O INFERNO
DE UM ANJO
Romance-folhetim
Título original:
L’enfer d’unAnge
Henriette de Tremière/o inferno de um anjo
e revisado por Paulo Sena
Rev. G.H.
BIBLIOTECA GRANDE HOTEL
Capítulo XI
AMOR DE
SERPENTE
Luís Paulo
estava preso na camisa de força havia mais de quatorze horas, sentia a cabeça
em chamas e doía-lhe todo o corpo, vendo-se
obrigado a permanecer sempre na mesma posição.
Mas o
sofrimento físico que experimentava era nada em comparação com as torturas
morais. Porque ele sabia que Maria ''Flor de Amor" estava sem nenhuma
ajuda, nem esperança de salvação, nas mãos do terrível doutor Démon e, não só
isto, mas também, nas mãos daquela espiã que o enganara de modo tão vulgar e
vil.
Odiava o doutor
Démon, porém, mais ainda, aquela infame mulher que, fazendo-se de vítima, quis
convertê-lo no assassino de sua própria amada.
A aurora havia
despontado há pouco, quando o rapaz foi arrancado da penosa meditação pelo
ruído dos cadeados e a porta se abria.
O doutor Judas
Démon entrou na cela, com o ar mais natural do mundo e, aproximando-se de Luís
Paulo disse, com um sorriso escarninho:
- Mocinho, os
seus sofrimentos me comovem, e então resolvi conceder-lhe repouso e libertação.
Luís Paulo lhe lançou um olhar desdenhoso.
- Compreendo
perfeitamente o que quer dizer, estar pretendendo eliminar-me! Mas não pense
que lhe darei a satisfação de começar a chorar e a gritar. Enfrentarei a morte
com serenidade, certo de que o senhor pagará muito caro e quanto antes pelos
seus crimes! Espero apenas que eu lhe baste e que a pobre e inocente Maria
"Flor de Amor", consiga a liberdade.
As nobres
palavras do rapaz não impressionaram nem um pouco o médico dos loucos, que
disse, com leve sorriso nos lábios finos e cruéis:
- Não sou tão mau como julga. Apenas...
Naquele
momento, a voz estridente da marquesa Renata que há pouco aparecera na porta o
interrompeu:
- Doutor Démon, não terá a intenção de
matá-lo, espero!
O médico fixou a marquesa através dos
grossos óculos escuros.
- Minha
querida, acho que não o matarei, mas tenho a impressão de que você não percebe
que este rapaz pode pôr-nos a perder!
Ele sabe demais!
Renata quis
replicar, mas depois se conteve, talvez para evitar fazê-lo na frente de Luís
Paulo e convidou o médico a sair com ela.
Quando chegaram
ao gabinete do doutor Démon, sentou-se e perguntou com ironia:
- Como é, bela
marquesa? Imaginou por acaso algum método rápido e científico para nos livrar
daquele intrometido? Ouçamos! Aprecio sempre a boa vontade, onde quer que a
encontre.
Sem notar o tom de zombaria, Renata
respondeu:
- Não imaginei
método nenhum. O que penso é que não devemos fazer nada, absolutamente, contra
ele!
- Nada?! -
repetiu Démon, maravilhado. - Se não a conhecesse bem, diria que está enamorada
do rapaz!
- E se fosse?
Atualmente, não sou livre para fazer o que me apraz? Pois olhe, eu me afeiçoei
a ele, sim... E não permito que lhe façam mal! Deixe-o por minha conta,
entendeu?
O doutor se agitou na poltrona, incerto.
- Quer dizer que... Quer que eu o entregue
à senhora?
- Isto mesmo!
- Mas Renata -
disse Démon rindo - você parece não compreender que ele a odeia mortalmente!
Não o ouviu falar, há pouco?
- Não se preocupe. Farei com que ele mude
de opinião.
- E eu que ganharei, depois de todo o
trabalho que tive?
Uma luz de
maldade passou pelos olhos da marquesa Renata Duplessis.
- Ora, Judas,
não se faça de ingênuo! Pensa que não notei que essa pequena dengosa, a tal...
Maria, lhe agradou muito?
- Não nego que
ela me atraia... - riu sarcástico o doutor diabólico - mas tenho bem poucas
esperanças de obter sucesso, já que ela está enamorada de outro. Já não sou
jovem e as coisas obtidas pela força não me agradam mais.
- Pois olhe,
tem muitíssimas esperanças! Bastará agirmos com um pouco de astúcia. Bastará
fazermos com que um pense que o outro o trai. Compreende agora?
- Ah, ah, ah! - riu Démon. - A ideia não é
má!
- Está vendo? E
agora, vamos libertar o meu cavalheiro, depois pensaremos na sua dama. Por
falar nisto, será oportuno dar-lhe alguns dos seus "remédios",
doutor, até mesmo para que ela não perceba a mudança de quarto... Assim o
engano parecerá mais natural, não acha?
Pálido como um
cadáver, Luís Paulo dormia num macio leito, não mais na sórdida cela, mas num
dos melhores quartos da clínica.
Seu sonho era
produto de um sonífero dissolvido no chá, que Viviana fez o rapaz ingerir.
Quando Luís
Paulo começou a voltar a si da letargia em que fora mergulhado, ficou
maravilhado por não sentir mais em volta de seus membros a pressão cruel da
camisa de força, Volveu em torno os olhos doloridos e o assombro aumentou
quando viu a seu lado uma freira, como rosto quase completamente escondido pelo
capuz branco.
Mal Luís Paulo
se mexeu, a freira se levantou da cadeira onde estivera sentada até aquele momento
murmurando uma prece, e aproximando-sedo leito perguntou:
- Como está? Sente-se melhor, hoje?
Ele passou a
mão pelos olhos, para estar seguro de que não sonhava.
- Sim, bastante
-murmurou. - Só que... Sinto-me fraco, muito fraco.
-Há de melhorar, verá.
- Irmã... Posso
saber onde estou? Não é possível que isto seja um dos quartos daquela horrível
clínica. Sinto O cérebro um pouco transtornado, mas, se não me engano, eu
estava numa situação bastante crítica. Quem me salvou? Responda, por favor!
A freira lhe passou, com gentileza, um
pano úmido na testa.
- Não se
exalte, por favor, - aconselhou, - não compreendo a que mudança o senhor se
refere... Mas o médico me ordenou que lhe falasse o menos possível, para que
não lhe voltasse a febre. O senhor está num hospital para onde foi trazido por
umas pessoas que o encontraram estendido no chão, sem sentidos, à beira do
grande bosque, fora da cidade.
- Mas então...
Maria "Flor de Amor"... À clínica dos horrores...
O doutor Démon... - balbuciou o rapaz. - Foi tudo alucinação? Não... Não pode
ser... Foi real demais! Irmã, estou mesmo num hospital? Tem certeza disto?
- Que
perguntas! Naturalmente! Este é o hospital de Saint-Gilbert e o senhor teve uma
violenta febre! Quanta coisa horrível disse durante o delírio!
- Eu... O que foi
que eu disse?
- Não entendi
bem, mas falou em loucos, em manicômio... E também numa tal Maria, que estava
em perigo e que o senhor queria salvar... Gritava, contorcia-se! Pensávamos que
fosse morrer!
Luís Paulo
cerrou os olhos por um instante, como para coordenar as ideias, que se
sobrepunham em seu cérebro.
- Mas então...
Foi tudo um sonho?! E "Flor de Amor"... A angelical Maria, não passou
de uma criação de minha fantasia?
- O delírio
prega peças de mau gosto... - concordou a freira. - Mas agora repouse e não
fale. Tome, engula estas pílulas e depois faça o possível para dormir. Sou a
sua enfermeira e ficarei a seu lado.
- Como se chama, irmã?
- Catarina...
- Agradeço-lhe os cuidados que teve
comigo... Realmente, eu não poderia desejar enfermeira melhor. Engraçado...
Ainda não consigo conformar-me de que tenha sido tudo um sonho. Mas estou com
tanto sono...
Não teve tempo
de terminar a frase, abandonou a cabeça no travesseiro e adormeceu outra vez,
profundamente. Os medicamentos do doutor Démon não deixavam nunca de produzir
efeito!
Enquanto isto, a
freira, logo que teve certeza de que o rapaz dormia, tirou o capuz que lhe
cobria quase por completo o rosto e o cintilar de seus grandes olhos verdes
revelou que ela era realmente a marquesa Renata!
Paulo que dupla terrível esse Dr. Démon e a marquesa Renata! Pobres jovens, tão ingênuos Luís Paulo e Flor de Amor, como vão sofrer nesse inferno! Que drama!
ResponderExcluirMais maldades de Renata e Démon. Quanto maior a maldade, maior o castigo nos folhetins. Vamos ver no final o que será feito desses dois. Paulo, excelente trabalho!
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