XXV
- Eu sinto tanto interromper vocês, mas
meu marido quer te cumprimentar, Claude! - A irônica voz de Nara atravessou o
momento.
- Nara! - Diz Claude, afastando-se de
Rosa, sem olhar em sua direção - Non sabia que estava por aqui novamente. –
Fala como se a ignorasse.
- Nara insistiu em passar nossa
lua-de-mel no Brasil.
Claude escutou aquela voz carregada no
sotaque francês e apertou os lábios. Era muita audácia de Nara. Olhou para o
dono da voz e disse:
-
Edmond Bouygues! - Disse sem nenhuma emoção na voz – Enton Nara, conseguiu o
que queria? – Sua voz passou a ter um tom tão irônico quanto o de Nara. –
Casar-se com um engenheiro francês...
-
Ah, Claude, não me diga que agora está com ciúmes? – Pergunta Nara,
divertindo-se com a situação.
Rosa
fecha as mãos, apertando-as até sentir as unhas entrarem em sua pele. Nara era
realmente insuportável e mesquinha.
-
Pardon por decepcioná-la, Nara, mas você non é o centro da minha atençon.
Ciúmes é algo que sentimos do que amamos. Mas non creio que sua mente pequena
vá entender isso. – E sem dar tempo de resposta, enlaça Rosa pela cintura e
continua - Rosa, mon amour, esse é Edmond Bouygues, engenheiro que atua nas
áreas de telecomunicações e construçon civil. É a maior empresa do ramo da
França. Digamos que eu era seu adversário antes de vir para o Brasil.
-
Muito prazer, Sr. Bouygues. É uma honra tê-lo em nossa festa. – Responde Rosa o
mais educadamente possível.
- O
prazer é meu, Srª Geraldy, encantado! Nara, devia ter sido mais honesta ao se
referir à senhora. – Diz de maneira simpática.
Nara
fica visivelmente contrariada e diz de maneira desdenhosa:
-
Oras, eu apenas disse o que vi. Que a esposa de Claude era uma mulher simples e
comum.
-
Pelo que eu vejo, Nara querida – Diz Edmond – de simples e comum, ela não tem
nada. – E voltando-se para Claude, continua - Claude, eu soube que vocês
venderam a Construtora Geraldy. Devia tê-la me oferecido, esquecendo nossas
diferenças...
- Eu
até faria isso, Edmond. Mas a oferta foi ton boa e num momento especial de
minha vida, que non pensei duas vezes. E non me arrependo. Rosa e nossa filha
son o que existe de mais importante para mim.
- Eu
adoraria ter um filho, mas Nara não quer. Insistiu até em colocar isso em nosso
contrato pré-nupcial.
-
Uma pena, Edmond. Fernanda, minha filha, é meu melhor projeto, hã? Ser pai é
uma experiência fantástica!
- Quem sabe um dia sua esposa, mude de ideia, Sr. Bouygues. – Diz
Rosa gentilmente.
- Não
conte com isso, querida! Eu não vou arruinar meu corpo só para satisfazer um
desejo de outra pessoa.
-
Tenho certeza que non, Nara. Você é egoísta demais para isso e mestre em
arruinar pessoas. – Retruca Claude, referindo-se aos seus projetos roubados por
Nara...
-
Vocês fizeram reserva? Não lembro de ter visto seus nomes em nenhuma lista de
hóspedes dos chalés... – Diz Rosa, tentando mudar o rumo da conversa.
-
Oh, não, minha cara! Foi coincidência encontrarmos alguns amigos no mesmo voo
para o Brasil. Quando comentaram para onde e porque estavam vindo, aqui no
Brasil, Nara fez questão de passar por aqui para apreciar esta festa, que por
sinal está perfeita, Claude. Parabéns!
-
Non é minha festa. É um projeto do Clube do Laço e da Prefeitura da cidade. Eu
apenas cedi a fazenda e assinei como responsável técnico pelas instalações...
Eu non tenho por hábito fazer sucesso com projetos alheios, Edmond.
-
Claude, Claude! Você ainda não esqueceu aquela pequena espionagem industrial da
qual foi alvo...
- Pequena?
Você descaradamente se apossou e usou o meu projeto e eu fui
acusado de plágio! Quase perdi minha licença como engenheiro, hã? Quer saber?
Você e Nara se merecem! Aproveitem o fim da noite. - E sai dali com Rosa.
Caminharam
até a casa da piscina em silêncio. Rosa sentia a tensão de Claude pelo modo
como a abraçava. A presença de Nara e seu marido não fazia bem a nenhum dos
dois, pensava ela, enquanto entravam em casa.
Rosa
vai direto ao quarto de Fernanda e dispensa Dadi, que fizera questão de ficar
com a menina.
-
...e obrigada de novo, Dadi. Amanhã, você vai aproveitar a festa e se divertir,
ok? A Fer vai comigo, não pretendo ficar muito tempo por lá. – Diz, enquanto
acompanha Dadi até a porta.
Vai
para seu quarto. Claude saía do banho.
- Claude... Está tudo bem, meu amor? Você parece irritado.
-
Non é irritaçon, Rosa. Estou inconformado com a cara de pau de Edmond e Nara,
hã? Depois de todo mal que me fizeram, agem como se fossem meus melhores
amigos!
-
Creio que até amanhã não irão estar mais aqui... Eu vou tomar um banho também,
já volto.
- D’accord.
Enquanto isso, vou dizer boa noite à nossa borboletinha, oui?
Minutos
depois, quando Rosa sai do banho, escuta Claude falando ao celular.
-
Como é que é Dadi? Ela insiste em ficar na casa da fazenda? Mas era só o que
faltava! Estou indo aí.- Diz, desligando o celular.
-
Quem quer ficar na casa da fazenda, Claude?
-
Nara. É uma abusada mesmo. Disse que se non temos chalés disponíveis, ela tem o
direito de passar a noite na casa, como amiga que é da família e como meus pais
já eston dormindo, Dadi non soube o que fazer.
- E
você vai até lá? Deve ser exatamente o que ela quer! – Diz Rosa sentida.
-
Ah, non gatinha! Sem crise de ciúmes, hã?
-
Ah, ok... Pensei que tinha o direito. Afinal “ciúmes é algo que sentimos do
que amamos”. – Repete o que Claude dissera à Nara, sentando na cama.
-
Voilá! - Claude senta-se ao lado dela – Enton, como você me ama, tem o direito
de sentir ciúmes. Mas non viaje na maionese, hã? Eu vou lá apenas para evitar
mais problemas. Quer ir comigo?
- Não...
Não podemos deixar nossa borboletinha sozinha. Além do que... Não gostaria de
ver Nara nunca mais. Eu acho até que nem mesmo o seu amigo merecia esse
castigo...
-
Ainda bem que ele non é meu amigo. E non gostei do modo como olhou pra
você... Parecia o lobo mau olhando para a Chapeuzinho Vermelho.
-
Opa! Tem mais alguém com ciúmes por aqui? – Diz Rosa, sorrindo.
- Direitos iguais, chérie. Eu a amo,
logo tenho o direito, d’accord? E se você estiver acordada, quando eu voltar,
vou fazer mais do que apenas falar que te amo. – Claude diz, levantando-se e
passando os dedos pelo rosto de Rosa carinhosamente.
Quando
já está saindo do quarto, escuta Rosa chamá-lo:
-
Claude...
-
Oui, gatinha? – Pergunta, voltando-se para ela.
- Se
eu estiver dormindo... você me acorda?
-
Seu desejo é o meu desejo, gatinha... – Diz, piscando para ela e saindo para a
casa da sede.
Quando
chega, tanto François quanto Joana haviam descido, pois Nara estava
visivelmente descontrolada e exigia em alta voz ser hospedada na casa.
Considerava-se amiga "íntima" da família e não iria se arriscar na
estrada àquela hora da madrugada.
Edmond
tentava acalmá-la e trazê-la de volta à razão, mas isso só fazia com que Nara
se exaltasse ainda mais. François, sem ver outra alternativa, acaba concordando
com o pernoite de Nara, que ameaçava até convencer o grupo de amigos franceses
a abandonar a fazenda, cancelando a estadia. Como o grupo tinha várias
atividades agendadas pagas à parte da festa, Claude, embora contrariado, acabou
concordando.
No
dia seguinte, Nara engenhosamente uniu- se ao grupo francês e todas as suas
atividades diurnas, como trilhas com passeios em cachoeiras e nascentes, tendo
Claude e Rosa como guias.
Nara
insinuava-se para Claude deslavadamente, criando um clima tenso e desagradável.
À
noite, Claude e Rosa não tinham compromisso com a festa, de maneira que puderam
aproveitá-la ao lado de Fernanda.
Tia
Elisabeth também chegou, pela manhã, no segundo dia da festa. E sem cerimônias
instalou uma tenda mística: búzios, tarô, runas, bola de cristal, I ching,
oráculo indiano, moedas, mandala, cabala, numerologia... Tudo que permitisse
uma previsão sobre o futuro.
Cobrava um valor simbólico de dois a cinco reais e o total
arrecadado seria repassado a uma entidade beneficente do município.
A
tenda foi o maior sucesso. Como dizia tia Elisabeth, mesmo quem não acredita
sempre tem a curiosidade de saber sobre o futuro.
Nara
também tinha. E foi se consultar logo no início da noite. Tia Elisabeth
concentrou-se e tentou afastar toda antipatia que sentia por Nara, pois sabia
que o emocional poderia interferir em suas intuições durante a leitura das
cartas do tarô, o oráculo que Nara havia escolhido.
Elisabeth
embaralha as cartas e as coloca em forma de leque sobre uma toalha vermelha com
símbolos místicos que cobria a mesa redonda. Pede a Nara que escolha três
cartas, um dos métodos de adivinhação através do tarô.
Depois
de escolhidas e retiradas do leque, tia Elisabeth as revela, virando-as com a
imagem para cima.
- O
Papa, a Lua, o Carro... – Diz pausadamente, balançando a cabeça de um lado para
outro – A carta do Papa significa que você deve buscar seu equilíbrio em
valores religiosos... porque as mudanças quando surgem vão trazer crescimento e
evolução, através do desenvolvimento de princípios como o altruísmo, a
paciência e a serenidade. A carta da Lua! - Continua Elisabeth - Representa os
medos, as ansiedades e as emoções em conflito, que a paralisam diante de uma
tempestade emocional e pede a você que busque a tranquilidade através do
relaxamento e da paz interior. A terceira carta, o Carro... Incrível! Fala
exatamente sobre isso que você precisa ter: equilíbrio entre corpo, mente e
emoções e no controle consciente dos impulsos agressivos.
-
Não entendi absolutamente nada, Elisabeth! Poderia ser mais clara?
-
Basicamente, darling, as cartas estão aconselhando você a usar sua sabedoria
para ajudar a si mesma, pois, não se pode alcançar a vitória a qualquer custo,
sem considerar o outro, tendo como objetivo apenas a satisfação do próprio ego.
-
Quanta balela! Nem sei por que me dei ao trabalho de ouvir essas asneiras!
- Se você pensa assim, meu bem, acaba de confirmar o que elas
disseram – Diz, apontando as cartas - A verdade está aqui...
-
Bobagem! Eu nem acredito nisso! Foi só por curiosidade que vim! – Diz,
levantando-se, jogando uma nota de dois dólares sobre a mesa e dando alguns
passos para trás.
-
Pois bem, eu vou tirar uma última carta para confirmar essas advertências... ou
não! – Fala Elisabeth e puxa uma outra carta do leque, sorrindo vitoriosa. - Os
enamorados! - Nara para e se volta para Elisabeth - Dúvida para realizar
escolhas... para encontrar dentro de si a força de assumir, sozinha, a responsabilidade
por qualquer ação que pratique... O que você está tramando, Nara?
-
Elisabeth! Não se deixe levar por essas suas crendices... Eu estou apenas em
lua-de-mel... Obrigada por me fazer perder meu tempo com essas babaquices!
Nara
caminha para sair da tenda. Mas antes de sair, ainda escuta as últimas palavras
de Elisabeth:
-
Cuidado com seus pensamentos, Nara! Alguém sensível o suficiente pode
escutá-los... Não se esqueça da lei do retorno. Imaturidade e recusa em
responsabilizar-se pelos próprios atos só lhe trarão complicações. Lembre-se
que a paz só pode ser alcançada através de atitudes conscientes.
Nara
olha para Elisabeth e diz, antes de sair rapidamente da tenda:
-
Não acredito em nada disso. Então, nada disso é verdade para mim, Elisabeth.
Assim
que Nara sai, Elisabeth recolhe as cartas e as joga rapidamente. Sua expressão
é de consternação, quando examina as novas cartas, que tirara pensando em
Claude e Rosa.
“Preciso
adverti-los... Mesmo que achem isso uma bobagem. As energias de Nara não são
nada boas... para ninguém. Nem para ela mesma. Meu consolo é saber que Nara
terá que assumir a responsabilidade por suas escolhas” – Pensa, recolhendo
todas as cartas.
Continua...
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