Depois que Duda e Ritinha partiram, a vida em Coroado continuou quase igual. A disputa entre Pedro Barros e os irmãos Coragem intensificava-se. O dr. Rodrigo, promotor de Justiça aliado a Jerônimo e João, achava que deviam desmascarar Lara.
- Ela é uma aventureira que posa de santa - definiu o promotor numa reunião dos três.
- Hoje mesmo vi a sem-vergonha na casa do coronel - interveio Jerônimo. - Reconheci ela, é a mesma que furtou o perfume. E você ainda tirou ela da cadeia, João!
- Acho melhor deixar a moça em paz, gente. Eu ... nós não temos certeza de nada! E se as duas não forem a mesma? Com que cara a gente vai ficar?
Diana estava de volta. Surgiu no casebre de Braz e pediu a Cema que fosse chamar João.
O jovem garimpeiro atendeu de imediato ao convite.
- Cadê ela, Cema? - perguntou, impaciente, ao chegar.
- Acho que está no rio, tomando banho - respondeu Cema.
João correu para o riacho. A moça acabava de se vestir quando avistou o garimpeiro.
- Ei, grandalhão! Vem cá!
João aproximou-se, receoso. Ela deixou a margem do riacho e, puxando-o pelo braço, levou-o até perto das águas.
- Voltei pra você. Sou sua, não sou?
João não resistiu à magia daquele momento.
Passaram juntos longas horas desfrutando o prazer do reencontro. Depois, João resolveu assumir publicamente o amor que sentia pela estranha mulher. Levou-a à casa de seus pais.
Da porteira do rancho, Potira, a índia mestiça de cabelos longos e olhos sombrios, criada pela família Coragem desde criança, avisou:
- João vem aí... com uma moça muito bonita.
Ele apeou e retirou Diana da garupa do cavalo, com gentileza. Quando o casal entrou na casa, Jerônimo enfureceu-se:
- Ô, João! Como você traz uma inimiga pra cá?
- Olha aí, grandalhão. Estão pensando que sou aquela cretina - comentou Diana, com uma gargalhada.
- Ela não é outra, João! É a filha do Pedro Barros ... - insistiu Jerônimo.
- Conheço essa aí, a Lara. É uma cretina, metida a besta. Tenho até pena dela - replicou, a jovem.
Jerônimo considerava aquilo tudo um truque de Pedro Barros.
Sinhana, possessa, concordava com Jerônimo.
- Diz pra eles, grandalhão - pediu Diana. - Conta o que foi que você decidiu a meu respeito!
Após muito hesitar, João comunicou que resolvera se casar com Diana. Sinhana, Jerônimo e Sebastião ficaram muito assombrados, mas respeitaram a decisão do garimpeiro, que não era criança e sabia o que lhe convinha.
Diana ficou morando com os Coragem durante algum tempo, enquanto João providenciava o necessário para oficializar aquela união.
Mas uma tarde, quando lavava os pés, queimou-se acidentalmente com água fervendo. A dor na perna pareceu fazer-lhe ver as coisas de outro modo, pois logo em seguida resolveu ir embora. Capengando, dirigiu-se ao centro de Coroado, onde pretendia pegar um ônibus ou uma carona.
João só chegaria tarde da noite e todos em casa ficaram preocupados com sua reação. Tanto assim que Sinhana acordou com o tropel ainda longínquo do cavalo de seu, filho mais velho.
Jerônimo também se levantou da rede onde dormia, para contar ao irmão o ocorrido. Sinhana aproximou-se do quarto de João, receosa do resultado da conversa entre os dois.
João entrou e estranhou a ausência de Diana. Jerônimo, querendo amenizar a decepção de seu mano, começou a atacar o que julgava ser futilidade da jovem:
- Ela não sabe o que é um lar, João. Não conhece honra, moral, nada disso!
- Já te pedi para respeitar minha mulher, Jerônimo - irritou-se João.
- Falar a verdade não é desrespeito!
- Jerônimo, a gente nunca brigou... Não vamos começar hoje, está bem?
Enrolada num xale, Sinhana interrompeu a discussão:
- Diz logo pra ele o que aconteceu, Jerônimo.
E, como o rapaz hesitasse, ela mesma contou:
- Sua noiva foi embora, João.
João ficou estático. Depois perguntou num fio de voz:
- A senhora mandou ela ir, mãe? Ou foi você, Jerônimo?!
- Ela foi de gosto, filho.
- De gosto não pode ser! Não pode ser!
João saiu furioso, batendo a porta.
Passou o resto da noite procurando por Diana no centro de Coroado, nos arredores do barraco de Braz e em outros lugares onde haviam estado juntos. Mas era como se a estranha moça tivesse desaparecido no ar. Ou como se nunca tivesse existido.
A passagem de Diana pelo rancho dos Coragem deixara marcas também em outras pessoas. Alguns dias depois da partida da jovem, Jerônimo chegou em casa para almoçar e assustou-se com o comportamento de Potira.
Fumando ostensivamente, a índia aproximou-se dele, encostouse nele, numa imitação muito canhestra dos trejeitos vulgares e sensuais de Diana.
- E aí, Jeromo? Tudo legalzinho? - perguntou ela.
- Tá doente, índia? - estranhou ele.
- Doente de amor, de vontade de rir, correr, ser livre. De amar quando quero. E quero agora!
Enlaçou o pescoço de Jerônimo e beijou-o na boca. Apesar do espanto, o rapaz entregou-se aos carinhos da irmã de criação. Do fundo da sala, Sinhana assistia a tudo. Angustiada, procurou refúgio no sossego do quintal. Jerônimo, após os primeiros instantes de excitação, reagiu com violência, batendo no rosto de Potira.
- Vagabunda! Precisa tomar vergonha nessa cara!
Potira começou a chorar, com a cabeça baixa.
No garimpo dos Coragem, o dr. Rodrigo comentava o fim da gestão do presidente da Associação dos Garimpeiros. Logo seria escolhido seu sucessor.
- Acho que é uma oportunidade de vocês elegerem um homem que defenda os interesses dos garimpeiros, e não os de Pedro Barros. Você pode ser esse homem, João.
O moço balançou a cabeça negativamente. Preferia continuar procurando diamantes. Ainda ia achar a maior pedra do mundo! O dr. Rodrigo não se deu por vencido. Foi falar com Jerônimo.
Impulsivo como era, Jerônimo não se sentiria à vontade num cargo político. No entanto, percebeu a importância de ocupar aquela posição estratégica, vital na campanha contra a exploração dos garimpeiros, que eram obrigados a vender as pedras que achavam, por qualquer preço, ao coronel Pedro Barros, dono de quase todas as áreas de garimpo. Aceitou disputar a eleição.
A notícia correu de boca em boca e logo Juca Cipó a transmitia a seu chefe.
O coronel estremeceu. Seus olhos amiudaram-se. Com raiva, atirou o charuto a distância e virou-se para o delegado, que almoçara com ele:
- Falcão, como é que você deixou isso acontecer?
- Não dava pra impedir. Qualquer homem livre pode se candidatar a esse cargo.
- Então é verdade mesmo?
Falcão confirmou. Pedro Barros decidiu:
- Agora a gente não pode facilitar. Os Coragem declararam guerra e vão ter guerra.
Mas João Coragem não procurava guerra. Queria paz, queria amor, e buscava consolo na igreja. Foi num pôr-do-sol, quando terminava de rezar uma ave-maria, que percebeu Lara num canto da igreja. Pela atitude contrita sabia que a moça não era Diana, mas havia tanta semelhança que ele não resistiu e aproximou-se, esperançoso.
- Boa tarde...
- Olá, João.
- Você... você é a filha do coronel ou a minha Diana?
- Sou Maria de Lara.
Lara, evidentemente, já sabia da existência de Diana e também que a outra se parecia muito com ela. Desejava que João lhe apresentasse a moça, quando a encontrasse de novo.
- Diga que eu preciso vê-la... Orientá-la, se puder. Coitada! Deve ser muito infeliz.
Em meio à conversa, João percebeu que a perna de Lara estava enfaixada. Imediatamente lembrou-se da queimadura de Diana. Lara estava ferida no mesmo lugar!
- Que foi isso na sua perna?
- Isso? - perturbou-se Lara. - Ah, sim... foi hoje de manhã... ou ontem, não sei... Às vezes eu fico um pouco atordoada... é que sinto muita dor de cabeça e...
Ainda perturbada, Lara despediu-se e deixou rapidamente a igreja. João não aceitou bem tanta coincidência. O mesmo rosto, o mesmo ferimento... Um dia haveria de descobrir tudo.
Lara também queria descobrir tudo. Entrou no carro pensando na conversa que tivera com Dalva a respeito do ferimento na perna. A tia lhe dissera que ela se machucara com um caco de espelho, num de seus desmaios. Mas a perna estava queimada, e não cortada!
De volta à fazenda, tornou a falar com sua tia.
- Não me sinto nada bem. Perco a noção de tempo... De repente, parece que sonho que estou em outro lugar, na companhia de um estranho. Faço coisas absurdas, não sei... Sei que esse homem me diz coisas ingênuas mas muito ternas, como se houvesse um relacionamento muito profundo entre nós. Tenho medo de enlouquecer, tia. Precisamos voltar para o Rio!
- Seu pai acha que você já ficou muito tempo fora de casa. Mas não se preocupe. Já contei a sua mãe sobre suas crises anteriores de amnésia. Estela ficou muito preocupada com sua saúde e só não chamamos ainda um médico ou um psicólogo porque precisamos antes preparar as coisas com o Pedro.
- Sim, tia, estou de acordo, mas não me deixe sem socorro. Tenho medo de fazer alguma besteira com o... com esse estranho!
Quem não tinha nenhum medo de João Coragem era Diana Lemos. Ela voltou alguns dias depois e encontrou-se com o noivo num descampado onde gostavam de ficar.
- E agora? Como é que te chamo? Lara ou Diana? – perguntou o garimpeiro.
O riso abusado da moça convenceu-o. Era Diana mesmo. Ela lembrou-o do casamento.
- Se prepare. Vou te tirar daqui - respondeu João.
- Daqui pra igreja?
- Não. Cheia de pecado como é, você não pode entrar numa igreja.
João disse que antes pretendia salvar Diana, regenerá-la. A moça abraçou-o com ternura. Ele procurou desvencilhar-se, mas ela o agarrou mais forte, encostando os lábios no rosto dele.
- Gosto um bocado de você, grandalhão. Ela, a Lara, também está começando a se apaixonar. Mas ela luta pra não ceder ao amor, ao desejo...
- Ela, quem? A filha de Pedro Barros?! Você falou com ela? - surpreendeu-se João.
- Falo sempre - respondeu Diana, enigmaticamente.
Passaram algum tempo trocando beijos e carícias e depois foram até a cidade. Diana não tinha documentos e João queria que o dr. Rodrigo os orientasse quanto à papelada necessária para o matrimônio civil.
Em Coroado, ficaram sabendo do misterioso assassinato do prefeito Jorginho. Pedro Barros acabava de voltar do enterro e avistou o casal. Pensou estar diante de sua filha. Chamou-a pelo nome:
- Lara! Venha aqui, menina!
Diana virou-se irritada, ostentando um olhar de fera ferida:
- Vai procurar sua filha na igreja, velho! A cretina não faz outra coisa senão rezar. Sabe por quê? Pra compensar diante de Deus os teus pecados!
Pedro Barros não queria acreditar no que via e ouvia. Passou a acusar João:
- O que foi quê você fez com ela, canalha?!
- Eu? Nada. Essa aqui é outra. Pelo menos é o que ela diz. Que não é Lara, sua filha.
- Mas como é possível?! Será que estou ficando louco?
Pedro Barros partiu em direção à fazenda, para confirmar suas suspeitas.
- Lara! Lara! - gritou, entrando na casa-grande.
Estela apareceu no alto da escada.
- Ela ainda está no quarto, Pedro!
Barros exigiu a presença da filha. Estela bateu à porta do quarto.
Dalva abriu.
- Que é?
- Será que posso falar com minha filha? Há dois dias que você não nos deixa entrar no quarto, alegando que a menina está com febre... isso não pode continuar, Dalva...
- Então veja você mesma...
Estela olhou o interior do quarto.
- Onde... onde está ela? - perguntou, visivelmente transtornada.
- Há dois dias que venho mentindo. Desde anteontem ela não está em casa - esclareceu Dalva.
Acostumado à verdade, a jogar limpo, João Coragem não se conformava com a ambigüidade da situação. Precisava saber claramente se Diana Lemos existia ou se era uma farsa de Maria de Lara Barros. Sem esclarecer de vez esse aspecto, não se casaria.
Por isso propôs a sua amada que fossem à casa de Pedro Barros.
- Aquela gente é muito chata, muito baixo astral - alegou ela.
Ele insistiu, acabaram discutindo violentamente. Diana conhecia e usava todos os palavrões. João irritou-se e agarrou-a pelos braços, com toda sua força descomunal, disposto a levá-la de qualquer modo à casa-grande e colocá-la face a face com Maria de Lara.
Diana reagiu com agressividade, esperneou, chutou seu companheiro. Depois, de repente, parou de lutar e soltou um grito que nem parecia humano. Então começou a balbuciar:
- Meu Deus, não é um pesadelo. Eu estou aqui mesmo...
- O que houve, Diana?!
- Eu não sou Diana, João Coragem. Você sabe muito bem que me chamo Maria de Lara...
Potira, que fora atraída pelo bate-boca, assistia atônita à metamorfose, à transformação de Diana em Lara.
- Vamos chamar o padre, João! - aconselhou ela, apavorada.
Saíram apressadamente. Lara ficou ajoelhada, rezando, enquanto lágrimas lhe corriam pela face.
Uma hora depois João retomou com o padre Bento.
- Ah, padre, que bom ver o senhor - exclamou Lara, erguendo-se e beijando-lhe a mão.
- O que você está sentindo, Lara?
- Não sei, padre! Não sei como vim parar aqui, não sei o que faço em companhia do... do senhor João Coragem...
- Droga, droga! - berrou o garimpeiro esmurrando uma parede - Isso tinha de acontecer justo comigo?!
Padre Bento levou Lara para a fazenda de Pedro Barros. João Coragem saiu em sentido oposto. Precisava cavalgar por lugares desertos, pensar, pôr as idéias em ordem.
Mais tarde, quando a família se reuniu para o jantar, Potira contou a Sebastião, Sinhana e Jerônimo o que ocorrera.
- Acho que encosta um espírito mau nela - diagnosticou o velho Coragem.
- Espírito nada, pai! É tudo fingimento da filha daquele diabo, como eu sempre disse - discordou Jerônimo.
Sinhana interveio:
- Você fica alegre porque tinha razão e esquece o sofrimento de seu irmão.
- É melhor sofrer tudo de uma vez do que viver sonhando com um amor impossível - respondeu Jerônimo, olhando veladamente para sua irmã de criação.
Alguns dias mais tarde Jerônimo e sua mãe partiram para o Rio e Janeiro, atendendo a um chamado de Rita.
OFEREÇEMOS O CAPÍTULO DE HOJE À CRIS, DE PRUDENTE, E À MARAÍSA, AMIGAS QUERIDAS DO MURAL DA URCA.
Os capitulos de irmao coragem estao cada dia melhor parabens........eh muito legal a historia....beijjao =)
ResponderExcluirEssa história de João Coragem e Lara/Diana rendia muito! Era muito sofrimento, confusões até o problema ser solucionado, já no final da novela! E Jerônimo e Potira também tinham uma história cheia de sofrimento! Mas mesmo assim gosto muito de lembrar, obrigada JE! Bjs.
ResponderExcluirConcordo com Lete, esta cada vez melhor os capitulos. Hoje quase deu nó foi na minha cabeça, rsrs, Lara/Diana/Lara. Vem muita emoção por ai com certeza. Beijos
ResponderExcluira todos.