II
Aquela
mulher era um perigo! Um atentado violento à sobrevivência! Era o que Claude
pensava, enquanto seguia para a cidade mais próxima da fazenda – Aquidauana. Um município brasileiro do estado de Mato
Grosso do Sul. Situada na Serra de Maracaju, a 139 km de Mato Grosso do Sul. É
conhecida por Cidade Natureza, devido à variedade de flora e fauna. Possuindo
muitas atrações, a cidade encanta com seus cenários únicos. Beira os cinquenta mil habitantes, é o sétimo
maior centro urbano do estado.
Não
podia se comparar com Paris, obviamente, mas precisava de um pouco de distração
e mesmo sem o glamour dos grandes centros, sabia que poderia encontrar diversão
em um dos bares da cidade, frequentados principalmente por peões da região. Um
local limpo, com boa bebida e alguns atrativos extras. Às vezes, havia música
ao vivo. Tinha até uma pequena pista de dança.
Precisava
se distrair um pouco. Sair da rotina daquela fazenda. Precisava se encontrar
isso sim! Havia deixado a França, logo depois de terminar seu relacionamento
com Nara.
Bonita,
vivida, sexy, uma mulher que todos desejavam.
Mas o que tinha de desejável, tinha de venenosa. Claude descobrira um
pouco tarde demais.
Conhecera
Nara, quando ela passou a ser estagiária em sua empresa, a pedido do pai, um grande
amigo e colaborador de Claude. Um interesse mútuo logo aconteceu e quando se
deu conta estava quase noivo.
Mas
foi aí que Nara deu aquele golpe. Um duplo golpe: literalmente roubara o
principal projeto de Claude: a construção de condomínios residenciais em áreas
menos valorizadas, para pessoas das classes mais carentes e apresentou ao seu
principal concorrente, que não primava pela honestidade.
Foi
neste momento que Claude descobriu que Nara era amante dele. Desde então,
passara a frequentar baladas, noite após noite. E descobrira que Nara não lhe
fazia falta.
A
ideia de seu pai de transformar a fazenda em um lugar para o ecoturismo atraiu
sua atenção e quando François lhe sugeriu gerenciar o serviço, não pensou duas
vezes. Gostava do Brasil e há muitos anos não tirava férias.
E
o projeto que o pai lhe enviara para análise era surpreendente, não demandava
um gasto exagerado, preservava a arquitetura original, com ideias simples e
arrojadas ao mesmo tempo. O tipo de projeto que ele gostava.
Já
era quase noite, quando ele chegou ao seu destino. Como sempre, assim quem
tirou o capacete, pode perceber os olhares femininos em sua direção.
Mas,
queria apenas se distrair. Não poderia nem beber, pois estava dirigindo. Não
estava a fim de ficar com ninguém e não conseguiria mesmo: aquela baixinha o
atingira em cheio! E andar de moto todos aqueles quilômetros não ajudou a
melhorar, pelo contrário, o desconforto aumentara.
Conhecia
muitas mulheres ousadas, mas aquela ultrapassava o limite do bom senso...
imprudente, abusada, audaz, impertinente, determinada, intrigante, impulsiva,
desejável... e com uma pontaria certeira.
-
“Mas que droga! Como foi que você voltou
aos meus pensamentos?” – Claude pergunta a si mesmo como se a visse em sua
frente e passa a mão pela cabeça, tentando com isso apagá-la de seus
pensamentos...
Logo,
porém, é chamado por Rodrigo, o fazendeiro vizinho e junta-se a ele numa mesa
do canto, no interior do bar, afastando-a
de sua mente.
Conversaram
sobre os problemas comuns entre as duas fazendas, sobre generalidades, por uma
ou duas horas. Rodrigo decide ir embora. Claude ainda permanece por lá.
Encostada
no carro, Rosa pensava no que fazer.
Não
poderia simplesmente fechar o carro e sair por aquela estrada deserta. Sabe-se
lá, quantos quilômetros até encontrar uma alma viva! E naquela escuridão que
esta noite prometia... Não, definitivamente, essa não era a saída!
Deu
a volta, fechou o capô do carro e voltou ao interior do mesmo, sentando-se no
banco do motorista.
A
visão daquele motoqueiro deixando-a sozinha ali, naquelas condições, depois de
tê-la atropelado e arrastado, era o que lhe ia pelo pensamento.
-
“Grosso! Mal educado, prepotente,
arrogante... - Pensava ela sobre Claude -
Que outros adjetivos eu posso usar para qualificá-lo? - Ah! Estúpido, irresponsável,
cínico, irritante, intolerável, desagradável, mal humorado, atrevido,
perturbador, insinuante, decidido, másculo, atraente, charmoso, extremamente
sexy e viril... Céus! Que foi que me deu?”
Irritada
consigo mesma por ter aqueles pensamentos tolos, abriu o porta-luvas e tirou de
lá uma lanterna do tipo recarregável, que não precisa de pilhas.
-
“Pois bem, Sr. Sabe-tudo, eu vou ficar bem! Não preciso da sua ajuda! Uma
mulher prevenida vale por duas, você
devia saber disso. Pelo menos, não vou ficar na escuridão total! Eu
poderia seguir com essa lanterna iluminando a estrada...
Não, pode aparecer algum animal e eu posso ser atacada.”
Rosa
trava as portas do carro e acende a lanterna.
Estava cansada, faminta e ansiava por um banho, um longo e refrescante
banho. Mas, no momento, tudo que poda fazer era olhar as fotos que tirara. Ela
liga a máquina, mas ela não responde aos comandos.
Na
certa, a queda deve ter danificado alguma coisa! Ainda bem que o cartão está
intacto! Assim que chegar à fazenda, eu passo para o note. Melhor eu me ajeitar
e tentar dormir.
Ela
coloca a lanterna sobre o painel, que age como um abajur e fecha os olhos. O
silencio só é quebrado pelo ruído dos grilos, o que torna a noite um tanto sinistra.
Acaba cochilando. De repente, uma batida no vidro do carro a faz acordar
assustada. Imediatamente, ela pega a lanterna e ilumina a janela.
A
mão que tentava impedir aquele facho de luz de acertar os olhos era grande. E o
rosto do desconhecido era simpático e agradável. Inspirava confiança. Rosa
abaixa o vidro da janela alguns centímetros.
-
A moça precisa de ajuda? – O tom de preocupação com que as palavras foram
pronunciadas confirmava a impressão que ela teve.
-
Meu carro pifou! Eu acho que o motor fundiu e pra ajudar fiquei sem bateria
também. Sabe me dizer se estou muito longe da Fazenda Borboleta Azul da família
Geraldy? Será que dá pra ir a pé?
-
Você está com sorte! Mas vamos por partes, ok?
Meu nome é Rodrigo Fernandes. Eu sou moro na fazenda vizinha. E você é?
-
Serafina Rosa Petroni, mas pode me chamar de Rosa simplesmente. Eu posso pedir
uma carona? Sei que é desagradável...
-
Claro! Estamos indo na mesma direção. Antes, abre o capô e me empresta essa
lanterna, eu vou dar uma olhada, quem sabe é menos do que você imagina.
Totalmente
confiante, Rosa desce do carro, entregando a lanterna a ele.
Depois
de olhar por alguns minutos e mexer em alguns lugares, ele se volta para ela.
-
Então? Eu tinha razão? O motor fundiu mesmo?
-
Aparentemente não. Ainda não! Mas se
você continuar com ele assim, vai fundir. Está completamente sem óleo no
motor. Posso tentar uma partida?
-
Claro, as chaves estão no contato, mas não vai adiantar, está sem bateria... –
Diz observando-o entrar no carro e virar a chave.
-
Realmente. Nem sinal. Mas esse não é seu único problema. Está quase sem
combustível, também. Isso acontece sempre com turistas, não se recrimine.
-
Não me recriminar? Isso é imperdoável! Acho que foi o encanto pelas paisagens e
por fotografá-las que me fizeram esquecer de conferir tudo isso no último
posto...
-
Ah, então você é fotógrafa? Trabalha para alguma revista?
-
Não sou fotógrafa, embora adore fotografar a natureza. Nem turista. Sou
arquiteta. O Sr. François Geraldy me contratou para adaptar a fazenda para o ecoturismo.
Parece que vai investir nisso. Além do que sou amiga de Janete.
-
Oh, verdade! Claude comentou algo a respeito. Mas... Bem deixa pra lá. Vamos?
Pegue suas coisas, eu deixo você na fazenda e amanhã providencio para que
alguém reboque o seu carro até uma oficina. Não deve ser nada grave.
-
Tem certeza que não vou te atrapalhar, não está indo pra algum outro lugar?
-
Não, estou justamente voltando pra casa e vou passar “na porta” da fazenda. A
pé e nessa escuridão, você passaria direto, pois para se chegar até ela há uma
longa e deserta estrada secundária.
-
Eu nem acredito! Você está sendo um verdadeiro anjo! Obrigada.
-
Não tem de que. Por aqui a solidariedade é muito importante e valorizada entre
os fazendeiros. Moramos praticamente isolados da civilização, rsrsrsrs! As cidades
mais próximas estão há quilômetros de distância. – Vai dizendo, enquanto acomoda
a bagagem de Rosa em sua pick-up.
-
“Acho que algumas pessoas não foram
avisadas sobre isso ou não sabem o que significa ser solidário” - Pensa com
a imagem de Claude na cabeça.
Mas
logo a substitui por Rodrigo, que parecia satisfeito por poder fazer as honras
do lugar. Cerca de cinquenta minutos depois, eles chegam à fazenda.
Mesmo
sobre o fraco luar, que lutava por aparecer entre as nuvens, a fazenda era
muito maior do que Rosa pensava...
Rodrigo
a ajuda a descarregar sua bagagem, enquanto Rosa bate à porta da casa principal
da fazenda. Uma construção equilibrada entre o colonial tradicional e o
moderno, pensa Rosa. A casa era grande. Daria um excelente hotel-fazenda. O jardim
parecia abandonado, mas com um bom trato ficaria charmoso e agradável. O
perfume de algumas flores era muito bom.
Não
precisou bater duas vezes. Quando a
porta se abriu, Rosa deu um largo sorriso para sua amiga de infância Janete,
enquanto a ouvia dizer:
-
Rosa! Rodrigo? Mon Dieu, o que aconteceu com você? Eu já estava preocupada,
pensando em chamar alguém para procurá-la!
Elas
se abraçam, depois de tanto tempo sem se verem.
-
Como vai, Janete? Sua amiga teve problemas com o carro... Bem, entrega feita! Rosa, amanhã eu cuido para
que seu carro seja socorrido e entregue aqui na fazenda, ok?
-
Não prefere que eu mesma faça isso? Você deve ter outros afazeres...
-
Não dará trabalho nenhum... Será um
prazer ajudá-la. Até qualquer hora! Boa
noite pra vocês!
-
Até, Rodrigo! E obrigada por socorrer minha amiga!
Rosa
pega sua mala, frasqueira, bolsa e segue Janete porta adentro. A casa era
aconchegante e a decoração de muito fino gosto. Clássica e combinando com o
campo.
Elas
sobem a escada, pois Janete a levava ao quarto de hóspedes. Depois de acomodá-la...
-
Você deve estar cansada e com fome. Tome um banho, eu trago algo pra você
comer. Esse seu figurino manchadinho...é
moda em São Paulo?
-
Continua espirituosa, não é? Essas manchinhas
são pura lama do pantanal. Eu estou bem
agora, mas nem te conto! Fui praticamente atropelada por um motoqueiro em alta
velocidade, rolamos barranco abaixo e depois ele me largou sozinha com meu
carro pifado!
-
Motoqueiro é? Amanhã vou querer detalhes da sua aventura! Tome um banho que eu
já venho com um lanche... Mas amanhã...
amanhã você não me escapa! Vai
contar tin tin por tin tin dessa história... Depois de rever meus pais,
naturalmente.
Janete
deixa Rosa à vontade. Quando ela sai do banho, o lanche está a sua espera. Ela
come o sanduíche e vai imediatamente para a cama. Em seu último pensamento o
barulho daquela moto...
-
“Devo estar enlouquecendo...” – E cai
num sono profundo e revigorante.
Claude
demora mais que o previsto na cidade. Ao voltar, encontra o carro ainda parado
e sem sinal daquela doida.
-
“Com certeza saiu andando pela noite!
Impetuosa como parece ser, non deve ter pensado nos perigos da noite por aqui!
Mon Dieu! Eu devia tê-la obrigado a me acompanhar até a cidade...”
Ele
ainda anda alguns quilômetros vagarosamente, iluminando o acostamento com o
farol da moto inutilmente. Nem sinal dela.
Claude
desiste e vai para casa, remoendo seus pensamentos, tentando se eximir da culpa
que começava a sentir. Não era responsabilidade dele. Além do mais, ela quase provocara
a morte dos dois. E depois, ainda o acertara com o capacete em seu... Diabos,
por que estava preocupado com ela?
Ele
entra em casa tentando não fazer barulho e sobe direto para seu quarto. Toma um
banho e vai para a cama. Ainda sentia um desconforto naquela região... Andar de
moto depois do golpe só piorara a situação. Finalmente consegue adormecer.
Claude
acorda cedo e toma apenas um café preto. Depois, enfia-se no escritório da
casa, dizendo não querer ser incomodado. Seu mau-humor era visível e nem ele
estava se aguentando. Culpa daquela desconhecida. Sonhara a noite toda com ela:
os dois rolando o barranco e fazendo amor, depois de discutirem de quem era a
culpa... Que absurdo! Passou a se concentrar nos jornais do dia, tentando
esquecer aquele corpo sob o seu, molhado e muito atraente...
Rosa
desperta assustada. Por uma fração de segundos, desconhece onde está. Então,
lembra-se do dia anterior e não sabe se suspira de alívio ou de resignação.
Francamente!
Esperava não cruzar nunca mais com aquele motoqueiro arrogante. Ela se arruma e
desce, procurando por Janete. Por dedução chega à cozinha.
-
Bom dia, Rosa! Pensei que quisesse dormir até mais tarde, descansar bem mais...
-
Bom dia, Janete. Eu não consegui, estou ansiosa demais pra falar com seu pai e começar
essa reforma. Vai ser um desafio e tanto pra mim.
-
É sobre isso mesmo que eu tenho que te falar. Meu pai passou essa tarefa de
gerenciar a reforma para meu irmão, Claude. Eu creio que você nunca o conheceu.
Ele sempre morou com a mãe dele, a primeira esposa do meu pai e só vinha para o
Brasil nas férias escolares de lá, que não coincidem com as nossas...
-
Ah! E isso muda alguma coisa? Altera o cronograma?
-
Não. Apenas que você vai resolver tudo com ele, não mais com meu pai. Aliás,
meus pais pedem desculpas por não estarem aqui pra te cumprimentar, logo pela
manhã. Tiveram um compromisso de última hora.
-
Bem, por mim está tudo bem. Creio que será até mais fácil, se não me engano,
você comentou em alguma carta que ele é engenheiro, não é isso?
-
Exatamente. Mas antes de falar com ele, vamos tomar um delicioso café da manhã,
preparado pela nossa grande Dadi. Dela
você se lembra, não é? Ah, olha ela aí! Dadi, lembra-se da Rosa?
-
E como eu poderia esquecer daquela menina magrela, curiosa e falante? Mas de
menina a senhora não tem mais nada... Como vai dona Rosa?
-
Dona Rosa? Pra que tanta formalidade? – Diz, abraçando Dadi.
-
Ela resolveu assim. Acha que é o certo. Até a mim ela chama de senhorita
Janete! Rsrsrsrsr! Mas eu estou curiosa, me conta o que foi que aconteceu ontem
com o tal motoqueiro...
Rosa
conta o incidente, não omitindo nem a parte do capacete. Quando termina seu
relato, Janete diz:
-
Eu queria ser um mosquitinho e ter visto tudo ao vivo! Aposto que o tal motoqueiro
ficou indignado! Deve estar com dor até agora! Rsrsrs
-
Janete! Como você pode rir de uma coisa dessas? Foi muito... desagradável!
-
Desagradável ou não, é muito engraçado! Quando eu contar pro Frazão, amiga! Ele
vai ao delírio!
-
E quando é que vocês vão casar? Nunca?
-
Assim que a fazenda estiver pronta. Ele vem pra cá e juntos vamos tocar o
negocio. Meu pai pretende viajar com mamãe em lua de mel ao redor do mundo!
-
É tão bonito esse carinho que eles têm um com o outro depois de tantos anos
juntos! Acho que é assim, quando se tem amor verdadeiro.
-
Também acho. Bem, amiga, o Claude já deve ter lido todos os jornais. Pronta?
-
Janete, impressão minha ou você está querendo me por medo?
-
Impressão sua. Tenho certeza que você e meu irmão vão se dar muito bem...
Vamos!
Janete
leva Rosa até a porta do escritório.
-
É aqui. Melhor você entrar sozinha para falar com ele, tratar de negócios... –
E se afasta antes que Rosa pudesse protestar.
Sem
entender a atitude de Janete, Rosa bate na porta.
-
Entre - A voz era profunda e decidida, o tom estranhamente conhecido.
Rosa
empurra a porta e entra. Sentado atrás
de uma mesa de madeira, o irmão de Janete continuou examinando alguns papéis e
nem levantou a cabeça para ver quem era.
Depois
de um longo e constrangedor silêncio, quando ele resolve erguer a cabeça, Rosa
leva um choque.
-
Você!? Você é o irmão da Janete? Eu não acredito!
-
Quem non acredita sou eu, d’accord? O que você está fazendo em minha casa? –
Os olhos dele agora já não eram tão amigáveis...
Rosa
queria responder, mas sua voz não saía. Engoliu em seco, respirou fundo e, por
fim, disse:
-
Eu sou Serafina Rosa Petroni, a arquiteta contratada pelo seu pai, para adaptar a
fazenda. Por acaso não me esperava?
-
Non. Eu esperava Serafin R. Petroni, um arquiteto, como estava na planta do
projeto em queston. Você... você é uma mulher! Uma mulher extremamente
perigosa, diga-se de passagem! Creio que podemos desfazer o contrato!
-
Nunca me ocorreu ter que especificar meu sexo ao lado de meu nome em uma
planta! Você só pode estar brincando! Não pode desfazer o contrato assim! Eu
tenho tanto conhecimento quanto qualquer arquiteto - Diz enfatizando o
“o”.
Continua...
Mais que homem machista esse Claude.
ResponderExcluirQuando tem o próximo capitulo?
Marli
OMG eu mato esse engenheiro afff kkkkkkkkkkkkkkkkkk é só um comentário viu gente hahahaha... mato nón!
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