O INFERNO
DE UM ANJO
Romance-folhetim
Título original:
L’enfer d’un Ange
Henriette de Tremière/o inferno de um anjo
e revisado por Paulo Sena
Rev. G.H.
BIBLIOTECA GRANDE HOTEL
Segunda
Parte - Capítulo XII – Parte 1
UM
EX-NOIVO QUE APARECE
Denise,
trajando elegantíssimo vestido que punha particularmente em destaque as suas
belas formas, estava preguiçosamente recostada num divã, numa das salas do
apartamento que ocupava no palácio dos Rastignac.
Estava
intimamente satisfeita consigo mesma e com o que fizera. Graças à sua
duplicidade, às suas artes de refinada farsante, fazendo tudo o que lhe
recomendara a pérfida mãe, conseguira iludir ainda uma vez Luís Paulo e lograra
fazer-se passar pelo que não era na realidade: uma jovem inexperiente da vida,
a enfrentar sua primeira experiência de amor.
Mas
agora, que deveria começar a colher os frutos da sua mentira, nova preocupação
vinha atormentá-la, como uma justa punição pelo mal que havia feito. Denise
sentia que estava para ser mãe! O fato não era iminente, é certo, mas os
sintomas dela eram inequívocos...
Luís
Paulo ainda não sabia que sua mulher iria ser mãe, pois ela, tomada de estranho
pudor, não tivera ainda coragem de comunicar-lhe.
Naquela
noite, porém, tinha a intenção de dizer-lhe tudo, razão pela qual, embora a
hora já fosse tardia, estava à espera do seu regresso.
Para
se distrair, Denise sentou-se numa poltrona e, tomando um livro ao acaso, em
cima da mesinha, começou a folheá-lo distraidamente.
As
linhas, porém, se embaralhavam diante de seus olhos e seu estado de inquietação
e angústia não lhe permitia prestar atenção à leitura por mais que se
esforçasse.
O
grande palácio estava mergulhado em silêncio. Toda a criadagem, àquela hora, já
devia estar dormindo.
A
certa altura, Denise, enquanto tentava mais uma vez apreender o sentido do que
estava lendo, sentiu que às suas costas soprava uma fria corrente de ar. Chegou
a ter um arrepio.
Ao
mesmo tempo, o leve rumor, proveniente de uma das portas-janelas envidraçadas
que davam para o jardim, chegou aos seus ouvidos, causando-lhe um sobressalto.
Sem
compreender direito o que estava acontecendo, pôs-se de pé e ficou a observar o
pesado reposteiro de brocado que, embora a noite fosse tranquila e não
estivesse ventando, agitava-se levemente...
Atrás
da cortina, algo misterioso e sinistro, que a jovem baronesa não podia
distinguir bem, estava a se mover.
Depois,
lentamente as duas bandas do reposteiro se separaram e, no fundo escuro da
vidraça escancarada, surgiu a cabeça de um homem e logo seu corpo, encolhido
como o de uma fera pronta a atacar. Quando Denise o viu, quase caiu para trás,
vencida pelo pavor. Quis fugir, mas sentiu que as pernas não lhe obedeciam.
Quis gritar, pedir socorro, mas apenas um som sufocado lhe escapou da garganta
contraída. Depois, de repente, seu medo se aplacou, enquanto uma horrível
suspeita lhe chegou à mente. De seus lábios trêmulos saiu, como num sopro, um
nome:
-
Afonso!...
Uma
risada rouca se seguiu àquela exclamação. Então, Afonso Houdin, o ladrão, o
evadido procurado pela polícia, voltou-se num gesto brusco, puxou o reposteiro,
saiu do seu esconderijo e surgiu na sala, onde ficou por um instante imóvel a
fitar Denise com olhos cintilantes.
O
rosto belíssimo da baronesinha se cobriu de suor frio, incapaz de se manter em
pé, tão fortes haviam sido a surpresa e o susto que a tinham assaltado,
deixara-se cair novamente sentada no divã, olhando-o como que hipnotizada.
Afonso
Houdin, visto à luz incerta da lâmpada velada que deixava grande parte da sala
às escuras, causava verdadeiramente medo.
Os
cabelos, despenteados, caíam-lhe sobre os olhos e estava com a barba crescida,
o que o deixava quase irreconhecível. As roupas, amarrotadas, estavam sujas de
lama, assim como os seus sapatos.
Se
Denise não o tivesse reconhecido, se não tivesse identificado naquele vulto
estranho, imediatamente, o noivo de outro tempo, teria morrido de medo, ante
sua aparição naquelas circunstâncias e àquela hora da noite.
O
ladrão, depois de ter olhado cautelosamente em volta, caminhando com toda a
calma se dirigiu à moça e estendendo uma das mãos, manchada de lama e de
sangue, agarrou-a pelo braço. Depois, embora ela se opusesse, com violento
impulso puxou-a para si, agarrou-a e lhe beijou o rosto e a boca.
-
Deixe-me! Deixe-me! - reagiu Denise, semi-sufocada. - Vá embora! Não o
tolero!...
Afonso
soltou uma risada, sinistramente.
-
Ah!... A senhora baronesa não me tolera, não é mesmo? É que está ficando muito
dengosa... Não será isso?
-
Vá embora!
-
Calma... Calma... Para que essa pressa toda, gente? Estou incomodando tanto
assim?... Nem comecei! Escute...
-
É completamente louco, louco! - exclamou Denise. - Não se dar conta do estado a
que está reduzido?...
-
Claro que sim - disse o ladrão num trejeito. - Sei que não estou em trajes
elegantes, apropriados para uma visita social a uma baronesa tão bela... Mas,
que quer? Temos que nos acomodar às circunstâncias e fazer das tripas
coração... São coisas da vida!
-
Deixe-me em paz, já disse!
Mas
o homem, em vez de obedecer e ir embora, puxou-a mais uma vez para si.
-
Por que esta pressa, querida? Não a estou reconhecendo. Não faz muito, você era
minha noivinha, que aceitava com alegria os meus beijos... Mudou assim em tão
pouco tempo?
-
Mudei! Mudou tudo! Tudo!
O
marginal, por si mesmo, largou-a e foi-se olhar num grande espelho que havia a
um canto da sala em rica moldura dourada.
Passando
a mão pela barba cerrada, continuou sarcasticamente:
-
Tem razão... Concordo que não estou muito apresentável... Mas, você deve
compreender que tive de fugir como um animal feroz pelo meio do mato,
perseguido dia e noite! Sim, passei um mau pedaço... Fique sabendo! Mas agora,
que consegui fazer com que a polícia perdesse a minha pista e, principalmente,
agora que estou aqui, nada mais tenho a temer!
Denise,
de olhos arregalados, fitava o homem que tinha à sua frente e não queria crer
que ele fosse realmente Afonso, aquele Afonso que, na última vez em que se
haviam encontrado, parecera-lhe, ainda, um modelo de elegância.
De
fato, embora Afonso sempre tivesse vivido de golpes, expedientes e vigarices,
quando não de roubos, sempre mantivera certa linha e aparentava até maneiras
finas.
Fora
justamente por isso que, achando-o elegante e atraente, Denise, certa noite,
numa reunião a que ambos haviam comparecido, reparara nele e se enamorara...
Na
ocasião, Afonso lhe parecera um rapaz bonito e, de certa maneira, isso era
verdade. Pondo de lado aquele olhar cínico que aparecia às vezes em seus olhos,
era um bonitão e qualquer mulher o tomaria por um moço de boa família que,
dispondo de tempo e dinheiro para gastar, vivia a divertir-se, talvez um pouco
mais do que o normal!
O
homem que agora se encontrava ali à sua frente, nada tinha em comum com aquele
do passado e a baronesinha sentia por ele enorme repulsa.
O
medo, a fome, as peripécias da fuga haviam deixado no semblante de Afonso
Houdin marcas indeléveis. Denise, assim que ele a soltou, afastou-se o máximo
possível e perguntou:
-
Que veio fazer aqui? Vamos! Diga! Como ousou entrar nesta casa? Trate de sair
por onde entrou, senão eu o farei expulsar, como a um cão!
Um
risinho zombeteiro surgiu nos lábios de Afonso:
-
Como é isso?... Vai chamar os criados? Não faça cerimônia, florzinha... É o que
deve fazer... Olhe aí a campainha!
-
Doido! Doido varrido!
-
Eu? Muitíssimo ao contrário! Estou apenas um pouco cansado e com uma fome
danada! Acho que você não faria uma bonita figura apresentando-me aos seus
criados, como seu ex-noivo. Nas condições em que me encontro... Eles iriam
achar que você não é uma criatura de bom-gosto...
-
Cale-se! Cale-se, Afonso!...
-
Por que devo me calar? Tenho é que lhe dizer o seguinte: se tiver um pouco de
paciência até eu tomar um banho no seu elegante banheiro e me ajeitar um
pouquinho, dentro de quinze minutos poderá chamar os criados, com toda a
tranquilidade.
Frente
à tamanha calma e tanto cinismo, Denise sentia que estava para enlouquecer.
-
Como se pode ser tão miserável, Afonso? - balbuciou com os olhos cheios de
lágrimas, lágrimas de raiva. - Como conseguiu entrar aqui, como ousou fazê-lo?
Não compreende que, de um momento para outro, meu marido pode aparecer, pode
chegar? Não tem medo, Afonso?!...
Afonso
fingiu estar muito interessado na observação das próprias unhas da mão
esquerda.
-
Medo? - murmurou - Mas sim, querida. Estou apavorado! Está satisfeita, agora?!
Aquela
frieza, tamanha indiferença e a gélida ironia tiveram o poder de levar ao auge
a fúria da jovem, que se sentia, no momento, na mesma situação de uma pantera
apanhada numa armadilha.
-
Louco! Assassino! - gritou, sem mais tratar de moderar o tom de voz. - Você é
um inconsciente! Que iria eu dizer a Luís Paulo, se ele aparecesse aqui, agora?
Que iria responder, se me pedisse uma explicação pela sua presença?
-
Isso é problema seu... Invente... Invente uma desculpa qualquer!
-
Isso é loucura! Ele não acreditaria no que eu dissesse... Chamaria a polícia,
isso sim, a polícia da qual você está querendo escapar! Trate de ir embora,
fuja! Saia daqui!
Sem
lhe dar importância, o ladrão sentou-se comodamente no divã, como quem está
tranquilamente mantendo uma frívola conversa em roda íntima.
Depois,
com um gesto de desânimo, alargou os braços e exclamou:
-
E para onde quer que eu vá? Estou em trânsito... Nem documentos possuo.
Respirando
com dificuldade, aflita, louca de medo, Denise correu ao outro aposento e
voltou logo trazendo na mão um punhado de notas de alto valor.
-
Tome! - disse, estendendo-lhe o dinheiro. - É tudo o que tenho à disposição, no
momento!
Enganava-se,
porém, pensando que com aquilo conseguiria livrar-se do fugitivo.
Afonso,
depois de ter ajeitado as notas e contado calmamente o dinheiro, meteu-o no
bolso, murmurando com voz cínica:
-
Bem... Para começar, não está mal... E agora, quer me dar alguma coisa para
beber? Está um tremendo frio lá fora e ir passear no bosque, a estas horas,
posso lhe garantir que não é muito salutar. Posso até apanhar um resfriado e sei
que isto desagradaria muito a você, não é verdade?
Denise,
aterrorizada, torcia as mãos. O tempo corria, Luís Paulo poderia chegar a
qualquer momento.
Mas
o ladrão parecia muito longe de pensar em ir embora.
A
filha da marquesa Renata, naquele momento, sentiu desejo, talvez pela primeira
vez em sua vida, de ter a mãe ao seu lado para ajudá-la a escapar daquela
horrível situação.
Por
nada deste mundo quereria que Luís Paulo descobrisse aquele homem nos seus
aposentos! Como poderia se justificar? Que desculpa iria arranjar, que mentira
inventar, para enganá-lo? Não! Afonso Houdin deveria ir embora, desaparecer,
sem perda de tempo.
Compreendendo
que por mal, pela violência, nada conseguiria obter dele, decidiu levá-lo por
bem e, tratando de dominar o nervosismo e a excitação, aproximou-se dele e, com
um tom de voz relativamente doce, assim falou:
-
Ouça, Afonso... Trate de compreender...
Mas
o marginal cortou sua tentativa de persuasão, interrompendo-a:
-
Você é que deve compreender que, se não fechar à chave aquela porta, daqui a
pouco poderão, talvez, acontecer aqui dentro coisas bem desagradáveis... Sabe a
que me refiro, não?
-
Não... Não entendo...
-
Minha querida Denise, raciocine um pouquinho... Se seu marido aparecer, que é
que eu serei forçado a fazer, para me defender? Acha que vou fazer-lhe carinho?
Que é que pensa de mim? Ainda sei matar!
Um
lampejo de terror passou pelos olhos de Denise.
-
Você não faria isso!...
O
ladrão teve um sorriso de complacência e tirou do bolso um punhal, cuja lâmina
fez saltar com a pressão do dedo.
-
Pois eu acho que faria, sim, belezoca, e com muito gosto! Está vendo isto?
Embora eu não tenha estado a pensar, durante todo o tempo em que estive nas
grades, senão em dar o fora de lá, sempre arranjei um jeitinho de conseguir
este brinquedo e será com imenso prazer que farei a sua inauguração nas tripas
de um barão... O senhor barão de Rastignac. Do qual, se não me falha a memória,
você me disse que é a esposa apaixonada... Que diz?
Como
única resposta, Denise correu para a porta e deu volta à chave.
-
Guarde isso! - exclamou, quase sem voz. - Sei que para você a vida de um homem
não tem o menor valor! Agora o conheço bem!
-
Ainda bem que você começa a ter um juizinho...
A
baronesinha, branca de fazer dó, sentou-se numa poltrona. Seu cérebro
trabalhava febrilmente, na tentativa de achar um estratagema para se ver livre
daquele indivíduo, que sabia ser capaz de tudo. Não conseguia compreender como
Afonso pudera atravessar o jardim sem que fosse pressentido e atacado pelos
cães que, à noite, eram sempre postos em liberdade.
Com
um aperto doloroso no coração pensava que, se Luís Paulo percebesse a presença
dele no palácio, tudo estaria acabado. Ela, principalmente, estaria
irremediavelmente perdida!
Era
absolutamente necessário afastar o fugitivo não apenas daquele aposento, mas
também da mansão e das imediações.
-
E então, Denise? - perguntou o malandro, vendo que ela estava em silêncio
pensando. - Como é? Que decide?
-
Não sei... Não sei...
-
A indecisão é um dos seus piores defeitos, sabe? Vamos acabar com isso:
decida-se, que eu não posso continuar neste estado...
-
Mas, que é que você quer que eu faça?
Num
pulo, o marginal se pôs de pé e disse, apontando para uma porta:
-
É por ali que se vai ao apartamento de seu marido, não é?
-
É. E daí? Que pretende fazer?
-
Por enquanto, acho que vou precisar de uma roupa dele e não tenho dúvida de que
temos o mesmo corpo e irei gostar do que ele usa, já que ele se veste nas melhores
alfaiatarias da cidade... Naturalmente, com o terno, precisarei de roupa
interior, meias, gravata, sapatos... Enfim, tudo isso que a gente usa. Isso,
por enquanto, depois pensaremos no resto...
-
Afonso, não cometa loucuras! Luís Paulo pode chegar de um instante para outro!
E se ele chegar, Afonso?!
-
Se é assim, trate de ajudar-me... A não ser que você prefira que eu chame um
criado ou o mordomo, para me dar uma ajuda.
Assim
falando, o delinquente se aproximou da campainha e estendeu o braço.
Antes,
porém, que tivesse tido tempo de fazê-la soar, Denise o deteve, com um grito:
-
Não, Afonso!... Farei tudo o que você quiser... Não faça isso!
-
Ah! Assim é que é bonito!...
-
Venha, então, para o meu quarto. Eu mesma tentarei trazer o que você precisa.
Mas, depois, por favor, prometa-me que irá embora... Irá, não é? Irá embora?
O
rapaz olhou-a com ar de compaixão.
-
Veremos. Por enquanto, trate de arranjar qualquer coisa que se coma e uma
garrafa de champanha, enquanto me lavo e me faço mais apresentável. Estou
faminto de verdade.
-
A estas horas? É muito tarde, eu não posso... Não é...
-
Basta! - cortou secamente o intruso, cônscio da sua superioridade. - Vá fazer o
que mandei, sem resmungos nem discussões! Lembre-se de que me deve obedecer em
tudo, se não quer que, com uma palavra, arranque-a desta gaiola dourada em que
vive!
Denise,
vencida, baixou a cabeça e murmurou:
-
Está bem, Afonso...
O
vigarista, com ar de senhor e dono, entrou no quarto da jovem baronesa e,
depois de passar um olhar em torno, dirigiu-se para o banheiro onde, após
fechar a porta, começou a se despir.
Enquanto
isso, Denise, tremendo só em pensar que Luís Paulo pudesse chegar de repente,
afobava-se tirando de um armário tudo o que Afonso ia precisar.
Enquanto
se deliciava com a água a lhe escorrer pelo corpo, o gatuno comentou com
sarcasmo:
-
Não se pode negar que Denise está cercada de todas as comodidades e todo o
conforto possíveis e imagináveis!
Momentos
depois, já vestindo um roupão, Afonso perguntou a baronesinha:
-
Esta janela dá para o jardim?
-
Não! - respondeu a moça. - Dá para um jardim suspenso... Por que quer saber?
-
É problema meu...
-
Afonso!...
-
Que é, querida?...
-
Em que loucura está agora pensando?
-
Loucura? Gosto sempre de saber onde me encontro. A propósito, ainda não fiz a
barba.
Denise
agitava-se para um lado e outro, cumprindo as ordens do bandido, como que
dominada por um íncubo, enquanto o bandido penetrava novamente no banheiro.
Não
fora o perigo de falhar no momento preciso, tentaria, sem hesitar, matar o
bandido, para se livrar dele de uma vez para sempre!
-
Ande depressa! Ande depressa! - pedia, de vez em quando.
-
Luís Paulo vai chegar... Já é tarde! Ele já está atrasado!...
A
baronesinha, porém, nesse ponto, se enganava, pensando assustar o chantagista
com aquelas palavras.
Do
banheiro vinha a voz dele como resposta:
-
Vamos acabar com essas lamúrias! Quanto ao barão, não sabe o que está ganhando,
demorando assim esta noite. Se bem que eu não quero nada com ele e nenhum mal
lhe farei enquanto não se intrometa nos meus assuntos.
Trêmula,
trazendo no braço um terno, camisa, cueca, sapatos e gravata, a baronesinha se
aproximou da porta do banheiro.
Quando
introduzia esse vestuário pela fresta que abriu, avistou, enfiada na fechadura,
a chave... Num relance pensou que se conseguisse trancar a porta e girar a
chave na fechadura, poderia encerrar Afonso no banheiro, chamar a polícia e
fazê-lo levar dali, antes que Luís Paulo aparecesse.
Cheia
de medo, encostou a mão na fechadura, ia segurar a chave... Antes, porém, de
ter tido tempo para pegá-la, o braço do bandido, avançou para ela e lhe segurou
o pulso, torcendo-o até fazê-la gritar de dor.
-
Eh! Que é isso, menininha?... Assim não entramos em acordo! - zombou Afonso,
puxando-a com violência. - Não queira bancar a espertinha comigo, que sou
mestre nesses truques!
Denise,
como se estivesse embriagada, cambaleou e se encostou à parede.
-
Pensou que ia me fazer de bobo? - continuou o bandido, dando uma risada. - Como
é tolinha! E logo depois que eu lhe perguntei para onde dava a janela! Eu teria
saído por ali e você teria o prazer de me ver desaparecer nas sombras da noite.
Está entendendo?
-
Você é um demônio!...
-
Bem... Agora me dê as roupinhas e, depois que eu me vestir, vamos ao champanha.
Ou, melhor, vá tratando disso, enquanto me visto como um fidalgo.
A
baronesinha cabisbaixa, derrotada, obedeceu. Enquanto arrumava às taças, pois trouxera
duas, como se para uma comemoração íntima, sentia tonturas, só de pensar em que
aquele miserável, aquele assassino sem escrúpulos, separado dela apenas por uma
porta e uma parede, tinha-a inteiramente nas mãos, era senhor do seu destino. E
naquela atmosfera de pesadelo, apenas uma coisa faltava: o aparecimento de Luís
Paulo!
Pela
primeira vez em sua vida, a pobre moça, de todo o coração, concentrou-se numa
prece: "Meu Deus, fazei com que Luís Paulo não volte tão cedo! Afonso é
capaz de matá-lo, é capaz de tudo!"
Naturalmente,
aquela súplica, aquela prece, feita naquelas condições, soava um pouco como o
pranto do crocodilo... Todavia, Afonso não lhe deu tempo de continuar a reza,
porque logo a seguir a porta se abriu e ele surgiu, completamente vestido
"à Luís Paulo", barbeado, engravatado, aspirando o perfume que
pusera, generosamente, num finíssimo lenço de seda.
Denise,
por um momento, custou a reconhecer naquele rapaz elegante e desembaraçado o
meliante sujo e rasgado que penetrara, pouco antes, no seu apartamento.
Mas
a voz de Afonso, no tom cínico de sempre, chamou-a à realidade:
-
Então, querida? Que tal estou? Olhe que as roupas de seu marido parecem ter
sido feitas sob medida para mim!
-
Está bem. E agora, que mais quer para ir embora?
-
Ih! Como é apressada! Nem mesmo me responde se estou bonitão, se estou
"legal"? Uma coisa, querida, depois da outra... A propósito, quero
avisá-la de que apanhei um relógio de ouro e uma abotoadura de brilhante, que
estavam em cima da prateleira, fica aborrecida?
-
Infame!
Sem
se importar com o insulto, o ladrão sentou-se comodamente e, virando uma taça
de champanha, disse:
-
E agora... Falemos de negócios...
Paulo, como Denise irá se sair dessa? Espero que não corra tudo bem pra ela, no final kkkkk, mas acho que ainda posará de vítima. Muito bom! Bjs.
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