O
conto que reproduzimos abaixo é da autora Ana Miranda.
Para
maiores informações sobre essa escritora, favor acessar: http://contosbrasileiros.blogspot.com.br/2007/12/ana-miranda.html.
Boa
leitura!
PONTO DE CRUZ
Eu
me apaixonei por um homem, ele visita minha mãe de tarde, em nossa casa chega
perfumado e tímido, as moedas tilintando no bolso de seu paletó, engasga nas
primeiras palavras mas depois ele conversa com ela e passa a mão nos meus
cabelos, sinto minha pele se arrepiar mas ele não percebe o sentimento que me
causa, pensa que sou apenas uma criança e crianças quando sentem mostram o que
sentem, mas eu não mostro, é forte a tentação de acompanhá-lo com os olhos, eu
não entendo o que eles conversam, olho o homem enquanto ele a olha a bordar no
bastidor, vejo-o levar a xícara de café aos lábios, ele me dá uma moeda e me
diz para ir à padaria comprar um confeito, faço o percurso concentrada e só
percebo o mundo de fora quando sinto o gosto doce da bala derretendo na minha
língua, volto para casa e ele ainda está sentado na frente dela, no mesmo lugar
mas um pouco pálido como se o seu coração tivesse parado de bater, eles
permanecem em silêncio, ele segura a mão dela e a beija, em seguida vai embora,
às vezes esquece de se despedir de mim, ela fecha os olhos, quando o ruído do
carro dele desaparece ela chora em silêncio, suas lágrimas caem nos pontos de
cruz, ela evita olhar para mim e depois que ele vai embora ela olha o relógio
da parede de instante em instante ou fica diante da janela perdida longas horas
olhando o gramado, algo esvaziou seus olhos, seu corpo, ela abraça e beija o
gato, quando o animal escapole de seu colo eu o abraço e tento beijá-lo da
mesma maneira mas em vão, olho o relógio porém não vejo nada, nem o tempo
passa, eu não espero que o homem volte, até mesmo esqueço que ele existe, minha
vida segue como a água da chuva que escorre procurando os subterrâneos, quando
o homem reaparece eu lembro que o amo, amo a presença dele e não a sua
ausência, um dia talvez eu vá amar a ausência de um homem, quiçá, não sei o
nome dele, esqueci de perguntar, mas o nome dele não é importante, o nome de
ninguém importa, sei quem ele é, pressinto sua alma, as esferas de sua
existência, o calor de seus gestos e o rumor de sua voz, sinto em meu corpo a
paixão que sente por minha mãe.
(Extraído
de Noturnos)
Fonte:
http://contosbrasileiros.blogspot.com.br/2007/12/ana-miranda.html
Bonito esse conto! Gostei.
ResponderExcluirBonito esse conto, fácil de entender, nos prende a leitura, mas , ao mesmo tempo , detesto contos que nos deixam assim, com cara de bobo, sem saber o final da história..
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