O INFERNO
DE UM ANJO
Romance-folhetim
Título original:
L’enfer d’un Ange
Henriette de Tremière/o inferno de um anjo
e revisado por Paulo Sena
Rev. G.H.
BIBLIOTECA GRANDE HOTEL
Capítulo
XXVII
A
INCRÍVEL RIVAL
No
magnífico palacete do conde Fernando, naquela bela manhã de sol, reinava grande
animação. Reluzentes carruagens chegavam sem cessar à alameda arborizada e
vinham estacionar no jardim que circundava a entrada principal.
Desciam
deles senhoras e cavalheiros elegantíssimos que, uma vez recebidos pelo mordomo
do conde, eram introduzidos num grande salão térreo, esplendorosamente
enfeitado, por motivo da cerimônia nupcial que teria lugar dentro em pouco. Servidores
de libré percorriam, atarefados, os corredores e salas, subindo e descendo as
escadas, num vaivém contínuo, numa febre de atividade proporcional à
importância do iminente acontecimento. Enquanto os convidados continuavam a
chegar e se entretinham conversando no interior do palacete ou passeando pelo
magnífico jardim, Denise Chanteloup, a noiva, num aposento reservado, diante de
um grande espelho, fitava a si mesma, satisfeita, admirando sua inegável
beleza.
Maria
"Flor de Amor", a loura jovem recém-admitida ao seu serviço, com
hábeis toques da mãozinha treinada, arranjava os últimos detalhes do vestido
nupcial, todo de renda branca, em cuja confecção o "atelier" de dona
Eufêmia gastara quase uma semana.
Acabando
de ajeitar o véu, que punha um toque vaidoso sobre os ombros da condessinha,
Maria "Flor de Amor", sem a menor pontinha de inveja, não se cansava
de admirar a beleza da outra e tudo fazia para que o vestido e os adornos
pusessem ainda mais em relevo o falso ar de pureza e ingenuidade que, na
realidade, era apenas uma simulação matreira da filha da marquesa Renata.
Denise,
no entanto, no auge da satisfação, cheia de vaidade, não cessava de admirar-se,
olhando-se no espelho, perguntando a cada momento:
-
Estou bonita? Bem bonita?... Não estarei pálida demais? Vou agradar aos
convidados e ao meu noivo? Não seria melhor pintar-me um pouquinho mais? Um
toquezinho de "rouge"? A bondosa Maria "Flor de Amor", com
inesgotável paciência, tratava de tranquilizá-la:
-
Está linda, condessinha! Parece uma fada e quanto à sua ligeira palidez, isso
até ajuda, eu lhe asseguro. E vai passar, daqui a pouco. Naturalmente, na hora,
lhe virá um pouco de excitação, pois este é um acontecimento belíssimo na vida
de uma mulher, um acontecimento que sempre se recorda com emoção, aconteça o
que acontecer depois!
-
Eu sei... Nunca me senti tão emocionada... - concordou Denise. - Estou pronta,
agora? Já arrumou tudo direitinho?
-
Está perfeita, condessa.
A
noiva lançou ainda um olhar demorado ao espelho, depois acrescentou, com
evidente irritação:
-
E meu noivo? Por que ainda não apareceu? Já devia ter chegado!... - estranho...
Já estou ficando nervosa!
Para
distraí-la, Maria "Flor de Amor" perguntou:
-
Seu noivo é muito bonito?
-
Oh! - seus olhos cintilaram. - É bonitão! Tem tudo o que se pode desejar num
homem! Quanto mais eu o olho, mais sinto o desejo de dar cabo daquela víbora
que me quer arrebatá-lo!
-
Não deve falar assim, condessinha... Ainda mais no dia do seu casamento... E,
além disso, mesmo que a tal moça o ame como a senhorita o ama, a esta hora seu
coração estará sangrando e se sentirá tão infeliz! Não sente pena dela?
-
Eu, pena dela?! - replicou Denise, batendo um dos pés no chão raivosamente. -
Quisera vê-la morta, isso sim!
Interrompeu-se,
vendo que Maria a fitava, admirada. Percebeu que pusera demasiadamente às
claras sua crueldade e logo tratou de corrigir:
-
Mas você, afinal, é quem tem razão, não devo estragar minha felicidade pensando
nela. Quando estiver casada, ninguém me poderá roubar o homem que amo! A
propósito, os convidados já devem ter chegado todos, não acha?
-
Acho que sim, condessinha. Se visse como o salão está cheio!
-
Oh! Como meu coração está batendo! Só o que me desgosta é meu pai ter cismado
de escolher aquela igrejinha, perdida no meio do bosque.
-
Mas condessinha - disse Maria "Flor de Amor", espantada - de certo
modo, a cerimônia terá um caráter de maior intimidade.
-
Sim, mas eu gostaria muito mais de casar-me na cidade, na catedral, sendo
oficiante o bispo. Meu pai, infelizmente, não quis dar o braço a torcer. Diz
ele que seus pais se casaram naquela igreja. E daí? Que importância tem isso?
Embora
estranhando que a filha de um nobre não percebesse a importância de uma
tradição de família, Maria "Flor de Amor" respondeu, para não
demonstrar ficando calada, que desaprovava o pensamento da outra:
-
Talvez seja pelo fato da igrejinha, estando perto do palacete, ser mais
conveniente e oferecer mais comodidade. Se o casamento fosse realizado na
cidade, teria de ser percorrido um bom trajeto para voltar até aqui.
-
Sim, pode ser isso, - concordou Denise sem grande convicção, mostrando não dar
muita importância à opinião da jovem. - Ufa! Por que meu noivo ainda não terá
chegado! Oxalá não lhe tenha acontecido alguma coisa...
Nesse
momento, alguém bateu levemente à porta.
-
É ele! - exclamou Denise, agitada. - Chegou! - E em voz mais alta: - Entre!
Pode entrar!
A
porta se abriu vagarosamente, mas, em vez de Luís Paulo, foi Pedro, o mordomo,
quem apareceu, e ele disse, curvando-se:
-
Condessinha, no salão verde há uma senhora que deseja falar-lhe.
-
Pedro! Admiro-me muito! Parece-lhe, acaso, que este momento é próprio para
anunciar-me uma visita? Tenha um pouco de bom-senso, homem! Se essa criatura
quer me ver, que vá para o salão, com os demais, e que espere!
O
velho mordomo, humilhado com aquele tratamento a que não estava habituado,
baixou a cabeça, murmurando:
-
Desculpe... Perdoe-me, condessinha... Mas é que a senhora insistiu tanto...
-
Quem é ela? Como se chama?
-
Não quis dizer o nome...
Esta
circunstância excitou ainda mais a cólera de Denise, que investiu novamente
contra o velho servidor, dizendo:
-
Mas isso é mesmo um abuso, um absurdo! Perturbar-me por causa de uma pessoa que
nem sequer conheço! Vou contar a meu pai!
-
Condessinha, lamento imensamente, a tal senhora usou um tom quase imperativo e
disse que se trata de assunto de tanta importância, que não tive coragem de
recusar-me a atendê-la...
Naquele
momento, penalizada por ver o mordomo tão humilhado, Maria "Flor de
Amor" interveio:
-
Não acha que seria melhor conceder-lhe alguns minutos, atender a essa
misteriosa visitante, condessinha Denise? Ela deve ter percebido, por causa das
carruagens lá fora e do movimento de convidados no jardim, que hoje é o dia do
seu casamento e se está insistindo tanto em lhe falar, deve ter um motivo bem
grave.
Não
podendo deixar de admitir que o que ouvia era sensato, e também curiosa,
malgrado seu, pelo último detalhe revelado pelo mordomo, Denise, embora
fingindo estar ainda muito contrariada, cedeu.
-
Está bem, então - disse. - Vou vê-la! Mas você me esperará aqui. Demorarei só
uns minutos.
Pediu
que “Flor de Amor” lhe tirasse o véu e, com um gesto irritado segurou a longa
cauda do vestido nupcial e, saindo do aposento, percorreu o longo corredor
pavimentado de mármore negro, brilhante como um espelho. E quando chegou diante
da porta da sala verde, nervosamente a escancarou e, bem no fundo da sala,
junto a uma janela que dava para o parque, avistou a senhora vestida de negro
que Pedro lhe descrevera. Como o mordomo bem dissera: do pequeno chapéu, também
negro, que trazia à cabeça, descia um véu que lhe ocultava completamente o
rosto. A desconhecida, mal ouviu a porta ser aberta, virou-se para o ponto de
onde Denise surgira impaciente, vindo em sua direção e dizendo num tom
visivelmente irritado:
-
Que é que deseja a senhora? Peço que seja breve, porque, como está vendo pelo
meu traje, neste momento estou ocupadíssima. E então?
-
Então... Não me reconhece, Denise?
Paulo, fiquei curiosíssima! Quem será essa mulher? Será Renata a mãe de Denise? Esse casamento se realizará mesmo? Pobre Maria "Flor de Amor", vai ter uma grande desilusão, se isso acontecer!
ResponderExcluirEstou gostando muito dessa parte em que Denise e Maria ficam juntas sem saber quem são. Como será a revelação? Deve ser emocionante. Vamos esperar para ver... Muito bom, Paulo.
ResponderExcluirAinda demora para esta revelação.....
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