XLVI
-
Você sabe que espaço que o bebê ocupa
agora já não é mais tão folgado, Rosa. Ele jácomeçou a se posicionar de cabeça
para baixo, numa posição mais confortável e a manterá até o nascimento. – Rosa escutava de sua médica na consulta de
pré-natal, agora semanal. - Oito meses completos. Pelo exame de toque, o colo
do seu útero já começou a dilatar. Vai manter o parto normal, não?
-
Sim, pretendo que seja. Você vê algum problema? – Indaga Rosa.
-
Nenhum. Você está ótima!
-
Tão ótima que já comecei a sentir com mais frequência aquelas contrações
estranhas no abdômen! Rsrsrs.
-
As famosas contrações de Braxton Hicks, um dos sintomas mais comuns da
gravidez. – Comenta Priscila, sorrindo.
- Existem para nos preparar para o parto.
-
Mas estão muito mais fortes dessa vez. – Replica Rosa, queixosa. – Eu até comentei
isso com o Claude.
-
Natural. É sua segunda gestação. – Responde a médica – E por falar em Claude...
Por que não está com você hoje?
-
Uma reunião de última hora... Ele estava comigo, mas você sabe, a política...
Me deixou aqui e vem me buscar.
-
Ele vai mesmo aceitar o convite? – Pergunta Priscila, enquanto escreve algo na
ficha de Rosa.
-
Ele ainda não se decidiu. Mas tem participado das reuniões do partido e sofrido pressão para se filiar. – Então, recebe uma mensagem pelo celular –
Olha aí, é ele! – Diz conferindo no celular -Está vindo
para cá.
-
Até parece que combinamos o horário... rsrsr. Bem, Rosa, até a próxima quinta. Qualquer coisa, tem meu celular e mm
..mmm...m..mmmm...
Minutos
mais tarde, Claude aparecia com Fernanda, já de volta da escola. Auxiliou Rosa
a entrar no carro e pôs-se a caminho. Rosa contava sobre a consulta, sem
prestar muita atenção ao trajeto, já que Fernanda a enchia de perguntas. Mas,
de repente, Claude faz o contorno de uma rotatória, em sentido contrário à casa.
-
Claude, por que está retornando?
-
Por que vamos passar o fim de semana na fazenda, hã? Mais do que nunca, precisamos
aproveitar todo o tempo livre para relaxar, antes de arrumar as malas para a
maternidade.
-
Mas, Claude, ainda temos um mês pela frente, meu amor!
-
Mas, um mês onde dormir será uma tortura para você, gatinha, até encontrar uma
posição para se deitar; depois, ter que
dividir você com vários
travesseiros ao seu redor, e, por fim,
nada de encomendas, hã? Non
estou reclamando, apenas... constatando,
d’accord?
-
Voilá! – Responde Rosa -Lembre-se de manter a calma, Papai Urso! A sua e a
minha... Para não apressar o parto. Seu
filho vai chegar no tempo dele.
-
Papai urso! – Exclama Fernanda rindo muito -
A mamãe chamou você de papai urso! Foi muito engraçado!
-
Foi non é? – Claude fala olhando-a pelo retrovisor- Pensando bem... É engraçado
mesmo, você tem um papai urso, uma mamãe gatinha e nasceu borboletinha...
rsrsrsr
***
O
fim de semana na fazenda foi divertido.
Rosa descansou a maior parte dele; pela manhã, aproveitava o sol em uma das
piscinas na companhia de Claude e
Borboletinha. Depois do almoço, um repouso e, em seguida, assistia aos esforços
da filha para manter-se em cima de Chantal. Um filme fechou a noite, antes de irem
para a cama.
Frazão
e Janete também apareceram com os filhos. Dadi fazia todos os gostos das
crianças e não descuidava de Rosa. Terezinha estava totalmente adaptada à vida
pantaneira e respondia pela administração das atividades da fazenda, tanto do
parque aquático quanto do ecoturismo. E o fazia muito bem. Contava com mais
dois funcionários fixos e em altas temporadas, contratava temporariamente. Em
geral, estagiários. Havia tido um relacionamento com Sérgio, um dos
empreiteiros, mas o romance não decolara.
François
e Joanna, que tinham plena confiança em seu trabalho, continuavam a
viajar pelo mundo. No momento, estavam em Houston, ao lado de tia
Elisabeth. Voltaram para casa no domingo à tarde, sob os protestos de
Borboletinha.
***
Na
quinta-feira, uma nova consulta. Tudo em ordem, o bebê na posição correta. Vida
normal, mas sem passar dos limites que sua situação impunha. O tempo para o
parto tinha uma flexibilidade de três semanas, talvez quatro, acreditava a
médica.
Os
dias seguintes foram uma suave rotina para Rosa. Levar Fernanda à escola,
passar pela construtora, almoçar com Claude e acompanhar Fernanda no ensaio
para a apresentação de sua turma de balé. A data do evento era alguns dias
antes do bebê nascer, no início de
dezembro, fato confirmado pela consulta.
Com
ajuda de Claude e Fernanda, comprou alguns itens que faltavam no enxoval do
bebê e depois de higienizá-los, preparou a mala que iria para a maternidade com
ela.
Rosa
não saberia dizer quem estava mais ansioso, se Claude ou Borboletinha, pelo
nascimento de Ursinho. O quarto dele estava praticamente pronto, faltando
apenas um tapete e a poltrona para os
momentos da amamentação.
Fim
de ano. Todos estavam na apresentação escolar de Fernanda: François e Joanna,
Terezinha, Janete, Frazão e os filhos e Dadi. Giovanni eAmália viriam nos próximos
dias para o nascimento do bebê.
Rosa
conversava com uma das professoras, ao lado de outras mães, perto do palco. Claude
lançou-lhe um olhar, detendo-se em sua barriga. Usava um vestido longo que a
acentuava ainda mais.
“Mon Dieu! Quase
quarenta semanas e nada!” – Pensou ele, com uma certa preocupação no olhar.
Como
que atraída pela força do pensamento do marido, o olhar de Rosa buscou o dele.
Sorriu para a professora e passou a mão ligeiramente pela barriga e desculpou-se com todas, antes de voltar para o lado de Claude.
-
Por que estava me olhando assim? Parece preocupado... Esses eventos sempre
atrasam e...
-
Non é isso que me preocupa. É você, hã? – Disse, segurando a mão dela - Você e o nosso... Ursinho. Você non tem
dormido bem, está cansada, tem que ir ao
banheiro de hora em hora ou menos... E ele está mais apertado do que nunca e
apesar de non se mexer tanto, também não fica parado muito tempo... Eu me sinto
responsável por todo esse seu
desconforto!
-
Claude! – Exclama levando a mão até o rosto do marido. - A gravidez é nossa, um trabalho de
equipe! Nós desejamos nossos
filhos e embora os desconfortos físicos sejam meus, você sempre esteve ao meu
lado, fazendo o que fosse possível e
isso foi muito importante!
-
Mas você já está com quase quarenta
semanas, chérie!
-
Não há razão para se preocupar, d’accord? – Diz, sorrindo - Seu filho ainda tem
duas semanas para deixar este confortável útero - E coloca a mão sobre sua barriga - e estrear no mundo.
-
D’accord... – Responde Claude, vencido - Nascer até a quadragésima segunda semana
é considerado normal pelos médicos, foi o que disse Priscila, non?
-
E eu estou muito bem: pressão arterial normal, sem inchaço nas pernas, sem
cólicas, sem perdas de sangue ou líquido... Olha, vai começar, me dê a câmera!
-
Non prefere que eu faça isso? – Pergunta, tirando a máquina da mochila.
-
Não, prometi a Fer que faria, amor... – Responde, levantando-se.
Rosa
ligou a câmera e procurou o melhor ângulo.
Andou de um lado para outro e resolveu
filmar pela lateral, assim teria
a imagem de toda turminha e não atrapalharia
a visão de ninguém.
As
meninas, vestidas de borboletinhas cor-de-rosa, já estavam em formação no palco,
aguardando o início da música, sentadinhas, como Rosa vira no ensaio. Assim que
as primeiras notas soaram, foram iniciando os movimentos e ficando em pé.
Ao
final, parou de filmar e sorriu para
filha que a procurava com os olhinhos brilhantes de cima do palco. A
apresentação durou menos de dois minutos.
Mas foi tempo suficiente para Rosa perceber que o bebê se mexia, desta
vez, daquela forma diferente.
Sentiu
que ele se posicionava mais para baixo e, em seguida, seu abdômen endureceu
momentaneamente. A dor nas costas correu até a frente da barriga, acompanhada
de uma certa cólica, já conhecida.
Sorriu
pra si mesma. Estava começando a entrar em trabalho de parto! Respirou fundo, tentando controlar a
ansiedade e o mal estar. Ainda tinha algumas horas de vantagem, havia sido
assim com Borboletinha.
Rosa
fazia o final do vídeo, com a saída das meninas do palco para os
bastidores, quando sentiu outra
contração. Dessa vez, não teve tempo de recompor-se e encostou na parede,
pois a contração veio acompanhada de uma
cãimbra na perna.
Fechou
os olhos e contou até dez, pausadamente. Isso sempre funcionava. Mas não
funcionou dessa vez.
Preciso
avisar o Claude, pensou com algum desespero e girou o corpo, caindo nos braços
dele:
-
Rosa, o que está acontecendo? -
Perguntou, tirando a câmera da mãos dela e entregando a Terezinha que o
acompanhara. -Você está pálida, suas mãos estão geladas... Mon Dieu, você ... Ursinhoestá pronto para estrear, chérie? É isso?
-
E eu acho que ele está com muita pressa, amor! Muito mais do que Borboletinha!
-
Eu vou pegar Fernanda – Diz Terezinha, saindo, enquanto os outros se aproximam.
-
Pra casa ou direto para o hospital? – Pergunta Claude, tentando mostrar uma
calma que não sentia.
Rosa
sorriu e, em seguida apertou um pouco mais a mão do marido.
-
Se tivesse me perguntado isso há um minuto atrás, eu diria para casa... Mas agora...
Agora eu acho melhor irmos direto para o hospital, porque a bolsa rompeu!
-
Vai, filho! – Disse François - Nós iremos atrás com Fernanda.
Claude
pegou Rosa nos braços, apesar de seus protestos.
-
Boa sorte, Rosa! – Exclamou Janete –Iremos pra lá também, não é, Frazão?
-
Claro que sim! Alguém precisa tomar conta do francês!
-
Frazon, se eu non estivesse ton feliz, neste
momento, pediria pra você ir pro
inferno, hã? – Fala Claude, com uma careta.
-
Passem emcasa – Pediu Rosa - e peguem as malas, por favor. Estão no quarto do
bebê. E digam pra Fer que eu estou bem - E sai carregada pelo marido sob alguns
olhares de curiosidade.
***
-
Vai, vovô! – Dizia Fernanda, apressando o avô - Ursinho vai nascer e eu
quero “vê ele”!
-
Calma,você vai vê-lo, meu anjo! –Disse François – Já estamos quase lá!
-
Mas ele pode demorar um pouquinho ainda para nascer. - Disse Joanna docemente
- Vamos ter que esperar, Borboletinha.
-
Mas meu papai falou que a Mamãe Natureza não atrasa nunquinha!
-
Ela não atrasa, querida, mas olha... – Diz Terezinha, até então calada. -Está
vendo como temos que parar nos sinais fechados? A Mamãe Natureza também tem que
seguir e, às vezes, dar uma paradinha em seus sinais...
-
As fadas também usam carro? – Pergunta com os olhinhos bem abertos, surpresa –
Eu não sabia!
Terezinha
sorri. Fernanda era uma figurinha, com certeza!
-
Elas usam sim, Fer! E são invisíveis como elas, ok?
Chegando
ao hospital, Terezinha e Fer desceram do carro e entraram no hospital, enquanto
François procurava uma vaga no estacionamento.
O
hospital estava pouco movimentado. Talvez pelo adiantado da hora. Já passava
das vinte e uma.
Logo
que entraram, de mãos dadas, chamaram a atenção para si, pois Fernanda
insistira em ir como estava: vestida de borboleta. Queria que o irmão a visse
pela primeira vez assim, como a Borboletinha que era.
Terezinha
dirigiu-se ao balcão. Havia várias atendentes, todas ocupadas. Escolheu uma delas, que fazia alguns
registros, digitando.
-
Com licença, senhorita... Alzira – Diz lendo o crachá – Boa noite! Minha irmã já deve ter dado entrada aqui...
Rosa Geraldy, trabalho de parto.
-
É a minha mamãe! – Diz Fer – Meu irmãozinho já nasceu?
-
Boa noite! Mas que borboleta linda! Mas eu acho que ele ainda não nasceu! – Diz,
sorrindo para Fernanda e depois olha
para Terezinha - Sim ela já deu entrada, eu mesma registrei a internação há
alguns minutos atrás. Foi encaminhada à sala de exames. – Aguarde um instante,
eu vou pedir informações.
Pouco
depois, uma enfermeira apareceu e disse que Rosa estava na sala de
partos, prestes a dar à luz.
Janete
e Frazão chegaram em seguida. Um pneu furado os atrasara no caminho. Quase uma hora depois, uma outra
enfermeira comunicava que o bebê havia nascido. Mãe, pai e filho passavam bem.
Mãe
e filhoestavam tendo os cuidados necessários e, em alguns minutos, seriam levados para o quarto. Poderiam esperá-los
por lá, na sala de espera do andar superior, caso quisessem.
Todos
subiram. Na porta do quarto onde
Rosa ficaria, uma pequena placa já
estava afixada, com a notícia:
***
No
dia seguinte, após o almoço Rosa foi liberada. Estava pronta para sair do
hospital com o bebê, aguardando apenas que Claude voltasse ao quarto, depois de
acertar as despesas. Já havia recebido todas as orientações e como não era mais
mamãe de primeira viagem, estava tranquila.
Assim
como João Marcos. Ele dormira a maior
parte da noite, depois de ser amamentado ainda na sala de partos. O que ele não
gostou, a princípio, foi o banho. Claude realmente não tinha muito jeito com
recém-nascidos. Mas insistiu no primeiro banho e depois que foi colocado na
água morna, João Marcos foi parando de chorar e tudo deu certo.
E
ali estava ele agora, bocejando em meio à manta que o protegia.
Amália
e Giovanni chegaram no dia seguinte. Ficariam para as festas de fim de ano.
Dino não pudera ir, pois estava em seu último período de provas na faculdade. Iria para o Natal e
conheceria seu mais novo sobrinho.
Um ano depois...
Como
boa fotógrafa que era, Rosa não dispensava nenhuma imagem, registrando os
melhores momentos.
“Borboletinha, tá na cozinha...♪♫♪♫
♪♫♪♫Fazendo chocolate para
o Ursinho
Petipolá♪♫♪♫♪
♪♫♪♫♪Olho de vidro
Cara de mau♪♫♪♫♪
♪♫♪♫♪Nariz de pica-pau...”
-
Voilá! – Diz Claude, entrando na cozinha com João Marcos – Olha só quem está
fazendo o seu “leite da manhã”, Joon!
-
Mamamama! Bobobobbobo! -Balbuciava João, tentando se equilibrar e caminhar, apoiado pelo pai.
-
A mamãe que fez! – Responde Fernanda - Eu só mexi papai!
-
D’accord... Mas isso é uma grande ajuda, non é mesmo, mamãe? – Fala Claude,
sentando-se e equilibrando João Marcos em suas pernas em pé.
-
É uma ajuda muito preciosa. – Confirma ela – Agora vamos para a mesa, querida.
Está tudo pronto. Claude, coloca a camiseta nele, ok?
Claude
colocou a camiseta em João Marcos, que não colabora muito, pois acompanhava
atentamente os movimentos da irmã e esticava os braços, mexendo os dedinhos,
pedindo o copo:
-
Dádádádádá...
Fernanda
entregou o copo cuidadosamente ao irmão e logo ele estava sugando o leite,
satisfeito.
-
A tia Terezinhavai demorar pra chegar, mamãe? – Pergunta Fer.
-
Eu acho que não, meu anjo. Ela ligou avisando que já estava na entrada da
cidade, não foi?
Terezinha
ficaria alguns dias com eles na cidade, antes da pressão do fim de ano na
fazenda. Alta temporada: férias escolares, festas de fim de ano e um belo
abacaxi nas mãos!
-
Falta muita coisa para providenciar, chérie?
Na
próxima semana era o primeiro aniversário
de João Marcos. A festa seria em Aquidauana mesmo. Teria novamente toda
sua família bem pertinho deles. Até Tia Elisabeth estaria presente. Todos
ficariam até depois do Ano novo, período que passariam na fazenda.
-
Não. Está tudo organizado para o primeiro aninho do nosso bebê! Mas vai ser
muito bom a Tera passar esses quinze dias de férias por aqui. Ela está tão estressada por causa
do edital. – E observa João, que
terminara oleite e tentava abrir o copo de qualquer maneira, enquanto pensa no
problema da irmã. E de todos.
Continua...
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