XXXVII
- O “marido” de tia Elisabete
acaba de telefonar. Non vai chegar de Houston a tempo de jantar conosco,
mon amour. – Fala Claude, entrando no quarto onde ficaria Fernanda.
- Que pena! Eu estou curiosa pra
conhecê-lo! – Diz Rosa, pendurando algumas roupas e ficando de costas para ele.
- E por quê, posso saber?
- Só curiosidade, Claude. Do tipo
como será um guru americano, na terra dos cowboys, que curte praia de nudismo?
Claude se aproxima de Rosa,
abraçando-a por trás. Dá um beijo em seu pescoço e diz, roucamente:
- Ficou curiosa também
sobre a praia de nudismo?
Rosa fecha o guarda-roupa e gira de
frente para ele, mas antes que respondesse qualquer coisa, Claude a beija
demoradamente, encostando-a na porta do guarda-roupa. Era evidente o desejo que
demonstrava em tê-la.
- Ainda temos um tempo antes do
jantar... – Claude fala sedutoramente, encostando sua testa à dela.
- Não posso... – Fala Rosa baixinho,
passando a mão pelo rosto do marido.
- Por que non?
- Mamãe!!!!!
- Por isso... – Diz, sorrindo
com os lábios.
- Já acabei! - Grita Fernanda
do banheiro, quebrando de vez com o clima.
- A mamãe está indo, querida! –
Responde Rosa.
- Mon Dieu, diz que o que ela
terminou foi o banho, chérie... – Fala Claude, afastando-se alguns
centímetros de Rosa, sem soltá-la.
- Quem me dera! – Fala Rosa
divertida - Ela foi fazer o número dois. Rsrsrsrs. Não quer
ir ajudá-la?
- Eu até iria, mas eu ouvi muito bem,
ela chamou por você, oui? – Responde Claude, torcendo o nariz.
- Claude! Que coisa feia você
fez! Ela é sua filha e você também já fez isso um dia!
- D’accord... – Exclamou - Assim que
voltarmos ao Brasil, vou pedir desculpas a meu pai!
- Desculpas a seu pai? Não entendi?
- Por tê-lo impedido de fazer amor
com minha mãe e deixá-lo nessa situaçon... constrangedora! – Concluiu quase sem
jeito.
- Palhaço! E eu achando que era
sério! – Diz, saindo do abraço.
- Mamãe!!!!
- Estou indo, filha! – Rosa caminha
para o banheiro da suíte.
No dia seguinte, um tempo após o café
da manhã, partem com Elisabeth para a fazenda vizinha, do “marido”
dela.
A casa de Gideon parecia coisa
de cinema, pensava Rosa, enquanto tia Elisabeth parava o carro em frente a ela.
Uma arquitetura doméstica
incrível. Uma construção contemporânea que misturava estilos, mas possuía uma
harmonia tão grande, que a deixava encantadora. Combinava colunas romanas, “esfinges”
gregas com enquadramento colonial, estilo espanhol, e a imponência dos
americanos.
E o jardim? Integrava a casa ao meio
ambiente. Imenso, com a grama verdinha, muito bem aparada. Parecia
um tapete verde no qual flores, árvores de fruto, luz do sol e sombra,
figuravam numa composição equilibrada. A fonte circular, no centro dele, típica
do estilo romântico inglês, provavelmente não fora colocada ali apenas para
servir de ornamento ou decoração, mas para manter a umidade do ar e, quem
sabe, saciar a sede, senão das pessoas, dos animais silvestres que passassem
por ali, pois pelas suas pesquisas, no Texas, o calor é muito forte no
verão.
Com certeza uma releitura da fonte do
Central Park, de 1857 - herança cultural inglesa que
espalhou-se por toda a Europa via França, e foi introduzida na América do
Norte, em Monticello – Virgínia, senão lhe falhava a memória.
Tudo a ver com a casa de um guru,
pois a água é um elemento condutor de energia e oferece tranqüilidade, ajudando
as pessoas a tornarem-se mais serenas e equilibradas.
- Incrível! Deixou escapar,
enquanto descia do carro – Parece cenário de cinema!
- Parece não, darling! Foi
mesmo. Por aqui foram rodadas algumas cenas do seriado Dallas da rede CBS:
dinheiro, vingança, sexo, paixão, sede de poder e intrigas familiares, esse era
o enredo.
- Uma série muito boa, hã? Teve até
continuaçon ano passado. – Comenta Claude – Borboletinha, tenha modos,
pare de correr e volte aqui!
- Ah, papai!!!
- Obedeça o seu pai, filha! –
Diz Rosa, reforçando a ordem de Claude - Ah, eu me lembro dela, era
com o ator Larry Hagman , o Major Nelson da Jeannie é um Gênio. -
Completa.
- Isso mesmo, Rosa! Foi o
suspense que deixou Dallas conhecido no mundo todo: o episódio "Quem
atirou em J.R."* fez história na televisão!
- Pensei que essa ideia era original
da TV brasileira com : “Quem matou Salomão Hayala”** Uma novela brasileira, que
já teve até remake.
- Well, honey... – Fala Elisabeth em
tom de dúvida – Isso teremos que pesquisar. Sabemos que na sétima arte, nada se
cria, tudo se copia...
- E quem conta um conto aumenta
um ponto... – Diz Rosa, ao mesmo tempo em que a porta da entrada da casa era
aberta.
- Good morning! Sejam bem vinidos
a cá! – Falou Gideon – Elisabeth tentou ensinar portuguese for me...
Sorry - Diz sorrindo - Eu ainda não aprender direito.
- Good morning, dear! – Tenho certeza
que nos entenderemos! Aqui estão meus amados sobrinhos: Claude,
Rosa e nossa little butterfly: Fernanda. Meus queridos, este é
Gideon!
Depois das apresentações, Gideon os convida a entrar e conhecer a casa por dentro. A decoração era ímpar! Bom gosto desde a escolha do papel de parede, costume americano, até a madeira dos móveis. Sofisticação equilibrada.
- Rosa ficou encantada com sua casa,
querido. – Comentou Elisabeth, falando em português e bem devagar. – Como
já lhe falei, ela é arquiteta e Claude, engenheiro.
- Oh! E qual sua opinião sobre ela? –
Pergunta Gideon, interessadamente.
- É uma casa muito...
pitoresca, eu diria – Falou Rosa – Uma combinação transcendental entre o
passado e o exótico.
- Rosa, você quis dizer atemporal,
non é chérie? – Comenta Claude.
- Você tem uma certa
implicância com nossas filosofia de vida, não é, Claude? – Pergunta
Gideon descontraído.
- Non é implicância. Eu apenas
discordo de alguns pontos de vista de vocês, mas nada que possa
abalar nossa amizade, oui?
- E essa garotinha linda, não
fala nada? – Pergunta, olhando para Fernanda.
- O papai não gosta de gnomos. Mas
ele gosta da fada dos dentes e até conhece ela! Mas eu só vou conhecê-la
quando ficar grande – Diz ingenuamente.
Antes que alguém pudesse dizer alguma
coisa além de sorrir, o almoço é anunciado e eles são conduzidos à mesa.
- Então, você conhece a fada dos
dentes e assim a consolou... – Fala Rosa baixinho – Muito engenhoso de sua
parte, Claude Geraldy...
Durante o almoço, uma conversa sobre
negócios logo se estabelece entre Claude e Gideon que, muito simpático,
parecia gostar de explicar sobre o Texas. Acabou contando toda a
história do estado americano, até chegar ao seu encontro com Elisabeth.
- E como todos sabem, o petróleo
localizado no Golfo do México promoveu o rápido crescimento de Houston e ela se
tornou a maior cidade do Estado e uma das maiores do país.
- Engraçado... Filmaram Dallas em
Houston? O cinema é mesmo fantástico! Uma caixa de fantasias. – Diz Rosa.
– Como esquecer a frase: “Houston, temos um problema”?
- Outra grandiosidade do Texas: o
quartel-general da NASA foi construído em Houston, em mil novecentos e sessenta
e quatro. Em sessenta e nove, com a missão da Apollo 11 rumo à Lua, a
indústria aeroespacial passou a ganhar gradualmente maior importância na economia
do Estado e a indústria cinematográfica não poderia ficar atrás! – Completa
Gideon.
- Crianças, os texanos são muito
orgulhosos de quem eles são e do que têm e com o tempo a gente descobre
que eles têm mesmo motivos pra se orgulhar! O Texas tem várias coisas
diferentes pra se fazer.
- E é o que vieram fazer aqui, não é
mesmo? Passear e se divertir! E faremos isso: nestas duas
cidades fantásticas: Houston e Austin.
- O que podemos esperar ou planejar
para eles, honey? – Pergunta Elisabeth.
Claude e Rosa escutam atentamente as
opiniões. Claude parecia satisfeito com o que escutava e com a
firmeza de Gideon. Esperava encontrar um playboy “espertinho”, que
estivesse interessado em passar a perna em tia Elisabeth e encontrara um homem
com opiniões formadas, cabeça feita e financeiramente muito bem estabelecido.
Inteligente, bem humorado, só tinha um defeito: era guru também!
Mas, parecia fazer tia Elisabeth feliz. E ela merecia ser feliz.
- Well... Houston é uma cidade muito
cultural, com museus e outros tipos de arte, como sinfonias e concertos.
E restaurantes do mundo inteiro. Há o Galleria, o maior shopping do Texas,
gigantesco mesmo! A Rice University e o Johnson Space Center -
NASA.Tudo muito bom de se apreciar.
- Mas a minha cidade favorita –
Intervém Elisabeth - é Austin! Ela é fantastic! Capital da música,
inspira vida e gente saudável.
- E San Antonio? – Pergunta Claude –
O que me diz dela?
- Podemos ir também . É onde fica o Álamo,
lugar que foi importantíssimo na revolução texana: a batalha do Álamo. Naquele
tempo, o Texas era no México e não norte-americano. Os texanos foram invadidos
pelos mexicanos porque não queriam mais pagar impostos. Como número de soldados
era muito diferente, é claro que eles perderam, mas a batalha acabou desencadeando
a revolução texana. O Texas venceu e separou-se do México, virando um país
chamado República do Texas por onze anos... Mas vocês não vieram pra cá
pra estudar história, não é? Vamos planejar por onde começar... mmm... mmm... mm...
Assim, Claude, Rosa e Fernanda passam
vinte e cinco dos trinta dias que tinham, passeando pelo Texas. Claude
teve o cuidado de evitar as praias de nudismo. Borboletinha se adaptou
facilmente à cultura texana.
Estavam na última semana, já
arrumando as malas e teriam que despachar uma delas direto para o Brasil,
lotada de lembranças do Texas, caso contrário, pagariam taxas de
bagagem excedente na saída dos Estados Unidos e no aeroporto de Paris, ao
chegarem. Sem contar que carregariam peso à toa.
Três dias antes de partir, Elisabeth
recebia uma visita inesperada. Inesperada e inconveniente: Roberta Vermont.
Atriz, filha de um casal
simpático à causa holística e esotérica: o pai, um ator francês e a
mãe, uma bailarina brasileira que fora trabalhar em uma companhia de
dança francesa. Conhecia Roberta desde criança e havia até “empurrado” Claude
para um relacionamento com ela, o qual hoje agradecia por não ter dado
certo.
Roberta se tornara uma pessoa
insensível em busca do sucesso profissional e de um marido rico que lhe
bancasse os sonhos e aventuras. Os pais foram dados como mortos - estavam
desaparecidos desde o tsunami que assolou o Japão - em dois mil e onze.
Apareceu por lá, parando seu carro em
frente à casa de Elisabeth, no minuto em que ela acabava de entrar para pedir
que fosse servido o lanche da tarde. Rosa brincava de esconde-esconde com
Fernanda pelo jardim e a filha acabava de encontrá-la.
Quando Roberta desceu do carro, olhou
à sua volta e sorriu, dando alguns passos, apreciando o lugar, distraidamente.
“Bem que você podia ter um
filho, não é Elisabeth?” – Pensou, sonhando em morar naquele lugar. “Mas
o Claude serve, mesmo sendo apenas seu sobrinho. Afinal, um dia ele vai herdar
tudo que é seu mesmo”
Fernanda corria para o “pique”, na
intenção de bater e ganhar a vez de novo.
- Borboletinha, cuidado onde
pisa, querida! – Gritou Rosa, correndo atrás dela e saindo detrás da árvore
onde se escondera.
O choque foi inevitável! O corpo de
Rosa bateu frontalmente com Roberta e por pouco as duas não caem. Mas o
grito de susto faz Fernanda voltar para perto da mãe.
Roberta é indelicada ao falar:
- Sua estúpida! Você é cega? – Então,
ao ver Fernanda chegando perto, tenta mudar o tom - Esta é a filha
do Claude, não é? – Pergunta altiva. - E você deve ser a
babá... – Fala, olhando rapidamente e com desdém para Rosa. - Quer chamar
Elisabeth, por favor?
Inocente e escutando só a última
fala, Fernanda diz:
- Eu chamo a titia, mamãe! – E entra
rapidamente na casa.
- Mamãe?! - Exclama, prestando mais
atenção em Rosa - Oh, God! Você é a esposa do Claude? – Falou
Roberta, medindo-a de cima a baixo. – Então, Nara foi trocada por você?!
Pobre Nara, imagino como se sentiu ofendida.
- Nem tanto quanto você deve ter
ficado, quando Claude a trocou por ela! – Responde Rosa, indignada,
fervendo de raiva. Não por ter sido confundida com uma babá, mas pela ousadia e
pouco caso dessa desconhecida.
- Vem titia, a moça tá procurando
você! – Dizia Fer, praticamente puxando a tia pela mão.
- Borboletinha, devag... - “Oh,
Lord! Roberta Vermont... - Pensa Elisabeth - Mon
Dieu, que a força esteja comigo!”
Roberta estava a ponto de outra
indelicadeza, mas ignorou Rosa, ao ver Elisabeth. Aproximou-se dela com
um sorriso duvidoso nos lábios, passos decididos e pensados.
- Oras, sua coisin... Elisabeth,
querida! Eu estava tão ansiosa para encontrá-la novamente! – Diz,
abraçando Elisabeth de maneira branda.
- Roberta Vermont! Mas que
surpresa! Que ventos a trazem até aqui?
- Os ventos do trabalho, ma chér amiê!
– Explica, enquanto tira os óculos de sol - Consegui um papel num filme
franco-americano e estamos rodando as cenas que se passam aqui no Texas.
Lembrei de você e depois de me informar sobre sua presença aqui, dei uma
fugidinha das gravações...
- Devia ter telefonado, dear!
Estou com...
- Vem, mamãe! O papai e o tio Gi tá
esperando a gente pro lanche! – Diz Fernanda, largando Elisabeth e puxando Rosa
para dentro, mas a tempo de ouvir a resposta de Roberta.
- Telefonado? E dado a você, tempo de
esconder o Claude de mim? Francamente, Elisabeth, até parece que você não me
conhece.
- Bem, já que está aqui, venha tomar
um chá conosco. Chegou bem na hora do lanche...
Na sala, onde o lanche era
servido, Fernanda divertia-se com Gideon e suas caretas.
- Rosa, que foi, chérie? Que carinha
é essa, hã? – Pergunta Claude, aproximando-se dela e abraçando-a, ao
mesmo tempo em que vê sua tia entrando acompanhada por Roberta. – Oh, já
entendi... – Murmura.
- Claude, mon amour! – Diz Roberta,
querendo cumprimentá-lo, mas Claude não solta Rosa. - Mon Dieu, como sua...
esposa é sensível! – sarcasticamente. - Querida, você se chateou só porque
pensei que fosse uma babá? Mas que culpa eu tenho se parece uma?
- Eu posso até parecer uma
babá, querida, mas estou casada com o Claude. E você? Não está cansada
de ser trocada? – Diz Rosa, num ímpeto, arrependendo-se imediatamente. – Oh,
céus! Desculpe, tia Elisabeth, estou na sua casa e isso foi muita grosseria...
Então, se desvencilha de Claude
e sai para o jardim, novamente. Cruza toda a extensão do pequeno
bosque de tia Elisabeth, até chegar à beira do rio que cortava a
fazenda
Minutos depois, escuta passos e
a voz de Claude.
- Enton, foi aqui que se escondeu,
gatinha? Por que fugiu assim, hã?
- Eu não fugi. – Responde, sem olhar
para ele - Saí apenas para ... admirar a beleza do lugar, foi isso.
- Voilá! Posso admirar junto com
você?
- Não. Por que não volta e admira um
pouco mais sua ex-namorada?
- Porque eu prefiro admirar você,
minha namorada atual... A minha eterna namorada, oui?
- Tem certeza? Ela é alta, tem estilo
e não se pareceria nunca com uma babá, como eu! – Murmura Rosa.
- Entendi. – Diz, sentando-se ao lado
dela no balanço. - Ficou bravinha porque Roberta a confundiu com uma simples
babá. Mas você a colocou no seu lugar, usou suas garras de gatinha, hã?
Porque saiu daquele jeito?
- Porque fui grosseira, mal educada,
extremamente impulsiva e... estava com ciúmes! – Foi baixando o tom de
voz.
- E que mal tem ser impulsiva de vez
em quando hã? Non foi assim que nos conhecemos? – Disse Claude sorrindo – Que
tal sermos impulsivos agora e dar uma volta de barco?
Continua
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