quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

IRMÃOS CORAGEM - CAPÍTULO XI (FINAL)


Antes, de seu casamento, Jerônimo resolveu despedir-se de Potira. No descampado, o casal se abraçava, se beijava.
- É só uma despedida? - perguntou a índia.
- É. Uma despedida! - confirmou Jerônimo.
O longo e desesperado beijo selou o adeus dos dois. Jerônimo só não imaginava que esse encontro estivesse sendo fotografado por Pedro Barros.

Não era todo dia que um prefeito de Coroado se casava. Ainda mais com a filha de um deputado federal. Nesse casamento, nem João faltou. Protegido por seu bando, o garimpeiro não encontrou dificuldades em assistir à cerimônia. Pedro Barros espumou de ódio.

O delegado Falcão, temendo perder o cargo, passara-se para o lado de Jerônimo. Essa atitude gerou uma revolta incomensurável em Pedro Barros. O coronel resolveu entregar para o dr. Rodrigo as fotos de Jerônimo e Potira.
A briga entre o dr. Rodrigo e Jerônimo foi inevitável. O prestígio do prefeito e do promotor ficou bastante abalado entre a população. Pedro Barros exultou.

Duda sofrera grave contusão durante o jogo e estava de volta a Coroado para uma longa permanência. Seu retorno coincidiu com a briga entre Rodrigo e Jerônimo. Duda ouviu atento as explicações do irmão. Ele achava que, passado o período crítico, o promotor voltaria à razão.
- Amanhã ele estará normal - disse Duda, procurando tranqüilizar Jerônimo.

Depois dessa conversa, Duda resolveu ir até a Prefeitura. Ele desejava rever Ritinha. O reencontro resultou na reconciliação definitiva do casal. Ritinha já não suspeitava mais que Duda houvesse denunciado o pai. E Duda, exultante, afirmou:
- Quero que você volte pra casa. Quero sarar e mostrar todo o futebol que sei jogar. A gente vai viver junto e vai viver bem.

Semanas depois, uma notícia sobre um acidente automobilístico chegou até Coroado. O acidente envolvia Branca d’Ávila e um homem. Alberto foi até Belo Horizonte. No quarto do hospital, Alberto prontamente identificou o pai. Ele estava em estado muito grave. A mãe nem tanto. E ela falou a respeito de toda a farsa.
- ...naquele dia ele veio me buscar. Tinha tudo pronto pra embarcar pra Europa. Fiquei desesperada, pensando em você. No carro... tentei matar Lourenço. Estava fora de mim. Então ele fez uma manobra infeliz. Daí... bem... O resto você imagina ...
- E o diamante de João? - indagou Alberto.
- Ninguém sabe. Só Lourenço. Deixou guardado num lugar que só ele conhece.
Alberto estava revoltado com toda aquela sujeira e ameaçou contar tudo a João. Branca valeu-se de chantagem emocional.
- Se não mereço que você me perdoe, não me interessa mais continuar vivendo.
Isso desarvorou Alberto e ele decidiu esconder a verdade de João.
Afirmou que o homem hospitalizado não era seu pai. João acreditou no rapaz. Duda, que ainda estava em Coroado recuperando-se da contusão, duvidou e partiu para Belo Horizonte. Mas também ele não reconheceu Lourenço. E não foi por acaso: Branca havia subornado Iolanda, a enfermeira, para que colocasse outro paciente no lugar de Lourenço.

O coronel Pedro Barros resolveu cortar o fornecimento de água de Coroado. Era mais um desafio que ele lançava à autoridade de Jerônimo. A maldade do velho chefe do garimpo provocava náuseas no prefeito da cidade. Os dois discutiram acaloradamente.
- A água vai voltar e a gente não há de necessitar da sua esmola! - esbravejava Jerônimo.
- Pois muito bem, mocinho. A gente vai entrar numa luta feia. E lhe digo mais: não vou parar por aqui. Vou destruir tudo o que fiz com meu sacrifício - ameaçava Pedro Barros.
A guerra estava declarada. Jerônimo resolveu construir uma nova canalização para a cidade. Os jagunços do coronel procuravam sabotar o trabalho de todas as maneiras possíveis. Apesar disso, as obras avançavam. E assim, depois de uma semana de dificuldades, a canalização ficou pronta. A água começou a jorrar.
- Jeromo venceu! Jeromo venceu! - berrou Potira.

Na aldeia dos foragidos, João estava preocupado, pois Alberto fora preso. De repente, Cema entrou na tenda, muito alegre.
- João, adivinha quem está aí? .
Era Márcia. João ficou conhecendo então a nova personalidade de sua mulher. E gostou.
Na manhã seguinte, enquanto João, embevecido, acariciava a mão de Márcia, Braz entrou na tenda. O negro informou que o contato com A1berto estava difícil. E esse contato era fundamental: João queria saber para onde fora Branca d'Ávila. E Alberto era o único que poderia informar.

Num afastado subúrbio de Belo Horizonte, Branca cuidava do marido.
- Você devia era estar num sanatório, Lourenço.
- Num sanatório, todo mundo vai me procurar. Aquele cretino do jogador deu o serviço.
- Ninguém acreditou nele, amor!
- Acho que vou ficar entravado pro resto da vida. Mas, um consolo eu tenho. Se morro, ninguém vai saber onde está o diamante. Nem você, nem o idiota do João Coragem. .
- Eu não estou interessada no diamante. Aquele seu amigo sujo, o Gastão, é que está. E se ele não dá cabo de você é de medo de não descobrir nunca mais onde você guardou a pedra.
Três dias depois, Lourenço despertou com um ruído na sala.
- Branca, é você? - perguntou, preocupado.
Era Gastão. Quando Branca retornou, Lourenço havia desaparecido .

João arquitetou um plano para libertar Alberto. Desta vez, seus planos falharam. João foi preso no interior da igreja. A multidão aglomerou-se na porta para assistir à saída do prisioneiro. Diversos guardas o cercavam.
Passados alguns dias, Márcia foi visitar o marido na prisão. Sua presença enterneceu o garimpeiro. Ela beijou-o com ternura e abraçaram-se demoradamente. João devaneava com a gravidez de Márcia. Pensava no nome da criança:
- Que tal Bastião?
- Nossa mãe! - exclamou Márcia, sorrindo.
- Uai! É o nome do meu pai. Sebastião Coragem!
- Ah, Sebastião, sim! Bastião, não!

Depois que João foi preso, um fato novo polarizou as atenções de Coroado: a determinação judicial para a exumação do cadáver de Lourenço. Corroído pelo tempo, o caixão de madeira apodrecida descansava sobre a terra revolvida, ao lado da sepultura. Um cheiro repulsivo agredia os presentes. Um pequeno grupo ali estava, pronto para o trabalho de identificação do morto: o dr. Maciel, o dentista Moreira, o dr. Rodrigo, o delegado Falcão, Jerônimo, João, Alberto, Branca e Pedro Barros. Quando abriram a tampa do caixão, Branca, de pronto, afirmou:
- Meu Deus! É ele mesmo!
- Gente! Este é o meu pai! - bradou Alberto, surpreso.
- Não tem dúvida! Este é Lourenço! - confirmou o coronel.
Falcão chamou o dentista para dar a última palavra. Moreira examinou a arcada dentária e balançou a cabeça, confirmando. Era Lourenço. Não havia dúvidas. Branca e Alberto entreolharam-se, surpresos. Um fato chamou a atenção do dr. Maciel.
- Pelo tempo, devia estar em pior estado!
- Isso quer dizer alguma coisa? - perguntou Rodrigo, com uma ponta de suspeita.
- Não, às vezes acontece... Depende muito do terreno onde foi enterrado. O daqui é propício à conservação - explicou o médico.
Jerônimo conversava baixinho com o irmão algemado:
- Sinto muito, mano... mas parece que não tem dúvida. Não desanima. A gente tira você dessa situação.

Passadas as primeiras horas de surpresa, Branca agora jantava no quarto do hotel. Laport, o homem com quem se casara, estava com ela.
- Era Lourenço! Ele mesmo!
Laport, com sua pronúncia de estrangeiro, dizia que tinha de ser um engano. Branca não concordava e passou a acusar Gastão.
- Gaston... non... non. Gaston viajou pro estrangeiro, fugido da polícia. Há mais de um mês. Ele non poderia vir até aqui para trocar o corpo.
Branca ficava cada vez mais intrigada. Por fim, Laport segurou com força as mãos da mulher e disse:
- Chegou o momento de lhe contar o que sei sobre o paradeiro de Lourenço!             .

No dia seguinte, Branca dirigiu-se à delegacia. Alberto perguntou se a mãe imaginava quem poderia ter assassinado o pai. Branca contou-lhe então tudo o que Laport havia dito:
- Talvez tenha sido a mulher que ele procurou em São Paulo.
- Que mulher?
- Uma sujeitinha por quem Lourenço tinha verdadeira loucura.
Estela Barros. A ex-mulher de Pedro Barros.
Alberto arregalou os olhos de espanto.

Alguns meses depois, o destino de João ia ser decidido. Enquanto o conduziam ao tribunal, seu pensamento estava em Márcia e no filho prestes a nascer. No julgamento, apesar da apaixonada defesa do dr. Rodrigo, João foi condenado a vinte anos de prisão.
Já na cela, o ex-garimpeiro não conteve o entusiasmo ao receber a notícia do nascimento de seu filho. Diante de tal felicidade, Alberto, revoltado com a injustiça cometida, resolveu-se: revelaria toda a verdade. E isso não tardou.
- Doutor Rodrigo, o corpo que nós vimos era do meu pai, mas não era o mesmo que foi enterrado há mais de um ano atrás. Meu pai morreu duas vezes e em nenhuma delas foi João quem matou. Minha mãe pode confirmar a história...
O promotor, aturdido com tal revelação, não tardou em procurar Branca d' Ávila. Cansada de sustentar a farsa, ela confirmou o relato de Alberto. O dr. Rodrigo não perdeu tempo. Pediu a revisão criminal do processo e conseguiu a liberdade condicional de seu amigo.
João viajou então para São Paulo, seguindo a trilha que levava ao responsável pelo roubo do diamante. Num parque de diversões, finalmente localizou e aprisionou o homem; o mesmo que havia roubado o diamante de Lourenço e matado Estela poucos dias antes: Hernani!
Na delegacia, Hernani confessou toda a trama:
- Conheci Estela em São Paulo. Foi por uma coincidência. Ficamos íntimos. Um dia ela me confessou que estava muito aflita. Tinha sido procurada por um homem. Pensou que ele estivesse morto. Era Lourenço d' Avila. Eu já conhecia toda a história, por meio de Duda. Então, bolei meu plano. Mandei que ela enganasse Lourenço e descobrisse onde estava a pedra. Ele acabou por dizer. Tinha deixado o diamante com Iolanda, uma enfermeira de Belo Horizonte. Quando ele desconfiou de minha existência, era tarde. Tentou me pegar e eu o matei para me defender. Depois foi aquele problema. A gente não sabia o que fazer com o corpo. Aí veio a idéia. Levamos o corpo até Coroado e fomos diretamente ao cemitério.
- E trocaram os corpos? - indagou o delegado.
Hernani confirmou e prosseguiu:
- Daí nos dirigimos a Belo Horizonte. Seduzi a enfermeira e não foi difícil conseguir o diamante. Eu possuía uma fortuna nas mãos e o único empecilho era Estela. Então...
- E onde está o diamante?
Hernani deu a informação pedida. O delegado chamou João.
- Tenho uma boa notícia, João. O seu diamante lhe será devolvido.
- Graças a Deus! - exclamou o garimpeiro.

Duda, já refeito da contusão, precisava retornar a São Paulo e reintegrar-se ao elenco do Corinthians. Apenas Rita o detinha em Coroado. Ela teria de decidir: ir ou não com Duda? Os apelos repletos de amor e carinho de Duda a convenceram: ela partiria com o marido. Os dois não podiam mais viver separados. Um beijo prolongado selou a reconciliação definitiva do casal.
Ao contrário de Duda e Ritinha, Jerônimo e Lídia não se entendiam. O casamento estava por um fio. Brigas diárias e o pensamento constantemente voltado para Potira pressionavam Jerônimo.
Numa noite, Lídia decidiu-se. Ela aguardava a chegada do marido para romper de vez com tudo. Jerônimo surpreendeu-se quando abriu a porta. Lídia não se movia. Tranqüila, apontava um revólver em sua direção.
- Cheguei a um ponto, Jerônimo, que não suporto mais. Prefiro te ver morto, do que saber que você está junto daquela índia.
- Será que você não entende que eu não gosto de você?
- Por causa dela? - perguntou Lídia, mordendo os lábios com raiva.
- Por causa de ninguém! Mulher nenhuma pode obrigar um homem a ter amor por ela!
- Eu queria lutar pra te conquistar! Mas agora eu quero que você morra!
No instante em que Lídia se preparava para acionar o gatilho, Jerônimo, num gesto rápido, agarrou-lhe a mão, voltando inadvertidamente o cano na direção da esposa. O tiro ecoou forte em meio à luta do casal. Lídia arregalou os olhos e pôs a mão sobre o estômago. Lentamente, foi caindo ao chão. O ferimento era grave. Então, Jerônirno, desesperado, abandonou a casa, levando a arma. Procurou Potira, e os dois, como alucinados, partiram para longe de Coroado.
A desgraça de Jerônimo não estava completa. Em sua fuga, encontrou Manuel, um homem que prestara depoimento falso, incriminando João Coragem em seu julgamento. A discussão foi inevitável. Manuel avançou na direção de Jerônimo. Para defender-se, o jovem sacou a arma e atirou. O tiro atingiu o adversário. Jerônimo e Potira deixaram o local a galope. Manuel agonizava.
Alguns dias depois, o dr. Rodrigo, após obter informações de um e de outro, encontrou o refúgio dos fugitivos. Jerônimo não estava. Potira admirou-se com a chegada do marido. Ele, educadamente, procurou convencê-la a voltar, dizendo que a polícia estava atrás de Jerônimo. A índia bateu o pé: ficaria com "Jeromo" até o fim.
Desconsolado, Rodrigo voltou para Coroado.
Quando Jerônimo chegou, Potira informou-lhe da visita de Rodrigo e da provável chegada da polícia. Eles não perderam tempo. Fugiram de novo.

Lara, Diana ou Márcia? O dr. Rafael resolveu pôr um fim nessa história. Decidiu internar a moça numa clínica do Rio de Janeiro e submetê-la a tratamento intensivo. João, apreensivo, aguardava o fim da terapia. Desejava ardentemente que a personalidade vencedora não fosse a de Diana.
Nos primeiros dias, a moça estava completamente desarvorada.
Não conseguia se recordar de nada. João se desesperava.
Os resultados positivos começaram a aparecer quando ela se recordou da existência do filho dela e de João. O garimpeiro alegrou­se. Com o passar dos dias, a memória foi voltando e uma nova-velha mulher ia surgindo: Maria de Lara. Uma Lara mais consciente, capaz de assumir todos os aspectos de sua personalidade e de lidar com eles.

Pedro Barros, destituído de seu antigo poder, ia perdendo sua fortuna. Falcão, ameaçando delatar as trapaças do outrora todo­poderoso coronel, havia ficado com o garimpo e com diversas pedras preciosas. Mas sua alegria não durou muito. Um novo delegado foi nomeado para a cidade e Falcão acabou preso, por corrupção.
Castro, o novo delegado, resolveu sair em perseguição ao ex­prefeito. Jerônimo, acusado de atirar em Lídia e Manuel, tivera seu mandato cassado e tornara-se um fora-da-lei.
João, que estava em Coroado para buscar o filho e levá-lo a Lara, encontrou o irmão no rancho. Para João, Jerônimo não tinha escolha: ele deveria fugir. Sinhana apoiou essa decisão. Jerônimo concordou. Sem dizer palavra, João entregou o diamante ao irmão.
- Mas o que significa isso? - indagou Jerônimo, admirado.
- Eu te dou meu diamante. Assim você consegue se arrumar. Se manda pra bem longe e começa tudo de novo...
Diante de tal generosidade, Jerônimo mostrou-se extremamente comovido. Abraçou o irmão com ímpeto, contendo as lágrimas. Sinhana, chorando num canto, pedia:
- Vai, Jerônimo, vai! Não perde tempo.
Jerônimo, alegre, retomou ao esconderijo e contou do nobre gesto de João a Potira. A índia arregalou os olhos ao ver o diamante.
- Virgem Mãe! É bom demais! - exclamou ela.
Nesse instante, Jerônimo ouviu ruídos do lado de fora do casebre. Era a polícia. Partiu apressadamente com sua amada.
Algumas horas mais tarde, foram alcançados.
- Não podem estar longe - disse Castro para seus homens. ­ Eles desapareceram por aqui. Procurem por todo buraco que existe.Têm de estar aqui!
Havia algo mais importante para os policiais que o fugitivo: eles suspeitavam que o diamante estava com Jerônimo.
Acabaram descobrindo o casal atrás de uma moita densa, protegido pela escuridão.
- Jerônimo Coragem, te dou um minuto pra sair desse buraco! Se você não sair eu vou atirar pra valer! - gritou o delegado.
- Atira! Vem que você também leva chumbo, delegado do diabo! - respondeu Jerônimo.
- Você está se suicidando, Jerônimo!
- Estou mais é esperando o primeiro safado que tiver coragem de se aproximar! - desafiou Jerônimo.
- O tempo está passando!
Potira começou a desesperar-se. Gritou:
- A gente se entrega, delegado.
- Cala a boca, índia! - disse Jerônimo, impedindo que Potira se levantasse.
- Tempo esgotado, Jerônimo, O que você resolve? - gritou Castro.
Aproveitando-se de um descuido do amante, Potira levantou-se e saiu em disparada.
- Eles te matam, índia! - gritou Jerônimo, desesperado.
Um dos policiais fez pontaria e atirou. Castro, pasmo, pulou na direção do policial, gritando:
- Seu louco! Seu louco!
Potira, com a mão ao peito, arrastava-se pelo chão, deixando uma trilha de sangue. Jerônimo, enlouquecido, puxou-a de volta: para o interior da mata.
- Índia! O que foi isso, índia? Por que você não me ouviu? Te carreguei criança, cantei pra te dormir...
Jerônimo levantou o corpo da mulher nos braços e gritou desesperadamente:
- A índia está morta! Morta, seus assassinos!
Começou a atirar alucinadamente. Em todas as direções.
- Pare de atirar, Jerônimo! Pare! - advertiu Castro.
Mas, desvairado, ele não parou de atirar. Levantou-se e começou a correr loucamente.
- Me mata também, cachorro!
Uma chuva de balas atingiu-o mortalmente. Num derradeiro esforço, Jerônimo olhou a face pálida da mulher a quem amava. Cambaleante, aproximou-se dela, inclinou-se e encostou seus lábios: nos lábios de Potira. Por fim, tombou sobre seu corpo.

No necrotério, Sinhana debruçava-se sobre o corpo do filho morto. João Coragem, com os olhos cheios de lágrimas, não conseguia acreditar no que tinha acontecido. Um homem aproximou-se dele e contou-lhe que os policiais mataram Jerônimo porque estavam atrás do diamante.
"O diamante, o diamante", pensou João. "Mais uma vez o dia­mante foi a perdição." Vasculhou as roupas do irmão e retirou a pedra da bolsinha de couro. Os policiais não o haviam encontrado. Então, como um desvairado, João correu até a praça e gritou para toda a cidade:
- Venha todo mundo! Todo mundo que quer ficar rico depressa! Eu vou distribuir riqueza! Meu irmão e a índia morreram! Vocês não querem festejar? Venham! Venham festejar com o diamante de João Coragem!
Colocou o diamante sobre uma pedra no centro da praça, e com tiros certeiros estilhaçou-o. O povo lançou-se avidamente sobre os pedaços brilhantes do que fora o maior diamante do mundo.

Profundamente abalado, João regressou ao Rio, ao encontro de Lara, levando consigo o filho. Uma alegria o aguardava: Lara estava cada dia melhor.
- O bom é a gente se sentir assim - disse ela. - De alma limpa. Como eu me sinto agora com relação a todas as coisas que me aconteceram. O importante é a gente ter vontade de viver. Acho que fizeram algum transplante de otimismo pra dentro do meu cérebro.

Passados alguns dias, o casal voltou a Coroado. Lara resolveu procurar o pai.
- Eu vim buscar o senhor. João quer ajudá-lo.
O coronel, já completamente louco, devido a seu declínio moral e financeiro, não queria nenhum favor.
- Vai embora com seu marido! Eu quero ficar sozinho e em paz! Estou maquinando um jeito de me vingar de todo mundo! Anda, vai com ele e me deixa cuidar da minha vida!

A vingança de Pedro Barros não tardou: ele colocou fogo em Coroado. Ria loucamente, assistindo à destruição da cidade que havia criado. As labaredas podiam ser vistas a léguas de distância. Coroado transformara-se em fogo e cinzas. A cidade deixara de existir. Pedro Barros penetrou numa casa tomada pelas chamas. Foi seu último gesto.

João, avisado do desvairado gesto de Pedro Barros, abandonou rancho e dirigiu-se à cidade em ruínas. Sua fisionomia parecia irradiar estranha luminosidade ao badalar o sino da igreja semi­destruída. Era o chamamento para a perplexa população da cidade.
- O sino é pra chamar vocês pra refazer tudo direitinho como era antes! - falava em tom místico, profetizando uma nova era para o povo da região. - Vamos fazer uma cidade melhor. Muito melhor! Porque agora não vamos ter mais luta! Nem exploração! Agora, o que restou de tudo foi uma lição de amor e paz! Vamos, minha gente!
Os primeiros movimentos entusiasmaram o líder. Os escombros começaram a ser removidos. Pessoas surgiam de todos os cantos. Um formigueiro. Pás, picaretas, enxadas. Lara ria e chorava. Sinhana ajoelhou-se numa escada suja de água e cinza. Padre Bento fez o sinal da cruz. Cema e Braz abraçaram-se, confiantes no futuro.
Certamente, Coroado renasceria das cinzas da destruição.

A AUTORA

Mineira, nascida em Conquista, Janete Emmer Dias Gomes, ou a inesquecível JANETE CLAIR, iniciou sua carreira em 1.946, como locutora e radioatriz na Rádio Tupi Difusora de São Paulo. Ao se casar com o escritor e dramaturgo Dias Gomes, Janete mudou-se para o Rio de Janeiro, e foi lá que, em 1956, escreveu para a Rádio Nacional sua primeira novela radiofônica: Perdão, Meu Filho. Depois de dez anos inteiramente dedicados ao rádio, Janete foi levada, por Fábio Sabag, à TV Tupi do Rio: a novela O Acusador, protagonizada por Jardel Filho, marcou sua estréia nessa rede. Foi um início tão notável que, em 1967, o caminho estava aberto para a TV Globo.
No final da década de 60, os melodramas importados já não tinham mais a mesma aceitação e, por esse motivo, histórias tipicamente brasileiras passaram a surgir no vídeo. Como Véu de Noiva, novela que lançou Regina Duarte (a "namoradinha do Brasil") na TV Globo e, ao mesmo tempo, reforçou o prestígio de Janete Clair.
"Escrevo sobre aquilo que conheço: a classe média", afirmava a autora. "E tenho o cuidado de fazê-lo ao gosto bem popular, não escondendo os problemas, mas tratando-os com mão leve. A idéia é tornar a vida e os conflitos humanos bem acessíveis a todos, fazendo com que os personagens vivam, e não apenas conversem sobre seus dramas."
Essa era a receita infalível de Janete, uma autora que, com seu jeito próprio de contar histórias, sempre bateu recordes de audiência. Um exemplo vivo disso foi Pai Herói: em certos capítulos, registrou-se um índice de 98% de televisores ligados em todo o país.
Outras novelas de destaque: Sangue e Areia (1968); Paço dos Ventos (1968); Rosa Rebelde (1969); Irmãos Coragem (1970); O Homem que Deve Morrer (1971); Selva de Pedra (1972); O Semi-Deus (1973); Fogo sobre Terra (1975); Bravo (1976); Pecado Capital (1976); Duas Vidas (1977); O Astro (1978): Coração Alado (1980); Sétimo Sentido (1982); Eu Prometo (1983) – terminada por Dias Gomes, devido ao desaparecimento de Janete, em 16 de novembro de 1983.

FICHA TÉCNICA

IRMÃOS CORAGEM

Autora: Janete Clair
Diretores: Milton Gonçalves e Daniel Filho

ELENCO

Tarcísio Meira - João
Cláudio Marzo - Eduardo (Duda)
Cláudio Cavalcanti – Jerônimo
Glória Menezes- Lara, Diana, Márcia
Regina Duarte. - Ritinha
Sônia Braga - Lídia
Zilka Salaberry – Sinhana
Lúcia Alves - Potira
José Augusto Branco – Rodrigo
Milton Gonçalves - Braz
Susana Faini – Cema
Helmício Fróes – Lourenço
Gilberto Martinho - Pedra Barros
Míriam Pires - Dalva
Ana Ariel – Domingas
Emiliano Queiroz - Juca Cipó
Dary Reis - Lázaro
Carlos Eduardo Dolabella ­ Falcão
Enio Santos - Maciel
Neuza Amaral - Branca          
Glauce Rocha - Estela
Macedo Neto - Padre Bento
Míriam Pérsia - Paula
Paulo Araújo - Hernani
Jurema Penna - Indaiá

VÍDEOS

O FIM DE JERÔNIMO E POTIRA




JOÃO CORAGEM DESTRÓI O DIAMANTE


3 comentários:

  1. JE, muita coisa que li aqui, no romance, eu não lembrava , como a troca de corpos e a morte de Lourenço, mas a morte de Jerônimo e Potira, é daquelas cenas que não se esquece! E o incêndio provocado por Pedro Barros que gritava: - Eu sou o Nero de Coroado!, também é inesquecível! Amei esse romance! Obrigada, JE por me trazer essas lembranças de uma época tão boa em minha vida! Beijos.

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  2. JE, foi muito bom acompanhar Irmãos Coragem assim como Pai Herói. Adorei esse final de João pedir ajuda para população para Reconstruir Coroado.
    Obrigada por mais esse romance publicado. Que venha Locomotivas.
    Beijos

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