quinta-feira, 7 de março de 2013

FIC - BORBOLETAS NO CORAÇÃO - CAPÍTULO 10 - AUTORA: SÔNIA FINARDI

X

- Non... Eu non vou pô-la no chão...
Claude atravessou o pátio com Rosa em seus braços... Essa parecia ser a melhor opção no momento.
- Droga, Claude! Você não devia brincar assim comigo! Não precisava fazer o que fez pra me mostrar novamente que “sou mulher”!
Desviou o olhar para ela.  Não conseguiria dormir se a deixasse pensar assim. Respirou fundo em busca de controle.
- Eu nunca brincaria contigo dessa maneira, gatinha...
- Você é um ser desprezível! – Diz Rosa, sem muito controle na voz e nos pensamentos – Uma hora diz que me quer, depois me deixa na saudade...
- Se vai ficar na saudade, a culpa é sua! Por que bebeu tanto daquele jeito? Queria provar o quê se comportando como uma... “piriguete” com aquele cantorzinho atrevido?
- Piriguete? Quem você pensa que é? Ele estava apenas sendo gentil comigo. E por que não me põe no chão? Eu posso andar sozinha!
- D’accord! – Diz Claude, colocando-a no chão no meio da escada. – Continue até seu quarto, enton, sem cair!
Rosa virou-se para ele. Queria dar-lhe uma resposta à altura! Mas ao girar para um lado, sua cabeça girou “para o outro” e estendeu os braços apoiando-se novamente em Claude.
- Isso é gentileza, gatinha...  – Fala com a voz suave, pegando-a nos braços e entrando no quarto.
- Não me deixe! - Rosa murmurou quando Claude a colocou sobre a cama, evitando o contato de seus braços.
Mas não pode evitar o contato visual. Nem o inesperado movimento que Rosa fez, passando seus braços pelo pescoço dele e colando suas bocas.
Mas Claude foi o primeiro a se afastar...
- Eu quero você, gatinha! Mas é melhor pararmos por aqui. Você non está sóbria o suficiente para saber o que está fazendo. Amanhã poderá arrepender-se e seria tarde demais...
Rosa sentiu o rosto queimar de vergonha. Estava se oferecendo e ele a rejeitava... Reuniu seu orgulho ferido e disse:
- Tem razão novamente! Devo estar fora do meu juízo! Mas não se preocupe, não vai acontecer mais!
- Vai sim.  Sabemos exatamente o que vai acontecer entre nós. É só uma queston  de acertarmos  o ponteiro, chérie. - Ele respirou fundo e virou-se antes que a tentação fosse forte demais e o fizesse ficar ali.
Quando despertou na manhã seguinte, Rosa sentiu-se profundamente deprimida com a lembrança da noite anterior.  Sua consciência a lembrara a noite toda que havia deixado a situação fugir do controle entre Claude e ela.
Havia se rendido ao desejo e seus valores estavam despedaçados. Lembrou-se das carícias no estacionamento e tremeu. Continuava fraca e absurdamente ansiosa por ele!
- Sua estúpida! – Pensou, empurrando os lençóis com os pés e levantando-se rapidamente.  A cabeça doeu. – Um banho e um café! É tudo que preciso no momento.
Minutos depois, já estava  descendo a escada e alcançando a mesa do café, onde Elisabeth já estava e pareceu contente quando a viu e fez um comentário sobre a noite anterior:
- Então, darling... Resolveram o problema do excesso de energia? – pergunta Elisabeth com um sorriso curioso. – Dadi, traga mais café, por favor!
- Não houve nenhum excesso de energia entre nós, titia. O que houve foi que Rosa cedeu aos seus conselhos e bebeu demais. – Diz Claude, sentando-se à mesa e deixando Rosa ainda mais vermelha com essa colocação.
- Sua tia não me forçou a nada. – Responde mesmo assim. – Sou maior de idade e posso perfeitamente tomar minhas próprias decisões!
- Como subir num palco e se expor daquela maneira? Se queria ser notada, parabéns! Você foi a sensaçon do bar!
- Ah! Isso causou preocupação com minha pessoa ou com a reputação de vossa senhoria?
- Você non percebe o risco que correu, non é mesmo, gatinha?
- Eu estava muito bem até você me tirar de lá como um troglodita do tempo das cavernas faria!
- Você non reclamou quando ficamos no estacionamento nos divertindo... Pelo contrário, hã? Você teve uma participaçon e tanto!
- Misericórdia! Isso não vai prestar, dona Elisabeth! – Fala baixinho Dadi, colocando o café na mesa, enquanto os dois continuavam a trocar farpas.
- Se acalme, Dadi! Nós duas sabemos onde isso vai parar, não é mesmo?
- Como você mesmo disse, eu bebi demais, portanto, não tinha noção do que fazia!
- O que você tanto cochicha com Dadi, titia?  - Fala Claude impaciente.
- Que a aura de vocês está confusa! Desequilibraram a energia vital um do outro... – Diz olhando o fundo da xícara de café que Claude tomara.
- Mon Dieu! Era só o que faltava! Agora você é vidente também?
- Xiiiiiii! Quieto, Claude Antoine! Vocês precisam canalizar essa energia, mandá-la de volta ao astral! Ela está contaminada.  Um banho de cachoeira iria fazer uma limpeza e tanto! – Diz, enquanto segurava a mão dos dois e as juntava – Sintam-se! Aummmm...  Aummmm
- Eu non/não sinto nada ! – Exclamam os dois ao mesmo tempo, separando as mãos.
- Não fujam da verdade só porque ela os assusta! Façam amor, não façam guerra!
- Acho melhor eu ir cuidar da casa da piscina! – Diz Rosa sem deixar de olhar para Claude, saindo dali apressadamente.
- Tia Elisabeth! O que pensa que está fazendo?
- Abrindo seus olhos, mon amour! Aceite que se apaixonou por ela e deixe acontecer...
- Quem non deixa acontecer é o destino, hã? - Diz levantando-se – E non tem nada a ver com paixon - E sai da mesa também.
Nos dias seguintes, tanto Claude quanto Rosa se evitaram. Mas não podiam fugir de suas funções. As reformas estavam adiantadas e logo estariam na fase de acabamento. A casa da piscina estava limpa e pronta para ser reformada.
Numa noite, após o jantar, os três, Elisabeth, Claude e Rosa estão na varanda, apreciando a noite pantaneira.
Aquela noite estava extremamente iluminada com a lua redonda e cheia, fazendo as estrelas cintilarem como diamantes. As damas da noite, arbustos com flores noturnas de coloração pálida e intensamente perfumadas, refletiam a luz da lua, atraindo os insetos com seu pálido reflexo e odor penetrante.
Havia damas da noite em toda a volta da casa, formando uma cerca viva.
- Tia Elisabeth - Fala Rosa - Preciso que me diga como quer que eu pinte a casa da piscina, as cores, se vai querer texturas, a disposição dos móveis reservados...
- Darling, eu quero que faça como se você fosse morar lá! Confio na sua competência e no seu gosto. Sei que será capaz de usar sua intuição...
- Mas...
- Nada de mas, mon cher! Eu sei o que digo, all right?
- Melhor non discutir com ela, Rosa. Você pode desequilibrar o ambiente...
- Claude Antoine! Seu mau humor não vai me aborrecer esta noite. Não está vendo, sentindo a perfeição do momento?
- Non, só estou sentindo o perfume de umas flores muito enjoadas, hã? Eu acho que vou até espir... Atchin! Atchim!
- Ah, Claude!  Eu preciso falar, tive uma ideia para a fachada das casas... que tal a gente padronizá-las com texturas semelhantes à dos bichos aqui do pantanal?
- Oh, my God! Você é genial, Rosa!  Não falei que sua intuição é conectada ao cosmos? – Fala Elisabeth, fazendo gestos e trejeitos.
- Explique melhor essa ideia, Rosa. – Diz Claude, antes erguendo o olhar diante do que ouve e espirrando novamente.
- São dez casas que serão transformadas em chalés. Poderíamos dar um nome a cada um deles, por exemplo, Chalé Arara-azul. A fachada seria pintada nas cores e imitando a textura das penas da arara. Ou podemos fazer uma grafitagem da arara mesmo.
- Interessante, gatinha... Continue.
Rosa desistira de pedir a Claude que não a chamasse de algo que não era.
- Poderíamos colocar uma ficha técnica com informações sobre o bicho: habitat, costumes, risco de extinção, etc.
- D’accord! Seria fácil de ser identificada tanto pelos futuros turistas quanto pelos empregados da fazenda... É uma boa ideia!
- É uma excelente ideia, Claude! Animais têm a energia pura da Terra, são poderosos aliados... Infelizmente, a maioria das pessoas não entende isso...
- Posso viabilizar, então? Eu já fiz até uma lista dos bichos aqui do pantanal, os mais tradicionais e em maior risco de extinção.
- Posso dar uma olhada nela?
- Claro!  Um momento, eu deixei lá no escritório. – Fala, indo rapidamente buscar a lista.
Em silêncio, Claude analisa a lista
“Aves: arara-azul grande, tuiuiú, tucano, periquito, garça-branca, jaburu, beija-flor, socó, ema, seriema, papagaio, gavião, curicaca; mamíferos: onça-pintada, capivara, lobinho, veado-campeiro, veado-catingueiro, lobo-guará, macaco-prego, cervo do pantanal, porco do mato, tamanduá, cachorro-do-mato, anta, bicho-preguiça, ariranha, suçuarana, quati, tatu e muitos outros; peixes: piranha, pacu, pintado, dourado, cachara, curimbatá, piraputanga, jaú e piau; répteis: jacaré, sucuri, jibóia, cobra-d’água, camaleão, calango-verde, jabuti, cágado.”
Depois de ler, levanta a cabeça, perguntando:
- Já escolheu os animais?
- Não, esperava fazer isso com você e com seu pai, para não haver erros, mas eles resolveram ficar mais uns dias em Campo Grande...
- Tenho certeza que você escolheria muito bem sozinha, mas podemos ver isso em outra hora?
- Claro. Ainda temos uma folga no cronograma da obra...
- Como foi que surgiu essa ideia, darling? - Pergunta Elisabeth curiosa.
- Foi ontem, antes de dormir, quando eu finalmente consegui retirar o cartão de memória da minha câmera. Eu tirei algumas fotos pelo caminho até aqui, inclusive estava filmando uma arara azul quando... quando fui atropelada e jogada barranco abaixo e a câmera foi danificada...
- Oh, yes! Está se referindo ao episódio em que o destino jogou Claude aos seus pés! Literalmente, hã?
- Como sabe disso? – Claude e Rosa perguntam ao mesmo tempo, olhando-se em seguida e exclamando – Janete!
- Aquela...  alcoviteirazinha! – Diz Claude - Vou te contar, hem?! Ela non perde por esperar!
- Pode apostar que não! Conclui Rosa. – Será que ela contou a seu pai e Joanna também?
 - Eu gostaria de ver essas fotos, se não se importar, darling...  E sim... ela contou quando estávamos na piscina um dias desses... – Fala calmamente Elisabeth.
- Maldiçon! A essa altura até Frazon deve estar sabendo disso! Eu mato Janete!
- Não prefere que eu mesma faça isso? – Pergunta Rosa, olhando para Claude e sorrindo ironicamente.
- Maravilha! Já estão fazendo planos em conjunto! – Exclama Elisabeth.
- Planos em conjunto... Titia, você non contou isso a Rodrigo, non é? – Indaga, ignorando o comentário dela.
- Keep calm, honey!  Ohhh! Mon Dieu! Falando em bichos, tem um me perseguindo... Xô! Xô – Fala e abana as mãos tentando espantar um inseto que a rodeava.
- É só uma mariposa, tia Elisabeth. Ou uma bruxa como se diz em Portugal.  Na certa, pensa que você é uma delas... Ou foi atraída pela sua “luz interior”, hã?  – Claude diz displicentemente.
- Claude! Que maldade com sua tia! – Rosa o repreende.
- Oh, darling, thank you!  Quanto a você mocinho, muito cuidado, uma “bruxa como eu” zangada é dez vezes mais poderosa... Quanto à minha luz, ela vai iluminar o seu caminho, tenha certeza disso! Eu vou buscar um suco, alguém quer?
- Não/Non – Falam quase ao mesmo tempo.
Elisabeth entra na casa. Depois de um breve silêncio...
- Eu quis parecer engraçado, mas acho que magoei tia Elisabeth, comparando-a a uma mariposa.
- Mariposa? Você a chamou de bruxa, mesmo! Mas sua tia é do tipo de pessoa que não guarda mágoas... Ela é “zen”. E falando em mariposas... Claude eu tenho uma curiosidade, por que a fazenda tem o nome de Borboleta Azul? – Indaga Rosa.
- Você non gosta de borboletas?
- Eu? Eu adoro borboletas e mariposas!  Desde o dia em que eu li o livro de Lúcia Machado de Almeida - O caso da borboleta Atíria . Eu devia ter uns dez anos... Você já apreciou o voo de uma borboleta? A maneira como ela abre e fecha suas asas... é incrível... Tão delicado e, ao mesmo tempo, tão majestoso...
- Tem razon... borboletas son verdadeiras obras primas da natureza...
- Eu consegui fotografar algumas durante o caminho... Droga, estou ficando repetitiva!  Mas você não me respondeu...
- Por que non damos uma volta pelo jardim? Eu te conto a trágica história de minha vida que deu origem ao nome da fazenda, d’accord? – Fala, ficando em pé e estendendo a mão para ajudá-la a se levantar.
- Por que não? O jardim parece encantado com a luz do luar... – E segura na mão que Claude lhe oferecia.-  Mas e sua tia?
- Ela virá atrás de nós... Como uma mariposa atrás de luz, hã?
- Se a minha câmera não estivesse avariada, eu iria fotografar essas mariposas... – Diz num impulso, sem notar o olhar de admiração que Claude lhe lançava.
Mas Claude se enganara. Eles já estavam descendo o último degrau, quando Elisabeth os vê pela vidraça da janela...
- Honey, what are you doing here? (Querida, o que estás a fazer aqui?) –  Fala consigo mesmo, Elisabeth. - Hora de deixar os pombinhos em paz, hã? – E vai para o seu quarto.
- Então... O que aconteceu de tão trágico em sua vida? – Pergunta, enquanto caminham pelo jardim que praticamente circulava toda a casa.
- Non é fácil admitir isso, hã? Minha mãe era bióloga e ensinou-me a amar os animais – todos eles – e que eles devem ser livres...  Enton, um dia, eu devia ter uns nove ou dez anos, a professora de ciências naturais pediu que levássemos borboletas vivas para estudar sua anatomia. Eu levei uma linda borboleta azul, a favorita de minha mãe. Mas aí, ela resolveu fazer uma coleçon com elas. Ela ia espetar um alfinete em cada uma das borboletas que levamos. Você consegue imaginar o que eu senti?
Rosa olha para ele, sem nada dizer. Incrível, mas conseguia. Claude percebeu isso e continuou...
- Eu tentei argumentar, mas ela insistiu que aquilo fazia parte dos estudos... Enton, planejei libertá-las. E foi o que fiz durante o intervalo: soltei todas! E ganhei uma advertência e uma visita à diretoria, onde meus pais já me esperavam.
- Pobre Claude! – Lamenta Rosa. - E o que aconteceu depois?
- A diretora fez um longo sermon e queria que eu dissesse que estava arrependido. Eu disse que faria tudo de novo. Levei uma semana de suspenson e tive que fazer uma pesquisa sobre elas para apresentar à turma.
- Não vejo onde isso é trágico!  Elas devem ter ficado agradecidas a você.
- Rosa... Por muito tempo fui chamado de “o garoto das borboletas”. Isso foi trágico. Havia uma certa maldade  quando falavam isso. Feria a minha integridade... masculina.
- Isso tem um nome: bulling!
- D’accord! Acabei mudando de escola por conta disso. Nessa época, meus pais estavam se separando e eu achava que era culpa minha...  Mas com o tempo, a história virou uma lenda em minha casa.
Claude sentindo-se culpado por alguma coisa? Isso era difícil de imaginar, pensa Rosa.
- Bem, pense pelo lado positivo... Você aprendeu muito sobre as borboletas! O que ainda lembra?
- Basicamente quase tudo! Rsrsrsr... O trabalho valeu a minha nota do semestre.
- Então... fala um pouco delas pra mim...
A essa altura, eles já haviam percorrido metade do contorno da casa e estavam na lateral dos quartos.
- Voilá! Já que estamos falando da borboleta azul, eu posso dizer que elas son do gênero Morpho e eston entre as mais belas do mundo, sendo encontradas na region neotropical, principalmente nas florestas tropicais da América do Sul. Eram adoradas religiosamente pelos astecas e incas... E o tom azul non é natural, as escamas da Morpho son pardas ou ocres, mas a luz, ao penetrar nos alvéolos cheios de ar que atapetam as escamas, produz, pela decomposiçon da luz, tonalidades azul-turquesa ou cobalto, acetinadas e metálicas.
- Está vendo? Não foi tão trágico assim... Ai! – Diz ao sentir uma mariposa colidir com ela. – Estou sendo atacada por uma mariposa! E tenta retirá-la do seu cabelo.



- Espere... Deixa que eu faço isso, hã? – Diz Claude, separando a mecha de cabelos onde a mariposa se enroscara e libertando-a sem feri-la. - Pronto! Essa é a diferença ente elas: mariposas, em sua maioria, têm hábitos noturnos, voam e se alimentam à noite. As borboletas, por sua vez, realizam suas atividades durante o dia. – Diz, tentando ajeitar o cabelo de Rosa com os dedos numa proximidade perturbadora.
No silêncio que se seguiu, só se ouvia a respiração dos dois sob a cantoria de alguns grilos...
- Sabe como as borboletas se comunicam? – Pergunta Claude com a voz rouca...
- Não – Murmura Rosa, incapaz de falar mais alguma coisa diante do olhar hipnotizante que Claude lhe proporcionava...
- Algumas espécies se comunicam também através do uso do som... Mas todas se comunicam principalmente por meio de sinais químicos... Como nós, minha doce gatinha...  – Diz, inclinando a cabeça até colar seus lábios aos dela...
Em seu quarto, Elisabeth se afasta da janela...
- Rien de plus nutritif que l'amour! (Nada mais nutritivo que o amor!) Sweet dreams, honey... (Bons sonhos, querida.) – Diz a si mesma, enquanto se deita para dormir...
        
Continua...

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