domingo, 25 de setembro de 2011

IRMÃOS CORAGEM - CAPÍTULO 66



Roteirizado por Toni Figueira
do original de Janete Clair 

CAPÍTULO 66

PARTICIPAM DESTE CAPÍTULO:

DELEGADO FALCÃO
JOÃO
SINHANA
JUCA CIPÓ
CABO ELIAS
JERÔNIMO
RODRIGO
DR. RAFAEL
DIANA

CENA 1  -  GARIMPO DOS CORAGEM  -  EXT.  -  AMANHECER.

A madrugada apontava nos céus. O mundo se iluminava aos poucos, variando os tons de vermelho-claro ao vermelho-vivo, com tintas alaranjadas e meios-tons em azul-celeste. O olho do sol abria-se, preguiçosamente, por detrás das montanhas.


DELEGADO FALCÃO  -  (irritado)  Quer saber de uma coisa? Vou dar um fim nisso. Já me cansei. Agora, vai ser pra valer. Quem for valente, que me acompanhe. (fez com a mão o gesto de convite á ação)  Vai todo mundo entrar na gruna., agora, disposto a matar ou morrer.

SINHANA  -  Falcão, não faça isso! Você vai fazer de meu filho um criminoso! Ele tá só revoltado, mas não quer matá ninguém. Não obriga ele a fazê o que ele não quer.

DELEGADO FALCÃO  -  Não quer matar ninguém, não é? Vamos lá ver.

Os homens agiam com rapidez e cautela, aproximando-se da entrada da gruna. João percebeu o movimento de assalto.

JOÃO  -  (gritou com ferocidade)  Não vem ninguém! Tou pronto pra tudo!

DELEGADO FALCÃO  -  Vou te dar uma chance! (gritou)  Vou contar até 10 pra você sair. Se não obedece, vai entrar todo mundo aí atirando pra te acertar. Se você atira, também vai ser pior pra todos nós. Vou te dar um tempo. Você sai, se não quer morrer!

Diogo Falcão, com a arma em punho, iniciou a contagem. No interior da gruna, João acompanhava, esticando-se contra o chão úmido e barrento. A voz do delegado chegava-lhe, nítida, aos ouvidos acostumados ao silencio.

DELEGADO FALCÃO  -   ...3 ...4 ...5 ...6 ...7...

João conferiu o tambor da arma e tateou a munição ao lado, próximo à cabeça.


Juca Cipó acabara de chegar, trazendo mais homens, do bando do coronel. A empreitada deixava de ser da justiça, para se caracterizar em manobra de interesse pessoal do coronel, dono de Coroado.

CABO ELIAS  -  (gritou, vendo Juca desmontar, rápido)  Chegaro em boa hora! Tamo preparando uma armadilha pro João!

DELEGADO FALCÃO  -  Está esgotando o tempo, João! Vai sair ou não vai?

JUCA CIPÓ  -  (estimulava o bando)  Fogo nele! Fogo nele, Falcão! Qué que eu ajude?

DELEGADO FALCÃO  -  (fez sinal para o cabo, chamando-o)  Você entra atirando e nós seguimos na sua trilha. Assim que der o primeiro tiro, deite-se na entrada da gruna e continue a atirar. Feito? (e para João Coragem)  É a última chance, João! – 8... 9...

JERÔNIMO  -  (gritou) Cuidado, João!

DELEGADO FALCÃO  -  10...

Cabo Elias entrou atirando para o fundo do buraco. Os estampidos repetiram-se um após outro e o cabo Elias caiu, estendido, com a perna ferida. Arrastou-se, aflito, num esforço doloroso. A perna doía-lhe e o sangue empapava-lhe a calça.

JOÃO  -  (berrou, ameaçador)  Eu avisei, cambada de vagabundo, a sôldo do coronel! Eu avisei! Vai embora daqui. Vão todos pras profundas do inferno! Num acreditô, Falcão? Vem vê, de perto! Vem você, patife!

Dois ou tres companheiros arrastaram o ferido para longe da zona de tiro.


CABO ELIAS  -  Ele tá com o diago no corpo!

JERÔNIMO  -  (avançou e levantou a mão, em sinal de paz)  Pera aí, Falcão. A gente tem direito de tentá resolvê as coisa por bem. Dê um voto de confiança pra minha mãe. Ela vai lá, tentá fazê meu irmão se entregá.

DELEGADO FALCÃO  -  Pois bem!  É a última chance. A situação dele piora cada vez mais. Se o cabo Elias morrer, ele vai ter que responder por mais uma morte.

RODRIGO  -  Foi em legítima defesa, Falcão. Ou você quer torcer a lei?

Falcão fechou a cara num trejeito de ódio.


JERÔNIMO  -  Vai, mãe!  A senhora ele ouve.

Sinhana se aproximou da gruna, a passo firme.


SINHANA  -  (da entrada, avisou ao filho acuado)  João, tou indo aí pra falá com ocê.

JOÃO  -  (desconfiado)  Tá sozinha, mãe? Ou vem com algum cabra do Falcão?

SINHANA  -  Sozinha, filho. Palavra de honra!

JOÃO  -  Entra, mãe!

CENA 2  -  GARIMPO  -  INTERIOR DA GRUNA  -  INT.  -  DIA.

A mulher alcançou o ponto onde o filho permanecia emboscado. Sujo, barbado, com as mãos rasgadas pelas arestas cortantes das rochas do rio. Sinhana abraçou o filho sem demonstrar medo ou covardia.


SINHANA  -  Num vim te censurá.  Nem reclamá pelo que tu tá fazendo. Acho que tu reage como home injustiçado. Também, num digo que tu faça bem e que teu procedimento deve sê imitado. Só quero te dizê uma coisa: que te compreendo. Mas vai chegá a um ponto que tu num tem mais razão, nem saída. Te acusam de um crime que tu não cometeu. Mas há pouco tu atirô num home. Se ele morrê ocê vai arcá com toda a culpa, mesmo tudo mundo vendo que tu atirô em legítima defesa. O home atirô primeiro. Mas, pro safado do Falcão, o que vai valê é a tua resistencia.

JOÃO  -  A senhora veio pedi pra me entregá. Pra que tanto rodeio? Diz logo e acaba com isso.

SINHANA  -  O que tu me responde?

JOÃO  -  Que num dianta. Eu num me entrego!

SINHANA  -  Tu perdeu a crença, a fé?

JOÃO  -  Perdi tudo. Até o amor de Deus!

SINHANA  -  (se benzeu, recriminando o filho)  Num diz assim que é pecado!

JOÃO  -  (desiludido)  Deus me deixô.  Eu prefiro acreditá que não existe do que acreditá que ele também me traiu.

SINHANA  -  Deus tá aqui, junto de nós, filho, e tá me mandando dizê procê alimentá sua fé. Tua atitude num leva a nada. Ou melhó, leva á disgraça. E não é pouca a que caiu em riba de nós. Teu irmão mais novo taí, e precisa de ocê. Os sonho dele vão sê cortado e é por sua causa.

JOÃO  -  (com rispidez)  Eu num nasci grudado com meu irmão!  Cada um tem sua vida, seu destino. O meu, já vi que é o pior de todos. Ele que siga o dele.

SINHANA  -  (bateu com as duas mãos nas coxas grossas)  Tua resposta é não?

JOÃO  -  É. Não.

A velha procurou uma rocha saliente no solo úmido e se sentou, prendendo a saia entre os joelhos.

SINHANA  -  Tá bão. Então eu fico com ocê. O que te acontecê de mal, acontece a mim, também. Prefiro morrê, varada por uma bala do Falcão, do que vê meu filho acuado como uma fera perigosa. (João tentou dizer qualquer coisa; Sinhana cortou-lhe a palavra)  E num dianta. Daqui só saio morta, ou com ocê, pra se entregá por bem.

CORTA PARA:

CENA 3  -  GARIMPO  -  EXT.  -  DIA.

O dia ia alto, quando Sinhana despontou na bôca do esconderijo.


SINHANA  -  Trago uma resposta do meu filho.

JERÔNIMO  -  Ele vai se entregá, mãe?

SINHANA  -  Vai. Por minha causa. Pra que se acabe com essa situação. Mas, tem que tê garantia de que ninguém vai traí ele.

DELEGADO FALCÃO  -  Manda ele entregá as armas (ordenou)  E tem minha palavra de que nada lhe acontece.

Sinhana voltou-se para a entrada da gruna e chamou pelo filho.

DELEGADO FALCÃO  -  (ordenou, enérgico)  João vai se entregar, minha gente! Ninguém atira. Eu me responsabilizo por ele!

O rapaz apareceu na boca da caverna, empunhando o revólver e com a mão esquerda á guisa de anteparo sobre os olhos, protegendo-se da luminosidade do dia. Era uma figura coberta de barro. O cabelo tornara-se amarelado, com pedaços de terra grudados ás longas mechas negras. No rosto, barro. No peito, barro. João parecia uma figura talhada em barro, a despontar na entrada escura da gruna.

DELEGADO FALCÃO  -  Jogue sua arma fora! (gritou,  atento aos movimentos do rapaz)

SINHANA  -  (reforçou a ordem)  Filho, tu prometeu!

Num gesto de indignação, João Coragem atirou as armas no meio das águas tranquilas do rio. Sinhana correu a abraçá-lo.
JUCA CIPÓ  -  (gritou, histèricamente)  Agarra ele, gente! Agarra! Ele escapa...

DELEGADO FALCÃO  -  Fique quieto, Juca... Tudo vai dar certo.

A um sinal do delegado, os homens agarraram o garimpeiro, dobrando-lhe os braços por trás das costas. João não reagiu. Acomodou-se ao seu destino. Dias piores estariam por chegar.

CORTA PARA:

CENA 4  -  RIO DE JANEIRO  -  CONSULTÓRIO DO DR. RAFAEL  -  INT.  -  DIA.


O médico insistia, Diana reagia. Rafael avizinhou-se da moça, com ar divertido. Diana fumava, soltando baforadas contra o rosto do especialista.

DR. RAFAEL  -  Está querendo se divertir comigo, Diana?

DIANA  -  Não estou fazendo nada, meu bonitão. É você que está me obrigando a mofar aqui, nesta sala, enquanto eu tenho tanta coisa pra fazer lá fora. Há duas horas, ou mais, sei lá, que estamos aqui, como dois paspalhões, um olhando para o outro, sem fazer nada. Ao menos... se você tivesse uma vitrola, com alguns discos bacanas, a gente podia dançar. Que tal a idéia? Assim o tempo passa mais depressa...

DR. RAFAEL  -  Diana, estou aguardando sua resposta. Vamos acabar com essa brincadeira. Me diga, honestamente, o que fez da arma de seu pai.

DIANA  -  De que adianta eu dizer, se você não acredita em mim? Pra você eu não passo de uma mentirosa, de uma imoral e não sei o que mais.

DR. RAFAEL  -  Eu quero acreditar.  Conte tudo o que lhe aconteceu naquela noite em que você saiu disposta a matar Lourenço.

Lara tornou a sentar-se sobre a mesa, cruzando as pernas, sem se importar com a presença do homem á sua frente. Alisou as pernas, sensualmente, antes de responder.

DIANA  -  Legal! Vou te dar o serviço direitinho. Escuta só. Como já disse, saí armada da casa de Pedro Barros. Peguei o carro, etc., etc., e fui parar no clube, onde eu sabia que aquele cachorro costumava ir. Lá me disseram que ele estava bebendo num bar que há ali perto. Um bar vagabundo. Sabe como é? Esses de estrada, cheio de mulher pilantra... Aí eu fui pra lá. Procurei o sem-vergonha e o dono do bar me disse que ele já havia estado lá, mas que tinha saído. Resolvi tomar um trago, pra esquentar... Logo, um cara se engraçou comigo. Topei a brincadeira. Estava a fim de me divertir, já que não havia encontrado Lourenço. Bebi mais. Bebi muito e saí fora do sério. O cara me convidou: “Como é, beleza, vamos embora?” – Disse pro otário: - “Não vou a lugar nenhum com você. Não sei quem você é... Aí ele veio com a história de que não tinha pago toda a bebida pra levar um fora. Tentou me agarrar. Esperneei, enquanto todo mundo ria, dentro do bar. O cara me arrancou pra fora e me levou pro caminhão dele. Era chofer de estrada. Foi aí que tirei o revólver da bolsa e o ameacei. “Tá pensando que eu sou de graça, mocinho?” O cara era vivo e forte e, num descuido meu, roubou minha arma, jogando-a fora. Foi aí que corri, entrei no meu carro e saí em disparada. O sujeito ficou esbravejando feito um touro que perde a vaquinha na hora H. Tá aí toda a história da arma. O camarada jogou ela longe. A sorte foi que ele se conformou e não me seguiu. Se você acredita ou não, é problema seu. Mas, a gente pode ir ao tal bar e você vai ver como todo mundo diz que foi verdade. Quem sabe o carinha não anda por lá, ainda?

DR. RAFAEL  -  Não acredito na sua história.  Só estou desolado vendo as complicações em que você se envolve. Aonde quer que Diana vá. Maria de Lara irá também. E isso quer dizer que, se você se portar mal, quem sofrerá as consequencias será ela.

DIANA  -  Já sei, já sei (disse, impaciente)  Não me venha de novo com aquela história da camisa-de-força e grades de ferro.

DR. RAFAEL  -  É o destino que te espera, Diana, se você não se portar bem!  

Diana fez uma pequena pausa para acender outro cigarro.

DIANA  -  Bem, em resumo, o que vai ser de nós duas? Quem vai vencer no final da história, eu ou ela?

DR. RAFAEL  -  Na verdade, há poucos casos como o seu na literatura médica. Minha primeira esperança é achar em vocês uma maneira de conseguir uma personalidade estável.

DIANA  -  Como?

DR. RAFAEL  -  Fazendo com que vocês duas se fundam numa só, se é que isso pode ser atingido. Combinando as melhores qualidades de cada uma, para fazer um caráter forte e consciente. (tirou um lenço do bolso e enxugou a testa, molhada de suor)  Bem... agora pode se despedir, Diana. Eu já sei o suficiente. Quero falar com Lara.

A moça fez um muxôxo e abanou a cabeça, em sinal de negação. Soprou mansamente a fumaça para o teto. Ao falar a voz não traía a mínima emoção.


DIANA  -  Quem disse que eu quero ir embora? (olhou para o médico com ar zombeteiro, sorrindo silenciosamente)  Agora, chegou a minha vez, doutor. Ela que se arranje. Eu não vou voltar tão cedo. Vou ficar até... quando quiser. E tem mais: já vou dando o fora. Isto aqui, tá cada vez mais chato...

Foi até a porta, endireitou a saia e desapareceu sem dar tempo ao médico de tentar impedi-la. Rafael correu ao telefone. Na portaria alguém atendeu.


DR. RAFAEL  -  Alô! Aqui é o Dr. Rafael. Minha cliente, Diana Lemos, vai tentar deixar a clínica. Impeçam-na de qualquer maneira. Não a deixem sair! Chego já aí!

Desligou, batendo com força o fone no gancho.

FIM DO CAPÍTULO  66
Sinhana entra na gruna e tenta convencer o filho a se entregar.

e no próximo capítulo...


*** DUDA E RITINHA, NO RIO DE JANEIRO, FICAM DESOLADOS AO RECEBER NOTÍCIAS DE COROADO E SABER QUE JOÃO ESTÁ PRESO!

*** FAUSTO PAIVA, MUITO ABORRECIDO COM A INSISTENCIA DOS DIRETORES DO FLAMENGO EM MANTER DUDA NO TIME, PEDE DEMISSÃO!

*** DIANA REAPARECE EM COROADO, NA CASA DO PAI, DIZENDO QUE VAI DESMASCARAR TODO MUNDO!

NÃO PERCA O CAPÍTULO 67 DE

2 comentários:

  1. Triste essa cena de João decidindo se entregar, coberto de barro! Juca Cipó, querendo ver sangue, que criatura repugnante! E Diana, sempre divertida, e sempre se metendo em confusão! Gostei desse capítulo, Toni. Bjs.

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  2. Maria do Sul, mais uma vez, obrigado pelos seus comentários! Diana é muito engraçada, eheheheh No próximo, vai botar pra quebrar em Coroado!

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