A crônica que transcrevemos abaixo é da
autoria de Rubem Alves.
Para maiores informações sobre o autor,
favor acessar: http://www.rubemalves.com.br/biografia.php.
Boa leitura!
O QUE MINHA
CADELA PENSA DE MIM
Meu nome é Lola. É assim que me chamam.
Quando gritam o meu nome, sei que me querem perto deles. Psicologicamente posso
ser definida como um animal incapaz de mentir ou fingir. Minha alma mora na
minha pele. Quando estou alegre, meu rabo abana por conta própria, independente
da minha vontade. Quando a alegria é demais, dou umas mijadinhas. Quando estou
triste, meu rabo e minha cabeça abaixam. Quando estou com sono, me esparramo no
chão do rabo ao focinho. Tudo se dependura: pele, orelhas, testa, olhos. Meu
dono gosta de mim embora fique bravo quando eu pulo para abraçá-lo e lhe dou
uma lambida. O que é verdade para mim não é verdade para o meu dono. A alma
dele não mora na pele. Ele mente. Ele finge. Nunca o vi dar uma mijadinha de
felicidade. Talvez ele não seja suficientemente feliz para isso. Às vezes, eu
estou deitada do jeito que descrevi ele está assentado numa cadeira. Ele olha
para mim de um jeito diferente. Não é alegria. Não é tranquilidade. Acho que é
inveja. Ele gostaria de ser como eu sou, mas não tem coragem… Está morrendo de
vontade de se esparramar também no chão frio, como eu. Mas não o faz. Fico a
pensar: o que o impede? Acho que é vergonha. Os homens têm vergonha uns dos
outros. Sou feliz porque não tenho vergonha e faço o que quero. Talvez essa
seja a razão por que os homens gostam de ter pets: porque nos pets eles
projetam uma felicidade que eles mesmos não têm. Diga-me o pet que você tem e
eu saberei como é a sua alma. Os pets têm uma função terapêutica. Bem, eu sou
uma cadela, e tudo o que disse foi de brincadeirinha. Porque eu mesma, na
realidade, me contento em ser feliz. Não gasto tempo pensando essas coisas…
Fonte: http://literaturaemcontagotas.wordpress.com/tag/cronicas/.
Amei essa crônica! Linda!
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