Capítulo 27 -
Emanuela
olhava alguns livros na biblioteca, enquanto Mariana estudava. Ela sabia que
mais cedo ou mais tarde, quando Dr. Otávio ficasse melhor, ele voltaria a falar
na prova que ela faria para entrar na faculdade. De repente, Mariana olhou para
a irmã que tinha acabado de pegar um livro na estante e o folheava.
— Manu,
você também está ansiosa com a faculdade?
Manu
sentou-se em uma das cadeiras que estavam próximas a mesa em que Mariana
estudava.
— Não
muito... Por enquanto quero apenas ajudar no escritório junto com o Dr. Otávio.
Quero aprender um pouco também.
Mariana
olhou atentamente para a irmã.
— Mas se
fosse fazer algum curso da faculdade, que curso escolheria?
— Não
sei...
— Não
sabe? Então... Como se imagina daqui a 5 ou 10 anos? Não tem nada que realmente
queira fazer? Um desejo ou sonho?
Emanuela
levantou-se de repente, fazendo com que Mariana tivesse um pequeno sobressalto de
surpresa.
— Vou
passear um pouco. – disse – Enquanto, eu estiver aqui, você não se concentra
nos estudos e se mete a falar.
Mariana
fez uma expressão como quem não gostou do comentário. Emanuela saiu da
biblioteca. Do lado de fora, na pequena sala que havia, olhou para a janela com
um olhar pensativo. Ultimamente, Mariana fazia perguntas que a deixava sem
resposta. O que queria fazer? O que escolheria? Essas perguntas sempre lhe
davam uma sensação estranha. Talvez por que, mais do que não saber o que faria
com seu próprio futuro, ela mesma não sabia quem era exatamente. Passara tanto
tempo da sua vida se preocupando em ser um apoio para a irmã e esquecendo seus
próprios desejos, que mesmo agora não sabia exatamente como era ou o que
realmente queria.
***
Estava
quase na hora do almoço, quando Gabriele foi à cozinha. Anne acabara de
terminar o almoço, quando percebeu que Gabriele entrara.
— Dona
Gabriele. O almoço já está pronto. A senhora quer que eu peça a uma das
empregadas para chamar as meninas?
— Não,
Anne. Não se preocupe. Eu mesma farei isso.
Gabriele
se dirigiu à sala e subiu as escadas, foi para o quarto de Viviane. Bateu à
porta e abriu. Viviane estava deitada na cama e com o braço que não estava
enfaixado tentava ler um livro.
— Sônia,
ainda bem que chegou. Você me ajudaria... – disse, logo percebendo que quem
entrara no quarto não era a governanta. - Ah... É você? O que quer? – perguntou
friamente.
Gabriele
se surpreendeu com o modo como Viviane falara com ela, mas preferiu não falar
nada.
— Você
vem para o almoço ou prefere comer algo no quarto?
Viviane
voltou a atenção para o livro.
— Não
estou com fome.
Gabriele
pareceu suspirar novamente.
— Mas
você precisa comer... Precisa se alimentar bem. Seu corpo ainda está se
recuperando do acidente. – disse, olhando para o braço enfaixado de Viviane.
Viviane
olhou para a mãe.
— Está
realmente preocupada comigo? – e rindo. - É interessante... Por que durante
muito tempo a senhora nem saberia se eu tinha almoçado se alguém perguntasse.
Gabriele
permaneceu calada por um instante.
— Até
quando vai me culpar por isso? Independente de qualquer coisa, eu sou sua mãe.
Posso não ter sido a melhor mãe do mundo, mas eu sou sua mãe. – disse, olhando
para a filha. - Até quando vai me tratar assim?
Vivi
ficou em silêncio por uns segundos.
— Até me
deixar em paz. A senhora não percebeu ainda? Será que eu vou ter que desenhar?
Não quero que chegue perto de mim, não quero que fale comigo. A sua simples
presença me deixa mal... Só o fato de olhar para seu rosto me dá raiva e
tristeza. Se realmente me ama como diz, então, por favor, se afaste de mim. É a
melhor forma de me fazer feliz.
Gabriele
não teve qualquer reação diante daquelas palavras.
— Vou
pedir a Sônia para trazer algo.
Viviane
voltou a ler o livro, enquanto Gabriele saía e fechava a porta atrás de si.
Emanuela
subia as escadas para ir ao seu quarto, quando viu Gabriele descendo. Parecia
um pouco abatida.
— Está
tudo bem, dona Gabriele?
Gabriele
apenas sorriu, mas depois pareceu lembrar algo.
— O
almoço já está pronto. Vou avisar a sua irmã e poderemos almoçar.
Emanuela
subiu as escadas e antes de entrar em seu quarto, olhou em direção ao quarto de
Viviane. Lembrou-se da expressão de Gabriele. Foi até o quarto de Viviane e
bateu na porta antes de abrir.
—
Viviane? – disse, entrando e vendo que a garota se concentrava na leitura de um
livro.
— Pelo
jeito não vou terminar esse livro nunca. – disse, fechando o livro e olhando
para Emanuela. – O que você quer?
Emanuela
aproximou-se.
— Queria
conversar com você. – disse.
Viviane
suspirou.
— Sobre o
quê? O que a perfeitinha da Emanuela quer me dizer de novo?
Emanuela
sentou-se na cama em que Viviane estava.
—
Perfeitinha, você diz...
— E
então, o que veio dizer hoje? Ah... Talvez você tenha visto a Gabriele, não é?
Aposto que ela estava chorando... – disse Viviane, ficando pensativa por alguns
instantes.
Emanuela
olhou para Viviane e percebeu algo diferente.
— É isso
mesmo que você quer?
— Eu já
disse a você... Quero que ela sofra tanto quanto eu sofri. Eu odeio aquela
mulher...
Emanuela
suspirou.
— Tem
certeza?
— Claro.
Você não estava aqui. Você não sabe o tipo de mulher que ela era. Como ela me
tratava. Como ela me desprezava, quando eu não tinha feito nada.
— E até
quando vai continuar com isso?
— Até eu
ficar satisfeita, o que pode significar nunca.
— Não
estava falando disso. Estava falando até quando vai sentir pena de si mesma.
Viviane
olhou confusa para Emanuela.
— Pena de
mim mesma?
— Sim.
Esse é o pior sentimento que alguém pode sentir por si mesmo. Achar que toda a
sua infelicidade ou tristezas é culpa de outra pessoa. Achar que todos os
outros são os vilões e você é apenas a coitadinha que sofre todas as injustiças.
Isso é sentir pena de si mesma.
Viviane
pareceu ficar chateada com o que ouviu.
— Não estou
sentindo pena de mim mesma.
— Está. E
quando alguém continuamente sente pena de si mesma, ela acaba se tornando pior
do que as pessoas que ela culpa. Egoísta e infeliz. Odiando todos ao redor e
sendo odiada por todos. Se continuar assim, você vai realmente odiar a sua mãe.
É isso que quer?
Viviane
parecia estar sem palavras.
— Você
sente raiva da sua mãe, porque acha que ela não sofreu o suficiente e isso
parece injusto para você. Mas você se esqueceu que também errou? Não lembra que
humilhou a mim e a minha irmã na sua festa?
— Você
vai passar isso agora na minha cara?
— Não. O
que estou dizendo é que essa pena que você sente faz com que você apenas
machuque os outros e a si mesma. E as pessoas acabam se afastando de você por
causa disso. Como eu disse, se não quer mesmo odiar a sua mãe, então deveria
parar.
— Como
pode dizer isso? Você não sabe o quanto eu sofri.
— Não
sei. Mas conheço uma garota que mesmo tendo passado por muitas dificuldades,
nunca reclamou. Ela que presenciou o assassinato da própria mãe e por causa
disso tem pesadelos constantes. Ela continua sorrindo sem guardar mágoa de
ninguém, nem mesmo do que você fez, Viviane. Quando todas as pessoas condenavam
o seu mau comportamento, ela se sentiu mal por você. Porque alguém assim continua
seguindo em frente, eu e você não temos o direito de viver no passado.
Dizendo
isso, Emanuela saiu do quarto.
Na sala
de jantar, Gabriele sentou-se a mesa, junto com Camila, Iêda e até mesmo Érica.
Logo em seguida vieram Emanuela e Mariana.
— Bem,
podemos começar. Acho que Vi... – Gabriele foi interrompida pelo aparecimento
de Viviane. – Então, acho que agora podemos começar.
Emanuela
olhou para Viviane e sorriu. Vivi desviou o olhar um pouco envergonhada.
***
Camila
desceu do carro e olhou para aquele prédio. De dia parecia um prédio comum,
exceto por não ter nenhum movimento. Entrou e observou a boate por dentro. Um
barman limpava o local, enquanto conversava com uma mulher. Quando a mulher a
percebeu, foi ao seu encontro.
— Bom
dia, em que posso ajudá-la?
Camila
olhou para Rosália da cabeça aos pés.
—
Gostaria de falar com o Fernandes.
Rosália
olhou para Camila e se perguntou que negócios uma mulher tão fina teria a falar
com uma pessoa como o seu meio-irmão.
— Você
marcou hora? Ele é muito ocupado...
Camila
riu.
— Apenas
diga que a mulher de Otávio Alcântara Jr. está aqui.
Rosália
suspirou e foi ao encontro Fernandes que estava em seu escritório. Depois de
algum tempo voltou.
— A
senhora poderia me acompanhar?
As duas
entraram por uma porta que havia na boate e depois de andar por alguns minutos,
chegaram a uma porta. Rosália bateu a porta e abriu. Camila entrou e encontrou
um homem de estatura baixa, encostado na mesa do escritório, sorrindo.
— Muito
prazer. – disse ele, estendendo a mão. – Meu nome é Fernandes, como deve saber.
Estou muito honrado com sua presença.
Camila
não estendeu a mão, o que irritou um pouco Fernandes.
— Muito
prazer, meu nome é Camila Alcântara. Nós nos falamos por telefone.
— E a
quem devo a honra de sua presença, Senhora Alcântara? – e apontando em direção
a uma cadeira. – Sente-se, por favor.
Camila
sentou-se.
— Estou
aqui para falar de negócios.
Fernandes
riu. Voltou para a sua poltrona e depois de acender um charuto, olhou
atentamente para Camila.
— E de
que negócios, a moça veio falar?
Camila
sorriu.
— Eu não
estou aqui para brincadeiras, senhor Fernandes. – e séria. – O senhor é
subordinado direto do Dr. Marcos, não é?
Fernandes
que estava sorrindo, de repente, ficou sério.
— Eu não
sei do que você está falando. – disse, logo em seguida fumando o charuto.
Camila
riu.
— Não precisa
se fazer de desentendido... Sei perfeitamente que tipo de negócios o tio do meu
marido possui. Conheço muito bem o tipo de mercadoria que ele exporta para a
Europa.
Fernandes
inclinou-se para frente, olhando para Camila.
— Se
sabe, deveria perfeitamente compreender que não é algo que a senhora pode se
meter. E não deveria ser tão imprudente a ponto de mencionar o nome dele em um
lugar como esse.
Camila
olhou para Fernandes.
— O medo
é para os fracos, senhor Fernandes. Já que estou aqui, significa que estou
disposta a sacrificar qualquer coisa.
Fernandes
sorriu.
— Eu
diria que o medo é um aviso para os descuidados, senhora Alcântara. – e fumando
o charuto. – Mas você não veio aqui para falar do tio de seu marido, não é?
— Tem
razão. Como eu disse, vim falar de negócios com o senhor. Algo que realmente
vai lhe interessar.
Fernandes
olhou para Camila pensativo.
— E o que
seria tão grande a ponto de chamar minha atenção?
Camila
sorriu.
— O
senhor sabe que existe a possibilidade de ser o próximo na linha de sucessão.
Há a possibilidade de o senhor ficar no lugar do Dr. Marcos.
Fernandes
olhou para Camila, tentando entender quais as razões por trás daquelas
afirmativas.
—
Continue.
— Mas o
senhor deve saber que possibilidade não significa certeza. O que eu quero dizer
é que se o senhor quer realmente ser o chefe, eu posso lhe ajudar.
Fernandes
riu.
— Você
está dizendo que eu deveria trair o meu superior? Está louca? Se sabe o tipo de
homem que ele é, deveria saber também que tipo de torturas ele faz com as pessoas
que traem a sua confiança. Coisas que fariam mafiosos italianos ficarem
surpresos.
Camila
permaneceu séria.
— Não
disse que não haveria um risco envolvido. Mas o que posso dizer é que tenho, se
não dizer tanto poder quanto o seu chefe, um grande poder.
— Do que está
falando?
— Poucas
pessoas sabem... Mas sou única herdeira dos negócios da minha família. Eu mudei
meu sobrenome quando me casei, mas anteriormente eu me chamava Camila Mansini.
Fernandes
pareceu surpreso, tão surpreso que por alguns segundos se manteve olhando para
Camila admirado.
—
Mansini... Família Mansini, de descendência italiana, chefe do submundo do jogo
do bicho. Quem diria que você é alguém tão importante. E se, hipoteticamente,
eu estivesse interessado, o que eu teria de fazer em troca? E que garantias
você me daria para que o Dr. Marcos não quisesse a minha cabeça em uma bandeja
depois?
Camila
sorriu.
— Não se
preocupe. A tarefa que tenho para você é muito simples.