quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

O INFERNO DE UM ANJO - SEGUNDA PARTE - CAPÍTULO 11 - COLABORAÇÃO: PAULO SENA

O INFERNO

DE UM ANJO

Romance-folhetim



Título original:
L’enfer d’un Ange




Henriette de Tremière/o inferno de um anjo

(Texto integral) digitalizado
e revisado por Paulo Sena

Rev. G.H.
BIBLIOTECA GRANDE HOTEL


Segunda Parte - Capítulo XI

UMA CARTA DESCONCERTANTE


Isolados num tranquilo e silencioso recanto da biblioteca do palacete, o conde Fernando e Luís Paulo, depois de terem jantado, percorriam distraidamente os jornais.
Fernando, depois dos sofrimentos que haviam abalado sua existência, já não sentia prazer em divertir-se e quase não saía de casa. Luís Paulo, por sua vez, prematuramente envelhecido pela perda de Maria "Flor de Amor" que, por mais que fizesse, não conseguia esquecer completamente, ia acompanhando os hábitos do sogro.
A certa altura, o conde Fernando largou o cálice de licor que tinha entre os dedos e exclamou com grande excitação na voz:
- Ora, veja! Por esta eu não esperava!
Luís Paulo se voltou para ele, interessado:
- Que foi, conde?
Como única resposta, o fidalgo lhe entregou o jornal que estava a ler. Num canto da página, em letras maiores, havia o título de uma notícia: FUGA DE UM CONDENADO e, logo depois, o subtítulo: Afonso Houdin, o famoso ladrão que foi recentemente condenado a dez anos de prisão, por lesões e tentativa de homicídio, acaba de evadir-se!
- Não se pode dizer que aquele indivíduo não seja um homem de sorte! - comentou Luís Paulo. - Como conseguiu escapar?
- De maneira romântica, para não dizer rocambolesca - explicou o conde, que lera toda a notícia. - Estava sendo conduzido de carruagem para o presídio onde deveria cumprir a pena, quando, aproveitando um instante de distração de um dos seus guardiões, atirou-se contra uma das portas da carruagem, conseguindo abri-la e lançando-se à estrada. Internou-se num bosque e os guardas que o custodiavam não conseguiram capturá-lo. A polícia deu uma batida por toda a zona, mas do fugitivo nem sinal!
Luís Paulo baixou a cabeça, pensativo.
- Conde - disse, pouco depois - você, há algum tempo, foi chamado pela polícia para uma identificação. O delinquente era esse homem, não?
- Sim... É uma lembrança tão desagradável que tenho procurado afastá-la da memória. Por que me pergunta isso?
- Bem, agora que esse sujeito perigoso está livre, não pensará, talvez, em vingar-se?
- Mas, afinal, por quê?
- Sim... Porque afinal de contas, se você não o tivesse reconhecido, estando ele sem documentos e havendo obstinadamente teimado em dar um nome falso, não teria sido condenado.


- Isso é muito improvável, Luís Paulo! - rebateu com enorme certeza o conde. - Aliás, não fiz mais do que cumprir o meu dever e, se não o tivesse feito, estaria protegendo um perigoso marginal!
O barão Luís Paulo ia retrucar, quando um criado se aproximou deles e, depois de uma curvatura, disse ao conde Fernando:
-Senhor conde, a senhora Flora pergunta se pode vir reunir-se com os senhores.
- Dona Flora?! - exclamou o conde, erguendo-se. - Diga-lhe que sim, que estamos esperando-a.
Momentos depois, Flora fazia sua entrada na biblioteca.
- Minha querida - disse Fernando, tomando-lhe uma das mãos, - Como está se sentindo? Procure não fazer nenhuma imprudência, pois bem sabe que ainda não está completamente curada.
- Oh! Não pensemos em mim - respondeu a moça, enfiando a mão num dos bolsos do seu agasalho. - Olhe, antes, para isto...
Calou-se e entregou ao conde Fernando uma carta, cujo envelope fora aberto e explicou, logo a seguir:
- Tomei a liberdade de abrir, como estou agora fazendo com toda a sua correspondência, posto que sou sua secretária e pensando que se tratasse de coisa rotineira... Mas, ao contrário...
Não teve, porém, coragem de prosseguir. Impaciente, Fernando desdobrou o papel e começou a ler a carta. Quase imediatamente uma estranha palidez se assenhoreou de seu rosto e ele balbuciou, passando o papel a Luís Paulo:
- Leia isto... Parece impossível!
Também Luís Paulo, depois de ter lido, exclamou, com a voz alterada:
- Mas... É incrível!... Esta carta foi escrita por Maria Aubert, mas Maria Aubert está morta.  Ninguém recebe cartas do outro mundo... Os defuntos não escrevem!
- Por favor, Luís Paulo - disse, no entanto, Fernando, que recuperara o sangue frio. Sabemos perfeitamente que Maria Aubert, que se faz chamar Denise, existe, porque é a baronesa de Rastignac, sua mulher. Digamos, antes, que aquela que se fazia passar por Maria Aubert, também chamada "Flor de Amor", e que pensávamos estar morta, ainda vive.
- Vive. - repetiu Luís Paulo, no cúmulo do estupor. - Vive... Então ela está... Viva?...
- Não entendo são os termos da carta - comentou o conde Fernando. - Ela pede que eu me encarregue do sepultamento da senhora Dorotéia Brancion, mãe do médico, que morreu hoje no meu palacete. Mas que eu saiba, na minha casa não morreu ninguém.
- George Brancion - interveio Flora - o psiquiatra encarregado pela Clínica Salus de tratar de Marta... Mas ele estava bem, ontem à tarde, tenho absoluta certeza. Ele viajou para tratar de um doente, e, por isso, somente ao seu regresso poderá tomar conhecimento desta carta.
Fernando retirou do envelope que a moça lhe trouxera outra folha de papel.
- Sim, ao seu regresso teremos de dar ao doutor a triste notícia. Aqui está o atestado de óbito passado por um médico. A senhora Dorotéia Brancion morreu mesmo...
Luís Paulo, que ficara apenas a ouvir até aquele instante, como se ainda não acreditasse no que estava escutando, limpou a fronte com o lenço.
- O extraordinário deste caso - exclamou o jovem barão - é que Maria "Flor de Amor" está viva!...
Um silêncio pesado se seguiu às suas palavras.

Um comentário:

  1. O que será que aconteceu com Dona Dorotéia? Desconfio do Dr Démon, ele é capaz de tudo! Como será o reencontro de Fernando, Luís Paulo e Maria "Flor de Amor"? Quanta reviravolta!

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