flor na cabeça, conversar com os amiguinhos.
- Mas a senhora tem certeza de que foi sua filha? interrrompeu um mascarado.
- Se já estou vendo o cadáver!... Ah, meu Deus, que dor!! Não! Não! Eu quero é contar a história dela. Isso me consola...
Fez uma pausa. Recomeçou depois, mais patética:
- Ainda nem tinha dezoito anos. Uma menina... Bordava quue era um gosto. Todos pareciavam ela... Me ajudava tanto.
Um sujeito, vestido de Hailé Selassié, escutava comovido. Pouco a pouco, a pobre senhora foi percebendo que estava sendo cercada de cavalos, bois e porcos prestimosos, além de um Mefistófeles e alguns Arlequins que vieram oferecer seus serviços. Essa fauna grotesca afigurava-se-lhe como aparições do reino do horror. Eles compreenderam, tiraram as máscaras. De dentro das máscaras surgiram fisionomias cheias de compaixão, que se voltavam para ela, querendo consolá-la. Alguém disse que a vítima era outra, uma mulata de Madureira, prota-estandarte de um cordão. A mulher não acreditava. Era inútil iludi-la.
Lá fora, um coro de vozes perguntava ainda, insistentemente, por certa Maria Rosa:

Cadê Maria Rosa
Tipo acabado de mulher fatal?
E anunciava que ela tinha como sinal
Uma cicatriz,
Dois olhos muito grandes,
Uma boca e um nariz.

A mulata tinha uma rosa no pixaim da cabeça. Uma mascarado tirou a mantinha da companheira, dobrou-a, e fez um travesseiro para a morta. Mas o policial disse que não tocassem nela. Os olhos não estavam bem fechados. Pediram silêncio, como se fosse possível impor silêncio àquela Praça barulhenta. A última das mães aflitas chega atrasada, atravessa o cerco, espia bem o cadáver, solta um grito de alegria:
- Ah, eu pensava que fosse a Raimunda! Graças a Deus quee não foi com minha filha! Escapaste Raimunda!
Saiu satisfeita. Alguns malandros, de cavaquinhos nas mãos, foram se afastando, meio desajeitados. Um deles dava opinião:
- Dor eu não topo, franqueza... Sou contra o sofrimento..
Tentaram pedir silêncio novamente. Uma rapariga comentava, enxugando as lágrimas:
- Só se você visse Bentinha, quanto mais a faca enterravva, mais a mulher sorria... Morrer assim nunca se viu...
O crime do negro abriu uma clareira silenciosa no meio do povo. Ficaram todos estarrecidos de espanto vendo Rosinha fechar os olhos. O preto ajoelhado bebia-lhe mudamente o último sorriso, e inclinava a cabeça de um lado para outro como se estivesse contemplando uma criança. Uma Escola de Samba repontava no Mangue. Ainda se ouviam aclamações à turma da Mangueira. Quando o canto foi se aproximando, a mulata parecia que ia levantar-se.
E estava sorrindo como se fosse viva, como se estivesse ouvindo as palavras que o assassino agora lhe sussurra baixinho aos ouvidos.
O negro não tira os olhos da vítima. Ela parecia sorrir; os curiosos é que queriam chorar. A qualquer momento ela poderia se erguer para dançar. Nunca se viu defunto tão vivo. Estavam esperando esse milagre. Ouvia-se uma canção que parece ter falado ao criminoso:

Quem quebrou meu violão de estimação?
Foi ela...

Ainda apareceram algumas mães retardatárias rondando de longe a morta.
A morta não tinha mãe nem parentes, só tinha o próprio assassino para chorá-la. É ele quem lhe acaricia os cabelos, lhe faz uma confidência demorada, a chama pelo nome:
- Está na hora, Rosinha... Levanta, meu bem... É o "Liraa do Amor" que vem chegando... Rosinha, você não me atende! Agora não é hora de dormir... Depressa, que nós estamos perdendo... O que é que foi? Você caiu? Como foi?... Fui eu? Eu?... Eu, não! Rosinha...
Ele dobra os joelhos para beijá-la. Os que não queriam se comover foram se retirando. O assassino já não sabe bem onde está. Vai sendo levado agora para um destino que lhe é indiferente. É ainda a voz da mesma canção que fala alguma coisa ao desespero:

Quem fez do meu coração seu barracão?
Foi ela...

Que ninguém o incomode agora. Larguem os seus braços. Rosinha está dormindo... Não acordem Rosinha. Não é preciso segurá-lo, que ele não está bêbedo... O céu baixou, se abriu... Esse temporal assim é bom, proque Rosinha não sai. Tenham paciência... Largar Rosinha ali, ele não larga não... Não! E esses tambores? Ui! que ventania... É guerra... ele vai se espalhar... Por que estão malhando em sua cabeça?... Na bigorna do Engenho de Dentro é assim... Se afastem que ele está lutando por ela... Ele é bamba... Não se massacra um operário dessa maneira... Estão atrapalhando o seu camino para Rosinha... Se apitam assim, acordam ela... Ela já não está presente... Deslizando no éter... Deixem ele passar... Os outros fiquem no chão... Fiquem por aí... Ele vai tirar Rosinha da cama... Ela está dormindo, Rosinha... Fugir com ela, para o fundo do país... Abraçá-la no alto de um colina...